sex, 27/06/2014 - 13:03 - Atualizado em 27/06/2014 - 13:33
Jornal GGN - “Ai, Papai, me doeu fundo no peito ouvir que a justificativa para você estar em um presídio e não em casa, mesmo com sua saúde debilitada, é o fato de existirem muitos outros presos nessa mesma situação. Que mundo é esse, meu Deus, em que as pessoas querem igualar a injustiça e não a justiça? Que mundo é esse em que queremos castigar você porque existe gente em uma situação tão horrível quanto a sua?”, escreve Miruna Genoino na sua 53ª carta ao pai.
O depoimento é um desabafo da filha de Genoino, depois da decisão do Supremo Tribunal Federal, desta quarta-feira (25), rejeitando o pedido de transferência para o regime domiciliar, depois da piora do estado de saúde já delicado do pai.
Leia mais: Genoino não voltará ao regime domiciliar
Confira, na íntegra, a carta de Miruna:
Meu Papai amado,
Logo que o ministro Barroso falou as duas primeiras frases eu já soube que o resultado seria a derrota. Infelizmente, depois de todos estes anos de tortura emocional e psicológica meus ouvidos já sabem ler muito rapidamente a guilhotina da covardia e da injustiça subindo bem rápido, se preparando para degolar a gente, bem ali, onde dói.
Porque dói muito, dói demais, ouvir da boca de alguém que representa algo importante no nosso país, que existem muitas provas de que você não tem nada grave, quando eu, você, nós, sabemos de um jeito tão duro e real, que a vida quase te levou, que você precisa de cuidados e que as coisas não estão bem aí na Papuda.
Ai, Papai, me doeu fundo no peito ouvir que a justificativa para você estar em um presídio e não em casa, mesmo com sua saúde debilitada, é o fato de existirem muitos outros presos nessa mesma situação. Que mundo é esse, meu Deus, em que as pessoas querem igualar a injustiça e não a justiça? Que mundo é esse em que queremos castigar você porque existe gente em uma situação tão horrível quanto a sua? Que mundo é esse…
Em um primeiro momento a minha maior raiva foi do novo relator, claro. Raiva de ter sentido esperança com a chegada dele e raiva do seu jeito técnico e jurídico de nos dar essa punhalada injusta. Mas na verdade não tenho raiva dele não, ou ao menos não totalmente. Tenho raiva de todos aqueles que em maior ou menor medida contribuíram para que essa decisão de hoje fosse tomada de forma tão vergonhosa.
Tenho raiva do cara, sim, ele, que foi construindo essa trama de mentiras ao redor da sua doença. Tenho raiva dos médicos de laudos, que contrariaram seus necessários princípios éticos e deturparam a sua condição de saúde. Tenho raiva da imprensa, que mesmo tendo ficado na porta do hospital, vendo boletins médicos e sabendo de tudo, foi colocando as notícias de forma a criar a dúvida sobre o que você tem. Tenho raiva dos covardes da câmara, que não quiseram dar o que era seu de direito, por medo, por covardia por pura injustiça. Tenho raiva de todas as pessoas que poderiam ter feito algo para que a verdade aparecesse e não fizeram, preferiram olhar para o lado. Tenho muita, muita raiva.
Mas vou vencer esse sentimento.
Ontem, Papai, escrevi aos meus amigos e amigas que eu não tinha esperanças sobre a decisão de hoje e recebi mensagens que nem sei como descrever, permeadas de amor, de presença, de carinho, de amizade e de muita, muita esperança. Não sei como essas pessoas estão se sentindo hoje, porque toda aquela corrente acreditando que sua situação ia melhorar viu hoje o muro da injustiça colocar mais um tijolo na sua história, mas acho que elas continuarão nos mandando da forma que for possível, sentimentos verdadeiros de paz, de fraternidade, de verdade, e de luz. E com isso me sinto esperançosa.
Mas hoje, depois que a realidade se fez presente eu senti um buraco no fundo do peito e pensei: de onde é vou tirar forças para acreditar na vida? No bem? Em que vale a pena fazer coisas boas?
De onde? Como educar duas crianças, meu filhos, para que acreditem, lutem, vivam a verdade e a bondade? Como? E não conseguia encontrar a resposta… Foi olhando as nossas fotos que encontrei o caminho… Achei uma foto linda, linda, de você segurando a Paulinha pela primeira vez. Que foto linda meu Papai lindo, que foto linda…
Era 2006, você tinha acabado de conseguir se eleger para a câmara dos deputados depois de toda essa tragédia na nossa vida, e finalmente conseguia ir me encontrar para conhecer sua neta, sua primeira neta. Lá na foto o que existe é isso. Vida, muita vida, emoção e alívio, muito alívio. Alívio por ver que a vida nos reserva esses pequenos grandes milagres que fazem tudo ter algum sentido. Alívio por saber que tínhamos conseguido vencer 2005 e sermos fortes para viver o nascimento da nossa Paulinha em 2006. Alívio por ver que a vida segue, e que de alguma forma existe uma força maior que sempre mostra que por maior que seja a maldade, sempre o que é bom, e justo, busca uma forma de se fazer presente. Alívio.
Essa é a foto que eu evoco hoje, Papai, a foto da vida, da vitória, da esperança. Você me ajudou a vencer o medo que passei com todos os meus problemas e angústias relacionados à maternidade e me fez ter forças para acreditar que eu ia realizar o sonho de ser mãe.
Agora, está aí dentro, e mesmo assim, longe de mim, consegue me mandar de alguma forma suas mensagens de fé e de esperança, de luta e de paz, e de verdade e coragem, porque existem duas crianças aqui lutando desesperadamente para seguir em frente, para ver sua família bem, para um dia reencontrar o avô.
Termino essa minha carta 53 mandando a você, Papai, todo meu amor, todo meu afeto, e toda minha saudade, mas termino principalmente essa carta com as palavras da sua netinha querida: eu acredito que um dia tudo vai ficar muito bem.
Te amo… Semana que vem estou aí para te visitar.
Muitos beijos da sua sempre,
Mimi
Mimi
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