Foto: Phil Noble/Reuters
AOS 86 ANOS DE IDADE E APÓS 60 ANOS DE REINADO, O FASCÍNIO QUE ELIZABETH II EXERCE SOBRE SEU POVO E A MÍDIA PERMANECE INTACTO. QUAL SERÁ O SEGREDO DO SUCESSO DA SOBERANA INGLESA?
Imagens: Divulgação
Ela completou 86 anos no dia 21 de abril, e festeja neste início de junho o seu Jubileu de Diamante: 60 anos de reinado! Apesar disso, Elizabeth II permanece na crista da onda para a mídia e para os seus cerca de 130 milhões de súditos. Mas que significa ser rainha no século 21? Quais são suas "reais" incumbências? Desde 1952, Elizabeth conferiu 387.700 condecorações, inaugurou 15 pontes, lançou ao mar 23 navios, convidou ao palácio 1,1 milhão de hóspedes, presidiu 256 visitas oficiais a 129 países estrangeiros e recebeu mais de 3 milhões de cartas (cerca 150 ao dia).
Por que uma instituição tão fora de moda como a da monarquia inglesa ainda atrai tanto a curiosidade e a atenção da mídia? Para começar, desde sempre, os membros das realezas foram as primeiras celebridades, graças à visibilidade de que gozavam quando ainda não existiam cinema ou televisão e as suas efígies giravam de mão em mão, estampadas nas moedas. Foi essa extrema visibilidade que alimentou e continua alimentando a nossa fantasia.
Reis das manchetes
750 milhões de espectadores permaneceram grudados à televisão para seguir as primeiras bodas de Charles da Inglaterra com Diana Spencer. Dois bilhões e meio acompanharam os funerais de Lady D, em emissões diretas de TV. A estrela Diana, na verdade, nunca se apagou: muitos ainda hoje estão dispostos a pagar 45 mil euros a diária para alugar a residência da família em Northamptonshire (Inglaterra) e dormir na cama da princesa.
O segundo casamento de Charles teve menor audiência, mas sua longa história amor com Camilla Parker Bowles durante anos encheu as páginas dos jornais. E logo se tornará um filme para a TV.
O matrimônio entre Charles e Camilla foi um fracasso para os vendedores de suvenires: em 1981, para as primeiras núpcias do herdeiro do trono, foram produzidos mais de 1600 tipos de lembrancinhas com os rostos dos esposos (chícaras, camisetas, chaveiros, botões, etc). As mesmas peças, acrescidas de outras, foram vendidas aos milhões de exemplares também depois do divórcio e do prematuro desaparecimento da princesa.
O matrimônio entre Charles e Camilla foi um fracasso para os vendedores de suvenires: em 1981, para as primeiras núpcias do herdeiro do trono, foram produzidos mais de 1600 tipos de lembrancinhas com os rostos dos esposos (chícaras, camisetas, chaveiros, botões, etc). As mesmas peças, acrescidas de outras, foram vendidas aos milhões de exemplares também depois do divórcio e do prematuro desaparecimento da princesa.
Por que tanto interesse pela família real inglesa? Como conseguiu a família Windsor resistir e geralmente vencer o ataque concorrente de atores, cantores, jogadores de futebol e animadoras de TV que colonizam as páginas dos diários e das revistas?
Cerimônias da corte
Sobretudo na Europa, as crônicas mundanas estão cheias de histórias de príncipes e rainhas: no mundo existem hoje 29 famílias reais, 7 delas apenas na União Europeia (Espanha, Bélgica, Holanda, Dinamarca, Suècia, Noruega, Luxemburgo). Nenhuma delas, no entanto, é mais alvo dos holofotes da imprensa do que a Casa Real inglesa.
Na Grã-Bretanha existe um grande apego à monarquia e a seus rituais. Essas cerimônias possuem grande valor unificador em todas as sociedades, mas na Grã-Bretanha a instituição mais ritualizada não é a igreja, e sim a monarquia. Os reis da Inglaterra continuam, por outro lado, a ter uma ambígua função religiosa, testemunhada pelo bordão "God save the Queen" (Deus salve a Rainha).
Concentra-se nela toda uma série de liturgias que perpetuam a existência de uma relação simbiótica entre o rei e Deus, o que não impede o soberano de manter os seus súditos por perto. Várias vezes ao ano eles são chamados a se reunir ordenadamente ao longo das ruas para assistir a passagem da rainha; é como se a soberana visitasse por instantes a sala de visitas da casa de cada um deles.
Na Inglaterra, a "democratização" da sociedade não chegou à monarquia que se nutre desde sempre de ritos exclusivos. Um deles é a coroação, que se repete a cada vez exatamente como no século 14. Ou a abertura anual do Parlamento, à qual a rainha chega de carruagem, toda enfeitada com a coroa e com paramentos preciosos.
Nada a ver, percebe-se, com os costumes dos "monarcas ciclistas", como são chamados os soberanos do norte da Europa que podem ser encontrados no supermercado fazendo as compras da semana. Numa entrevista, o historiador Anthony Sampson, especialista em questões reais, disse: "As pessoas deste país, a Grã-Bretanha, amam o fausto, amam assistir às grandes cerimônias. Existe um nível de fantasia que precisa ser alimentado".
Fechado por luto
Assim sendo, no século 19, a rainha Vitória apostou na visibilidade cenográfica, com um cerimonial cheio de pompa e desfiles majestosos, para levantar o prestígio da monarquia depois da crise que tomou conta de Buckingham Palace, "fechado por luto". Durante três anos, com efeito, abalada pela morte do marido, o príncipe Alberto, Vitória literalmente desapareceu da visão dos seus súditos, que não a perdoaram.
A mesma indignação se espalhou quando Elizabeth II decidiu não retornar imediatamente a Londres depois da morte de Diana, preferindo permanecer na sua residência de verão, o castelo de Balmoral, na Escócia. As pessoas queriam que sua rainha representasse o estado emocional da inteira nação perante o mundo.
Fascínio vem de longe
O que representam os reis e rainhas para os que não são seus súditos? Os especialistas dizem que a monarquia simboliza a estabilidade e a continuidade da história. Os tempos mudam, mas a realeza permanece sempre lá, imóvel, a nos recordar nossos laços com o passado.
O sobrenome histórico que carregam há séculos nos faz sonhar. No caso dos atuais soberanos ingleses, foi o pai de Elizabeth II, Jorge VI, a mudar em 1917 o nome alemão da família real Sachsen-Coburg-Gotha para Windsor (uma das mais prestigiosas propriedadees da família), para respeitar as posições políticas anti-alemães e não ferir a sensibilidade dos súditos.
A imensa fortuna real
No imaginário coletivo pesa também a riqueza da família real. Elizabeth é uma das mulheres mais ricas do mundo. Recebe do governo uma assistência monetária de 11,8 milhões de euros ao ano. Mas nos últimos tempos os negócios não têm corrido muito bem. Em 1993, seu patrimônio pessoal, que inclui residências, obras de arte, a coleção de selos mais importante do mundo, carros, aviões e até o Royal Train, o trem real, era avaliado ao redor de 7 bilhões de dólares (5,7 bilhões de euros), fazendo da rainha a mulher mais rica da Inglaterra. Em 2005, a caderneta da rainha retrocedera à 180ª posição, apenas superando 500 milhões de dólares (408 milhões de euros).
Muito menos do que os bens de outros personagens reinantes, como o rei da Arábia Saudita, Fahd Bin Abdul Aziz Alsaud, que possui bens avaliados em 18 bilhões de euros, ou o sultão de Brunei, que ocupa o segundo lugar entre os soberanos mais ricos do mundo, com um patrimônio de 16 bilhões de euros.
Conto de fadas para adultos
Mas, na verdade, o dinheiro não é tudo. Reis e rainhas são modelos ancestrais para o ser humano: a mamãe é a rainha, o papai é o rei e ambos têm cadeira cativa no palácio da lenda e do mito. Desde criança, a imaginação nos faz viver no mágico mundo dos contos de fadas. Essa sensação permanece na idade adulta e, no nosso imaginário, reis e princesas continuam a representar a "família típica".
A aura divina carregada pelos monarcas ingleses implicaria no direito de não serem julgados pelos homens comuns. Mas a monarquia inglesa deve prestar contas para a imprensa inglesa, particularmente gulosa de fofocas coletivas. Estar sempre sob as lentes da imprensa é o outro lado da moeda dos monarcas modernos, e os membros da família Windsor o estão na máxima potência, inclusive devido ao prestígio e o poder da nação que representam.
Do Olimpo à televisão
A cultura de massa (imprensa, televisão, publicidade) diminuiu nas últimas décadas a distância entre súditos e monarcas. "Eles são os primeiros verdadeiros astros e estrelas do mundo das celebridades, os únicos que podem se gabar de possuir uma função sagrada; desde sempre jogam com a ambiguidade da sua investidura pelo povo e sua investidura diretamente de Deus", diz o italiano Enzo Kermol, professor de psicologia da comunicação. "Antes que se impusessem o cinema e a televisão, responsáveis pela coroação das celebridades modernas, eram os reis que possuíam a mais ampla visibilidade: seus rostos eram estampados nas moedas e reproduzidos em telas pelos artistas mais importantes", explica Kermol.
A cultura de massa (imprensa, televisão, publicidade) diminuiu nas últimas décadas a distância entre súditos e monarcas. "Eles são os primeiros verdadeiros astros e estrelas do mundo das celebridades, os únicos que podem se gabar de possuir uma função sagrada; desde sempre jogam com a ambiguidade da sua investidura pelo povo e sua investidura diretamente de Deus", diz o italiano Enzo Kermol, professor de psicologia da comunicação. "Antes que se impusessem o cinema e a televisão, responsáveis pela coroação das celebridades modernas, eram os reis que possuíam a mais ampla visibilidade: seus rostos eram estampados nas moedas e reproduzidos em telas pelos artistas mais importantes", explica Kermol.
Elizabet II, no entanto, sempre demonstrou uma certa aversão em expor-se e sempre viveu um silêncio em relação à mídia. Nunca deu uma entrevista e a cada ano escreve de próprio punho apenas dois discursos, um dirigido aos países da Commonwealth, o outro aos súditos por ocasião do Natal.
Seu filho Charles também se mostra esquivo, tolerando pouco as contínuas incursões de jornalistas na sua vida privada que ele mesmo definiu como "uma indústria para os jornais e televisões". Cada vez com maior frequência, no entanto, a Casa Real inglesa tem de compactuar com seus grandes inimigos, os meios de informação.
A rainha, cuja coroação foi a primeira a ser transmitida pela televisão, consentiu em participar em 1969 de um documentário da BBC intitulado "The Royal Family" (a Família Real), no qual sua família se mostrava, sorridente, ao redor de um enorme churrasco principesco. O objetivo era "fazer com que os súditos aceitassem mais facilmente o sistema, fazendo-os sentir-se parte dele", declarou na ocasião o príncipe consorte Philip.
A princesa do povo
Com as telecâmeras constantemente voltadas para as portas e janelas de seus palácios (e tendo em casa um exército de mordomos, motoristas, secretários, guarda-costas e escudeiros não sempre fidelíssimos) tornou-se cada vez mais difícil mostrar apenas o lado "oficial" da vida dos membros da família. Sem falar nos membros que não sabem manter a boca fechada, como foi o caso de Diana, chamada de "princesa do povo" e também de "princesa da mídia".
Diana foi a primeira a aprender a técnica da negociação, passando notícias em anteprima a cronistas fiéis e fazendo-se "surpreender" por paparazzi amigos em poses e momentos que mais favoreciam o seu personagem. Primeiro, mostrou-se como uma cinderela tímida e apaixonada pelo seu príncipe encantado. Depois, desenvolveu a imagem de esposa e mãe afetuosa, aprendiz de rainha. Por fim, decidiu aparecer sedutora e escandalosa, alérgica à etiqueta da Corte. Levou o processo adiante, até tornar-se vítima, inimiga da mofada instituição monárquica, protetora dos fracos e abandonados.
Nos anos 90, em plena crise matrimonial, Diana Spencer admitiu sofrer de distúrbios alimentares e ser escrava da bulimia. Uma pesquisa hoje revela que naqueles anos dobrou o número de pessoas que buscaram ajuda nas estruturas sanitárias inglesas queixando-se de distúrbios similares. Era o "efeito Diana", o mesmo processo de imitação e admiração sem limites que se estabelece entre um astro do cinema, da TV ou da música e os seus fãs.
Sem perder a aura de modelo inalcançável em sua riqueza e fama, Diana, exposta incessantemente na mídia tornou-se um ideal imitável, a princesa da porta ao lado. A crise com o marido príncipe e as traições recíprocas a tornaram mais burguesa do que nunca. Ao mesmo tempo próxima e inabordável. A ela foram concedidas transgressões e fragilidades não permitidas aos mortais comuns.
Hoje, pouco importa se o comportamento de Charles que esposou a ex- amante, ou do filho Harry, que se vestiu de nazista e foi várias vezes flagrado em clubes duvidosos, sejam considerados reprováveis. O importante é que disso nasça uma notícia, algum fato sensacional que nos faça sentir-se envolvidos e autorizados a proferir críticas e julgamentos, a atirar flechas no mito, para projetar, ou seja, transferir para ele, os nossos próprios sentimentos e as nossas emoções.
Os poderes da Rainha da Inglaterra
A rainha do Reino Unido da Inglaterra e Irlanda do Norte, formalmente, detém todos os três poderes de um Estado democrático: legislativo, executivo e judiciário. No entanto, já no distante ano de 1689, a Bill of Rights (declaração sobre os direitos) sancionou a soberania do parlamento. Hoje, Elizabeth II da dinastia Windsor (no trono desde 1952) é um chefe de Estado formal e cerimonial. Não faz parte do governo, mas recebe semanalmente o primeiro-ministro (atualmente o trabalhista Gordon Brown) para reuniões nas quais tem o direito de exprimir suas próprias opiniões; é, no entanto, tradicionalmente instada a respeitar as decisões do primeiro-ministro e do parlamento.
Os poderes da rainha são chamados de "prerrogativas reais", embora só existam formalmente, e não na prática: pode nomear (e destituir) o primeiro-ministro, dissolver o parlamento, declarar guerra, firmar e paz, etc. No transcorrer do tempo, no entanto, essas funções foram outorgadas por tradição (o Reino Unido não possui uma Constituição escrita) ao próprio primeiro-ministro e ao parlamento. A rainha também possui o direito de aprovar ou rejeitar os projetos de lei: se os aprova, tornam-se lei automaticamente. A última vez que um soberano britânico rejeitou um projeto de lei foi em 1707. A rainha também conserva o título, também apenas formal, de governadora suprema da Igreja anglicana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário