quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Em processo contra o Facebook, senador também fez pedido de sigilo, mas Justiça recusou




Por Renato Rovai, colaborou Marcelo Hailer

O senador Aécio Neves teria ingressado com um processo de procedimento sumário contra o Google e outras empresas de internet solicitando exclusão de conteúdo com base em direito de imagem.
O processo de número 1102747-51.2013.8.26.0100 foi distribuído para a 2a Vara Cível no dia 16 de dezembro último, às 15h12, – Foro Central Cível – de São Paulo e está sob a guarda do juiz Tom Alexandre Brandão. Informações desse processo podem ser acessadas neste link.

O nome do requerente aparece como A. N. Da C., iniciais que coincidem com o nome completo do senador, Aécio Neves da Cunha. Um dos requeridos, G. B. I. L coincide com as iniciais do Google do Brasil Internet Ltda. Outras empresas requeridas foram a C.S., a M.I.L e a N.S.N do B.S. De C. L.
A fonte que passou as informações do processo para a revista Fórum não tinha conhecimento de que empresas se tratavam as outras citadas no processo por iniciais.

A assessoria de imprensa do Google, procurada pela Fórum, num primeiro momento disse que: “O Google informa que cumpriu a decisão judicial fornecendo os dados solicitados pela justiça brasileira.” E depois procurou a redação para que seu posicionamento fosse alterado por se tratar de uma ação da qual não teriam sido citados. “O Google nem chegou a ser citado, portanto, não temos nada a comentar.”

O senador Aécio Neves também foi procurado. Seu assessor, Fernando, afirmou desconhecer o assunto, afirmando que retornaria o contato. Depois de insistentes ligações da reportagem, porém, não ofereceu resposta até o fechamento desta nota.

Fórum procurou, ainda, a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo e a resposta foi de que o juiz não pode dar entrevista porque o processo corre em segredo de justiça.

Em relação ao processo contra o Facebook, não há segredo de justiça, por isso o nome do senador e da empresa podem ser verificados neste link do Diário Oficial do último dia 10, reproduzido no Jus Brasil.

O senador, porém, também tentou obter sigilo nesse processo, como se pode verificar no trecho destacado abaixo. A Justiça indeferiu o pedido por duas vezes.

Processo 1091699-95.2013.8.26.0100 – Procedimento Sumário – Direito de Imagem – AÉCIO NEVES DA CUNHA – Facebook Serviços Online do Brasil Ltda e outro – Certidão – Oficial de Justiça – Mandado Cumprido Positivo – Processo Digital – ADV: JULIANA ABRUSIO FLORÊNCIO (OAB 196280/SP), CELSO DE FARIA MONTEIRO (OAB 138436/SP), EMELYN BARBARA ZAMPERLIN NASCIMENTO (OAB 318405/SP)

Processo 1091699-95.2013.8.26.0100 – Procedimento Sumário – Direito de Imagem – AÉCIO NEVES DA CUNHA – Facebook Serviços Online do Brasil Ltda e outro – Vistos. 1. Fls. 104/112: O requerimento de reconsideração da decisão de fls. 92/93, no que concerne ao indeferimento requerimento de tramitação do feito como segredo de justiça, não pode ser deferido, porquanto inexistente fato novo que autorize o reexame da questão. 2. Ciência ao autor quanto aos termos das petições de fls. 114/117 e 221/224, bem como quanto aos documentos que as acompanham. 3. No mais aguarde-se a apresentação de contestações tempestivas. 


Int. – ADV: JULIANA ABRUSIO FLORÊNCIO (OAB 196280/SP), CELSO DE FARIA MONTEIRO (OAB 138436/SP), EMELYN BARBARA ZAMPERLIN NASCIMENTO (OAB 318405/SP)

Consultado pela reportagem, o Facebook, por meio de sua assessoria, diz que não se pronuncia sobre processos judiciais. Estejam ou não em andamento.

Segredo de justiça e privacidade 

Pedro Estevam Serrano, advogado e professor de Direito Constitucional da PUC-SP, mestre e doutor em Direito do Estado, diz que não é possível afirmar se há justificativa para que o processo tramite em segredo de justiça, mas diz que em geral, na área cível, isso só é comum em casos de família e que envolvam menores. “Afora essas situações, é preciso verificar o processo e o juiz é quem analisa os riscos que existem de dar publicidade. Mas o padrão é que os processos tenham publicidade”.
O assunto do processo de Aécio contra o Google é de “direito de imagem”. Serrano considera que “o conteúdo concreto do direito de imagem muda concretamente de acordo com a pessoa”. Segundo ele, há uma dimensão subjetiva, no caso do direito de intimidade. “Ele é maior quando não tenho uma vida publicizada. Mas quando alguém é político e como, no caso dele, candidato a presidente da República, faz-se uma opção em que seu direito de intimidade é menor. Esse é um dos ônus do regime democrático, porque a pessoa decidiu fazer parte do processo público”, considera.

Serrano tem posição bastante liberal em relação à cobertura da imprensa e a liberdade de debate no processo político. “Acho muito boa a postura da mídia brasileira de preservar a intimidade dos políticos, mas essa é uma postura ética e não jurídica. Quem se candidata tem que estar disposto a esse escrutínio, porque questões pessoais que possam influenciar a prática de atos públicos caso a pessoa seja eleita podem ser fruto de debate.

Serrano dá como exemplo o caso de um presidente alcoólatra. “Se o presidente for alcoólatra isso pode impactar na vida pública. Não acho que esse tipo de informação deva ser censurada”. E vai ainda mais longe. “Até o fato de o candidato ter amantes pode ser fruto de debate público. Porque isso pode ser usado como chantagem contra ele no futuro.”

Na opinião do professor, tudo que possa influenciar direta ou indiretamente a prática de atos públicos ou de um futuro agente público, “em especial de um chefe de poder”, pode ser devassado no debate democrático. “E, havendo dúvida, defendo que o direito se estabeleça a favor da liberdade.”

Histórico de censura 

O senador Aécio Neves, quando governador em Minas Gerais, foi acusado por diversos jornalistas de, a partir de sua irmã, Andrea Neves, recentemente escolhida como uma das 60 pessoas mais poderosas do país, intimidar veículos e constranger a liberdade de imprensa no estado. No vídeo abaixo, Liberdade essa Palavra, tanto o jornalista Marco Nascimento, ex-diretor de Jornalismo da Globo Minas, como o apresentador Paulo Sérgio, ex-apresentador da Itatiaia Patrulha, dão depoimentos neste sentido.

Um dos fatos curiosos relatados neste vídeo é o depoimento do jornalista Jorge Kajuru, que por citar privilégios a convidados do governador Aécio num jogo de futebol da seleção brasileira foi demitido ao vivo pela TV Bandeirantes. Ele acusa diretamente a irmã de Aécio, Andrea Neves, pela demissão.
Outro jornalista demitido diz que foi intimidado pelo atualmente senador Zezé Perrela quando este era presidente do Cruzeiro. Perrella, que recentemente teve um helicóptero de sua família com 450 quilos de pasta de cocaína apreendido, teria dito ao jornalista que quando Aécio Neves assumisse ao governo, ele seria demitido, o que se confirmou posteriormente.

Aécio Neves é aliado do ex-senador Eduardo Azeredo, atualmente deputado federal pelo PSDB-MG. Azeredo foi autor do projeto de controle da internet e de quebra da neutralidade na rede que foi cunhado de AI-5 digital pelos defensores da liberdade na internet.

O professor doutor da Universidade Federal do ABC, Sérgio Amadeu, considera que se o Judiciário brasileiro tiver em relação à internet postura diferente do que tinha sobre os debates na imprensa e na mídia de massas, destruirá a liberdade de expressão no país.

“Nós não podemos aceitar que a crítica política seja entendida como algo que afeta a honra do político. Vários senadores e deputados querem as benesses da representação e ao mesmo tempo querem evitar que os eleitores e cidadãos critiquem suas ações. Também não podemos aceitar casos de dois pesos e duas medidas. A Folha pode fazer humor, mas quando a Falha fez humor com a Folha, o Judiciário deu ganho ao jornal por uso indevido da marca.”, afirmou.

Para Amadeu, o que o senador está tentando é a instituição da censura prévia na internet. “É disso que se trata. É censura prévia. Imagine se o ex-presidente Lula fizesse o que o Aécio está fazendo, sendo que com Lula há exageros muito maiores do que com Aécio.”

http://revistaforum.com.br/digital/130/aecio-faz-uso-de-segredo-de-justica-ao-tentar-censurar-google/

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