EDUARDO GUIMARÃES
Ela não se comunica com o seu eleitor como Lula faz justamente porque seu discurso é só gordura. Se submetê-lo ao calor de uma análise, derrete e não sobra nada
Não adianta negar os fatos: Marina Silva é um fenômeno político. Contudo, é um fenômeno muito diferente de Lula, por exemplo. A grande vantagem do ex-presidente sempre foi a sua forma de se comunicar – as pessoas mais simples entendem o que ele fala, pois fala como o povo, ou seja, fala um português coloquial mesmo nos ambientes mais formais.
Todo fenômeno político requer uma razão de ser. Marina, portanto, tem lá sua característica de fenômeno para conseguir seduzir boa parcela do eleitorado brasileiro. Contudo, essa característica, à diferença da de Lula, não está em sua comunicação verbal e, sim, em suas características físicas.
Marina tem cara de povo, ou seja, cara de gente humilde. Por que? Porque é negra e “magrinha” (como disse Eduardo Jorge, no debate da Band). Você olha para ela e pensa em uma mulher sofrida. Então se lembra de até onde ela chegou e isso, obviamente, desperta simpatia nos que se identificam com belas histórias de vida como a dela.
Marina é, por assim dizer, um excelente produto de marketing. Em alguma medida, talvez mais convincente do que Lula. Explico: no início de seu primeiro mandato, ele esteve em algum fórum internacional e um dos chefes de Estado presentes declarou que se surpreendeu ao conhecê-lo pessoalmente, pois não achava que fosse “tão branco”.
Já Marina é o retrato do povo brasileiro, em termos de biótipo.
Mas o fenômeno Marina é parecido com o de Lula pela forma como ela se posiciona diante de uma plateia, seja por via eletrônica ou presencial. Ela sabe exprimir um ar lírico e de sinceridade.
Tem, ainda, uma vantagem sobre Lula que lhe permite transitar entre a elite: é formada, tem curso superior – é historiadora, professora e psicopedagoga. A elite não perdoa Lula por não ter diploma, pois não admite que alguém sem formação universitária possa atingir um alto cargo como o de presidente.
Vivemos no país da “prisão especial”, caro leitor. Aqui – e em nenhuma outra parte do mundo – o diploma universitário é visto como divisor da humanidade. Quem é formado não seria um cidadão comum, pela ótica das classes média e alta. Seria “especial”.
Se um pobre é pego pela polícia vendendo um pacotinho de droga na porta da favela ele é jogado em uma masmorra superlotada, daquelas em que para alguns presos poderem dormir outros têm que ficar de pé. Já o cidadão “especial”, ou seja, com diploma universitário, se atirar pelas costas numa jovem namorada e lhe tirar a vida – como fez o ex-diretor do Estadão Pimenta Neves, por exemplo –, fica sozinho numa cela com direito a tevê, vazo sanitário, cama, colchão…
Marina, pois, é um grande produto de marketing. Por conta disso, seu eleitorado não liga muito para o que diz; atenta para seu tipo físico, para seus trejeitos e entonações do que diz sem se importar com o conteúdo.
Há, inclusive, um exemplo recente desse fato que cai como uma luva para esta análise. A entrevista de Marina no Jornal Nacional, na quarta-feira, será utilíssima para comprovar que essa senhora não diz nada, mas tem recursos imagéticos para seduzir quem a assiste.
Antes de escrever este texto, o blogueiro fez um teste: escolheu um grupo heterogêneo de pessoas para analisar a entrevista de Marina ao Jornal Nacional. Os escolhidos variaram entre pessoas com maior e menor instrução, jovens e maduras.
Foi perguntado a cada uma dessas pessoas o que entenderam das respostas que Marina deu aos entrevistadores daquele telejornal. Ninguém soube responder.
Para entender o que ocorreu, comecemos pela primeira pergunta de William Bonner – sobre o avião mal explicado que era usado por Marina e Eduardo Campos – e pela resposta que ela deu.
William Bonner: Muito obrigado pela sua presença. O tempo da entrevista começa a ser contado a partir de agora. Candidata, o avião que o PSB vinha utilizando na campanha eleitoral, até aquele acidente trágico de duas semanas atrás, está sendo investigado pelas autoridades competentes. Ele foi objeto de uma transação milionária feita por meio de laranjas. Essa transação não foi informada na prestação de contas prévia, parcial, à Justiça Eleitoral. A senhora tem dito que vai inaugurar uma nova forma de fazer política, que todo político tem que ter certeza absoluta da correção de seus atos. No entanto, a senhora usou aquele avião como teria feito qualquer representante daquilo que a senhora chama de velha política. Eu lhe pergunto: a senhora procurou saber que avião era aquele, quem tinha pago por aquele avião, ou a senhora confiou cegamente nos seus aliados?
Marina Silva: Nós tínhamos, William, uma informação de que era um empréstimo, que seria feito um ressarcimento, num prazo legal, que pode ser feito, segundo a própria Justiça Eleitoral, até o encerramento da campanha. E que esse ressarcimento seria feito pelo comitê financeiro do candidato. Existem duas formas, três formas, aliás, de fazer o provimento da campanha: pelo partido, pelo comitê financeiro do candidato e pelo comitê financeiro da coligação. Nesse caso, pelo comitê financeiro do candidato. Essas informações eram as informações que nós tínhamos.
Você considera, leitor, que a pergunta foi respondida? Aliás, o que foi que Marina respondeu?
As pessoas escolhidas para analisar as respostas de Marina no JN são todas simpatizantes dela. Foram perguntadas sobre se ficaram satisfeitas com as respostas de sua candidata e disseram que ficaram. Então, foram perguntadas sobre que resposta Marina deu ao caso do avião, mas não souberam sintetizar.
Sabe por que, leitor? Porque ela nada respondeu.
Bonner perguntou se era coerente com esse papo de “nova política” Marina e o seu companheiro de chapa, agora falecido, usarem um avião do qual ela afirma que não sabia a origem e que, agora, descobriu-se que era produto de uma transação milionária entre testas-de-ferro.
O Blog sintetizou, acima, a pergunta de Bonner. Faça um teste, leitor, e tente sintetizar a resposta de Marina.
Conseguiu? Não? Então aqui vai uma ajuda: Marina respondeu que fez justamente o que Bonner a acusa de ter feito: confiou cegamente nos aliados e não foi a fundo na origem do avião. Porém, usou o bom e velho “embromation” para responder. Citou formas de arrecadação de recursos de campanha, mas não respondeu se “confiou cegamente”, como disse Bonner.
Seria condizente com o conceito de “nova política” um político aceitar dinheiro para suas necessidades de campanha sem saber nada sobre aquela doação? Afinal, receber um avião para usar como seu durante meses e meses é, em resumo, receber dinheiro.
Bonner não aceitou a resposta, como ninguém mais poderia aceitar. Afinal, não houve resposta. Então insistiu:
William Bonner: A senhora sabia dos laranjas? Essa informação foi passada para a senhora como candidata a vice-presidente?
Marina Silva: Não tinha nenhuma informação quanto a qualquer ilegalidade referente à postura dos proprietários do avião.
William Bonner: Eu lhe pergunto isso…
Marina Silva: As informações que tínhamos eram exatamente aquelas referentes à forma legal de adquirir o provimento desse serviço. Agora, uma coisa que eu quero dizer para todos aqueles que estão nos acompanhando é que, para além das informações que estão sendo prestadas pelo partido, há uma investigação que está sendo feita pela Polícia Federal. E o nosso interesse e a nossa determinação é de que essas investigações sejam feitas com todo o rigor para que a sociedade possa ter os esclarecimentos e para que não se cometa uma injustiça com a memória de Eduardo.
A pergunta não poderia ter sido mais direta: “A senhora sabia dos laranjas?”. Simples, não? Porém, Marina deu uma longa resposta, mas não respondeu. Mais uma vez, então, leitor, você saberia resumir a resposta da candidata da “nova política”?
O que Marina disse é que não se importou com a origem do avião, que há uma investigação e que não se deve acusar antes para não ferir a memória de Eduardo Campos. Mas não explicou se a “nova política” comporta conduta tão igual às da “velha política”, ou seja, não procurar saber se os recursos usados na campanha são legais antes de gastá-los.
Contudo, o gestual de Marina, sua cara de sofredora, sua entonação de voz induzem a crer que é quase uma heresia com a “memória” de alguém pedir a uma candidata a governar o país que diga no que difere seu comportamento se, tal qual qualquer candidato da “velha política”, ela abraçou o avião disponibilizado pelos “amigos” de Campos sem perguntar nada.
Você poderá argumentar que Dilma ou Aécio também têm contra si ausência de questionamentos que deveriam ter feito em determinados casos. Ok, essa argumentação pode ser válida. Contudo, quem está se apresentado como encarnação da “nova política” é Marina. Certo?
O avião fantasma de Marina e Campos não era usado só por ele, mas também por ela. Ao dizer que perguntar sobre o caso seria “injustiçar” a “memória de Eduardo” é, no fim das contas, empurrar para o falecido toda a responsabilidade, ainda que ela fosse tão candidata quanto ele e pretensamente o arauto da “nova política”.
Mas o caso do avião não é o tema deste texto. Aqui se procura incentivar o leitor a que procure entender – de verdade – o que Marina diz, pois, analisando diversas falas dela, o que o Blog descobriu é que, via de regra, não se consegue resumir ou explicar o que diz.
Como Marina, à diferença de Lula, fala difícil, o ouvinte fica pensando: “Olha só, uma mulher tão sofrida e fala tão bonito”. Esse é o fenômeno que Marina representa. Ela não se comunica com o seu eleitor como Lula faz justamente porque seu discurso é só gordura. Se submetê-lo ao calor de uma análise, derrete e não sobra nada.
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