Mais de 50 mil documentos encontrados no Arquivo Público de São Paulo mostram como a polícia civil se infiltrou e investigou partidos políticos, movimentos sociais e sindicatos em pleno governo de Mário Covas
Pedro Marcondes de MouraAgentes infiltrados em movimentos sociais, centenas de dossiês sobre partidos políticos, relatórios minuciosos com os discursos de oradores em eventos políticos e sindicais. Tudo executado por policiais, a mando de seus chefes. Estas atividades, típicas da truculenta ditadura militar brasileira, ocorreram no Estado de São Paulo em plena democracia, há pouco mais de dez anos. Cerca de 50 mil documentos, até então secretos e que agora estão disponíveis no Arquivo Público do Estado, mostram como os quatro governadores paulistas, eleitos pelas urnas entre 1983 e 1999, serviram-se de “espiões” pagos com o dinheiro dos contribuintes para monitorar opositores. Amparados e estimulados por seus superiores, funcionários do Departamento de Comunicação Social (DCS) da Polícia Civil realizavam a espionagem estatal. Até o tucano Mário Covas, um dos maiores opositores do regime militar e ele mesmo vítima de seus métodos autoritários, manteve a “arapongagem” durante todo o seu primeiro mandato e por um período de sua segunda gestão. Entre os alvos preferidos na administração do PSDB aparecem o PT e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), organização sindical fundada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Há dezenas de dossiês com informações sobre as duas entidades e seus principais expoentes. Já as investigações a respeito dos tucanos e seus aliados foram suspensas a partir de 1995, quando Covas assumiu o governo de São Paulo.
A classificação dos documentos, que vieram à tona em uma reportagem publicada pelo portal IG, deixa claro como a polícia a serviço dos políticos paulistas se utilizou exatamente das mesmas práticas que fizeram a fama dos órgãos de repressão militar. As informações coletadas eram organizadas em fichas por códigos alfanuméricos, como no temido Departamento de Ordem Política e Social (Dops), onde opositores do golpe de 1964 foram alvo de interrogatórios e sessões de tortura. Tarimbados profissionais do extinto Dops integravam também a equipe do Departamento de Comunicação Social da Polícia Civil. Delegados de cidades paulistas foram orientados a reportar qualquer acontecimento político-social ao DCS. Codinomes e infiltrações em assembleias grevistas também faziam parte da rotina dos agentes, que relatavam os acontecimentos aos superiores. Em um dos dossiês sobre a CUT, os investigadores autodenominados Gama 30 e Gama 38 relatam a tentativa frustrada de participar de uma assembleia dos funcionários da Fundação Florestal do Estado de São Paulo em 13 de março de 1995. Dizem que “cumpriram a determinação”, mas foram barrados por uma moça na portaria. Os crachás de empregados temporários de que dispunham os agentes trapalhões não eram aceitos na entrada.
Os agentes eram enviados para acompanhar até eventos públicos. “Em cumprimento à determinação de V.S., assistimos no local e constatamos a presença de aproximadamente 250 pessoas juntamente com um carro de som e de uma perua Kombi”, relatam os agentes Gama 45 e Gama 55 sobre manifestação da CUT realizada no dia 10 de março de 1995, na Praça da Sé, em São Paulo. No documento ainda identificam os proprietários dos veículos pelas placas e fazem questão de mencionar que o hoje deputado Vicente Paulo da Silva (PT-SP), o Vicentinho, presidente na época da entidade sindical, discursou no evento. Essa seria apenas uma das diversas arapongagens contra a Central Única dos Trabalhadores na gestão Covas.
A classificação dos documentos, que vieram à tona em uma reportagem publicada pelo portal IG, deixa claro como a polícia a serviço dos políticos paulistas se utilizou exatamente das mesmas práticas que fizeram a fama dos órgãos de repressão militar. As informações coletadas eram organizadas em fichas por códigos alfanuméricos, como no temido Departamento de Ordem Política e Social (Dops), onde opositores do golpe de 1964 foram alvo de interrogatórios e sessões de tortura. Tarimbados profissionais do extinto Dops integravam também a equipe do Departamento de Comunicação Social da Polícia Civil. Delegados de cidades paulistas foram orientados a reportar qualquer acontecimento político-social ao DCS. Codinomes e infiltrações em assembleias grevistas também faziam parte da rotina dos agentes, que relatavam os acontecimentos aos superiores. Em um dos dossiês sobre a CUT, os investigadores autodenominados Gama 30 e Gama 38 relatam a tentativa frustrada de participar de uma assembleia dos funcionários da Fundação Florestal do Estado de São Paulo em 13 de março de 1995. Dizem que “cumpriram a determinação”, mas foram barrados por uma moça na portaria. Os crachás de empregados temporários de que dispunham os agentes trapalhões não eram aceitos na entrada.
Os agentes eram enviados para acompanhar até eventos públicos. “Em cumprimento à determinação de V.S., assistimos no local e constatamos a presença de aproximadamente 250 pessoas juntamente com um carro de som e de uma perua Kombi”, relatam os agentes Gama 45 e Gama 55 sobre manifestação da CUT realizada no dia 10 de março de 1995, na Praça da Sé, em São Paulo. No documento ainda identificam os proprietários dos veículos pelas placas e fazem questão de mencionar que o hoje deputado Vicente Paulo da Silva (PT-SP), o Vicentinho, presidente na época da entidade sindical, discursou no evento. Essa seria apenas uma das diversas arapongagens contra a Central Única dos Trabalhadores na gestão Covas.
FOCO
Tanto Lula, candidato a presidente contra Fernando Henrique Cardoso,
quanto Marta Suplicy, que disputava o governo de São Paulo com
Mário Covas, foram alvo da arapongagem estatal paulista em 1998
Em tempos tucanos, o Partido dos Trabalhadores (PT) virou o principal alvo. Há pilhas e pilhas de documentos produzidos pelo Departamento de Comunicação Social (DCS) a respeito da sigla. Convenções, disputas internas, gestões municipais do partido e informações das principais lideranças e dos possíveis candidatos a eleições majoritárias eram coletadas pela “polícia política” em plena década de 90. Os nomes do ex-presidente Lula e da hoje senadora Marta Suplicy (PT-SP), que disputaria com Covas o primeiro turno da corrida pelo governo de São Paulo em 1998, aparecem constantemente nos “dossiês PT”. Já para Antônio Palocci, prefeito de Ribeirão Preto no período, criaram um dossiê exclusivo. Na pasta, o ex-ministro é apresentado como uma figura em ascensão no partido e favorável a privatizações.
Segundo o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Rio de Janeiro, Wadih Damou, as atividades realizadas pelo Departamento de Comunicação Social da Polícia Civil do Estado de São Paulo são ilegais, violam a Constituição e devem ser investigadas com extremo rigor. “Causa mais repulsa ainda que tenham sido feitas em um período democrático. Nunca vi nada parecido. Fico preocupado e penso se isso não continua acontecendo.” O DCS, pelo menos, acabou extinto em 24 de novembro de 1999.
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