Para tentar impedir a implantação de Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), criminosos levam terror ao Complexo do Alemão, mas ameaças surtem efeito contrário: governo agora vai antecipar lançamento do programa na favela de julho para março do ano que vem
Michel AlecrimTENSÃO
Tiroteio entre traficantes e militares (acima) e protesto
popular no Complexo do Alemão: clima de guerra
Há nove meses, os céus da Penha, bairro da zona norte do Rio de Janeiro, não eram riscados pela luz vermelha das balas traçantes disparadas por fuzis de grosso calibre. Ali, onde está boa parte do Complexo do Alemão, a paz se instalara desde que o Exército ocupou as suas ruas para preparar a implantação de mais uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Na noite da terça-feira 6, a tranquilidade foi quebrada e o clima de guerra voltou. Aproveitando-se de um episódio em que soldados do Exército e moradores entraram em conflito – vários deles foram feridos pelos militares –, traficantes voltaram a mostrar suas garras. Tiros, explosões de granadas e outros estampidos de guerra soaram novamente no Alemão. “Como foi uma ação combinada pouco tempo antes, nosso setor de inteligência não tinha como prever”, declarou o general Adriano Pereira Júnior, comandante do Comando Militar do Leste (CML). O episódio é o mais grave numa escalada de turbulências que o plano de pacificação das favelas do Rio, elogiado no Brasil e no Exterior, vem sofrendo ultimamente. “Isso faz parte de um processo, mostra que se deve fazer ajustes”, diz a socióloga Julita Lemgruber.
Um dia antes, outra favela pacificada teve problemas. Na Cidade de Deus, na zona oeste, a própria sede da unidade da PM foi atacada por pessoas que saíam de um baile funk. Também na semana passada, um homem ficou ferido em uma briga com a polícia por estar ouvindo funks de apologia ao crime. Nos últimos meses, outros embates vinham sendo travados em favelas com UPPs (desde 2009, 17 comunidades antes dominadas pelo tráfico ou milícias receberam essas unidades). A reação do tráfico fez com que as autoridades mudassem os planos. O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, anunciou que antecipará para março o processo de implantação das UPPs no Complexo do Alemão, antes previsto para julho de 2012. “Ninguém vai reverter 40 anos de domínio do tráfico em um curto prazo”, diz Beltrame. “Não há mágica. Incidentes vão acontecer, mas não deixaremos de fazer com que as pessoas vivam melhor.”
A reação imediata das autoridades foi reforçar a presença das tropas no conjunto de favelas do Alemão. Mais de 100 fuzileiros do Exército foram chamados e outros 120 policiais militares passaram a ocupar dois morros que não tinham patrulhamento permanente. Segundo o general Pereira Jr., a revista a moradores vai continuar e outros reforços serão chamados. “Se for preciso colocar mais uma brigada, vamos colocar”, diz ele. “O Alemão e a Penha são pontos de honra para nós.” Basta andar pelas ruas do lugar para perceber que, apesar dos recentes confrontos entre militares e moradores, a maioria da população quer se ver livre do tráfico. “As pessoas querem a permanência do Exército”, diz um morador, que pediu para não ser identificado. “O problema é que os soldados não sabem abordar os moradores. Eles agem com truculência, como se todos fossem bandidos.” Foi o que aconteceu no domingo 4, no confronto que serviu de álibi para que os criminosos insuflassem a população contra os soldados.
O sociólogo Gláucio Soares, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, afirma que é difícil para policiais e militares do Exército identificar entre as pessoas que circulam pelas vielas das comunidades quem tem ou não relação com o tráfico. Grande parte dos criminosos, diz ele, cresceu nesses lugares, ao lado de moradores. “Os bandidos não usam uniforme como as torcidas de futebol”, diz Soares. “Sem colocar recursos no patrulhamento e dar melhores salários aos policiais, é complicado vencer esse jogo.” Para Julita Lemgruber, uma importante solução já está nas mãos das autoridades do Estado, que estudam a construção de um centro de treinamento só para policiais que vão ocupar os morros. “Entrevistamos 400 PMs que atuam nessas áreas e ficou claro que eles não sabem o que fazer para se aproximar da população”, diz Julita. O ex-policial e atualmente consultor de segurança pública Paulo Storani afirma que essa disputa só será definitivamente vencida pelo poder público se as batalhas ocorrerem em outras frentes. Para ter o apoio das populações, seria preciso mais investimento social. “Várias secretarias têm que se unir para atuar nas áreas de UPPs”, afirma Storani. “A prioridade deveria ser para menores em situação de vulnerabilidade, como forma de evitar que venham a optar pelo crime.”
Um dia antes, outra favela pacificada teve problemas. Na Cidade de Deus, na zona oeste, a própria sede da unidade da PM foi atacada por pessoas que saíam de um baile funk. Também na semana passada, um homem ficou ferido em uma briga com a polícia por estar ouvindo funks de apologia ao crime. Nos últimos meses, outros embates vinham sendo travados em favelas com UPPs (desde 2009, 17 comunidades antes dominadas pelo tráfico ou milícias receberam essas unidades). A reação do tráfico fez com que as autoridades mudassem os planos. O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, anunciou que antecipará para março o processo de implantação das UPPs no Complexo do Alemão, antes previsto para julho de 2012. “Ninguém vai reverter 40 anos de domínio do tráfico em um curto prazo”, diz Beltrame. “Não há mágica. Incidentes vão acontecer, mas não deixaremos de fazer com que as pessoas vivam melhor.”
A reação imediata das autoridades foi reforçar a presença das tropas no conjunto de favelas do Alemão. Mais de 100 fuzileiros do Exército foram chamados e outros 120 policiais militares passaram a ocupar dois morros que não tinham patrulhamento permanente. Segundo o general Pereira Jr., a revista a moradores vai continuar e outros reforços serão chamados. “Se for preciso colocar mais uma brigada, vamos colocar”, diz ele. “O Alemão e a Penha são pontos de honra para nós.” Basta andar pelas ruas do lugar para perceber que, apesar dos recentes confrontos entre militares e moradores, a maioria da população quer se ver livre do tráfico. “As pessoas querem a permanência do Exército”, diz um morador, que pediu para não ser identificado. “O problema é que os soldados não sabem abordar os moradores. Eles agem com truculência, como se todos fossem bandidos.” Foi o que aconteceu no domingo 4, no confronto que serviu de álibi para que os criminosos insuflassem a população contra os soldados.
O sociólogo Gláucio Soares, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, afirma que é difícil para policiais e militares do Exército identificar entre as pessoas que circulam pelas vielas das comunidades quem tem ou não relação com o tráfico. Grande parte dos criminosos, diz ele, cresceu nesses lugares, ao lado de moradores. “Os bandidos não usam uniforme como as torcidas de futebol”, diz Soares. “Sem colocar recursos no patrulhamento e dar melhores salários aos policiais, é complicado vencer esse jogo.” Para Julita Lemgruber, uma importante solução já está nas mãos das autoridades do Estado, que estudam a construção de um centro de treinamento só para policiais que vão ocupar os morros. “Entrevistamos 400 PMs que atuam nessas áreas e ficou claro que eles não sabem o que fazer para se aproximar da população”, diz Julita. O ex-policial e atualmente consultor de segurança pública Paulo Storani afirma que essa disputa só será definitivamente vencida pelo poder público se as batalhas ocorrerem em outras frentes. Para ter o apoio das populações, seria preciso mais investimento social. “Várias secretarias têm que se unir para atuar nas áreas de UPPs”, afirma Storani. “A prioridade deveria ser para menores em situação de vulnerabilidade, como forma de evitar que venham a optar pelo crime.”
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