O teto de vidro do secretário Beltrame (Direto de Brasília)
Baseado em denúncia do deputado Garotinho, Adepol-RJ apura que secretário de
Segurança recebe até mais que o dobro do salário teto de ministro do Supremo
Uma denúncia feita no mês de março último pelo deputado federal Anthony Garotinho (PR/RJ), no plenário da Câmara dos Deputados, chamou atenção da Adepol-RJ pelo absurdo e pela gravidade do fato, que enseja uma aparente inconstitucionalidade.
Em nota publicada na coluna Pinga-Fogo, do Jornal da Câmara – edição de 15/03/2011, página 4 –, o parlamentar fluminense expressa sua indignação com o salário recebido pelo secretário de Segurança Púbica do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame.
“Após carnaval estarei aqui com o seu contracheque (do secretário), com um vencimento de R$ 34 mil, em função do acúmulo do salário de Delegado Federal e de Secretário de Segurança Pública do Rio”, diz a notícia, reproduzindo a denúncia de Garotinho.
O valor citado pelo deputado supera em muito o teto remuneratório estabelecido pela Constituição Federal para o funcionalismo público, que é o de ministro do Supremo Tribunal Federal, atualmente fixado em R$ 26,7 mil. Também representa, simplesmente, o dobro do subsídio mensal do Governador do Estado do Rio de Janeiro, que a Lei nº 5.847 de 21 de dezembro de 2010 estipulou em R$ 17.200,00 para o exercício de 2011.
Supersalários
Baseado na denúncia do deputado Garotinho, e no momento em que se empenha em todas as frentes para alcançar a tão almejada equiparação do teto remuneratório dos delegados de polícia com as demais carreiras jurídicas, a Adepol-RJ decidiu ir a fundo na questão e descobriu que a situação ainda é mais escandalosa.
Em virtude de um questionável acúmulo de vencimentos, o secretário Beltrame recebeu, em termos brutos, a incrível remuneração de R$ 60.912,44 em dezembro de 2010, resultado da soma de um repasse de R$ 40.878,42 referente aos vencimentos de delegado federal, R$ 10.017,00 do subsídio de secretário de Estado e mais R$ 10.017,02 a título de gratificação de encargos especiais.
Em janeiro deste ano, o contracheque de Beltrame somou R$ 50.293,18 (R$ 24.493,18 da remuneração de delegado, R$ 12.900 dos vencimentos de secretário, e R$ 12.900,00 de gratificação). Em fevereiro, mais R$ 50.220,18 (R$ 24.420,18 da Polícia Federal, R$ 12.900,00 do subsídio e R$ 12.900,00 de gratificação).
Tais remunerações, que certamente fazem do secretário Beltrame um dos servidores públicos mais privilegiados do país, ferem frontalmente o que preceitua o Art. 37, inciso XI da Constituição Federal:
“Art. 37. (...)
XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)”. O grifo é nosso.
No âmbito estadual, o teto remuneratório em vigor foi estabelecido pela Lei nº 5.847 de 21 de dezembro de 2010, que tem a seguinte redação:
“LEI Nº 5.847 DE 21 DE DEZEMBRO DE 2010
FIXA, EM OBEDIÊNCIA AO QUE PRECEITUAM OS ARTIGOS 28, §2º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E 99,IX, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO, O SUBSÍDIO DO GOVERNADOR, DO VICE-GOVERNADOR E DOS SECRETÁRIOS DE ESTADO.
O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º - O subsídio mensal do Governador do Estado, para o exercício financeiro de 2011, será de R$ 17.200,00 (dezessete mil e duzentos reais).
Art. 2º - O subsídio mensal do Vice-Governador, para o exercício financeiro de 2011, será de R$ 12.900,00 (doze mil e novecentos reais).
Art. 3º - O subsídio mensal dos Secretários de Estado, para o exercício financeiro de 2011, será de R$ 12.900,00 (doze mil e novecentos reais).
Art. 4º - Esta Lei entrará em vigor em 1º de janeiro de 2011, revogadas as disposições em contrário, em especial os artigos 1º, 2º e 3º da Lei nº 5598, de 18 de dezembro de 2009.
Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 2010
SÉRGIO CABRAL
Governador”
A tormentosa questão do teto remuneratório dos delegados fluminenses.
Após o reajuste de 87,34% concedido pela Lei 5764 de 29 de junho de 2010, que atualizou os valores do vencimento-base das autoridades policiais previstos na Lei 1639, de 30 março de 1990, brevemente, todos os delegados, inclusive os mais novos, passarão a ter o redutor remuneratório, em razão de glosa mensal que vem sendo aplicada há longo tempo, a quase todos os demais delegados sob a rubrica nos contra-cheques “EMENDA CONSTITUCIONAL NUM. 41/03” . É certo que a Lei 5764/10 – que restabeleceu a harmonia remuneratória com as demais carreiras jurídicas – “foi uma correção de uma injustiça histórica”, como afirmou o então presidente da ALERJ, Jorge Picciani, apesar da opinião do Secretário de Segurança José Mariano Beltrame, que se posicionou contra esse aumento e, pior, pois afirmou categoricamente que os delegados não mereciam o reajuste!
Assim sendo, tal descritério configura, na espécie, “tratamento antiisonômico por consistir sistema desigualador de iguais”, afrontando o princípio constitucional da razoabilidade (C.F., art. 5° LIV). Sendo assim, o que justifica esse tratamento diferenciado? As atribuições dos delegados estaduais, porventura, são de menor complexidade do que as de seus colegas delegados federais? A que título, por que os delegados federais colocados à disposição da Secretaria de Segurança não tem o teto fixado para o Governador do Estado (R$17.200,00) e, nem mesmo do próprio Ministro do Supremo Tribunal Federal (R$26.700,00)? Ao que tudo indica, essa remuneração sem teto do Secretário de Segurança e de seus auxiliares de investidura federal ofende não somente o art. 37, XI, bem como o principio da moralidade previsto no art. 37, caput, ambos da Constituição Federal. A ADEPOL/RJ analisa a possibilidade de representar à Procuradoria Geral da República, visando a instauração de um inquérito civil público e sua conseqüente ação civil pública, a fim de que todas as parcelas recebidas indevidamente pelo Secretário e demais servidores de investidura federal sejam devolvidas ao erário público, a partir de janeiro de 2007, além das demais cominações legais.
Rio de Janeiro, 24 de maio de 2011
Wladimir S. Reale
PRESIDENTE DA ADEPOL/RJ E
VICE–PRESIDENTE DA ADEPOL/BRASIL |
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