Janio de Freitas, Folha de S. Paulo
Políticos são políticos em toda parte, e a causa pública é pública, mas não é causa em parte alguma. A razão política prevalece para eles e sobre ela.
Um exemplo daqui mesmo, que se repete a cada dia brasileiro, mudados apenas os aspectos físicos, humanos ou não.
Deputados fluminenses, com ares alarmados, adotam iniciativas firmes, diante das notícias de ligação de Sérgio Cabral Filho com empresários, por sua vez, ligados a concessões estaduais; e alarmados, ainda, com a quantidade e o valor das contratações de um deles para obras chamadas emergenciais, sem licitação pública.
Providenciam-se um levantamento de tais contratações, com os respectivos pormenores, e um projeto de lei que proíba o recebimento, pelos governadores fluminenses, de favores, presentes e outras generosidades, assim como lei federal determina ao (à) presidente da República.
Um país que precisa de tal lei para a própria Presidência, não bastando a simples recomendação da ética, não suscita qualquer dúvida sobre a dimensão dos valores morais em seus costumes políticos e administrativos. Vamos adiante.
Sérgio Cabral Filho não mudou seus modos de governador, vindos do primeiro mandato. No máximo, tornou-os mais repetitivos, tão logo superada a fase de adaptação às circunstâncias do cargo, e passou a ostentar uma arrogância de que jamais dera nem o mais sutil sinal. Em contraste com o exercício permanente de sedução, no qual fora considerado imbatível.
As contratações com dispensa de licitação, tidas como 17, não são recentes. Para constatá-las nas ocasiões de suas ocorrências, os deputados agora ativos já dispunham de equipes de assessoria, tempo, recursos técnicos, infraestrutura e documentação oficial consultável sem dificuldade, disponível inclusive no Tribunal de Contas do Estado.
Os espantos e as urgências de hoje atestam que nenhum dos atuais defensores dos interesses públicos teve interesse algum na devida ocasião. Aquela em que, se constatada irregularidade, sustariam contrato após contrato.
Foi necessária a tragédia no litoral baiano para que as relações empresariais de Sérgio Cabral Filho, com seus desdobramentos noticiosos, acendessem o interesse dos políticos vigilantes.
É difícil distinguir se foram movidos pela causa pública ou pela tragédia. Se pela causa pública, não se explica que precisasse haver a tragédia para despertar seu interesse. Não foi a tragédia. Nem foi a causa pública. Foi a conveniência, o momento enfim conveniente à razão política. Se não surgisse sob outra forma, paciência - por si, a causa pública não se faz causa.
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