quarta-feira, 29 de junho de 2011

Diplomatas brasileiros em La Paz pediram que Lula ajudasse a “moderar” presidente boliviano







Por Tadeu Breda, especial para a Pública




Diplomatas brasileiros em serviço na Bolívia confidenciaram a seus colegas da Embaixada dos Estados Unidos em La Paz, em 2009, que “compartilham boa parte da frustração” dos norte-americanos com as atitudes de Evo Morales em várias áreas, “desde política econômica até combate ao narcotráfico”.

Membros do serviço diplomático brasileiro também relataram aos norte-americanos conversas privadas entre o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu par boliviano. Os diplomatas americanos sondaram os brasileiros pedindo que eles ajudassem a “moderar” o líder aimará.

As informações constam de um telegrama diplomático de agosto de 2009 vazado pelo WikiLeaks – que a agência Pública divulga com exclusividade no Brasil.

Documentos do WikiLeaks já haviam revelado que Lula teria pedido em encontro privado para que o presidente venezuelano Hugo Chávez “moderasse o tom” nas críticas aos EUA.

Em agosto de 2009, as representações diplomáticas de Brasil e Estados Unidos em La Paz mantiveram pelo menos dois encontros para discutir aspectos da visita que Lula faria à Bolívia no dia 22 de agosto.

Os americanos estavam preocupados: uma nova Constituição acabara de ser aprovada no país e haveria novas eleições. Evo Morales, mais que candidato, era favorito para permanecer no cargo – como, de fato, acabou acontecendo.

Os diplomatas dos Estados Unidos revelaram aos brasileiros seu descontentamento com a maneira que o presidente boliviano vinha tratando Washington.

Na época Evo Morales já havia nacionalizado o petróleo e o gás – decreto que, segundo o WikiLeaks revelaria mais tarde, manteve a Embaixada de La Paz em alerta – e expulsado a DEA (Drug Endowment Agency) do país.

O governo boliviano também havia declarado persona non grata a um diplomata estadunidense supostamente ligado à CIA (Central Intelligence Agency) e o embaixador Philip Goldberg, que acabou deixando a Bolívia sob acusações de promover o separatismo no Estado de Santa Cruz.



Antes



Por essas e outras, o staff norte-americano procurou a Embaixada brasileira e sondou os diplomatas sobre a possibilidade de Lula “encorajar algum sinal útil de cautela” em Evo Morales no que diz respeito às suas relações com os Estados Unidos.

E, segundo o telegrama de 26 de agosto, tiveram uma resposta positiva. “As autoridades disseram que é do interesse do Brasil a existência de um melhor relacionamento entre Bolívia e Estados Unidos, e prometeram fazer o possível para incentivar um comportamento mais construtivo por parte do governo boliviano.”

A partir de conversas com diplomatas brasileiros, o documento afirma que o Brasil quer oferecer a Evo Morales uma alternativa aos conselhos radicais que vem recebendo de Cuba e Venezuela. Porém, deixaram claro que Brasília não está em concorrência direta com Caracas.

“Os brasileiros acrescentaram que, ainda que estejam comprometidos com o engajamento dos bolivianos em questões democráticas, eles não consideram que os direitos humanos ou a democracia na Bolívia estejam fora dos padrões hemisféricos.”



Morales não ouviu



Isso tudo aconteceu antes da visita de Lula a Morales. Quando os presidentes finalmente se encontraram, no dia 22 de agosto de 2009, a Embaixada dos Estados Unidos em La Paz interpretou a agenda oficial como ato eleitoral em benefício do boliviano.

O encontro aconteceu em Villa Tunari, pequena localidade encravada na região do Chapare, berço político do presidente boliviano e grande produtora de folha de coca. Milhares de camponeses assistiram à celebração de acordos bilaterais e ouviram Lula comparar Evo a Nelson Mandela.

Acabadas as festividades, os diplomatas norte-americanos procuraram o conselheiro da Embaixada do Brasil para saber como havia sido a conversa entre Lula e Morales. “Julio Bitelli nos confirmou que Lula falou com Morales sobre as relações entre Bolívia e Estados Unidos (durante o percurso que fizeram de carro até o evento público), mas disse que a questão levou ao ‘usual’ discurso retórico sobre os supostos crimes cometidos pelos Estados Unidos”, revela o documento.

“Morales recordou sua experiência pessoal nas mãos de agentes da DEA, protestou contra a hegemonia estadunidense na América Latina e não pareceu receptivo a ouvir qualquer conselho, de acordo com Bitelli.”
Escrito apenas quatro dias depois da visita, o telegrama termina com a promessa: “Continuaremos a encorajar o Brasil a seguir em frente com seu manifesto interesse de ajudar a moderar Morales, apesar dos limites evidentes de tais abordagens.”

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