Chegou a hora de o STF julgar o
processo do mensalão tucano e mostrar para a sociedade que a Justiça não
tem coloração partidária
Alan Rodrigues
Com a prisão dos primeiros condenados na
Ação Penal 470, o chamado mensalão do PT, o Supremo Tribunal Federal
(STF) tem agora o dever de mostrar à sociedade que é de fato uma corte
sem coloração partidária. Juristas de diversos matizes ideológicos
passaram os últimos dias proclamando que o julgamento do mensalão
petista somente se consolidará como um divisor de águas na Justiça
brasileira caso os critérios e a celeridade adotados pelos ministros
sirvam para balizar as outras ações que tramitam na Suprema Corte. E o
caso que melhor pode sinalizar esses novos tempos é conhecido como
mensalão tucano ou mensalão mineiro. O esquema de desvio de dinheiro
público montado em 1998 para abastecer ilegalmente a malsucedida disputa
pela reeleição de Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais foi
denunciado por ISTOÉ em setembro de 2007 e é apontado pelo Ministério
Público Federal como “a origem”, “o laboratório” do mensalão do PT.
“Vamos julgar esse caso o mais depressa que o devido processo legal
permitir”, afirmou o ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação, na
terça-feira 19. Sua avaliação é a de que o julgamento comece em março
do ano que vem e termine ainda no primeiro semestre. Essa, porém, não é
uma opinião unânime entre os ministros. Na quinta-feira 21, dois deles
disseram à ISTOÉ que o caso pode se arrastar para além de 2014.
O RÉU
Eduardo Azeredo era candidato à reeleição ao governo de Minas
quando foi criado o esquema do mensalão, em 1998
Uma das virtudes mostradas pelo STF no julgamento da Ação Penal 470
foi a celeridade imposta pelo relator Joaquim Barbosa para impedir que
alguns crimes fossem prescritos. O mesmo não ocorreu com o mensalão
mineiro – o ex-ministro Walfrido dos Mares Guia, um dos envolvidos, já
teve sua eventual pena prescrita – e caberá agora ao relator Barroso a
difícil missão de acelerar os trâmites, sem atropelar o direito de
defesa. Os crimes atribuídos aos condenados do mensalão petista
ocorreram entre 2003 e 2005 e o caso foi julgado em 2013. Os crimes
atribuídos aos mensaleiros do PSDB, entre eles o atual deputado Eduardo
Azeredo, ocorreram em 1998 e desde 2009 a denúncia se arrasta pelos
corredores da Suprema Corte. Segundo a contabilidade da Polícia Federal,
as investigações somam 159 políticos mineiros beneficiados, de 17
partidos diferentes, além da movimentação financeira de cerca de R$ 100
milhões. Outra diferença já verificada entre os dois casos e que permite
uma leitura de que o Judiciário possa estar usando de dois pesos e duas
medidas diz respeito às instâncias de julgamento. No caso do mensalão
do PT, todos os réus foram julgados pelo STF. Não tiveram, portanto, a
oportunidade de recorrer a juízes de tribunais superiores. No processo
dos tucanos, apenas os réus com foro privilegiado, como é o caso de
Azeredo e do senador Clésio Andrade, acusados de peculato e formação de
quadrilha, estão sub judice dos ministros do Supremo. Os demais
envolvidos têm suas atividades investigadas pela Justiça de primeira
instância, em Minas. Ou seja, se forem condenados, terão como apelar
para o Tribunal de Justiça e depois para os tribunais em Brasília.
O FAVORECIDO
Lentidão da Justiça permitiu que as penas para os crimes
atribuídos ao ex-ministro Mares Guia fossem prescritas
Assim como no esquema petista, no caso do PSDB foi o empresário
Marcos Valério quem montou a principal fonte de arrecadação financeira,
fazendo operações cruzadas envolvendo sua agência de publicidade
SMP&B, empresas estatais e os bancos. No inquérito, vários laudos
periciais da PF mostram que Valério obteve um total de R$ 28,5 milhões
em diversas operações de empréstimos com os bancos Rural, Cidade e de
Crédito Nacional. Segundo a polícia, os empréstimos eram um subterfúgio
para encobrir a origem ilícita das verbas tomadas de empresas do Estado,
como a Companhia de Saneamento (Copasa), Companhia Mineradora (Comig),
Banco do Estado (Bemge) ou Companhia Energética (Cemig). A Polícia
Federal concluiu que a lavagem do dinheiro seguiu um mecanismo
semelhante ao do mensalão do PT, com a diferença de que, no caso dos
mineiros, o desvio dos recursos públicos foi ainda mais explícito.
Relatório elaborado pela Polícia Federal e revelado por ISTOÉ conclui
que “constatou-se a existência de complexa organização criminosa que
atuava a partir de uma divisão muito aprofundada de tarefas, disposta de
estruturas herméticas e hierarquizadas, constituída de maneira metódica
e duradoura, com o objetivo claro de obter ganhos os mais elevados
possíveis, através da prática de ilícitos e do exercício de influência
na política e economia local”. O documento faz parte do processo e tem
anexado uma série de perícias e laudos contábeis. Segundo alguns
juristas, trata-se de uma prova muito mais contundente do que as
encontradas no mensalão do PT, mas resta saber se para os tucanos também
valerá a teoria do domínio dos fatos para responsabilizar os agentes
públicos pela prática corrupta.
http://www.istoe.com.br/reportagens/336020_QUE+O+RIGOR+CONTINUE
Nenhum comentário:
Postar um comentário