Marcelo Auler
A chiadeira dos delegados federais na suposta defesa do orçamento da instituição para 2016 na verdade esconde um jogo político grande e acirrado. Há de tudo um pouco, mas o principal mote de muitas das reclamações, em especial de um grupo cujo tamanho não é possível ainda mensurar, é a briga política contra o governo de Dilma Rousseff, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, Lula e o Partido dos Trabalhadores.
Logo, se constata que o que existe é uma briga política, pois muitas das críticas partem de pessoas as quais, embora se apresentem como defensoras da instituição, no fundo estão fazendo campanha política com interesses variados. Algumas delas, campanha direta contra o governo.
Basta verificar várias postagens que circularam durante 2014 e 2015 no Facebook dos delegados de Polícia Federal,como a da foto ao lado, que rola na rede social desde março passado, bem antes de se saber do corte orçamentário
Até hoje, como declarou Cardozo na quarta-feira (06/01), não faltaram recursos. Por isso, ele cobra do superintendente do Paraná, Rossalvo Ferreira Franco, explicações sobre o pedido de verba extra feito ao juiz Sérgio Moro para compras de peças de carro e pagamento da luz.
O pedido pode ter sido indevido, com base no Manual de Bens Apreendidos, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conforme mostrou Fernando Brito emA “doação” de Moro para a PF: “embora não seja apropriado”?, no blog Tijolaço.com.br. Ele foi além e descobriu que apesar de requisitar R$ 172 mil ao juiz, a SR/DPF/PR dispunha de verba orçamentária, duas vezes maior – R$ 409 mil -, para estas despesas. Isto Brito mostrou na reportagem Dr. Moro, desculpe, erramos. Não eram R$ 202 mil em peças para carros da PF , eram R$ 409 mil.
Na quarta-feira, o ministro Cardozo falou que a prova maior de que não falou verba no Paraná foi a devolução, por parte da superintendência, de R$ 3 milhões que não foram utilizados no exercício de 2015.
Na briga política entre delegados e o governo Dilma, o Sindicato dos Delegados do Paraná e a Associação Nacional dos Delegados Federais emitiram nota na tarde desta quinta-feira (07/01), de solidariedade ao superintendente do DPF naquele estado. Mais uma vez se apegam à Operação Lava Jato para passarem a ideia de que o governo do PT está contra combaterem a corrupção. As duas entidades desmentem o ministro garantindo que a Superintendência não devolveu dinheiro algum e a Delegacia de Foz de Iguaçu terminou o exercício com um rombo de R$ 2 milhões. Com isso, justificam o dinheiro pedido ao juiz.
“Assim, demonstrado que a aceitação do mencionado montante não se deu em razão de má gestão ou malversação do dinheiro público, na medida em que é notório que o Delegado de Polícia Federal Rosalvo Ferreira Franco e sua equipe estão realizando um trabalho exemplar em prol da população brasileira, mormente no combate à corrupção, as entidades signatárias vêm à público reafirmar seu incondicional apoio a estes no sentido de repudiar qualquer ato falacioso que vise denegri-los ou a qualquer integrante da Polícia Federal”, encerra a nota.
Desrespeito ao regulamento – As desavenças entre delegados e governo do PT são antigas, Muitas delas começaram após a saída do primeiro diretor do DPF no governo Lula, Paulo Lacerda. Mas se exacerbaram nos últimos anos, após os escândalos do Mensalão e da Lava Jato. Desde então as postagens dos delegados no Facebook deixaram de ser mero exercício do direito à liberdade de opinião para passarem a atropelar o previsto no Decreto Nº 59.310, de 23 de setembro de 1966, Trata-se do Regimento Jurídico da Carreira que estipula deveres e direitos dos policiais federais.
Estas postagens, não apenas desrespeitam autoridades e atos administrativos (parágrafo primeiro do Art. 364) como também podem ferir, dependendo da interpretação, o parágrafo XII do mesmo artigo que proíbe “valer-se do cargo, com o fim ostensivo ou velado, de obter proveito de natureza político-partidária para sim ou para outrem” (veja quadro). O que tem faltado no DPF na gestão do diretor geral Leandro Daiello Coimbra e também pelo ministro Cardozo, é comando e liderança.
Impunidade gera abusos - A atual direção e o ministro deixaram impunes fatos como o ocorrido na véspera das eleições de 2014. Na época, um grupo de delegados da Lava Jato postou no Facebook mensagens criticando o governo Dilma, sua candidatura e apoiando Aécio Neves. Foi campanha política pura, mas nada aconteceu aos seus autores. Talvez por medo da direção geral de punir delegados que estavam nas páginas do noticiário com heróis pelas prisões da Operação Lava Jato.
Da mesma forma como nada aconteceu quando começaram a surgir denúncias de irregularidades na SR/DPF/PR. Foram várias, do grampo ilegal instalado na cela de Alberto Youssef, ao vazamento de um rascunho da delação premiada do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, quando ele estava na carceragem da superintendência. Passam ainda pelo grampo no fumódromo, pelo vazamento seletivo de informações para jornalistas escolhidos a dedo, pelo uso de celular por Youssef na cela, pela apresentação de uma sindicância que hoje se tem como inverídica diante dos fatos já levantados, pelo falso testemunho de delegados diante de um juiz federal entre outras.
A liberalidade foi como um sinal verde. E aa páginaa do Facebook, como mostram alguma postagem que o blog recebeu, mais do que crítica à política do governo, passou ao deboche das autoridades, entre elas a presidente Dilma, como na foto no alto desta postagem, e o ministro Cardozo, nas fotos, acima, em que ele foi tratado como palhaço, e ao lado, com uma charge em que é tratado como cachorro de Lula.
Quando a briga não é para derrubar o governo é por aumento de salários, em uma velha disputa que delegados federais travam para se equipararem aos membros do Ministério Público Federal.
Sobrou para Paula Rousseff - Nessa disputa, atingiram até a filha da presidente Dilma Rousseff, Paula Rousseff Araujo, que, em 2003 – bem antes, portanto, de a mãe ser escolhida para suceder Lula – foi aprovada em concurso no Ministério Público do Trabalho – carreira que faz parte do Ministério Público Federal.
Entre seus colegas, pelo que o blog ouviu de uma procuradora do trabalho, ela é respeitada como séria e dedicada. Ainda assim, virou alvo das críticas de delegados, por conta do velho anseio de serem equiparados à carreira do MPF.
Em uma reprodução de postagens, o delegado Armando Rodrigues Coelho Neto, aposentado, com um trabalho elogiável a favor das rádios comunitárias e pessoalmente bastante crítico aos que defendem o impeachment da presidente, levou à pagina dos delegado federais o valor do salário de Paula, com o comentário: “maior que um DPF com 30 anos de serviço. Isso é salário moral? #issonãoémoral”.
A remuneração dela é a da categoria: procuradores do trabalho. Mas, por ser maior que o dos delegados, gera o movimento de protesto como se fosse um salário específico, beneficiando-a por ser filha de quem é.
Apoio da Maçonaria - Na verdade, há de tudo nesta discussão em torno do orçamento da Polícia Federal. Em alguns casos, a preocupação com a falta de verba em, si, pode não ser o mote maior.
Apela-se também para todo o tipo de denúncia. E para todos os tipos de aliança. Como, por exemplo, os Maçons do Brasil, que defendem abertamente o impeachment da presidente, a derrubada do PT e de Lula, considerados comunistas.
Eles, inclusive, prometem um ato em 19 de fevereiro quando estarão no Congresso Nacional para protestar contra a corrupção e, obviamente, endossar o coro pró-impeachment.
Ressalte-se que muitos delegados e policiais federais – como o superintendente do Paraná, Rosalvo -, são maçons. Outros, ao menos, parecem apoiados por eles. A delegada Tânia Prado, diretora regional em São Paulo da Associação Nacional dos Delegados da PF e uma das articuladoras da mobilização da categoria contra o que classificam de ‘sucateamento’ da corporação, por exemplo, aparece nas páginas dos maçons e leva as postagens deles para a dos delegados federais, como ao lado.
Já na página “Avança Brasil Maçons BR” uma postagens mostra e-mail da superintendência em Brasília. Nele, no dia 22 de dezembro, o setor de logística comunicou que zerou a cota de combustível do ano e que o atendimento rotineiro voltará a acontecer a partir de 1 de janeiro.
Trata-se de documento interno da Polícia que vazou. Serviu para mais uma propaganda de que o governo Dilma estaria cortando verbas da Polícia Federal. Esquecem apenas que ele se relaciona ao orçamento de 2015, previsto em 2014 e executado durante os onze meses e vinte e dois dias do ano que terminaria nove dias depois, dos quais cinco praticamente feriados e fins de semana.
O e-mail não diz que não haverá mais combustível, pois admite que podem ocorrer situações de urgência. Alerta apenas que nesses casos – e se houvesse operação ou alguma diligência, certamente seria uma delas – “deverão se apresentadas ao Exmo. Superintendente Regional para autorização do atendimento”.
Mas a postagem dos maçons fala em “desmanche da PF após o corte do orçamento”. Corte programado para o orçamento de 2016 e que, portanto, nem sequer aconteceu – nem se sabe se acontecerá. Mas já é apontado como responsável por uma situação excepcional, ocorrida em dezembro, no final do exercício financeiro. E que em momento algum paralisou a superintendência de Brasília. Muito menos a Polícia Federal como um todo. Ou seja, não passou de mais uma típica propaganda contra o governo, feita com base em documento vazado de dentro da superintendência.
Por isso é que é preciso muito cuidado ao se deparar com a campanha que esbraveja por conta dos cortes do orçamento que foi previsto, mas ainda não ocorreu. Na verdade, pode estar havendo uma grande manipulação. Afinal, com servidores assim, dispensa-se oposição partidária.
http://www.marceloauler.com.br/briga-por-verba-reflete-a-briga-contra-dilma-na-pf/#more-2066
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