Foi assim que o maior ídolo do basquete nacional reagiu quando soube que tinha um tumor de 7,5 cm no cérebro. Recuperado, ele critica os jogadores que não querem defender a seleção
Rodrigo CardosoVIDA NOVA
Hoje ele é comentarista esportivo e vive de
palestras pelas quais cobra R$ 25 mil
"Queria ser presidente. Quando fui candidato ao Senado ganhei
inimigos e ainda recebo críticas. Até minha mulher torceu contra"
"Não imaginava que o Bernardinho pudesse assinar embaixo essa atitude
(entregar o jogo para a Bulgária). Ele era intocável e ganhou uma mácula na carreira"
ISTOÉ - Faz pouco mais de um mês que o sr. descobriu e retirou um tumor do cérebro. Qual a cena mais marcante do processo todo?
OSCAR SCHMIDT - A pior foi depois da ressonância. Um médico espanhol entrou no quarto, onde eu estava internado e disse, seco: “Temos um tumor de 7,5 cm no cérebro”. E a minha filha, do lado da minha cama, ouvindo isso. Que jeito mais frio da porra! Pensei: “Morri, né? Mas a minha vida foi boa”. Eu sempre comentava em casa e com os amigos que achava que já poderia morrer, porque tenho a sensação de missão cumprida. Então, quando eu soube do tumor, não fiquei nervoso com a possibilidade da morte. Só me preocupava como a minha mulher e meu filho estavam se sentindo naquele momento. Eu não via a possibilidade de um tumor daquele tamanho não ser maligno. Demorou cinco dias para sair o resultado da biópsia: era benigno.
ISTOÉ - Como foi realizada a operação?
OSCAR SCHMIDT - Entrei na sala de cirurgia e vi dez pessoas. Vi que iriam fazer uma coisa grande. Acordei sete horas e meia depois. Foi feito um corte sobre a minha cabeça de orelha a orelha. Puxaram a pele do meio da cabeça até a sobrancelha. Abriram um quadrado na parte esquerda da testa e ali operaram. Frankstein mesmo! O tumor ficava aqui na frente, do lado esquerdo.
O médico o retirou por inteiro. Abrir a cabeça e remexer lá dentro é uma pancada. Eu poderia perder a fala na cirurgia – sendo que, hoje, eu sou comentarista e palestrante. Mas o doutor foi muito seguro. Me dizia para eu não me preocupar porque iria dar tudo certo. Não tenho sequela nenhuma. Tem gente que sai paralítico de uma cirurgia como essa. Deus foi meu amigo. Ele deve ter pensado: “Deixa eu dar um susto nele, porque anda muito nervoso”. A vida é curta e tem de ser bem vivida com a família e os amigos. Já me sinto mais calmo do que antes. Estou muito mais complacente com a minha esposa. Eu sabia que era admirado pelas pessoas, mas com esse episódio descobri o quanto eu sou querido.
ISTOÉ - Como está a recuperação?
OSCAR SCHMIDT - Ótima. Estou curado. Não preciso fazer nenhum tratamento, químio ou radioterapia. Em uma escala que vai até quatro, meu tumor era grau dois e tinha um crescimento muito lento. Por isso, não tive nenhum sintoma de que ele estaria ali. Saí da mesa de cirurgia tomando dez remédios diferentes. Hoje, tomo um anticonvulsivo e um antibiótico. Quatro dias depois de ser operado, peguei uma infecção por meio do cateter. A Stephanie me falou algo genial: “Pá, não se preocupa. Seus glóbulos brancos são verdadeiros gladiadores”. Jamais esquecerei disso. Tirei do cérebro um tumor de 7,5 cm! Fiquei 12 dias internado. Estou de alta e posso fazer tudo, até jogar futebol. Mas não voltei a jogar porque não posso cabecear, apesar de já ter batido a cabeça numa coluna dia desses. Já fiz uma palestra e, depois, em outubro, vou trabalhar um mês em Guadalajara, no México, cobrindo o Pan-Americano para a Record.
ISTOÉ - Em 2008, o sr. trocou a Globo pela Record. Por quê?
OSCAR SCHMIDT - A Globo me fez ídolo. Eu não teria me tornado ídolo se não fosse ela. É um canhão aquilo lá, todo mundo vê. Mas está ficando cada vez menos potente. Troquei pela Record, porque ela me deu mais espaço. Na Globo, eu ficava meses sem fazer nada. Depois da Olimpíada de Pequim (2008), se eu não fosse amigo do Faustão, eu não teria ido a lugar nenhum (feito nenhuma aparição). Eu gostaria muito que o Tadeu (Schmidt, irmão de Oscar e apresentador de um quadro esportivo no “Fantástico”) se tornasse o apresentador do “Fantástico”. O meu irmão é tão importante na Globo que eu saí de lá e não aconteceu nada com ele. O Tadeu é um fenômeno. Conseguiu fazer as coisas que estão na nossa cara de modo agradável.
ISTOÉ - Por que um ídolo do esporte como o sr. tentou a carreira política?
OSCAR SCHMIDT - Eu passei 13 anos na Europa pensando em um dia ser presidente do Brasil. Meu pai é militar, sou patriota do tipo de ter bandeira do Brasil em todo lugar. Queria ser presidente. Na época, fui convidado para ser secretário de Esportes de São Paulo. Apesar de ouvir muitas opiniões contrárias, quero sempre errar com a minha cabeça. E a política, de fato, não era a minha vida. Tudo me incomodava. Eu queria fazer algo, mas tinha de passar por licitação antes. Aí, vai demorando, demorando... e perde-se até a vontade de fazer. Quando fui candidato ao Senado foi pior. Ganhei inimigos e ainda hoje recebo e-mails com críticas. Minha mulher torceu contra a minha candidatura e ainda bem que eu perdi. Prefiro ficar assim, de calça de agasalho, chinelo e meia. Minha carreira na política durou um ano e meio. E, ainda hoje, recebo proposta para ser candidato e assumir secretarias. Claro, eu tive quase seis milhões de votos (para o Senado)! Mas joguei fora esse patrimônio para ter uma vida de comentarista e palestrante. Pode ser que, naquela época como político, eu tenha pego o tumor. Por que não?
ISTOÉ - Ficou mais impaciente depois de encerrar a carreira de jogador?
OSCAR SCHMIDT - Sim. Eu sempre fui nervoso, com meus filhos, a esposa. Discutia por causa, sei lá, de uma janela aberta ou não, sem motivo algum, uma perda de tempo. Você veja: fui atleta, nunca bebi, nunca me droguei ou fiz extravagância e tive um tumor no cérebro. Essa destemperança não vale a pena. Sou casado há 36 anos. A Cris é, mais do que mulher, o ser humano da minha vida. Não sei se teria sucesso sem ela, que largou o quinto e último ano de psicologia, a dois meses de concluí-lo, para ir morar comigo na Europa. Dedicou a vida a mim. Nunca me pressionou para ajudar com os filhos. Pouca mulher faz isso.
ISTOÉ - O Leandrinho, estrela da seleção que joga na NBA, pediu dispensa e não irá disputar o Pré-Olímpico. Anderson Varejão e Nenê, que também jogam nos EUA, já optaram por não defender a seleção. Por que isso tem se tornado comum?
OSCAR SCHMIDT - O campeão da NBA deste ano, o alemão Dirk Nowitzki, declarou que quer muito jogar o Pré-Olímpico pela Alemanha. O Paul Gasol foi campeão pelo Los Angeles Lakers, serviu a seleção da Espanha e com ela foi campeão mundial. O Kobe Bryant e o LeBron James defendem os Estados Unidos por patriotismo. E os nossos craques, que não são craques nos Estados Unidos, não querem jogar na seleção. Isso irrita muito. Diz logo que não quer mais jogar pelo Brasil. O Nenê não joga mais pelo Brasil porque não quer. Não adianta ficar com desculpas esfarrapadas. Alguns argumentam: “Ah, eles têm de pensar na família, ganham muito dinheiro e não podem correr o risco de se machucar (defendendo o Brasil)”. Porra, paguem um seguro (contra contusões)! Eu pagava um seguro anual. Por que eles não podem?
ISTOÉ - Qual o porquê dessa situação?
OSCAR SCHMIDT - O Brasil não conquistou grandes resultados ultimamente. As não classificações para as últimas três Olimpíadas e os péssimos resultados em Mundiais fizeram aparecer uma pressão enorme para que se obtenha bons resultados. Isso prejudica o time, que sempre perde no final. A pressão é tão grande que não tem nenhum jogador com a atitude de pedir a bola para decidir no ataque ou gritar na defesa. O mal do nosso basquete é a falta de liderança e a abnegação de todos. O Nenê se apresentou para o último Pré-Olímpico acima do peso, fora de forma. Dois jogos depois foi titular. Imagina se os outros jogadores acham isso legal? Na minha geração isso não aconteceria. O que pesa para o Nenê é ele nunca querer jogar na seleção. Isso irrita. O basquete brasileiro está perdendo todos os potenciais jogadores para o vôlei, cuja seleção raramente perde
ISTOÉ - A seleção do Bernardinho já perdeu de propósito no último Mundial, ano passado, não é?
OSCAR SCHMIDT - É. Isso eu não engulo. O time de vôlei do Brasil perdeu de propósito para a Bulgária – e veja –, que também estava em quadra para entregar o jogo para o Brasil! Certa vez, alguém sugeriu, dentro da seleção, que entregássemos um jogo. Quase houve briga. O time do Brasil é o dream team do vôlei mundial, não precisa perder para escolher o adversário seguinte (a seleção venceu o Mundial). Não imaginava que o Bernardinho pudesse assinar embaixo essa atitude. Era intocável e ganhou uma mácula na carreira. Foi campeão mundial e, na volta, teve de justificar porque perdeu para a Bulgária. Disseram que houve uma votação entre o grupo. Não existe isso! Quem manda é um só e vem de cima para baixo. Tenho certeza de que muitos jogadores e o próprio Bernardinho se arrependem de ter disputado aquela partida. Perder no esporte de propósito vai contra a lei da dignidade.
ISTOÉ - O contrato do Felipe Massa com a Ferrari já o fez deixar de ultrapassar um adversário.
OSCAR SCHMIDT - Não pode ter contrato para perder. Pensei que só o Rubinho faria isso, mas o Massa fez a mesma merda. O Senna jamais faria, mas, se fizesse, passaria na frente do boxe dando banana para os chefes.
ISTOÉ - O Neymar desponta como novo ídolo do esporte nacional. Mas um técnico de seu time, o Santos, foi demitido porque não abria mão de punir um ato de indisciplina dele. Como vê a carreira de Neymar?
OSCAR SCHMIDT - Esse menino teve muitas atitudes feias, sobretudo a demissão do Dorival Júnior do cargo de técnico do Santos. Ele é um menino, mas deveria ter insistido para que a diretoria respeitasse a pena que seu técnico queria lhe aplicar (ficar de fora no clássico contra o Corinthians, no ano passado). Ele deveria dizer que não queria ser responsável por derrubar um técnico. Depois desse episódio, passei a odiá-lo. Mas, recentemente, elogiei-o no meu blog por ter boas atitudes. É craque e espero que seja o melhor do mundo. Derrubar técnico é o segundo pior erro de um atleta. O primeiro é perder de propósito.
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