Ministério do Trabalho promove o milagre da multiplicação, criando uma nova entidade a cada dia, e documentos revelam um mercado negro das cartas sindicais
Claudio Dantas SequeiraA trajetória do ex-jornaleiro Carlos Lupi, que virou presidente do PDT e ministro de Estado, é um exemplo do quanto a política e os movimentos sociais no Brasil são capazes de transformar a vida de um cidadão. Foi a disciplinada militância de Lupi nos partidos e nos sindicatos que consolidou seu caminho até o Ministério do Trabalho. E desde que assumiu a pasta, em 2007, Lupi, associado ao deputado federal Paulinho da Força (PDT), ainda teve fôlego para tornar-se personagem de um novo milagre: o da multiplicação de sindicatos. Em apenas três anos de sua gestão no Ministério, foram concedidos 1.457 registros sindicais e há outros 2.410 pedidos em trâmite na Secretaria de Relações do Trabalho.
Nos primeiros seis meses deste ano, o ministro autorizou o funcionamento de 182 entidades sindicais, tanto de trabalhadores como patronais. Ou seja, em média surge um novo sindicato a cada dia no Brasil. Em vez de alta produtividade associativa, no entanto, parece haver uma situação de descontrole total na concessão de registros, como indicam uma avalanche de impugnações por parte de sindicatos históricos e o acúmulo de processos na Justiça do Trabalho. Há sinais contundentes de que a fabricação de sindicatos, federações e confederações vem atendendo a interesses políticos e partidários, não apenas trabalhistas. Denúncias, recebidas por ISTOÉ, indicam inclusive a existência de um balcão de negócios por trás da concessão das cartas sindicais, que chegariam a custar R$ 150 mil no mercado negro da burocracia federal.
Nos primeiros seis meses deste ano, o ministro autorizou o funcionamento de 182 entidades sindicais, tanto de trabalhadores como patronais. Ou seja, em média surge um novo sindicato a cada dia no Brasil. Em vez de alta produtividade associativa, no entanto, parece haver uma situação de descontrole total na concessão de registros, como indicam uma avalanche de impugnações por parte de sindicatos históricos e o acúmulo de processos na Justiça do Trabalho. Há sinais contundentes de que a fabricação de sindicatos, federações e confederações vem atendendo a interesses políticos e partidários, não apenas trabalhistas. Denúncias, recebidas por ISTOÉ, indicam inclusive a existência de um balcão de negócios por trás da concessão das cartas sindicais, que chegariam a custar R$ 150 mil no mercado negro da burocracia federal.
MILAGRE
O ministro Carlos Lupi e o deputado Paulinho da Força promovem a
multiplicação das entidades que disputam contribuições de trabalhadores
A presidente da Federação Nacional dos Terapeutas (Fenate), Adeilde Marques, relata um episódio definitivo para revelar o tratamento diferenciado que estaria ocorrendo na burocracia federal. Quem paga, segundo ela, vai para o topo da fila das concessões de cartas sindicais. Quem se recusa a entrar no esquema pode ficar esperando indefinidamente pelo registro. Ela conta que, ao buscar a regularização da entidade junto ao Ministério do Trabalho, em Brasília, foi encaminhada ao escritório do sindicalista Miguel Salaberry, ligado à Social Democracia Sindical, hoje a nova central UGT, União Geral dos Trabalhadores. “Me pediram R$ 5 mil para que a carta sindical saísse mais rápido”, afirma. Indignada, Adeilde pediu apoio da Força Sindical. Foi pior. Em conversa com o próprio presidente da central em Sergipe, Willian Roberto Cardoso Arditti, o “Roberto da Força”, Adeilde foi informada de que a carta sindical poderia custar até R$ 40 mil. “Eu me recusei a pagar”, garante.
Roberto da Força é o mesmo personagem que aparece em denúncia da presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Nossa Senhora do Socorro, Edjane Silveira. Ao Ministério Público Federal, ela disse que não quis pagar o pedágio e trocou a Força Sindical pela CUT. Em retaliação, Roberto criou, com aprovação do Ministério, um clone do sindicato de Edjane com um nome quase idêntico: o Sindicato dos Servidores do Município de Nossa Senhora do Socorro (Sindispub). No comando desse Sindispub clonado está Joanes Albuquerque de Lima, que também preside outros sindicatos locais da Força Sindical. “Mesmo provando que o sindicato de Edjane já existia desde 2001, a Secretaria de Relações do Trabalho arquivou nosso processo de pedido de registro sindical”, reclama o advogado João Carvalho.
Há uma coleção de casos estranhos. Em São Paulo, o camelô José Artur Aguiar conseguiu fundar o Sindicato dos Trabalhadores em Casas Lotéricas, mesmo sem nunca ter trabalhado na atividade (o registro é contestado na Justiça). Em outro episódio, o Sindicato de Empresas de Desmanche de Veículos (Sindidesmanche), entidade patronal ligada à Força, ganhou sua carta sindical apesar de seus dirigentes – Mario Antonio Rolim, Ronaldo Torres, Antonio Fogaça e Vitorio Benvenuti – também comandarem, na outra ponta, uma entidade de trabalhadores, o Sintseve, que reúne inspetores técnicos em segurança veicular. O objetivo da multiplicação de entidades não é difícil de entender.
Roberto da Força é o mesmo personagem que aparece em denúncia da presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Nossa Senhora do Socorro, Edjane Silveira. Ao Ministério Público Federal, ela disse que não quis pagar o pedágio e trocou a Força Sindical pela CUT. Em retaliação, Roberto criou, com aprovação do Ministério, um clone do sindicato de Edjane com um nome quase idêntico: o Sindicato dos Servidores do Município de Nossa Senhora do Socorro (Sindispub). No comando desse Sindispub clonado está Joanes Albuquerque de Lima, que também preside outros sindicatos locais da Força Sindical. “Mesmo provando que o sindicato de Edjane já existia desde 2001, a Secretaria de Relações do Trabalho arquivou nosso processo de pedido de registro sindical”, reclama o advogado João Carvalho.
Há uma coleção de casos estranhos. Em São Paulo, o camelô José Artur Aguiar conseguiu fundar o Sindicato dos Trabalhadores em Casas Lotéricas, mesmo sem nunca ter trabalhado na atividade (o registro é contestado na Justiça). Em outro episódio, o Sindicato de Empresas de Desmanche de Veículos (Sindidesmanche), entidade patronal ligada à Força, ganhou sua carta sindical apesar de seus dirigentes – Mario Antonio Rolim, Ronaldo Torres, Antonio Fogaça e Vitorio Benvenuti – também comandarem, na outra ponta, uma entidade de trabalhadores, o Sintseve, que reúne inspetores técnicos em segurança veicular. O objetivo da multiplicação de entidades não é difícil de entender.
MANIFESTAÇÃO
Nesta semana, a Força Sindical reuniu 17 mil pessoas
em São Paulo para pedir redução da jornada de trabalho
O esquema que permite a clonagem e o fatiamento de entidades sindicais começou em 2008, a partir da Portaria 186, que estabeleceu novas regras para o registro sindical. O texto tinha por princípio combater a unicidade sindical nas entidades de grau superior (federações e confederações), mas acabou retalhando o movimento sindical e servindo aos interesses da Força e do PDT. A Secretaria de Relações do Trabalho, responsável pela concessão das cartas sindicais, foi comandada até o ano passado por Luiz Antonio de Medeiros, que deixou o posto para concorrer nas eleições.
Mesmo fora da pasta, ele continua operando por intermédio da técnica Zilmara Alencar e de seu chefe de gabinete, o delegado aposentado Eudes Carneiro, que representa Lupi em reuniões sindicais e inaugurações de entidades. Carneiro é tesoureiro do Sindicato Nacional dos Delegados de Polícia Federal (Sindepol). Questionado por ISTOÉ, Lupi negou que haja interferência política na liberação dos registros. “O papel do ministério é de mediação”, diz ele. Na opinião do ministro, a Portaria 186 “democratizou” o movimento sindical. Não é o que pensam outros históricos sindicalistas como o ex-governador gaúcho Olívio Dutra. Para ele, a política de Lupi não passa de um “democratismo sindical”, que estaria “estilhaçando a representação dos trabalhadores e favorecendo barbaridades”. Dutra alerta: “São gangues que se apropriam dos recursos do trabalhador
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