Por Luis Nassif
Caso Murdoch, crise europeia, problemas da Obama, todos esses fatos estão interligados e expostos como sinal de fim de ciclo.
As principais características do ciclo anterior foram as seguintes:
A exemplo do ciclo financeiro do final do século 19, uma aliança entre setor financeiro e mídia visando implantar a ideologia financista, caracterizada por livre fluxo de capitais, privatização (ou concessões públicas) e fortes ajustes fiscais - incidindo sobre a população - visando preservar a capacidade de endividamento do Estado. Aliás, em momentos de transição o mercado de capitais tem papel fundamental. Mas quando leva a rédea aos dentes, coloca o país inteiro a seu serviço.
Essa aliança ganha enorme expressão política com a entrada de forças políticas associadas. Conforme expliquei em meu livro "Os Cabeças de Planilha", os políticos recebem ideias "salvadoras", financiamento para suas campanhas, poder financeiro e entregam, na contrapartida, as condições econômicas mais favoráveis ao capital financeiro. Ainda que à custa do sacrifício geral do país.
Com isso, financistas e mídia conseguem se tornar a força mais poderosa do país, sobrepondo-se muitas vezes ao próprio poder do Estado.
A pedra de toque do discurso de legitimação política é a famosa "lição de casa", brandida aqui por Pedro Malan e Antonio Palocci: sacrifiquem-se hoje e terão o céu amanhã. À medida em que sua influência se consolida, o jogo especulativo ganha dinâmica própria, afastando-se rapidamente das normas prudenciais. Resultam daí as crises, globais pela própria natureza internacionalista e de vasos comunicantes do capital financeiro.
O próprio movimento de internacionalização do capital acaba produzindo novos atores globais que passam a ameaçar os grupos midiáticos tradicionais. É nesse contexto que surge a fórmula Murdoch - seguida em muitos países e, no caso do Brasil, particularmente pela revista Veja. Consiste em utilizar a informação como arma política, sem respeitar limites éticos nem jornalísticos. Passa-se a recorrer sistematicamente ao escândalo, à manipulação das informações, ao assassinato de reputações e, no auge do processo, à mentira reiterada.
A opinião como arma comercial
A atividade econômica jornalística não tem como concorrer com outros setores da economia. Uma empresa jornalística tradicional tem que investir como indústria, tem intensidade de pessoal como o setor de serviços e uma estrutura de distribuição típica de varejo.
Numa ponta, a velha mídia tem que enfrentar os grandes grupos de entretenimento ou de telecomunicações. Na outra, vê seu poder de formação de opinião sendo erodido pelo avanço das outras formas de mídia, do exército das teles à guerrilha dos blogs.
Seu trunfo único é o poder político remanescente, angariado na etapa que está se encerrando. É nesse contexto que, à medida em que vê seu último trunfo erodindo, entra em uma espiral de virulência que, no caso do modelo Murdoch, a leva a ultrapassar os limites da legalidade. Conta com seu poder para intimidar o Judiciário, o Legislativo e o Executivo. E manipula como álibi jurídico o direito à informação - da mesma maneira que alguns advogados que usam as prerrogativas da profissão para atuarem como extensões de seus clientes. Como se mentir e assassinar reputações fossem norma constitucional.
O caso Veja é sintomático. Houvesse um Judiciário mais ágil e menos temeroso, há muito os abusos da revisia teriam sido obstados pela ação dos juízes.
Agora, nesse fim de ciclo há o questionamento do poder de influência do mercado (o impasse da União Europeia é típico) e, por tabela, do poder excessivo da mídia associada, que fugiu dos princípios tradicionais e enveredou pelo mundo do espetáculo do denuncismo ou mesmo pelas veredas do crime.
É o velho ciclo nos seus estertores mas, como um polvo agonizante, ainda com poder de fazer estragos com suas braçadas.
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