De olho no mercado milionário do MMA, americanos colocam filhos para participar de competições nos EUA. Especialistas alertam para os prejuízos físicos e emocionais da luta
Wilson Aquino
Confira cenas de meninos de 7 anos lutando como adultos:
A partir dos cinco anos, crianças
americanas têm sido levadas por seus pais para participar de torneios
infantis de MMA – ou melhor, Pankration, técnica grega semelhante, mas
na qual são proibidas joelhadas e cotoveladas. Estima-se que cerca de
três milhões de meninos e meninas pratiquem o esporte nos Estados
Unidos. No Brasil, começam a despontar academias de artes marciais
mistas (ou MMA) para os pequenos, porém sem combates oficiais. Mas, com a
popularização dos marmanjos fortões do Ultimate Fighting Championship
(UFC), que enriquecem em shows de brutalidades, não será surpresa o
surgimento de torneios infantis aqui, até porque não há legislação que
proíba. Nos EUA, os eventos para crianças não envolvem dinheiro, mas os
minúsculos gladiadores são condecorados com medalhas e troféus, além do
aplauso dos pais, que sonham com os bilhões de dólares que a indústria
pode oferecer aos pimpolhos no futuro. Entretanto, apesar de serem
fortes e disputarem ferozmente com os adversários no octógono, eles não
deixam de ser crianças e, não raro, saem de cena chorando. Alguns fazem
pirraça e se negam a cumprimentar o rival, como é obrigatório.
MINIGLADIADORES
Torneio infantil nos EUA: os campeões têm apelidos como "A Besta"
Torneio infantil nos EUA: os campeões têm apelidos como "A Besta"
A questão chamou a atenção recentemente,
depois que o fotógrafo peruano radicado em Nova York Sebastian Montalvo,
24 anos, viajou por vários Estados americanos registrando as lutas
entre crianças. O conjunto das fotos é um impressionante documento sobre
roubo de infância até para feras do octógono, como o ex-lutador de MMA
Royler Gracie, 48 anos, que mora e tem academia nos Estados Unidos desde
2008. “Sou totalmente contra esse tipo de competições para crianças
porque elas não têm maturidade para isso”, afirma. Montalvo resume o que
viu: “Como é um dos esportes que mais crescem no mundo, uma nova
geração tem feito de tudo para participar dos eventos da Liga Americana
de Luta.”
Um dos campeões de MMA infantil tem 7 anos,
nasceu no Arizona, e atende pelo apelido de “The Arm Collector” (O
colecionador de braços), por causa de sua habilidade de vencer pela
imobilização dos membros superiores dos adversários. Outro, da
Califórnia, da mesma idade, é conhecido como “The Beast” (A Besta). Como
será o crescimento de uma criança que se acostumou a ser chamada por
esses apelidos e elogiada pela brutalidade? “Quem passa a infância e a
adolescência batendo nos coleguinhas vai se transformar em um adulto que
não consegue negociar, não tem empatia nem pena do outro”, alerta a
psicanalista Ana Maria Iencarelli, que há 40 anos trabalha com crianças e
adolescentes. “Qual é a filosofia desse esporte?”, pergunta ela, para
responder em seguida: “Acabar com o outro.” Ou seja, o ensinamento
básico não pode proporcionar um crescimento saudável.
CONTROLE
Academia em Brasília: crianças aprendem técnicas de MMA, mas só lutam jiu-jítsu
Academia em Brasília: crianças aprendem técnicas de MMA, mas só lutam jiu-jítsu
“É um esporte muito contundente. Uma
criança não está preparada em nenhum aspecto para suportar esse tipo de
competição”, adverte o professor paulista Danilo Dourado, que treinou
campeões do UFC, como Maurício Milani Rua, o Maurício Shogun, e ensina
MMA para crianças, mas não admite luta entre elas. É seguido, no
raciocínio, pelo diretor e médico da Confederação Atlética Brasileira de
MMA, Márcio Tannure: “Sou a favor de a criança treinar MMA porque, além
de ser saudável para o corpo, a filosofia milenar das artes marciais
educa a mente. Mas sou contra colocar para lutar.” Ortopedistas alertam
para os riscos de lesões que podem ocorrer na placa de crescimento (leia
quadro).
O ex-lutador Pedro Galiza, que ensina o
esporte para crianças, em Brasília, não incentiva a competição e opta
pelo treino de jiu-jítsu, que é arte marcial e prioriza a imobilização.
“Chute e soco somente na manopla (almofada)”, explica. Uma de suas
alunas, Isadora, 9 anos, pediu aos pais para trocar o balé pelas aulas
de MMA. O pai, o advogado brasiliense Mário Thiago Padilha, 31 anos,
praticante de muay thai (boxe tailandês), diz que é uma atividade física
saudável. “Disciplina e prega o respeito aos colegas. Em ambiente
controlado de academia, com professor observando, os riscos de lesão são
praticamente nulos”, defende.
Fotos: Sebastian Montalvo/Polaris; Adriano Machado
http://www.istoe.com.br/reportagens/334825_OCTOGONO+E+LUGAR+PARA+CRIANCAS+
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