O escritor e apresentador lança o livro "As Esganadas", diz que é adepto da anarquia criativa e que só começa uma história quando sabe o seu final
Marcos Diego NogueiraCRIMES NO RIO
Novo livro de Jô Soares trata de assassinatos em série de mulheres gordas
Humorista nato, Jô Soares gosta de brincar com fatos históricos quando assume o teclado de escritor. Em seu mais novo romance, “As Esganadas” (Companhia das Letras), ele novamente reconstitui o cotidiano do Rio de Janeiro nos anos 1930 com uma boa dose de referências a fatos e personagens verídicos. Mas parte de uma premissa que não deixa de ser uma piada sobre o gênero que mais aprecia: as tramas detetivescas. Para animar o seu quinto livro, Jô criou um serial killer obcecado por gordinhas.
A preferência do criminoso por mulheres rechonchudas, motivo constante de risadas do leitor, não é só uma forma de defender uma “categoria que sumiu” do linguajar comum, os gordos. É também uma maneira de criticar o politicamente correto no humor. “Nos EUA, quando eu me chamo de ‘fat’, as pessoas ficam chocadas, acham um absurdo. Eu sou o que então? Possuidor de uma imagem física alternativa?”, diz o apresentador e autor, no escritório onde cria as suas tramas policiais, uma ampla sala no primeiro andar de seu elegante apartamento duplex no bairro de Higienópolis, em São Paulo.
Aos 73 anos, Jô Soares sai pouco de casa. Apesar disso, a ideia do novo livro não nasceu nesses momentos de agradável isolamento. Foi durante uma temporada em Lisboa, quando apresentava seu espetáculo sobre o escritor português Fernando Pessoa, que lhe veio à mente a figura, não do assassino, mas do detetive da trama, o espirituoso Tobias Esteves. Seu nome foi inspirado no “Esteves sem metafísica”, citado no poema “Tabacaria”, de Pessoa. “Vindo para o Brasil, pensei sobre o personagem: nada melhor que um inspetor para ter a lógica binária de que se todas as outras soluções são impossíveis, a mais improvável é a verdadeira.
O Conan Doyle usa muito isso no Sherlock Holmes”, afirma Jô, citando outra de suas influências. Getúlio Vargas, o capitão Filinto Müller, da Coluna Prestes, e o embaixador alemão Karl Ritter são algumas das figuras verídicas que passam pelos olhares de Esteves.
É onde realidade e ficção se encontram – e o melhor, se confundem, como em livros anteriores. Em “O Homem que Matou Getúlio Vargas”, por exemplo, é narrado um episódio da Segunda Guerra em que a tropa francesa vai para a Batalha do Marne de táxi. Jô Soares lembra que o fato é absolutamente verídico. “Muita gente me diz: ‘Essa ideia que você teve é sensacional’. Só que não foi minha ideia, é histórico, é verdade!”, diz o escritor, fascinado com os achados de suas pesquisas.
São descobertas que lhe custam tempo, muitas vezes avançando na madrugada. Notívago, quando não está no computador ou entre livros de todos os gêneros, Jô passa horas ouvindo cantores como Madeleine Peyroux e Rufus Wainwright ou assistindo a seriados ingleses. Seus favoritos são os produzidos pela BBC, especialmente “The Hour”, sobre um noticiário inglês da década de 1950. Por isso, seu processo de escrita é definido como “totalmente anárquico”. Só um hábito não muda: ao acordar, sempre após o meio-dia, escreve um pouco. “Aprendi com o Rubem Fonseca que todo dia você tem que abrir seu texto, nem que seja para colocar uma vírgula. Mas tem que ser todo dia, não interessa a que horas ou por quanto tempo.”
Outra regra, essa inventada por ele mesmo: só começar a escrever um livro quando sabe como ele termina. “Não consigo criar em processo.” Mesmo assim, ele aproveita seu programa de entrevistas, gravado de segunda a quarta-feira, para reunir subsídios para o miolo da história. “Vieram três legistas falar sobre um luminol que não precisa de luz ultravioleta para detectar sangue em tecido. É claro que eu os aproveitei para perguntar um monte de coisas do livro. Depois até mandei trechos das autópsias que escrevi para ver se estavam corretas e eles mudaram alguns termos técnicos”, lembra o autor. E a eterna dúvida em saber quando o livro está terminado?
“Piora a cada trabalho”, diz, sem ver nisso um grande problema. “Quando entrego para a editora, sempre tenho aquilo que em francês se chama ‘espírito de escada’. É quando o cara te pergunta alguma coisa, você não responde no momento, vai embora, e quando acaba de descer a escada, pensa: ‘Droga, eu tinha que ter respondido isso!’”, diz.
A preferência do criminoso por mulheres rechonchudas, motivo constante de risadas do leitor, não é só uma forma de defender uma “categoria que sumiu” do linguajar comum, os gordos. É também uma maneira de criticar o politicamente correto no humor. “Nos EUA, quando eu me chamo de ‘fat’, as pessoas ficam chocadas, acham um absurdo. Eu sou o que então? Possuidor de uma imagem física alternativa?”, diz o apresentador e autor, no escritório onde cria as suas tramas policiais, uma ampla sala no primeiro andar de seu elegante apartamento duplex no bairro de Higienópolis, em São Paulo.
Aos 73 anos, Jô Soares sai pouco de casa. Apesar disso, a ideia do novo livro não nasceu nesses momentos de agradável isolamento. Foi durante uma temporada em Lisboa, quando apresentava seu espetáculo sobre o escritor português Fernando Pessoa, que lhe veio à mente a figura, não do assassino, mas do detetive da trama, o espirituoso Tobias Esteves. Seu nome foi inspirado no “Esteves sem metafísica”, citado no poema “Tabacaria”, de Pessoa. “Vindo para o Brasil, pensei sobre o personagem: nada melhor que um inspetor para ter a lógica binária de que se todas as outras soluções são impossíveis, a mais improvável é a verdadeira.
O Conan Doyle usa muito isso no Sherlock Holmes”, afirma Jô, citando outra de suas influências. Getúlio Vargas, o capitão Filinto Müller, da Coluna Prestes, e o embaixador alemão Karl Ritter são algumas das figuras verídicas que passam pelos olhares de Esteves.
É onde realidade e ficção se encontram – e o melhor, se confundem, como em livros anteriores. Em “O Homem que Matou Getúlio Vargas”, por exemplo, é narrado um episódio da Segunda Guerra em que a tropa francesa vai para a Batalha do Marne de táxi. Jô Soares lembra que o fato é absolutamente verídico. “Muita gente me diz: ‘Essa ideia que você teve é sensacional’. Só que não foi minha ideia, é histórico, é verdade!”, diz o escritor, fascinado com os achados de suas pesquisas.
São descobertas que lhe custam tempo, muitas vezes avançando na madrugada. Notívago, quando não está no computador ou entre livros de todos os gêneros, Jô passa horas ouvindo cantores como Madeleine Peyroux e Rufus Wainwright ou assistindo a seriados ingleses. Seus favoritos são os produzidos pela BBC, especialmente “The Hour”, sobre um noticiário inglês da década de 1950. Por isso, seu processo de escrita é definido como “totalmente anárquico”. Só um hábito não muda: ao acordar, sempre após o meio-dia, escreve um pouco. “Aprendi com o Rubem Fonseca que todo dia você tem que abrir seu texto, nem que seja para colocar uma vírgula. Mas tem que ser todo dia, não interessa a que horas ou por quanto tempo.”
Outra regra, essa inventada por ele mesmo: só começar a escrever um livro quando sabe como ele termina. “Não consigo criar em processo.” Mesmo assim, ele aproveita seu programa de entrevistas, gravado de segunda a quarta-feira, para reunir subsídios para o miolo da história. “Vieram três legistas falar sobre um luminol que não precisa de luz ultravioleta para detectar sangue em tecido. É claro que eu os aproveitei para perguntar um monte de coisas do livro. Depois até mandei trechos das autópsias que escrevi para ver se estavam corretas e eles mudaram alguns termos técnicos”, lembra o autor. E a eterna dúvida em saber quando o livro está terminado?
“Piora a cada trabalho”, diz, sem ver nisso um grande problema. “Quando entrego para a editora, sempre tenho aquilo que em francês se chama ‘espírito de escada’. É quando o cara te pergunta alguma coisa, você não responde no momento, vai embora, e quando acaba de descer a escada, pensa: ‘Droga, eu tinha que ter respondido isso!’”, diz.
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