domingo, 17 de março de 2013

Os Inaceitáveis privilégios do Ministério Público da União

 Da vanguarda ao atraso

Por Mauricio Dias na carta capital

Está na pauta do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) a proposta para a criação do auxílio-moradia e o pagamento de verbas indenizatórias em relação ao auxílio-saúde recebido pelos membros do Ministério Público da União e dos estados.

Aprovado, o benefício alcançará cerca de 20 mil procuradores e, por discutível isonomia, beneficiará os juízes em número igual ou superior. Esse privilégio se soma ao vale-alimentação e ao plano de saúde já existentes.

A criação do auxílio-moradia, no valor aproximado de 3 mil reais mensais, trará embutido o princípio da retroatividade de cinco anos.

Quem estiver interessado faça as contas. Antes, porém, sente-se para suportar o susto provocado por essa retroatividade: 3 mil reais por mês viram 36 mil anuais; multiplicado pelos 60 meses referentes aos cinco anos retroativos, o resultado se transforma em 180 mil, sem contar a correção. Agora basta multiplicar pelos integrantes do MP. E não se pode esquecer, posteriormente, de fazer a mesma conta para a Magistratura. Esse princípio de equiparação, segundo a ministra Eliana Calmon, foi estabelecido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Justiça, neste caso, em causa própria.

A enaltecida ministra, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), recebeu, em setembro, 84 mil reais do citado auxílio-alimentação. Naquele mês, o jornal O Estado de S. Paulo revelou que o contracheque dela registrou salário de R$ 113.009,50.

Com a mesma coragem com que denunciou juízes corruptos ou, segundo ela, “bandidos de toga”, a ministra respondeu publicamente ao jornal: “O Ministério Público já recebe esse vale-alimentação sem questionamento algum. O Conselho Nacional de Justiça entendeu o processo de equiparação e isso levou ao pagamento”.

Data venia, a magistrada não se saiu bem quanto a esse privilégio. Sobre esse ganho, cerca de mil reais por mês, não incide Imposto de Renda. O Leão é manso. Não ruge  nem morde essa gente.

O procurador-geral da República paga vale-alimentação a todos os membros do Ministério Público da União, sem que haja lei prevendo tal benefício. A Constituição fixa a remuneração dos integrantes do MP como “parcela única”, o subsídio. O pagamento seria, portanto, ilegal.

Tudo indica que isso se transformou numa artimanha para contornar as decisões da Presidência e do Congresso. Ou seja, inconformados com o aumento oficial que recebem, articulam aumento sobre o aumento. Tudo em causa própria.

A ministra Eliana Calmon errou também quando disse que o MP vem recebendo o vale, isso sem questionamento algum. Há quem questione, sim.

Eliana Calmon. Desta vez, justiça em causa própria. Foto: Luiz Silveira / Agência CNJ

Eliana Calmon. Desta vez, justiça em causa própria. Foto: Luiz Silveira / Agência CNJ

Luiz Moreira Lima, conselheiro do CNMP, que travou e venceu, praticamente isolado, a luta com Gurgel e asseclas para ser reconduzido à função, tenta fazer prevalecer a lei. Ele pediu vista e, ao avaliar a instituição auxílio-moradia, desmontou esse sistema alternativo criado para driblar o aumento oficial.

Essa situação mostra mais um retrocesso nos princípios republicanos. O Ministério Público ganhou vida nova com a Constituição de 1988. Tornou-se uma instituição de vanguarda do Estado brasileiro na luta contra velhos vícios da República. Há exceções, mas a regra não durou muito.

O corporativismo renasce recrudescido numa das mais importantes instituições da República.

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