Há 20 anos Paulinho Paiakan, de uma bordunada só, conseguiu esvaziar a Eco-92 e transferir a atenção do planeta para um elo perdido no sul do Pará. Ao estuprar a estudante Silvia Letícia com a ajuda da mulher Irekran, manchou com sangue sua reputação de "bom selvagem", às vésperas de protagonizar um filme de Ridley Scott, "The Amazon Vision", inspirado na vida dele, capaz de, quem sabe, deixar "Dança com Lobos" no chinelo. Embrenhado desde então na floresta, à espera da justiça dos brancos, o cacique verá pela TV a Rio+20 e relembrará seus tempos de estrela da ecologia.
Paulinho Paiakan já era, então, uma celebridade internacional. O Prêmio Global 500 ele ganhou em Nairóbi, no Quênia. Em Nova York, era homenageado no Waldorf Astoria. Em Genebra, dava conferências nas melhores casas do ramo. No México, fechava festivais de cultura.
Todo esse badalo começou mais ou menos em 1988, quando Paulinho Paiakan peitou a construção da hidroelétrica de Cararaô (hoje Belo Monte), cochichando no ouvido do Banco Mundial que ela ia inundar as terras dos índios no Xingu. Foi seu primeiro affair com a Justiça, que se pauta pelas códigos de leis e não pela palavra dos caciques.
Na época, um promotor de plantão queria lhe aplicar a Lei dos Estrangeiros e detonar Paiakan para longe do patropi. O processo terminou engavetado, mas o cinturão de solidariedade que envolveu Paiakan deu no I Encontro dos Povos Indígenas, em Altamira, um evento precursor da Eco.
Aos 37 anos, manager dos negócios caiapós, admirado pela realeza britânica e paparicado pela tietagem verde, Paulinho Paiakan tinha planos de voos bem mais altos do que os do bimotor Cesnna que ele faturou da Body Shop, a cadeia de lojas londrina de produtos naturais, um dos braços da Caiapó S.A., instalada na aldeia Ukre. Um dos sonhos do cacique – ele me confessou na gravação de um documentário – era se candidatar a deputado federal, na trilha de Mario Juruna.
O ápice da carreira de espetáculos de Paiakan seriam as palavras dele no Parlamento da Terra, evento do Fórum Global da Eco onde o cacique seria o coordenador de assuntos indígenas. A museóloga Denise Hamu, do Museu Emílio Goeldi de Belém, já havia despachado a passagem para Paiakan deitar falação no Fórum, cuidava dos últimos detalhes da exposição caiapó no Paço Imperial quando soube, por mim, por que Paiakan não tinha pintado no Rio. Ela ficou atônita, mas não exatamente surpresa:
- O Paiakan mudou muito nesses últimos tempos.
Vi Paiakan pela última vez no documentário "O Crepúsculo dos Deuses", exibido em São Paulo pelo cineasta Neville d'Almeida. O documentário é de 2009, mas as imagens foram captadas na aldeia Ukre em 2003. E não é sobre o cacique, que faz ali apenas uma pontinha.
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