terça-feira, 19 de outubro de 2010

A Volta do Cipó de Aroeira no Lombo de Quem Mandou Dar.

Ninguém há de negar que algo de surreal, de abjeto, de repulsivo, serviu como grito de alerta por obra e graça da campanha de Serra que marcou definitivamente as eleições atuais como as mais sujas desde a redemocratização do Brasil, aflorando no povo brasileiro o sentimento de ódio, rancor, em resultado direto da ação covarde e clandestina de grupos que se aparelharam na web, bem como através de e-mails, nos púlpitos das igrejas, pelas mãos das lideranças religiosas e de milhões de panfletos disseminados por todo país, estampando a estória de que Dilma era a favor do aborto, de que ela teria dito que nem Jesus impediria sua vitória no primeiro turno, de que seu vice era satanista e de que ela seria lésbica, havendo inclusive uma demanda judicial de uma ex-amante que lhe cobrava pensão na justiça, que ela teria nascido na Bulgária e portanto não poderia ser a presidente do Brasil, que estaria impedida de entrar no E.U.A , que seu estado de saúde era terminal e o seu vice seria aquele que realmente governaria o Brasil, entre tantas outras mentiras mais. O ápice da baixaria, da grossa baixaria que ainda continua, aconteceu com o envolvimento pessoal da mulher de Serra, Mônica, que numa visita ao Rio de Janeiro ouviu de um eleitor que votaria em Dilma. O suficiente para replicar dizendo que como evangélico ele não deveria ter esta opção de voto, afinal de contas Dilma era a favor da morte de criancinhas. É de perguntar-se: Como tudo isso veio parar na campanha eleitoral, de modo a se tornar o fator de desequilibrio que alçou Marina de uma posição de candidata nanica, para uma participação vistosa que a fez receber quase vinte milhões de votos sendo a responsável direta pela ida de Serra ao segundo turno? A mudança do eixo da campanha de Serra que a princípio deveria se concentrar no debate de idéias, na apresentação de propostas, na comparação de governos e de modelos, para a campanha rasteira da calúnia, da boataria, comandada por um indiano, Ravi Singh, contratado a peso de ouro com a missão de fazer por aqui o mesmo que fez nos E.U.A , explica-se pela contingência de não ter como impedir a vitória de Dilma no primeiro turno, se não fosse pelos expedientes rasteiros que utilizou. Era isso ou a vergonha de ter sua carreira como candidato a presidente da república encerrada com a maior votação já conseguida por uma candidata no primeiro turno da história das eleições presidênciais. Serra prefiriu o isso a ter de ir pra casa completamente humilhado. Embora seja o responsável maior pelo rumo que a campanha tomou, com toda baixaria que persiste nos subterrâneos, o eleitorado que estava com Dilma e foi para Marina tem sua parcela de responsabilidade por ter acreditado e até sido usado como veículo para espalhar a onda de boatos que tomou conta do Brasil, sem que tivesse sequer usado o senso crítico para avaliar objetivamente as informações passadas. Na América, esse indiano que trouxe o nohall de como se fazer uma campanha eleitoral rasteira para cá, levantou as piores calhordices contra Obama, obrigando-o a criar um site especificamente para desmentir a boataria lançada na internet contra a campanha dos democratas. Para o bem da democracia americana, Obama conseguiu neutralizar as mentiras e saiu-se vitorioso. Obviamente que aqui houve um efeito inverso. Se a sordidez da boataria feita pela campanha de Serra serviu de benefício à Marina, que saiu maior do que entrou nestas eleições, serviu também ao objetivo traçado, pelos tucanos, de levar as eleições a um segundo turno. Assim, conseguiram imprimir na campanha de Dilma a marca do aborto. Sutilmente, conveceram o segmento religioso da população que Dilma legalizaria o aborto no Brasil se porventura viesse a eleger-se no primeiro turno. Apesar de Dilma negar insistentemente que seja a favor do aborto, inclusive empenhando sua palavra aos principais líderes religiosos do movimento evangélico, no sentido de que não mudará a legislação caso seja eleita, chegando inclusive a escrever uma carta, divulgada pela imprensa, dando todas garantias de que passa ao largo de suas intenções propôr qualquer alteração na legislação sobre o tema em debate, fato esse de conhecimento público, ainda assim, sorrateiramente colaboradores de Serra continuam a disseminar, por meio de uma modalidade nova de campanha, o telemarketing, que Dilma mente e que só está se comprometendo com a posição da igreja porque quer eleger-se. (http://www.viomundo.com.br/politica/serra-continua-acusando-dilma-de-propor-aborto.html) Ora, é ofensivo à candidata Dilma que mesmo renunciando as suas convicções, mesmo dobrando-se à vontade da maioria do povo brasileiro que não aceita que o aborto seja legalizado no Brasil, mesmo nunca tendo praticado um aborto e mesmo dizendo que o que defende é o direito da mulher que tenha passado por um aborto clandestino seja atendida pela rede pública de saúde, continuem a execrá-la, a colocá-la numa posição de fragilidade. Isto é especialmente repulsivo depois da revelação de que Mônica Serra, esposa do candidato José Serra, teria feito um aborto quando estava no exílio. Pois é, surpreende saber que a mesma Mônica Serra que disse para o evangélico do Rio de Janeiro não votar em Dilma, porque Dilma era a favor de matar criancinha, tenha ela mesmo tomado a decisão de abortar, segundo Sheila Canevacci, uma de suas ex-alunas que ouviu em sala de aula a professora fazer tal confissão.(http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/folha-e-a-hipocrisia-de-serra-sobre-aborto#more) O aborto da esposa de Serra não é relevante, é secundário, deve-se provavelmente a uma circunstância excepcional, de grande sofrimento pessoal que só ela pode mensurar. O relevante é a hipocrisia da discussão do tema introduzido por vias oblíquas e aproveitado oportunisticamente pela campanha de Serra, apesar do precedente pessoal de sua esposa que tendo passado por tão amarga experiência, jamais deveria estar entre aqueles que se apressaram em atirar a primeira pedra na reputação de Dilma, já que seu drama íntimo era a prova viva de que o aborto é uma questão delicada que transcende o aspecto moral da ética religiosa. Trago este fato público da vida íntima de Mônica Serra, amplamente divulgado na internet e na Folha de São Paulo, não para condená-la, como ela impiedosamente fez com Dilma e o seu marido continua fazendo. Trago tão somente para refoçar que esta coisa de moralismo é perigosa e sempre anda de mãos dadas com a hipocrisia. Vejam a que ponto de discussão chegamos a nos ocupar, quando o essencial é debater o futuro do Brasil. Como dizem os versos de Geraldo Vandré, é "a volta do cipó de aroeira no lombo de quem mandou dar". Com a palavra, os religiosos aliados do neoconvertido José Serra.