domingo, 8 de julho de 2012

Em Meio À Corrida Do Brasil Para Se Desenvolver, Trabalhadores Resistem


do The New York Times



Por SIMON ROMERO
Publicado em: 05 de maio de 2012

JACI PARANÁ, Brasil - A revolta aqui, nas margens do Rio Madeira, maior afluente do Amazonas, incendiou após o ocaso. No final latente de uma greve de 26 dias de 17.000 trabalhadores no mês passado, uma facção de trabalhadores que estavam furiosos com salários e condições de vida começou a atear fogo ao canteiro de obras na barragem de Jirau.

Ao longo da noite, eles queimaram mais de 30 estruturas e saquearam lojas da empresa, capturando o caos em suas próprias câmeras de celulares, antes de os bombeiros extinguirem as chamas. As autoridades em Brasília voaram em centenas de tropas de uma força de elite para acabar com a agitação.

Homens com roupas camufladas ainda patrulham o local de trabalho em expansão, refletindo um dilema para os líderes do Brasil. Mesmo quando se movem para tocar uma das últimas grandes reservas de energia hidrelétrica do mundo, a bacia amazônica, greves e revoltas operárias nos maiores projetos estão produzindo atrasos e custos suplementares.

"Ninguém queima qualquer coisa se eles estão satisfeitos", disse Altair Donizete de Oliveira, um líder sindical aqui na fronteira oeste do Brasil. Ele listou os salários, alojamentos insalubres e pedidos de mais visitas ao lar entre as queixas que estavam contribuindo para a tensão purulenta entre os trabalhadores, que somam dezenas de milhares de pessoas de vários locais de trabalho na Amazônia.

O Brasil está liderando uma corrida entre as nações sul-americanas para construir uma matriz de dezenas de barragens na Amazônia. As autoridades esperam pelo menos 20 importantes projetos hidrelétricos, incluindo as barragens de Jirau e Santo Antônio aqui no Estado de Rondônia, a serem construídas no Brasil na próxima década. Em outros lugares na Amazônia, o trabalho começou no projeto da maior represa do Brasil, Belo Monte, um esforço para desviar o rio Xingu exigindo mais de US$ 12 bilhões.

O avanço dos projetos abriu o Brasil a críticas de grupos ambientalistas, que dizem que o deslocamento de povos indígenas e as inundações de faixas de floresta tropical - potencialmente liberando grandes quantidades de gás metano - superam os benefícios das barragens.

Mas as autoridades argumentam que o Brasil precisa de barragens para atender à demanda por eletricidade, que está prevista para subir 56 por cento até 2021. A presidenta Dilma Rousseff defendeu vigorosamente os projetos em abril, acusando os adversários de viverem num reino de "fantasia" se achavam que o Brasil poderia melhorar os padrões de vida apenas com energia renovável.

"Eu tenho que explicar às pessoas como eles vão comer, como eles vão ter acesso à água, como eles vão ter acesso à energia", disse Dilma.

A grande aposta brasileira nas barragens é ilustrada pela urgência com que os funcionários estão avaliando os problemas trabalhistas em Jirau, que foi atingida por um motim anterior, em 2011, quando os trabalhadores atearam fogo em 35 locais que serviam como alojamentos e 45 ônibus. O governador de Rondônia, recentemente pediu a Brasília para enviar tropas para ocupar os projetos de barragens. Gilberto Carvalho, um alto assessor de Dilma, disse que a agitação em abril foi de "banditismo" que exigia uma resposta forte.

Juntos, os levantes atrasaram a conclusão da barragem de Jirau por meses. Greves, recentemente, também pararam o trabalho em Santo Antônio, que também fica no Rio Madeira, e em Belo Monte, onde milhares de trabalhadores chegaram na cidade remota de Altamira.

As preocupações sobre um potencial efeito dominó de agitação trabalhista em outros grandes projetos de infraestrutura estão emergindo à medida que trabalhadores pressionam por aumentos salariais num momento em que a taxa de desemprego do Brasil, atualmente em 6,2 por cento, está historicamente baixa.

Funcionários da União dizem aqui que a informação sobre as estratégias para a obtenção de melhores salários e benefícios é rapidamente partilhada em mensagens de texto e e-mails entre as equipes de trabalho em extremidades diferentes da Amazônia, permitindo que os sindicatos rapidamente exerçam pressão sobre os empregadores.

Fora da Amazônia, greves recentes, algumas delas violentas, podem ter alterado projetos em construção pela gigante do petróleo Petrobras, incluindo o complexo petroquímico Comperj, no Rio de Janeiro, o porto de Barra do Riacho, no estado do Espírito Santo, e a refinaria Abreu e Lima, no nordeste.

Embora o Brasil tenha reduzido a desigualdade de renda dentro de suas fronteiras, os salários para trabalhadores braçais aqui ainda ficam atrás dos praticados nos mais ricos países industrializados. Os salários iniciais na represa Jirau permanecem em cerca de 525 dólares por mês, num país onde o custo de vida rivaliza ou supera o dos Estados Unidos.

"Meu salário aqui é uma vergonha, metade do que eu ganhava em Angola", disse João Batista Barbosa Arce, 29, um trabalhador da construção que chegou a Jirau depois de trabalhar para uma empresa brasileira de construção em um projeto de barragem africano. Ele disse que perdeu todos os seus pertences no incêndio em abril.

Os executivos que fiscalizam o projecto da barragem questionam as afirmações de que os salários aqui são muito baixos para os padrões brasileiros, ou que as condições de vida são precárias, dizendo que os trabalhadores têm acesso a Internet-cafés, academias, salões de bilhar e até mesmo cinemas que mostram filmes "picantes", ou atrevidos.

"Todo esforço é feito para humanizar as condições para os milhares de homens e mulheres que trabalham aqui", disse José Lucio de Arruda, diretor da empresa que irá operar Jirau, controlada pela gigante de energia francesa GDF Suez em parceria com duas companhias elétricas estatais estaduais brasileiras e a Camargo Corrêa, uma empresa de construção.

Ainda assim, os nervos continuam à flor-da-pele em Jirau, que está programada para começar a produzir electricidade em 2013. A Agência Brasileira de Inteligência, que é conhecido como ABIN, acompanhou de perto a situação, e centenas de policiais militares da Força Nacional de Segurança Pública percorrem o chão em picapes Mitsubishi.

"É estranho ver a polícia em patrulha agora, mas também reconfortante", disse Gua Xiaoyi, um empregado da Dongfang Electric, uma empresa chinesa que está fornecendo turbinas para Jirau.

Fora dos portões de Jirau, o projeto e seu influxo de trabalhadores têm refeito a paisagem amazônica. A economia de Rondônia cresceu 7,3 por cento em 2011, a maior taxa entre os 26 estados do Brasil. Gestores brasileiros e chineses vivem com conforto em Nova Mutum Paraná, uma cidade construída a partir do zero há dois anos para reassentar as famílias deslocadas pela barragem.

Seus cerca de 6.000 habitantes beneficiam-se das ruas pavimentadas, de dois supermercados, um heliporto e sete igrejas. Dirija por 10 minutos por uma estrada através da floresta limpa, porém, e outro assentamento, Jaci Paraná, que se parece o gêmeo distópico de Nova Mutum Paraná, entra em exibição.

A população de Jaci Paraná aumentou para mais de 15.000 de 4.000 desde que a construção das barragens começou em 2008. Todos os dias da semana, ônibus descarregam trabalhadores perto das estradas de terra aqui alinhadas com bordéis. O mau cheiro do esgoto bruto permeia o ar.

Os moradores fazem uma piada sombria de que a cidade é um exemplo do “Faroeste” do Brasil, ou Far West, apontando para relatos de pistoleiros contratados para acertar as contas entre posseiros e uma cova rasa nos arredoresde Jaci Paraná, onde os corpos de seis vítimas de assassinatos, incluindo uma de cinco anos de idade, foram encontrados em dezembro.

Ainda assim, oportunidade persistem em meio à balbúrdia, e caçadores de fortuna variados que fizeram o seu caminho até aqui são gratos pelos projetos hidrelétricos. "As barragens têm sido nossa salvação", disse Leude Amorim, 29, dono do Big Stop, um bar em Jaci Paraná.

Após a conclusão da construção, apenas 400 funcionários em tempo integral serão necessários para operar Jirau, ante um pico de mais de 20.000 trabalhadores em 2011. Milhares de trabalhadores já começaram a procurar emprego em outros lugares na Amazônia, forçando Jaci Paraná e outras partes em expansão de Rondônia a refletir sobre um futuro declínio.

"Claro que eu não me sinto totalmente seguro aqui", disse Leonice Layanoya, 50, um balconista de uma loja na localidade de Jirau que foi saqueada durante a agitação. Ainda assim, ela disse que estava fazendo planos de se mudar para Belo Monte, na esperança de encontrar trabalho no maior projeto da Amazônia.

 “Estes são lugares assustadores," disse a Sra. Layanoya, " mas que outra escolha eu tenho a não ser seguir o dinheiro?"

Lis Horta Moriconi contribuiu com a reportagem do Rio de Janeiro.

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