“Pouco menos de 300” parlamentares, de um total de 594, respondem a inquérito ou ação penal no Supremo, segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em entrevista exclusiva à Revista Congresso em Foco
Em 2004, o Congresso em Foco foi pioneiro no levantamento das acusações criminais contra parlamentares no Supremo Tribunal Federal (STF). De lá para cá, este sitese especializou no acompanhamento das pendências judiciais de deputados e senadores. O último levantamento, divulgado em setembro do ano passado, mostrava que 224 congressistas respondiam a 542 acusações na mais alta corte do país. Mas, segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot Monteiro de Barros, este número hoje é ainda maior. “É um pouco menos de 300”, disse em trecho da entrevista exclusiva à Revista Congresso em Foco. Na conta do procurador-geral, entram casos novos, mas também aqueles cuja existência é mantida sob sigilo pelo STF. Ou seja, praticamente metade dos 594 parlamentares federais é alvo de inquérito ou ação penal no Supremo.
Na entrevista, uma das raras exclusivas que concedeu desde que assumiu o cargo de chefe do Ministério Público brasileiro, Janot conta que adotou uma estratégia para tentar acelerar o julgamento das acusações criminais contra deputados e senadores: recomendar o encerramento dos processos pouco consistentes para que o Supremo se concentre nos casos de fato relevantes. “Tem problemas sérios, mas tem muita porcaria”, avalia. Para ele, é preciso desafogar o Judiciário para que os casos possam ser julgados com celeridade.
A quantidade de políticos processados, porém, pode levar à impunidade. Janot faz o seguinte raciocínio: se 200 parlamentares tivessem pendências judiciais, o STF demoraria pelo menos 400 sessões plenárias para analisar o recebimento da denúncia e julgar a acusação. Em outras palavras, mais de meia década para a conclusão de todos os casos.
“Sem contar toda a tramitação do processo, produção de provas etc etc”, afirma o procurador. “O Supremo faz sessão quinta-feira para tratar de processos penais. É só fazer a conta e ver quanto tempo vai demorar isso”, avalia Janot.
Ou seja, desconsiderando-se os políticos com mais de um processo, os recessos do STF e a possibilidade de mais de um caso ser analisados numa mesma sessão, seriam necessários mais de sete anos para os ministros julgarem tudo. “A falta de resultado do processo penal gera frustração, que deixa na população o sentimento de impunidade.”
Na conversa, o procurador afirmou que a quantidade exata não poderia ser divulgada no momento. “A gente já tem uns números iniciais aí e eu não quero divulgar para não fazer uma declaração falsa”, disse. Depois da entrevista, osite Congresso em Foco pediu à assessoria da Procuradoria-Geral da República o nome dos deputados e senadores “sendo observados através de inquérito ou de processo penal”, nas palavras do procurador. Semanas depois, a assessoria informou que não possuía o levantamento com os nomes dos políticos com pendências judiciais
Em um dos trechos da entrevista à revista, Janot ainda criticou a proibição das doações de empresas nas campanhas eleitorais. Para o procurador, ao contrário de combater a corrupção, a medida pode incentivar o caixa dois. “A gente pode caminhar para um sistema que não o exclua, um sistema misto que permite o financiamento público e privado, mas com controle mais eficaz.”
Investigação eleitoral só com autorização do juiz, conforme decisão do TSE
“Se toda vez que um promotor eleitoral se encontrar diante de um fato que entende caracterizar ilícito, com risco eleitoral, tiver que ir ao juiz e aguardar que ele autorize o início da investigação, estaremos na contramão da história.” [Dias depois da entrevista, Janot entrou com uma ação no Supremo questionando a regra do TSE]
Como enfrentar o caixa dois nas campanhas eleitorais
Isso é um ditado antigo: ‘Follow the money‘. De onde vem o dinheiro? De onde vem o dinheiro de forma não transparente? Isso já é um sinal fortíssimo de problemas sérios. Eu sou cético quanto a essa visão de que evitar o financiamento privado diminui o caixa dois. A tendência é o contrário. Não defendo a exclusão do financiamento eleitoral privado. A gente pode caminhar para um sistema que não o exclua, um sistema misto que permite o financiamento público e privado, mas com controle mais eficaz.”
Lei da Ficha Limpa
“A Lei da Ficha Limpa depura o processo eleitoral, incrementa a evolução do nosso processo civilizatório, e isso é bom para a consolidação da democracia. A tendência é ela ser aplicada com mais facilidade, evitando as perplexidades próprias da aplicação de um instituto novo que aconteceram em 2012. Já na eleição de 2014, elas serão menores que a de 2012. Vejo essa lei como um poderoso sistema de aplicação democrático.”
O STF nos mensalões do PT e do PSDB
“O julgamento do Supremo foi público, aberto e cada ministro expôs de maneira transparente o que entendia e fez o seu voto. Cada um tire daí a interpretação que quiser. A minha interpretação é um brocado latino: ‘Roma locuta, causa finita’. O Supremo decidiu, decidiu, quer você goste, quer não goste. E o que se quer é a segurança jurídica, a definição da questão. Qualquer definição vai agradar a uns e não vai agradar a outros.”
Mudanças na política brasileira
Transformações em curso
“A sociedade brasileira está vivendo um momento de mudança cultural. E o que a gente espera é que cada um cumpra o seu papel. Que o eleitor cumpra o seu papel, que a Justiça cumpra o seu papel, que o MP cumpra o seu papel, que a imprensa cumpra o seu papel no sentido de trazer à tona isso, esclarecer todo mundo, e todo mundo tem que interagir nesse processo.”
O trabalho do Ministério Público
“A gente tem que ter muito cuidado com o que faz de inovações. E esse é o modelo do Ministério Público. É jabuticaba, e uma jabuticaba doce, jabuticaba muito boa. Tem despertado a curiosidade de vários países, não só os que estão em fase de transformação social, como o Brasil, mas países já estabilizados. Quando se diz que o Ministério Público brasileiro tem muito poder, o poder é a caneta [levanta sua caneta]. O poder reside em requerer. O juiz diz sim ou não.”
Copa do Mundo
Regime diferenciado de contratações (RDC)
“Para esse regime diferenciado tem a Adin [ação direta de inconstitucionalidade] ajuizada pelo MP. O fundamento principal dessa Adin é a ausência de um projeto básico na contratação do que se faz no regime diferenciado. Esse é o ponto principal. Se você supera isso com um projeto base, diminui muito os riscos de uma compra não licitada. Sem projeto básico, você faz uma compra aberta. Então esse é o questionamento que estamos fazendo no Supremo. Acho que o que está na lei não atende.”
Protestos contra a Copa
“Esse conceito genérico que geralmente corre nas mídias sociais e nas ruas de que falta lisura, algum emprego que não é lícito… Na visão jurídica, não é tão fácil quanto no discurso político. A gente tem que verificar eventual ilicitude, fazer a incompatibilidade com a legislação e ter a reação possível.”
http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/janot-metade-do-congresso-tem-pendencias-criminais/
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