Os agitadores ingleses se organizam rapidamente usando o serviço de mensagens quase instantâneo e gratuito dos 'smartphones' BlackBerry, que têm a vantagem, para os vândalos, de ser codificado, ao contrário dos posts publicados na rede social Twitter.
Os aparelhos BlackBerry, frequentemente associados a empresários que checam seus e-mails nestes telefones multifuncionais, também são usados amplamente pelos agitadores ingleses desde o fim de semana passado.
"Se você usa o Twitter e até certo ponto o Facebook, suas mensagens são públicas", explicou Alastair Paterson, diretor-geral da Digital Shadows, empresa especializada em segurança na internet.
No entanto, "se você utiliza o serviço de mensagens do BlackBerry, geralmente só os contatos aprovados pessoalmente podem ver suas mensagens", explicou à AFP.
O serviço de mensagens do BlackBerry (BBM) possui outras vantagens: é gratuito e permite enviar a mesma mensagem a várias pessoas ao mesmo tempo.
O Blackberry, assim como o Twitter e o Facebook, que também foram amplamente usados pelos manifestantes em diferentes revoltas como a do Egito, no começo do ano, são "ferramentas de comunicação muito eficientes, capazes de burlar a vigilância da polícia", disse Paterson.
O deputado da oposição britânica, David Lammy, representante de Tottenham, bairro do norte de Londres onde começaram os primeiros distúrbios no sábado, pediu à BlackBerry que contemple a possibilidade de suspender seu serviço de mensagens.
O BBM é "um dos motivos pelos quais os malfeitores principiantes demonstram ser mais inteligentes do que as forças da polícia, muito mais sofisticadas", escreveu esta terça-feira no Twitter, pouco antes da quarta noite de violência no país.
Mas para Paterson, a suspensão do BBM não resolveria o problema, visto que os agitadores poderiam recorrer a outros meios de comunicação. As convocações para saquear e enfrentar a polícia têm circulado nos últimos dias no BBM, como uma mensagem escrita no domingo e publicada depois no Daily Mirror:
"Todo mundo, de todas as partes de Londres, vá para o coração de (o centro de) Londres, OXFORD CIRCUS!! Lojas abertas serão destruídas, então venham pegar alguma coisa. Se você vir um irmão... SAÚDE! Se você vir um cana.... ATIRE!". Na mesma noite, cinquenta pessoas atacaram esta avenida comercial do centro da capital britânica.
A BlackBerry prometeu ajudar a polícia. "Nós nos compadecemos daqueles que têm sido afetados pelos distúrbios dos últimos dias em Londres", disse o diretor-geral de vendas da BlackBerry, Patrick Spence. "Nós nos comprometemos a ajudar as autoridades em todo o que for possível", disse.
No entanto, a empresa canadense fabricante dos BlackBerry, Research in Motion (RIM), recebeu ameaças de represália na terça-feira, caso transmita informações para as autoridades britânicas. "Se ajudarem a polícia (...) vão se arrepender", advertiu mensagem publicada no blog da RIM.
Poderes da polícia
O primeiro-ministro britânico David Cameron revelou nesta quinta-feira novas medidas para conter os distúrbios, sem descartar o recurso ao Exército no futuro, depois que o país teve sua primeira noite de calma após quatro dias consecutivos de violência.
Diante do Parlamento reunido em sessão extraordinária, Cameron anunciou a ampliação dos poderes dos policiais, dando à corporação o poder de retirar panos, máscaras e capuzes utilizados para esconder os rostos das pessoas suspeitas de atividades criminosas.
Vários saqueadores semearam o terror nos últimos dias em diversas cidades da Inglaterra escondendo seus rostos, o que complicou sua identificação pelas câmeras de vídeo. Frente aos tumultos, que deixaram quatro mortos, as autoridades refletem também as condições do estabelecimento de um cessar-fogo, acrescentou o primeiro-ministro conservador, que não descartou o recurso ao Exército no futuro.
"Minha responsabilidade é garantir que consideradmos todas as eventualidades, incluindo se há tarefas que o Exército pode garantir e que daria mais liberdade à polícia na linha de frente", declarou Cameron, que já havia anunciado no início da semana um grande reforço da polícia e o possível recurso aos canhões d'água.
Em um discurso firme, o chefe de governo, que encurtou suas férias na terça-feira, condenou "a criminalidade pura e simples" dos revoltosos. Não se trata "de política, nem de manifestação, mas de roubo",considerou. A morte de um homem, alvejado pela polícia na semana passada em Londres, foi "utilizada como desculpa por bandidos oportunistas", afirmou.
Os revoltosos depredaram de sábado a quarta-feira várias lojas e incendiaram prédios em diversas cidades da Inglaterra, incluindo Londres, que vai sediar os Jogos Olímpicos de 2012.
"A um ano dos Jogos, temos que mostrar que o Reino Unido não é um país que destrói, mas um país que constrói, que não baixa os braços, um país que enfrenta, que não olha para trás, mas sempre para a frente", disse Cameron.
A fatura dos episódios de violência urbana vai superar amplamente a faixa dos 225 milhões de euros (321 milhões de dólares), segundo dados provisórios apresentados nesta quinta-feira por seguradoras e associações profissionais. O governo anunciou a criação de um fundo de 22 milhões de euros (32 milhões de dólares) para auxiliar os comerciantes que tiveram suas lojas atacadas.
Pela primeira vez desde o início da onda de violência no sábado, nenhum incidente foi registrado na quarta-feira à noite no Reino Unido, onde um grande aparato policial e a chuva parecem ter dissuadido as pessoas que semeavam o pânico.
Mas a polícia, que efetuou no país mais de 1.200 detenções ligadas aos episódios de violência, continuava nesta quinta-feira a deter supostos arruaceiros. Em Londres, a corporação efetuou buscas para aplicar 100 mandados de prisão, segundo a Scotland Yard.
Para dar conta do grande número de julgamentos, os tribunais foram mantidos abertos durante a noite. Entre os detidos estão um garoto de 11 anos que reconheceu ter roubado uma lata de lixo no valor de 57 euros (81 dólares) e uma funcionária de jardim de infância, também acusada de roubo, que assumiu sua culpa.
Nos bairros desfigurados pelos tumultos, os piores já registrados no país em décadas, a vida voltava lentamente ao normal nesta quinta. Em Ealing, área residencial do oeste de Londres, uma cafeteria, cuja vitrine quebrada foi substituída por pranchas de madeira, estava aberta. "O bairro se recupera rapidamente", disse o dono do estabelecimento, Hussein Hagg.
Apesar destes sinais de volta ao normal, os riscos de tumultos ainda são grandes. O ambiente ainda tenso levou a Liga Inglesa de Futebol a adiar a partida da primeira rodada do Campeonato Inglês, que seria realizada no sábado em Londres entre Everton e Tottenham, time que recebe o nome do bairro onde os distúrbios começaram no final de semana passado.
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