quinta-feira, 21 de julho de 2011

Dirigindo bêbado em Jerusalém

 
Thomas L. Friedman, The New York Times

Sou um grande fã de Joe Biden. O vice-presidente é um incansável defensor dos interesses dos Estados Unidos no exterior. Por isso, é doloroso para mim dizer que, em sua recente viagem a Israel, quando o governo do primeiro-ministro Bibi Netanyahu esfregou em seu nariz os novos planos habitacionais para a disputada Jerusalém Oriental, o vice-presidente perdeu a oportunidade de enviar um poderoso sinal público: ele deveria ter fechado seu notebook, retornado imediatamente para o Air Force Two, voado para casa e deixado o seguinte bilhete: "Mensagem dos Estados Unidos para o governo israelense: amigos não deixam amigos dirigirem bêbados. E, neste momento, vocês estão dirigindo bêbados. Vocês pensam que podem constranger seu único aliado verdadeiro no mundo, para satisfazer algumas necessidades políticas domésticas, sem consequências? Vocês perderam totalmente o contato com a realidade. Chamem-nos quando estiverem falando sério. Nós precisamos nos concentrar na construção do nosso país".

Acho que isso - em vez de irritar-se e depois colocar panos quentes - teria funcionando como uma mensagem muito útil por duas razões. Primeiro, o que os israelenses fizeram leva diretamente a uma pergunta que muitas pessoas estão fazendo sobre a equipe de Obama: o quão enérgicos são esses caras? A última coisa que o presidente precisa, num momento em que enfrenta o Irã e a China - sem falar no Congresso - é passar a impressão de que o aliado mais dependente dos Estados Unidos pode intimidá-lo.
E, em segundo lugar, Israel precisa de uma advertência. Continuar a erguer assentamentos na Cisjordânia e até moradias na disputada Jerusalém Oriental é uma loucura total. Yasser Arafat aceitou que os subúrbios judeus lá estariam sob a soberania de Israel em um acordo de paz que também incluísse estabelecer a capital palestina nas partes árabes de Jerusalém Oriental. A expansão habitacional planejada por Israel agora levanta dúvidas sobre se Israel estará disposto a admitir uma capital palestina nas vizinhanças árabes de Jerusalém Oriental - um grande problema.

Israel já abocanhou um vasto pedaço da Cisjordânia. Se quiser continuar como uma democracia judaica, sua única prioridade agora deve ser buscar um acordo com os palestinos que lhe permita permutar os blocos de assentamentos na Cisjordânia ocupados pelos judeus por uma quantidade de terra equivalente de Israel para os palestinos e, então, colher os resultados - em termos de economia e segurança - do encerramento do conflito.

Infelizmente, não foi o que aconteceu na semana passada. Durante nove meses, o enviado especial do governo americano para o Oriente Médio, George Mitchell, tentou encontrar uma forma de conseguir alguma negociação de paz entre israelenses e palestinos. Os palestinos não confiam em Netanyahu, e Netanyahu tem sérias dúvidas sobre se a dividida liderança palestina será capaz de cumprir suas promessas.

No entanto, Mitchell ainda conseguiu convencer os dois lados a concordar no sentido de negociações indiretas, as "conversas de aproximação" - os palestinos ficariam em Ramallah, e os israelenses, em Jerusalém, e Mitchell se encontraria separadamente com eles por 30 minutos.

Depois de uma década de negociações diretas, isso mostra como o processo degringolou.

Os assessores de Mitchell e Netanyahu fizeram um acordo informal: se os Estados Unidos derem início às conversas de aproximação, não haveria anúncios de construções em Jerusalém Oriental, nem nada para perturbar os palestinos e forçá-los a sair. Netanyahu concordou, dizem os representantes dos Estados Unidos, mas deixou claro que não poderia se comprometer com nada publicamente.

Então, o que aconteceu? Biden chegou um dia depois do início das conversas de aproximação e foi surpreendido pelo anúncio, por parte do ministro israelense do Interior, de que Israel tinha acabado de aprovar planos para construir 1.600 novas moradias na parte árabe de Jerusalém Oriental.

Netanyahu disse que foi pego de surpresa. Isso provavelmente seja verdade num sentido estreito. A iniciativa parece ter sido parte de uma concorrência entre dois dos ministros sefarditas direitistas de Netanyahu, membros do partido religioso Shas, no sentido de quem poderia ser o campeão em construção de casas para os judeus ortodoxos sefarditas em Jerusalém Oriental. É uma demonstração do quanto Israel dá nosso apoio como certo e do quanto a direita religiosa israelense está dessintonizada com as necessidades estratégicas dos Estados Unidos.

Biden - um verdadeiro amigo de Israel - teria dito a seus interlocutores israelenses: "O que vocês estão fazendo aqui compromete a segurança de nossas tropas que estão lutando no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão. Isso nos coloca em risco e coloca a paz regional em risco".

Toda essa rixa também nos desvia do potencial deste momento: somente um primeiro-ministro de direita, como Netanyahu, pode fazer um acordo sobre a Cisjordânia; as políticas efetivas de Netanyahu sobre a questão dos territórios disputados ajudaram os palestinos a desenvolver sua economia e estabelecer sua própria força de segurança reconstruída, que está trabalhando com o exército israelense para evitar o terrorismo; os líderes palestinos Mahmoud Abbas e Salam Fayyad estão se mostrando tão honestos e sérios com relação a trabalhar na busca de uma solução quanto Israel poderia esperar; o Hamas suspendeu seus ataques a Israel na Faixa de Gaza; com os árabes sunitas obcecados com a ameaça do Irã, sua disposição para trabalhar com Israel nunca foi tão grande, e a melhor forma de isolar o Irã é deixar a carta do conflito palestino longe das mãos de Teerã.

Em resumo, existe aqui uma real oportunidade - se Netanyahu escolher agarrar-se a ela. O líder israelense precisa decidir se quer fazer a história ou, mais uma vez, ser uma nota de rodapé nela.

*Thomas L. Friedman é colunista do jornal The New York Times desde 1981. Foi correspondente-chefe em Beirute, Jerusalém, Washington e na Casa Branca (EUA). Conquistou três vezes o Prêmio Pulitzer, até que em 2005 foi eleito membro da direção da instituição. Artigo distribuído pelo New York Times News Service.

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