Do Correio Braziliense
Por Marcos Coimbra
Nessa história do encontro entre Lula, Gilmar Mendes e Nelson Jobim, só uma coisa é certa: todos estão errados.
Por motivos óbvios, tornou-se o principal assunto da semana. Tem tudo para permanecer no centro dos debates por longo tempo.
Uma das razões para isso é que ele faz pensar em aspectos relevantes de nossa vida política: a relação entre os Poderes, a natureza do Supremo Tribunal Federal, a atuação dos ex-presidentes da República - para ficar nos mais evidentes.
Olhando-o do ponto de vista de seu principal personagem, seria, no entanto, algo até corriqueiro.
Que mal - deve ter pensado Lula - pode haver em encontrar Gilmar Mendes? Não tendo função no Executivo, sem ocupar cargo formal na estrutura do PT, não pertencendo a nenhuma entidade vinculada ao governo, não seria, apenas, o encontro de dois velhos conhecidos?
Lula - como sabem até as criancinhas do grupo - é um ser que vive a política em regime de dedicação exclusiva e tempo integral.
Pensa, em primeiro lugar, no seu partido. Conhece cada militante da velha guarda pelo nome e acompanha de perto o surgimento da nova geração.
Também se envolve nas questões dos outros partidos que estiveram em sua base e que estão na de Dilma. Seus integrantes sabem que podem contar com ele.
Tem compromisso com os amigos - especialmente os que passam dificuldades. Parece-se, nesse aspecto, com muitas de nossas lideranças maiores, do passado e do presente. Não abandonar os companheiros é uma qualidade sem a qual não se vai longe na política.
Na iminência do julgamento do mensalão, Lula está preocupado. Não com sua imagem - ou a de seu governo. Essas, ele sabe - assim como nós - quais são. Mas com alguns dos acusados, cujos atos - ele sabe, assim como nós - são regra em nosso sistema político. Ele quer ajudá-los.
Gilmar Mendes ignorava tudo isso quando foi encontrá-lo?
Se vivêssemos nos Estados Unidos, o ministro teria todo motivo para se escandalizar se visse um ex-presidente da República em plena atividade política - falando e se agindo como liderança partidária. Lá, todos saem do combate e se tornam estadistas.
Aqui, nenhum.
Pelos relatos dos participantes da reunião - considerando os muitos que forneceram -, parece confirmado que Lula sugeriu ao ministro a conveniência de não correr com o julgamento e deixá-lo para depois das eleições (o que, segundo o ministro Marco Aurélio Mello, um dos decanos da Corte, seria um pleito “natural” e “legítimo”).
O quanto Lula foi além é duvidoso: para Jobim, nada; para Mendes - em algumas versões - também nada; em outras, bem mais.
Domingo, o ministro Celso de Mello disse que, se Lula ainda fosse presidente, o caso justificaria a discussão do impeachment. Mas é uma declaração apenas retórica. Muitas coisas que a lei veda aos agentes públicos não proíbe aos líderes partidários.
As regras que regem o funcionamento da Suprema Corte não impedem os encontros de ministros com políticos - mesmo fora do Tribunal - para tratar de assuntos políticos. Mas o bom senso os desaconselha. Ainda mais na véspera de julgamentos politicamente sensíveis.
Está claro o que Lula queria do encontro. E o que imaginava o ministro? Que seria uma tertúlia sobre temas do direito?
Depois da celeuma provocada pelo episódio, o presidente do STF, ministro Ayres Britto, falando em nome de seus pares, assegurou: “Nós não perdemos o foco, que é o nosso dever de julgar todo e qualquer processo - inclusive esse chamado de mensalão - com objetividade, imparcialidade e serenidade”.
A pergunta é outra: Gilmar Mendes tem, hoje, essa condição? Conseguirá por de lado a mágoa que revelou em seus pronunciamentos e julgar com isenção?
Em situações análogas, alguns de seus antecessores mais ilustres reconheceram que deviam declarar-se impedidos.
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