Na Argentina, grupo de mídia ameaçado pela entrada em vigor da Lei de Meios lança manifesto em que reclama de "desafio às garantias constitucionais"; companhia tentacular ainda não anunciou plano de adequação à nova lei, que entra em vigor na sexta-feira 7, a 7D; presidente Cristina Kirchner procura esconder tensão diante de momento decisivo para seu governo; mas o que pode ser mais importante para ela agora?; vigência terá repercussões em todo continente
Aline Gatto Boueri_correspondente Brasil 247 em Buenos Aires - O governo argentino transformou uma data em sigla, e a mitificou: às vésperas do 7 dedezembro, o “7D”, prazo máximo para a entrada em vigência da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual (a Lei de Meios), a presidente Cristina Kirchner só pensa naquilo: o Grupo Clarín. Ela tenta esconder a tensão, transmitindo por assessores mensagens de que não há a menor previsão de algum tipo de crise política em razão do início da aplicação da lei. Mas mesmo com a oposição parlamentar controlada, e forças ocultas aparentemente desbaratadas, a desorganizada oposição popular que convocou protestos como o último panelaço com mais de 500 mil pessoas pode reaparecer. Cristina, mesmo que não demonstre, tem bons motivos para encarar o 7D como decisivo para o seu governo.
O Grupo Clarín ainda não apresentou seu plano de desinvestimento para reduzir a quantidade de licenças de operação em rádio, TV aberta e a cabo. Segundo números divulgados pela Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (Afsca), atualmente, o Clarín possui licença para utilização de 25 frequências em nível nacional, das quais duas são de Rádio AN, nove de FM e cinco de TV aberta. O máximo estipulado pela lei é de 10. Na TV a cabo o número de licenças excede ainda mais o máximo permitido: em todo o país o Grupo Clarín tem 237, enquanto a lei determina 24 como limite.
O Grupo Clarín também deve diminuir sua participação na TV a cabo para cumprir a lei. Um dos pontos do artigo 45 estabelece que os grupos que oferecem serviços audiovisuais com uso do espectro de frequência só podem possuir um sinal, enquanto o Grupo Clarín possui nove.
Tensão
Martín Sabbatella, presidente da Afsca, declarou que “A lei é para todos, ninguém pode achar que está por cima dela”, em uma clara referência ao Grupo Clarín, que dilata a apresentação do seu plano de adequação com alegação de que a Justiça ainda não se pronunciou sobre a constitucionalidade do artigo 161 da Lei de Meios, que estabelece que os conglomerados midiáticos se desfaçam das concessões que excedam o limite estabelecido pela norma.
Sabbatella afirmou que a “democracia precisa dessa lei, uma lei que foi debatida em um Parlamento democrático e foi votada por ampla maioria.” Também fez questão de de frisar que a lei favorece “a liberdade de expressão, a pluralidade, a diversidade e a democracia da palavra.”
O presidente da Afsca também lembrou que se algum grupo não apresentar um plano de adequação à lei até sexta-feira o órgão “terá que começar um processo de transferência de susa licenças.” Sabbatella detalhou que o procedimento legal inclui a taxação das concessões e dos bens afetados pelo uso de cada uma, a seleção das concessões que serão licitadas, a licitação e a trasnferência a novos titulares. “Durante o processo, que deve durar em torno de 100 dias úteis, pediremos ao atual dono que preserve os postos de trabalho, o serviço e os bens relacionados a cada licença.”
O Grupo Clarín lançou um comunicado em resposta a Sabbatella no qual o acusa de “avançar de forma ilegítima” sobre “direitos adquiridos.” O Clarín argumenta que sem um decisão judicial sobre o artigo 161, a lei não pode ser integralmente aplicada e que o processo de deinvestimento quebra um contrato, ao não reconhecer a renovação de suas concessões por dez anos em 2005.
De maneira confusa, o Clarín também retrucou que a aplicação da lei fere a liberdade de expressão porque a Corte Suprema do país ainda não julgou a constitucionalidade do artigo que prevê o desinvestimento e que a prova concreta disso é a “colonização oficial do sistema de meios de comunicação nos últimos três anos, depois dos quais praticamente não sobraram rádios e TVs fora do controle oficial.”
O conglomerado também reclama que os grupos que não entraram na Justiça foram beneficiados porque obtiveram o direito de apresentar suas estratégicas de adequação no mesmo prazo concedido ao Grupo Clarín. O fatídico “7D.”
Enquanto isso, Cristina Fernández de Krichner se mantém afastada da contenda midiática sobre a aplicação da Lei de Meios. Nesta terça-feira almoçou com seu par equatoriano Rafael Correa, que na mesma atrde recebeu na Universidade de La Plata, capital da província de Buenos Aires, o prêmio Rodolfo Walsh (jornalista argentino desaparecido durante a última ditadura militar) pela comunicação popular.
Íntegra do comunidado do Clarín (em espanhol):
"Ante nuevas declaraciones del titular de la AFSCA, el Grupo Clarín desea poner de manifiesto que:
- El funcionario volvió a insistir con el avance de oficio sobre licencias sin esperar ningún fallo judicial, pese a que la Corte Suprema dijo que esa situación implicaba “denegación de justicia”.
- Reconoció que a cuatro días del 7 de diciembre, el AFSCA, sin darle intervención a la oposición, habría cambiado los procedimientos de la Resolución 297/10 de dicho organismo, que reglamente el artículo 161 de la ley. De esta forma, se estarían modificando los plazos de adecuación vigentes, que otorgan 30 días más para la denominada “adecuación voluntaria”. Es evidente que esta modificación afecta los derechos adquiridos, el derecho de defensa y busca evitar que el fallo sobre la inconstitucionalidad llegue antes del avance de facto sobre las licencias.
- Pese a que Sabbatella sostuvo que el AFSCA quiere que se resuelva el juicio de fondo, toda la conducta estatal estuvo dirigida a demorarlo: lo demoró diez meses en 2010, lo demoró tres meses en 2012 con sucesivas maniobras para apartar jueces, y sigue buscando demorarlo hoy con presentaciones dilatorias en primera y segunda instancia.
- El funcionario reconoció que benefició a los grupos que no fueron a la Justicia, extendiéndoles un año el plazo de desinversión, que según dijo la Corte Suprema había vencido el 28 de diciembre del año pasado. Además, volvió a desconocer la composición accionaria de varios grupos y sus incompatibilidades con diversos artículos de la ley de medios, pese a las pruebas difundidas en estos días.
- En un desafío a las garantías constitucionales y para justificar un avance de hecho sobre las licencias, dijo que si el fallo de fondo determinara la inconstitucionalidad de los dos artículos impugnados, sólo habría derecho a una indemnización y no a la intangibilidad de las licencias, lo que implica una violación de todos los precedentes jurídicos, incluso de la Corte Interamericana de Derechos Humanos.
- Repitió varias veces que la ley no afecta la libertad de expresión, cuando la Justicia jamás se pronunció sobre ello porque nunca falló sobre el tema de fondo. La mejor prueba de su afectación está dada por la colonización oficial del sistema de medios en estos últimos 3 años, donde prácticamente no quedaron radios y canales de TV fuera del control oficial".
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