Projeto negociado com o Congresso ainda inclui retirar artigo que fixa teor de álcool no sangue e aumentar prazo de apreensão de CNH
Vannildo Mendes - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O governo se rendeu à evidência de que a lei seca caducou depois de três anos e meio de existência e está fechando com o Congresso um acordo para mudar o texto. O plano é combater a impunidade de motoristas que dirigem sob efeito de álcool e são responsáveis por mais de 20% das mortes no trânsito. A ideia, segundo o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, é dobrar o valor das punições e retirar da lei o artigo que fixa o teor de álcool no sangue.
Dessa forma, deixaria de existir o limite de 6 decigramas por litro. E seriam validados os diversos meios de produção de prova já previstos e utilizados.
Um ponto consensual do substitutivo aumentará substancialmente a pena de quem for apanhado dirigindo alcoolizado. A multa inicial, que hoje é de R$ 957,65, dobra para R$ 1.915,30. Na reincidência, o valor dobra de novo e sobe para R$ 3.830.
Hoje, a lei impõe também a suspensão do direito de dirigir por 12 meses. O prazo vai dobrar. Pelo novo texto, a reincidência será medida em dois anos, aumentando o tempo em que o infrator ficará sob quarentena.
Adotado em 2008, o teste do bafômetro, que mede o teor de embriaguez, vem sendo recusado por um número cada vez maior de motoristas, amparados no dispositivo constitucional que desobriga o cidadão de produzir prova contra si. "Não é possível que as coisas continuem como estão", disse o ministro. "Hoje, ou você submete o sujeito ao teste do bafômetro, ou ninguém é condenado, mesmo que cometa crimes bárbaros sob efeito de álcool ao volante", criticou.
O texto está sendo construído pela Secretaria de Assuntos Legislativos do ministério, em parceria com o deputado Hugo Leal (PSL-RJ), em forma de substitutivo a ser votado em regime de urgência ainda neste semestre.
O ponto de partida é o projeto de lei do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), aprovado pelo Senado no fim do ano passado, que retira dele todos os pontos que não são consensuais e foca nas medidas destinadas a impedir a impunidade de motoristas bêbados.
Sopro de defesa. Os mais de 1 milhão de bafômetros distribuídos pelo governo em todo o País, segundo o ministro, deixariam de ser elemento necessário para a condenação de motoristas, mas não serão aposentados. Eles continuarão sendo utilizado nas blitze de Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans) e Polícia Rodoviária Federal, mas agora como instrumento de defesa para contraprova de motoristas que contestem os novos meios utilizados.
Entre esses meios estarão o auto de flagrante da autoridade policial, fotos do infrator, testemunhas e os diversos recursos periciais da ciência forense. "A questão central para o País é combater a violência que assola o trânsito brasileiro", disse o ministro.
Dados do governo mostram que o trânsito brasileiro, um dos mais violentos do mundo, faz mais de 40 mil vítimas por ano. "Uma das causas dessa matança é o uso de álcool por motoristas irresponsáveis", enfatizou.
Segundo estatísticas do ministério, de junho de 2008 a dezembro de 2011, a Polícia Rodoviária Federal aplicou mais de 2,7 milhões de testes de bafômetro e identificou mais de 84 mil motoristas embriagados. Para Cardozo, o álcool é considerado uma tragédia e uma das principais causas de acidentes graves no trânsito. Estima-se que o custo social dos acidentes nas rodovias federais, entre janeiro e setembro de 2011, tenha sido de R$ 7,9 bilhões.
Exame clínico. O artigo 276 da substitutivo diz que "qualquer concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar sujeita o condutor às penalidades previstas nas penalidades do código". Com a mudança, todo condutor de veículo envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito "será submetido a testes, como exame clínico, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados, permitam certificar se o condutor se encontra sob influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência".
O QUE DEVE MUDAR
Tolerância zeroO governo quer tirar da lei seca o teor mínimo de 6 decigramas por litro de sangue - que caracteriza embriaguez ao volante. Isso equivale a 2 copos de cerveja ou uma taça de vinho.
Várias provasBafômetro deixa de ser único meio de produção de prova. Vão valer testemunhas, imagens, vídeos, auto de flagrante do policial, exames clínicos, perícias e testes que não necessitem do sopro do motorista. Como o etilômetro passivo, que mede embriaguez pelo ar.
Multa e carteiraA multa dobra em caso de reincidência. CNH passa a ficar apreendida por 2 anos.
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