sexta-feira, 18 de maio de 2012

Kassab e a máfia dos imóveis



Investigação do MP revela o envolvimento do prefeito de São

Paulo com o esquema de aprovação de licenças para edificações.

Para os procuradores, Gilberto Kassab (PSD) sabia das

irregularidades há pelo menos quatro anos e pode ter se

beneficiado delas

Alan Rodrigues
chamada.jpg
Há pelo menos uma década, o Ministério Público de São Paulo vem recebendo informações e documentos sobre a existência de uma máfia que atua no setor imobiliário de São Paulo e a ligação dessa organização com funcionários da própria prefeitura da capital. Agora, depois de anos de denúncias, veio a público a suspeita de que um dos líderes dessa possível quadrilha é Hussain Aref Saab, ex-diretor responsável pela aprovação de edificações de médio e grande porte da cidade. Trata-se de um funcionário público que ascendeu na administração municipal pelas mãos do atual prefeito, Gilberto Kassab (PSD), e que chegou ao ponto alto da carreira nomeado pelo ex-governador e ex-prefeito José Serra (PSDB). Aref, como é conhecido nos gabinetes paulistanos, foi flagrado depois que a Corregedoria-Geral do Município (CGP) identificou 106 imóveis (apartamentos, casas, terrenos, salas comerciais e vagas de garagem) em seu nome. Um patrimônio de mais de R$ 50 milhões adquiridos nos últimos sete anos.
img1.jpg
106 é o número de imóveis que Hussain Aref comprou nos últimos
sete anos, depois que foi nomeado diretor por José Serra
Fortalece as suspeitas de corrupção o fato de toda essa riqueza ser amealhada por um funcionário público que vivia com R$ 20 mil mensais – salário e aposentadoria que somam R$ 9.400 e os outros R$ 10.600 creditados das retiradas financeiras de um estacionamento da família, conforme revela sua declaração de renda. Segundo a Controladoria, as fraudes causaram um rombo de mais de R$ 70 milhões aos cofres municipais. De acordo com o MP, a máfia chegou a ponto de criar uma tabela de propina. “A quadrilha cobrava de R$ 40 mil a R$ 400 mil para que fosse autorizada a liberação de áreas para construção na cidade”, diz um dos promotores. O funcionário pediu demissão no dia 15 de abril. O problema para Kassab é que documentos em poder do MP e da Câmara dos Vereadores, aos quais ISTOÉ teve acesso, comprovam que o prefeito sabia de tudo há pelo menos quatro anos. Mais do que isso. Kassab pode ter sido um dos beneficiários do esquema criminoso, assim como familiares do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, uma rede de empresários e dezenas de servidores públicos. “Estamos diante do maior escândalo já visto dentro da máquina pública paulista”, avalia o vereador Aurélio Miguel (PR), autor de um pedido de CPI para apurar o caso, que até a tarde da quinta-feira 15 já colecionava 18 das 28 assinaturas necessárias.
img2.jpg

img4.jpg
As suspeitas sobre as ações irregulares de Aref durante a aprovação de licenças de edificações começaram em 2006, depois que o teto de uma igreja evangélica desabou sobre os fiéis no centro de São Paulo. Na época, uma Comissão da Câmara de Vereadores identificou várias irregularidades na concessão dos alvarás de funcionamento de prédios na cidade. Diante disso, tanto o Ministério Público quanto a Corregedoria da prefeitura foram alertados sobre a possível existência de uma máfia no setor imobiliário paulista. O envolvimento de Aref ficou mais evidente durante as investigações da CPI do IPTU, em 2008, que apurou falsificação de carnês do imposto e desvios de verbas. Segundo a CPI, mais de três milhões de metros quadrados tiveram sua licença aprovada irregularmente. Nesse período, o responsável pelas liberações das construções era Aref. De acordo com integrantes da Comissão de Inquérito, a Prefeitura de São Paulo foi reiteradamente comunicada. “Pedimos apurações e nada aconteceu”, alerta Aurélio Miguel. Uma das mais contundentes provas de que Kassab sabia do esquema está na correspondência encaminhada em novembro do ano passado à prefeitura pelo presidente da Câmara, José Pólice Neto (PSD). No ofício, Neto comunica o prefeito sobre a convocação de Aref e outros quatros funcionários. Só que Aref e os demais subordinados do prefeito ignoraram os convites para o depoimento. Na mesma carta, Kassab foi informado de que a ausência dos funcionários atentava contra o regimento do servidor público e que o não comparecimento deles implicava na suspensão de seus vencimentos.
img3.jpg
O comportamento do prefeito pode ser explicado por outra denúncia do MP. Em 2008, o próprio Kassab, segundo o Ministério Público, foi beneficiado pelo esquema. As irregularidades constam do processo 0163622/10 encaminhado aos promotores em 2010. A peça jurídica detalha que, em 2003, Kassab, em sociedade com o deputado estadual Rodrigo Garcia (DEM), pleiteava a aplicação da Lei da Anistia para regularizar a reforma de um prédio de propriedade da empresa R&K Engenharia, pertencente na época à dupla. No entanto, em 8 de março de 2006 o pedido de regularização do imóvel foi indeferido. Chama a atenção nesse processo que, mesmo passado o prazo de apresentação de recursos – 60 dias –, a Secretaria de Habitação, onde estava lotado Aref, tenha decidido reconsiderar o caso. Um ano depois, o processo foi revisto e Kassab conseguiu aprovar a anistia. Outro detalhe surpreendente dessa história é que a revisão só foi possível porque várias páginas do processo desapareceram. Em agosto de 2008, a prefeitura reconstituiu a documentação e deu o sinal verde para a regularização do imóvel do prefeito. Kassab nega que tenha sido favorecido, mas o processo está sendo analisado pelo MP. O prefeito também diz que irregularidades são comuns na administração pública e que sua gestão está pronta para puni-las. “Nós descobrimos e estamos punindo.” Nas declarações, Kassab se mostra cioso no trato com a coisa pública e na investigação de eventuais malfeitos. Mas só em 2012 é que a prefeitura pediu que a Corregedoria apurasse o caso, depois de seis anos de recorrentes alertas tanto por parte do MP quanto pela Câmara de Vereadores.

Funcionário de carreira, Aref é tido como parceiro de Kassab desde a administração Celso Pitta, quando o atual prefeito comandava a Secretaria de Planejamento e ele ocupava um cargo de diretoria na mesma pasta. Mas foi José Serra quem guindou o servidor ao principal cargo na área de aprovação de edificações. Em janeiro de 2005, Serra o transformou no responsável pela liberação de qualquer área construída acima de 500 m² na cidade. Desde então, o MP e a Corregedoria passaram a colecionar denúncias de cobrança de propina por funcionários da pasta comandada por Aref. Os procuradores também começaram a identificar uma meteórica evolução patrimonial. De 2005 até julho de 2008, Aref registrou 58 imóveis em seu nome, boa parte deles de alto luxo, como seis apartamentos em um prédio com vista para o Parque do Ibirapuera, o maior de São Paulo, imóveis orçados em R$ 4 milhões cada. Os investimentos de Aref não pararam. Três anos depois de assumir o posto, ele constituiu a SB4 Patrimonial, uma empresa de capital social de R$ 10 mil, que conta como sócios a mulher e dois filhos, na qual registrou outros 46 imóveis. O advogado de Aref contesta as acusações. Segundo ele, o aumento do patrimônio é fruto de investimentos imobiliários iniciados na década de 1960.
img.jpg
“Estamos diante do maior escândalo já visto
dentro da máquina pública paulista”
Segundo apurações do MP, Aref não está sozinho nessa grande teia de corrupção. Os promotores do caso querem ouvir nos próximos dias o secretário especial de Controle Urbano da prefeitura, Orlando de Almeida Filho, antigo chefe de Aref, que aparece nas denúncias como possível beneficiário do esquema. Orlando é corretor de imóveis, ex-presidente do Creci (Conselho dos Corretores de Imóveis) e ex-conselheiro do Secovi, sindicato do setor imobiliário em São Paulo. Em 2005, José Serra o nomeou secretário de Habitação e ele passou a chefiar Aref. Para os procuradores, Orlando de Almeida tinha conhecimento das irregularidades nos processos de anistias. No período em que Orlando comandou a secretaria (2005-2008), surgiram denúncias que envolviam a família do governador Geraldo Alckmin (PSDB). A querela tratava da regularização do prédio da Wall Street Empreendimentos, empresa do cunhado de Alckmin, Adhemar Ribeiro. O prédio foi construído em 1975, mas passou por uma ampliação na metade da década de 1990. Para efetuar a ampliação da área, a empresa deveria ter pago títulos de outorga onerosa, um recurso que possibilita ao proprietário do imóvel o pagamento para erguer edificações acima do permitido pela lei de zoneamento. As denúncias acusavam a empresa do cunhado de Alckmin de forjar o pagamento de taxas, já que a Wall Stret alterou o tamanho do prédio no carnê do IPTU, com o objetivo de diminuir o cálculo das tarifas. A firma foi acusada de deixar de pagar R$ 4 milhões em taxas relativas ao edifício. O Sistema de Processos da Prefeitura mostra que o documento no qual consta a “irregularidade grave” no pedido de regularização do prédio da Wall Street feito em 1994 foi enviado para o gabinete do secretário de Habitação no dia 29 de setembro de 2005. À época, o titular da pasta era Orlando de Almeida, que nada fez.  

Menos segredo, mais democracia



Depois de 30 anos, a Comissão da Verdade é instalada na mesma 

semana da entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação. As 

iniciativas representam o amadurecimento da democracia no País

Izabelle Torres e Octávio Costa
chamada.jpg
MOMENTO HISTÓRICO 
A instalação da Comissão da Verdade no Palácio do Planalto reuniu a presidenta 
Dilma Rousseff e os quatro antecessores, Fernando Collor, José Sarney,
Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva
Às 11h46 da quarta-feira 16, o locutor oficial do Palácio do Planalto anunciou: “Está instalada a Comissão da Verdade.” A plateia que ocupava o Salão Nobre, repleta de familiares de vítimas da ditadura militar, aplaudiu com entusiasmo, certa de que estava vivendo um momento histórico. De volta à plenitude democrática, o País finalmente poderá passar a limpo os episódios tristes e cinzentos dos anos de chumbo. Emocionada com a criação do órgão que vai apurar os horrores da repressão, a presidenta Dilma Rousseff, ladeada por quatro ex-presidentes da República, fez questão de ressaltar que no mesmo dia entrava em vigor a Lei de Acesso à Informação, que obriga órgãos públicos a fornecer dados requeridos por qualquer cidadão. A nova lei e a Comissão da Verdade não nasceram juntas por mera coincidência. São frutos, como lembrou a própria Dilma, de um longo processo da democracia, de quase três décadas. “Não posso deixar de declarar meu orgulho por coincidir com o meu governo o amadurecimento da nossa trajetória democrática. Por meio dela, o Estado brasileiro se abre, mais amplamente, ao exame, à fiscalização e ao escrutínio da sociedade”, afirmou a presidenta.
img3.jpg
Não faltou emoção durante a solenidade de posse dos sete integrantes da Comissão. Dilma fez um discurso bastante cuidadoso, referindo-se à participação de seus antecessores na consolidação do Estado de Direito, lembrando até dos falecidos Itamar Franco e Tancredo Neves. Sem mencionar expressamente a Lei da Anistia, enalteceu quem lutou contra a ditadura, mas disse que reconhece e valoriza os pactos políticos que levaram à redemocratização. A ex-guerrilheira da VAR-Palmares, hoje no comando do País, chorou ao lembrar a dor das famílias que nunca puderam enterrar seus mortos. “Merecem a verdade factual aqueles que perderam amigos e parentes e continuam sofrendo como se eles morressem de novo e sempre a cada dia”, afirmou a presidenta, com a voz embargada. Foi interrompida por aplausos e completou: “É como se disséssemos que, se existem filhos sem pais, se existem pais sem túmulo e se existem túmulos sem corpos, nunca, nunca mesmo, pode existir uma história sem voz.” Novamente a plateia irrompeu em aplausos. A exceção foram os comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha que ficaram em silêncio e estáticos.

Com seu discurso, a presidenta deixou claro qual será o foco da Comissão da Verdade: jogar luz sobre o destino dos desaparecidos, para que as famílias possam reverenciar seus mortos. Sua mensagem foi discutida na primeira reunião da comissão e enterrou de uma vez por todas as discussões sobre a possibilidade de investigar também excessos cometidos por quem lutou contra a ditadura. No fim da tarde da quarta-feira 16, os sete integrantes já tinham em mente algumas das principais metas e começaram a pensar numa agenda de prioridades com base no recado de Dilma, que lhes foi transmitido discretamente pela ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. “Não existem relatos do Estado procurando por militares desaparecidos ou vitimados pelos ativistas. Existem, sim, vítimas e parentes de brasileiros em busca de informações sobre seus familiares. E esse deve ser nosso foco”, opinou a psicanalista Maria Rita Kehl, uma das integrantes mais engajadas. A Comissão sabe que terá de lidar com a expectativa de centenas de familiares em busca de respostas e com o desejo anunciado de que o relatório sirva de instrumento para pedidos de reparações judiciais no Brasil e nas Cortes internacionais. “Acho que é cedo para comentar sobre o direito das famílias, porque ainda não temos subsídios e fatos apurados. Mas é um direito legítimo”, diz o ex-procurador Cláudio Fonteles.
img.jpg
“A PALAVRA VERDADE É ALGO TÃO 
SURPREENDENTEMENTE FORTE QUE NÃO 
ABRIGA NEM O RESSENTIMENTO,
NEM O ÓDIO, NEM TAMPOUCO O PERDÃO”
Dilma Rousseff, presidenta
Diante de um País ansioso por informações até hoje mantidas em absoluto sigilo, existe o risco de excessiva exposição individual dos sete membros da comissão. Ao definir o rodízio de coordenadores durante os próximos dois anos, o grupo mostrou preocupação com a convivência durante os trabalhos. “Perguntaram a um dos integrantes da comissão da verdade na África do Sul o que tinha sido mais difícil e ele disse que foi conviver com os outros 16 membros. É com isso que temos de tomar cuidado”, disse o advogado e escritor pernambucano José Paulo Cavalcanti. Para ele, o ideal é falar pouco e apurar bem os fatos. “Nós temos que saber que nosso trabalho precisa dar certo”, completa, destacando a responsabilidade de grupo. Por enquanto, está definido que nos primeiros meses o grupo será coordenado pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça, Gilson Dipp.

O compromisso da Comissão em apresentar resultados concretos animou os familiares de vítimas da ditadura, que há décadas sofrem sem informação sobre seus parentes mortos pela repressão, principalmente por conta do sigilo de documentos. Com a Lei de Acesso à Informação, esses entraves aos direitos dos cidadãos deixarão de existir. “Nunca mais os dados relativos a violações de direitos humanos poderão ser reservados, secretos ou ultrassecretos”, garantiu Dilma. A nova legislação obriga os órgãos do governo federal e empresas de economia mista a ter um Serviço de Atendimento ao Cidadão (SIC) em suas páginas de internet e uma sala para receber pedidos de informação de brasileiros sem acesso a computadores. Informações sobre contratos e licitações dos órgãos públicos devem ser fornecidas em linguagem simples e a negativa de divulgá-las implicará sanções contra os funcionários.
img1.jpg
FARDA SILENTE
Enquanto a plateia aplaudia o discurso da presidenta Dilma Rousseff, 
os comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha permaneciam em silêncio
A regra já começou a surtir efeitos. Na tarde da quarta-feira 16, o Banco Central anunciou que vai dar total transparência às reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), com a divulgação dos votos de cada diretor. É do Copom que saem as decisões sobre as taxas de juros. Até hoje, a posição dos diretores era mantida em segredo. Os pedidos de informações e a pressão pelo cumprimento da nova lei também mudaram a rotina do Legislativo e do Judiciário. Ambos os Poderes ainda estão analisando como vão se adequar ao novo contexto. A expectativa é de que em um mês eles divulguem as regras com os prazos para recursos contra pedidos de informações não atendidos. “Todas as medidas estão sendo tomadas para o cumprimento da nova lei. Há disposição dos órgãos, mas alguns, como o Ministério da Justiça, sofrem com alguns problemas operacionais devido à quantidade de instituições subordinadas. Mas a lei vem para ficar e creio que em breve estaremos operando com tranquilidade”, disse à ISTOÉ o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. 

De acordo com os órgãos de controle, apenas 30% das instituições estão realmente preparadas para fornecer informações com facilidade aos cidadãos. O grande gargalo está nos Estados. Em alguns deles sequer os documentos foram digitalizados e as páginas de internet operam de forma precária. Nesses casos, somente a pressão da sociedade poderá forçar o Poder Público a cumprir a lei. Apesar da dificuldade operacional dos órgãos e da lentidão dos Estados de disponibilizar as informações, especialistas e autoridades comemoram os avanços. “Este é o início de uma revolução no relacionamento das instituições com os cidadãos. Os problemas serão resolvidos um a um”, avalia Jorge Hage, ministro-chefe da Controladoria-Geral da União. “Direitos começam a ser respeitados no Brasil. Tanto o de conhecer os segredos dos tempos de ditadura quanto o de ter acesso a informações públicas”, diz o cientista político da Universidade de Brasília (UnB), David Fleischer. Está, portanto, inaugurada uma nova fase da democracia no Brasil: mais transparente e aberta aos cidadãos.  
img2.jpg
VELHA AMIGA
Rosa Maria defendeu Dilma durante a ditadura.
Agora, integrará a Comissão da Verdade

Muito barulho por nada



Sessões da CPI do Cachoeira são marcadas por bate-bocas 

acalorados, mas um acordo entre os partidos não deixa que as 

investigações sobre as relações do bicheiro com políticos e 

empresários avancem de verdade

Izabelle Torres
chamada.jpg
NO RINGUE 
Os senadores Fernando Collor e Pedro Taques 
protagonizaram o primeiro bate-boca da CPI
Criada para investigar as relações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com políticos e empresários, a CPI do Cachoeira até agora pouco avançou. Na primeira semana de depoimentos, os debates foram dominados pela troca de acusações entre integrantes da Polícia Federal e a Procuradoria da República. Já a aguardada audiência de Cachoeira, inicialmente marcada para a terça-feira 15, foi adiada por causa de uma liminar acolhida pelo ministro do STF, Celso de Mello. Na quarta-feira 16, parlamentares de governo e oposição costuraram um conveniente acordão para postergar ao máximo o depoimento de governadores do PSDB, PT e PMDB citados no inquérito da Operação Monte Carlo, restringindo o foco das investigações a personagens menores do esquema. “Só chamaram os bagrinhos. Os importantes mesmo estão de fora”, criticou a senadora Kátia Abreu (PSD-TO). Também mandaram direto para o arquivo os pedidos de quebra de sigilo das contas da Delta em todo o País, com exceção da região Centro-Oeste. A decisão livra os tucanos de sofrer constrangimentos em São Paulo e os peemedebistas no Rio de Janeiro. “Não há chance de a CPI avançar. Não vejo interesse nos partidos”, reconhece o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE). Enquanto a apuração engatinha e não há demonstrações contundentes de que o esquema de Cachoeira será investigado a fundo no Congresso, os parlamentares aproveitam os holofotes proporcionados pela CPI para produzir barulho. Apenas barulho. 

Desde o início dos trabalhos, no fim de abril, as discussões entre parlamentares são uma constante e os bate-bocas se transformaram num espetáculo à parte. Os integrantes da CPI divergem sobre tudo e começam a transformar o ambiente de trabalho em um ringue repleto de acusações e xingamentos. A reunião secreta que ouviu o delegado Matheus Mella, responsável pela Operação Las Vegas, foi um exemplo da beligerância. Durante o depoimento, pelo menos três discussões acirradas aconteceram a portas fechadas. A mais áspera envolveu o deputado Ônyx Lorenzoni (DEM-RS) e o senador Humberto Costa (PT-PE). Ao descobrir que os advogados de defesa dos acusados assistiam ao depoimento, o deputado do DEM reclamou: “Precisamos ter mais ordem aqui. Isso, daqui a pouco, vai virar um circo”, disse. Na penúltima fileira, o senador petista respondeu que o deputado já era um palhaço de circo. Ônyx levantou-se e gritou com o dedo em riste: “O senhor é um sanguessuga!”, numa referência ao escândalo nas compras de hemoderivados, quando Costa era ministro da Saúde. De acordo com relatos dos políticos que participavam da sessão secreta, o delegado ficou constrangido com o bate-boca e o clima cordial demorou a ser restabelecido.
img.jpg
Na semana inaugural dos trabalhos, o senador Fernando Collor (PTB-AL) protagonizou o primeiro bate-boca entre integrantes da CPI. Decidido a defender o sigilo dos documentos sobre as relações de Cachoeira, o senador reclamou que deputados vazavam informações. Foi interrompido pelo senador Pedro Taques (PDT-MT): “Estamos aqui numa brincadeira da carochinha! O inquérito inteiro está na internet. Nenhum parlamentar pode ser responsabilizado por vazamento. Falar em sigilo é hipocrisia.” Collor ficou vermelho, franziu a testa e impostou a voz: “Não há uma posição hipócrita, nem safada, de quem quer que seja aqui! Hipócritas são aqueles que fornecem informações por debaixo dos panos para alguns confrades e fazem uso dessas informações como lhes convier!” 

As divergências entre os integrantes da CPI também têm por trás brigas paroquiais dos Estados. Inimigos em Campina Grande (PB), os senadores Vital do Rego (PMDB-PB) e Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) estão se controlando para a temperatura não subir. Esforço que tem dado certo na frente dos holofotes, mas que não resiste aos ânimos exaltados nas reuniões sigilosas. Foi assim durante o depoimento do delegado Raul Alexandre Sousa na terça-feira 8. Cunha Lima também provocou o relator Odair Cunha (PT-SP), ao ressaltar que as decisões do colegiado eram um retrato do jogo político que o PT pretende fazer. Transtornado com a iminente convocação do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), o senador da Paraíba não poupou críticas ao relator, a quem acusa de manipular o andamento das investigações. A convocação de Perillo também foi motivo de um bate-boca público entre o senador Randolfe Rodrigues (Psol-AP) e o deputado Silvio Costa (PTB-PE).

Com tantos parlamentares e partidos constrangidos com as investigações do esquema comandado pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira, é natural que os ânimos estejam exaltados. O problema é se esses bate-bocas se transformarem numa grande cortina de fumaça destinada a mascarar a ausência de investigação. Um sms enviado pelo deputado petista Cândido Vaccarezza (SP) ao governador do Rio, Sérgio Cabral, ilustra bem o clima de acordão reinante na Comissão. “A relação com o PMDB vai azedar na CPI. Mas não se preocupe. Você é nosso e nós somos teu”. Com tanta discussão, pouco consenso e falta de empenho para apurar o alcance das relações de Cachoeira com políticos e empresários, a CPI corre o risco de perder o foco. 

Escravidão sem fim



Enquanto os deputados se recusam a votar a lei que pune o 

trabalho escravo, novos casos de abuso se repetem no País. O 

último envolve a rede Gregory de moda feminina

Natália Martino
chamada.jpg
FLAGRA
Fiscais fecham uma das oficinas terceirizadas da 
Gregory: situação de trabalho degradante
Na semana passada, a Câmara dos Deputados mostrou que sua sintonia com a sociedade não está bem afinada. Pela segunda vez em menos de 15 dias, parlamentares de todas as matizes políticas adiaram a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438, já aprovada pelo Senado. Trata-se da lei que prevê a expropriação de imóveis rurais e urbanos, cujos donos sejam flagrados usando trabalho escravo. Para procurar justificar os seguidos adiamentos, líderes de vários partidos dizem que a dificuldade está em definir o que é trabalho escravo. Um discurso que não encontra respaldo na realidade. O Ministério do Trabalho e Emprego tem regras muito claras que determinam como deve ser a relação entre empregadores e empregados. Ao fugirem do tema, os deputados parecem ignorar que, em pleno século XXI, ainda existe no Brasil situação de escravidão. E não são apenas casos isolados nos rincões do País. As fiscalizações do Ministério têm encontrado esse tipo de prática em grandes centros urbanos e a serviço de fortes grupos econômicos. Este mês, os fiscais encontraram 12 trabalhadores submetidos a condições semelhantes às da escravidão em São Paulo e em Itaquaquecetuba, no interior paulista. São bolivianos que produziam peças para a marca de roupas femininas Gregory, presente nos principais shopping centers do País.
img1.jpg
GRIFE
Roupas da rede feminina espalhadas pelo barracão: R$ 3 por peça
De acordo com o relatório da fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo (SRTE-SP), os 12 trabalhadores bolivianos eram mantidos em condições precárias de segurança e saúde, com ausência de pagamento justo e cerceamento de liberdade. Sem a aprovação da PEC, os responsáveis por casos como esse estão sujeitos ao pagamento de verbas trabalhistas e indenizações. Na esfera criminal, a pena é de dois a oito anos de prisão, o que em geral é substituído por doação de cesta básica ou prestação de serviço comunitário. A fiscalização que flagrou a Gregory se deparou, em barracões precários, com situações como a de uma imigrante amamentando seu filho de um mês e meio enquanto trabalhava. Em uma das oficinas, o armário de alimentos ficava trancado. Em outra, os trabalhadores precisavam de autorização para sair, que nem sempre era concedida. Em todos os casos, iluminação precária, cadeiras improvisadas e jornadas de trabalho de 12 horas.

De acordo com Andrea Duca, diretora de marketing da rede fundada em 1981, que possui 80 lojas em 21 Estados brasileiros, a empresa não tinha conhecimento prévio sobre a situação e não possui o controle sobre o que acontece dentro das oficinas dos seus fornecedores, que são terceirizadas. “A fiscalização fez uma associação indevida do nosso nome ao problema”, afirma. O relatório, porém, é incisivo ao afirmar que a empresa “é inteiramente responsável pela situação encontrada”. De acordo com o documento, as notas fiscais das oficinas eram emitidas em nome de um CNPJ artificial como estratégia para eximir a Gregory de responsabilidades pela forma como a produção era conduzida. Essa não é a primeira vez que a grife se vê envolvida em denúncias. Em 2011, durante investigação que flagrou trabalho escravo a serviço da Zara, também foram encontradas etiquetas da Gregory nas oficinas fechadas pela fiscalização.
img.jpg
AÇÃO 
Artistas e líderes de movimentos sociais entregam manifesto 
em Brasília a favor da PEC do trabalho escravo
“A empresa define o que vai ser produzido e o preço que vai pagar: apenas R$ 3 por peça, a ser dividido entre os donos das oficinas e os trabalhadores. É ela que efetivamente lucra com a exploração, não os intermediários”, diz Luis Alexandre de Faria, auditor da SRTE-SP. Os fiscais agora aguardam que a Gregory assine um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para regularizar o trabalho dos seus fornecedores. A rede assegura que resolverá o problema com o fim das compras de material de fornecedores que terceirizam o trabalho. 

Os trabalhadores resgatados já receberam as verbas trabalhistas devidas, quase R$ 55 mil, mas ainda resta a incerteza sobre o futuro. “O Brasil tem que avançar muito no pós-resgate. Se a si­tuação de vulnerabilidade não acaba, o trabalhador é aliciado de novo”, diz Luiz Machado, coordenador do projeto de combate ao trabalho forçado no Brasil da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Temos que lembrar que o fato de a vida dessas pessoas ser precária não é argumento para que o trabalho seja uma continuidade dessa condição”, afirma Leonardo Sakamoto, coordenador-geral da Repórter Brasil, ONG que atua no combate ao trabalho escravo. 

Das áreas rurais, onde as denúncias costumam envolver tortura física e falta de acesso a água potável, vem as maiores críticas em relação à PEC. O adiamento da votação é encabeçado pela bancada ruralista no Legislativo. De acordo com o deputado Moreira Mendes (PSD- RO), um dos integrantes dessa bancada, falta uma definição do que é escravidão. “As denúncias costumam ser um exagero absoluto”, afirma o deputado. Atualmente, os fiscais seguem as normas do Ministério do Trabalho e Emprego e o artigo 149 do Código Penal, que criminaliza o cerceamento de liberdade, trabalho degradante e as jornadas exaustivas. “Trabalho escravo é aquele que coisifica a pessoa e tira dela a dignidade. Não é irregularidade trabalhista, é afronta aos direitos humanos”, diz Luiz Camargo, procurador-geral do trabalho. Foram esses argumentos que tomaram conta da Câmara dos Deputados no dia 8 de maio, quando a PEC deveria ser votada. A data havia sido escolhida por se tratar da semana de 13 de maio, data em que a Lei Áurea foi assinada há mais de um século. A PEC seria uma nova abolição da escravatura no Brasil. Mas não foi desta vez. Agora os deputados afirmam que voltarão a falar sobre o assunto na terça-feira 22.
img2.jpg

Negócio da china em Barueri



Ministério Público acusa o ex-prefeito e atual deputado Gil 

Arantes de superfaturar desapropriações para favorecer 

empresa de seu procurador

Pedro Marcondes de Moura


img.jpg
Na última década a desapropriação de terrenos em Barueri, na Região Metropolitana de São Paulo, foi sinônimo de negócios da China para aqueles que estivessem próximos ao poder local. No município, de 240 mil habitantes e conhecido por abrigar grandes condomínios de luxo, ter um imóvel desapropriado pela prefeitura era um privilégio digno de inveja a especuladores experientes do mercado. O preço do imóvel pago pela prefeitura chegou a variar mais de 400% em 18 meses. Tanta lucratividade chamou a atenção do Ministério Público, que há cinco anos investiga essa indústria da desapropriação. Os dois principais protagonistas desse enredo, segundo o MP, são o ex-prefeito e atual deputado estadual (DEM), Gilberto Macedo Gil Arantes, e a empresa Conspar Empreendimentos e Participações. Em junho de 2002, por exemplo, a companhia comprou onze terrenos na cidade, entre eles o que hoje funciona o serviço Ganha Tempo, por R$ 2,7 milhões. Em janeiro de 2004, o então prefeito Gil Arantes os desapropriou. A prefeitura pagou R$ 12 milhões pelas áreas, R$ 4 milhões em outubro de 2004 e R$ 8 milhões em janeiro de 2005. Uma valorização de 444% em um ano e meio.

Um outro caso de máxima valorizacão em tempo mínimo é alvo de uma ação civil pública, na qual o MP pede que o ex-prefeito seja condenado a ressarcir os cofres públicos. O processo mostra que em janeiro de 2002, Arantes ordenou em caráter de urgência a desapropriação de 13,8 mil metros quadrados de uma área total de 151 mil metros quadrados pertencentes à Conspar por R$ 952 mil. O valor equivale a R$ 68,95 por metro quadrado. A Conspar tinha adquirido o terreno 11 meses antes, desembolsando R$ 31,85 por metro quadrado. Ou seja, a área mais do que dobrou de valor em menos de um ano. Além da supervalorização os promotores estranharam a pressa da Prefeitura. Ao contrário do alegado no decreto de desapropriação, não havia projeto da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo previsto para aquela área. “Na condição de prefeito, Gil Arantes violou os deveres de honestidade, imparcialidade e legalidade”, escreveu o promotor Marcos Mendes Lyra.
img1.jpg
COINCIDÊNCIAS 
Ricardo Arantes, filho do ex-prefeito, é nomeado procurador da Conspar, 
empresa favorecida em desapropriações como a da área do 
Ganha Tempo (doc. abaixo) O ex-prefeito nomeia o dono da Conspar,
Eufrásio Domingues,como representante de sua empresa (doc. abaixo)
img2.jpg
Na quarta-feira 16, por meio de seu advogado, o ex-prefeito afirmou que os valores pagos pela Prefeitura foram os de mercado. “Não existe nenhum relacionamento entre Gil Arantes e seus familiares com a empresa Conspar e seu(s) proprietário(s)”, afirmou o advogado de ex-prefeito à ISTOÉ. Não é isso o que mostra os documentos a que a reportagem teve acesso e que já estão em poder do MP. Um desses documentos é uma procuração pública feita em 23 de abril de 2002, no Cartório do Registro Civil de Jandira. Nela, a Rinaan Empreendimentos e Participações Ltda, empresa do ex-prefeito, nomeia como seu procurador o empresário Eufrásio Humberto Domingues, sócio da Conspar. Em outro documento, também registrado no Cartório de Jandira, só que em 11 de maio de 2005, a Conspar nomeia Ricardo Macedo Arantes, filho do ex-prefeito, como seu procurador. “Gil Arantes e Eufrásio Humberto Domingues mantinham estreitas relações de amizade”, registrou o promotor Mendes Lyra. “A desapropriação foi praticada com desvio de finalidade, visando a favorecer a Conspar, representada por Eufrásio.”

Gil Arantes governou Barueri de1997 a 2004. Elegeu-se deputado estadual em 2006 e foi reeleito em 2010. Seu projeto político imediato é voltar à prefeitura. O problema é que ele terá muito a explicar. Segundo dados da ONG Transparência Brasil, Gil Arantes faz parte da lista dos parlamentares da Assembleia Legislativa de São Paulo que mais respondem ou responderam a processos na Justiça ou no Tribunal de Contas do Estado. Contabiliza nada menos do que 18 deles.

http://www.istoe.com.br/reportagens/207253_NEGOCIO+DA+CHINA+EM+BARUERI

Patrões da mídia acuaram CPI por dois lados



Patrões da mídia acuaram CPI por dois ladosFoto: Montagem/247

JOÃO ROBERTO MARINHO, DAS ORGANIZAÇÕES GLOBO, E FÁBIO BARBOSA, TITULAR DO GRUPO ABRIL, ENTRARAM EM CAMPO PARA IMPEDIR CONVOCAÇÃO DO JORNALISTA POLICARPO JUNIOR E DO EMPRESÁRIO ROBERTO CIVITA PELA CPI DO CACHOEIRA; O PRIMEIRO MARCOU DURO O PMDB; O SEGUNDO PROCUROU JOSÉ DIRCEU

18 de Maio de 2012 às 18:07
247 – Foi o chamado ataque em pinça. Numa ponta, um dos principais empresários de mídia do País, João Roberto Marinho, herdeiro das Organizações Globo. Na outra, o baqueiro chamado a comandar o Grupo Abril, Fábio Barbosa. A cada um deles, uma parte da missão que buscava o mesmo fim: evitar, a qualquer custo, a convocação à CPI do Cachoeira do jornalista Policarpo Junior, redator-chefe da revista Veja. Ele é suspeito de ligações extravagantes com o contraventor Carlinhos Cachoeira, sua fonte de informação durante cerca de 20 anos. Mais ainda, coube aos dois patrões eliminar o mínimo vestígio de possibilidade de chamamento oficial, pela mesma CPI, do empresário Roberto Civita para depor. A eventual ida de Policarpo à sessão da Comissão passou a ser vista, pelo patronato, como um precedente perigoso para o futuro. Mas ver Civita sendo inquirido seria interpretado como uma verdadeira humilhação para toda a classe.
Como se viu pela lista convocados a depor na CPI, aprovada na reunião da quinta 17 depois de muitas divergências, a estratégia patronal deu super certo. Nem Policarpo, e muito menos Civita, constam do rol de suspeitos, testumunhas ou simples depoentes. Para esse desfecho, porém, osdois movimentos foram cruciais.
Dias atrás, João Roberto tomou o jatinho da Globo para desembarcar em Brasília à fim de participar de um jantar marcado a seu pedido. Diante dele se postaram os principais líderes do PMDB nacional, a exceção do presidente do Senado, José Sarney, em período de convalescência médica. O recado foi dado de forma direta: seria inaceitável, pela Globo, a convocação de Policarpo. A de Civita, inimaginável. O filho do Dr. Roberto argumentou, sem fazer questão de ser afável, que estaria aberta uma perigosa porta para a dissecação das relações da mídia com todo o mundo político, e não apenas entre Policarpo e Cachoeira. Ficou claro que a diretriz de barrar o chamado a Policarpo deveria ser seguida à risca, pela unanimidade dos integrantes do partido na CPI, sob pena de os dissidentes serem tomados como adversários da Globo.
Após a verdadeira enquadrada do líder da Globo sobre o partido, chegou a vez de Fabio Barbosa, presidente do Grupo Abril, fazer um tête-à-tête com ninguém menos que o ex-secretário nacional do PT, José Dirceu, reconhecido como a maior liderança individual da agremiação depois do ex-presidente Lula. O papo, sem testemunhas, resultou na versão de ter sido  bastante ameno, mas com Barbosa deixando claro que a Abril e seu carro-chefe, a revista Veja, não esqueceriam jamais dos parlamentares que, agora, ignorassem aquele apelo.
Os resultados dos dois movimentos coordenados foram exatamente os buscados pelos patrões que entraram forte no braço-de-ferro com os partidos. Na sessão da quinta 17, o senador Fernando Collor ficou praticamente sozinho, sem ouvir um eco em seu apoio sequer, no requerimento que fizera pelo resgate da gravação do depoimento de Policarpo na CPI dos Bingos, no qual o jornalista professou a idoneidade de Carlinhos Cachoeira. Nem PMDB nem PT apareceram para lhe dar respaldo – e a mágica da evaporação política que João Roberto e Fabio Barbosa queriam, plim! plim!, aconteceu.

Hora da freada de arrumação na CPMI de Cachoeira



Autor: 
 
A CPMI fez bem em não convocar Policarpo Jr para depor. E a sessão de ontem deveria servir de lição para os próximos passos.
Nos últimos anos a perda de legitimidade da velha mídia – encabeçada pela Veja – se deveu à sua arrogância e absoluto desprezo pelas instituições e pelos preceitos legais. Foi isso que a levou à aliança com o crime organizado, à disseminação da intolerância, aos ataques desmedidos à reputação de quem atravessasse seu caminho. E são esses procedimentos que estão na raiz do profundo processo de descrédito que atinge a revista.
O que de pior poderia acontecer para todos os que querem uma mídia limpa seria a repetição dos mesmos métodos pela CPMI. Só faltava, a esta altura do campeonato, atitudes que possam ser utilizadas para vitimizar a revista ou legitimar seu álibi de que defende o país contra manobras autoritárias da esquerda.
Em que pese o clima passional e de acerto de contas que cerca toda CPMI, não se pode fugir das boas técnicas de investigação nem recorrer a qualquer método que possa ser utilizado para comprometer a credibilidade das investigações.
Por exemplo, há suspeitas fundadas de que a revista participava de um conluio criminoso com Carlinhos Cachoeira. Se há suspeitas, mesmo baseadas em indícios veementes, investigue-se antes. E existem todas as condições na própria análise do material a ser fornecido pela Polícia Federal – as 47 gravações de conversas diretas de Cachoeira e Policarpo e as infindáveis de Policarpo com outros membros da quadrilha.
Ouvidas as conversas, haverá um trabalho de relacioná-las com matérias da própria revista e com os ganhos diretos e indiretos das duas organizões: Cachoeira e Abril. Não há lógica em produzir um escândalo por dia, mas a necessidade de construir diligentemente todas as amarras que comprovem os procedimentos criminosos da revista.
Deve-se escutar, analisar e divulgar, sem pressa, sem arrogância. Se, de fato, mostrarem provas contundentes de envolvimento criminoso, que se convoque Policarpo e Roberto Civita. Mas sem colocar o carro antes dos bois. E por dois motivos: para impedir que o sentimento de vingança se sobreponha ao da justiça; e para ouvir Policarpo apenas quando se dispuser de elementos consistentes para um bom interrogatório.
Quando o senador Pedro Taques passa a engrossar a tal Bancada da Veja há alguma coisa de errado – e não propriamente com ele. Miro Teixeira e Álvaro Dias dependem umbilicalmente da aliança com a mídia para sua própria sobrevivência. Taques tem uma biografia impecável e é fundamentalmente um legalista.
A CPMI deveria amainar o espírito de vingança e ensinar à própria Veja como utilizar técnicas de investigação correta e consistentes, com direito ao contraditório e sem ceder ao clamor das ruas.
A punição de Veja ocorrerá seguindo todos os procedimentos legais e analisando-se seu papel com um senso de justiça que sempre faltou à ela própria. Baixe-se a fervura e que os parlamentares comportem-se com a dignidade que sempre faltou à revista.

Justiça manda fazer busca no gabinete de Eduardo Paes prefeito do Rio



Reprodução da Folha online
Reprodução da Folha online


No dia 8 de março os jornais do Rio de Janeiro noticiaram e enalteceram o acordo feito pelo prefeito Eduardo Paes para construir o campo de golfe das Olimpíadas de 2016. Paes encheu o peito pra dizer que o campo de golfe teria custo zero para a prefeitura. Eu aqui no blog imediatamente denunciei que aquilo que a imprensa vinha destacando, na verdade escondia uma negociata milionária como podem conferir abaixo.


Reprodução do Blog do Garotinho (Clique na imagem para ampliar)
Reprodução do Blog do Garotinho (Clique na imagem para ampliar)


A tacada de Paes vai resultar num faturamento adicional para a construtora de no mínimo R$ 300 milhões. E quem cuidou da mudança do gabarito para 22 andares numa área onde os prédios pela legislação municipal só podiam ter 6 andares foi o secretário de Urbanismo de Eduardo Paes, aquele da Gangue dos Guardanapos, Sérgio Dias, vizinho de Cabral, em Mangaratiba. Olha ele aí de novo. É claro que a mudança contou com a conivência da maioria dos vereadores do Rio de Janeiro que só fazem o que Paes manda.

No ritmo que as coisas vão no Rio de Janeiro, com as negociatas milionárias que se sucedem, até as Olimpíadas de 2016, a elite da cidade terá certamente na lista dos mais ricos vários integrantes da turma de Cabral e da Gangue dos Guardanapos. Mas vejam abaixo a continuação da matéria da Folha online.


Reprodução da Folha online
Reprodução da Folha online

Lâmpada ou lanterna?





Por Mino Carta


Lâmpada ou lanterna?


Roberto Civita é dotado exclusivamente de certezas. Talvez se deva ao QI. Há 52 anos, em um dia de abril ou maio, vinha ao lado dele pela calçada de uma rua central de São Paulo a caminho da Editora Abril, onde eu aportara pouco antes, e eis que pergunta qual seria meu quociente de inteligência. Declaro ignorar, de fato nunca me submeti a exames psicotécnicos. Sorriso cesáreo, pronuncia um número e esclarece: “É o meu”. “Satisfatório, imagino”, comento. Mais que isso, premia um ser humano a cada 25 milhões de semelhantes. O Brasil tinha então 70 milhões de habitantes, donde deduzo: “Só pode haver mais dois iguais a você”. “Pode – admite, plácido –, mas a estatística inclui todos os terráqueos, de sorte que eu poderia ser o único.”


Roberto Civita tende mesmo a se considerar único, um Moisés chamado a conduzir a Abril à terra prometida. Pronto a pôr em prática, assim como o herói bíblico dividia as águas, as artes da mídia nativa, inventar, omitir, mentir. Tropeço entre atônito e perplexo na última edição da revista Veja, a qual impavidamente afirma, entre outras peremptórias certezas, a autoria da derrubada de Fernando Collor da Presidência da República em 1992. Comete assim, entre a invenção e a mentira, o enésimo lance clássico do jornalismo nativo ao contar um episódio tão significativo da história do País.


Um ex-diretor da Veja, Mario Sergio Conti, escreveu um livro, Notícias do Planalto, para sustentar que Collor foi eleito pelos jornalistas. Não sei se Conti é mais um dos profissionais que no Brasil chamam o patrão de colega. Claro está, de todo modo, que a mídia naquela circunstância executou a vontade dos seus barões, a contarem com a obediência pronta e imediata dos sabujos. E à eleição de Collor Veja ofereceu uma contribuição determinante não menos do que a das Organizações Globo. Agora gabam-se pelo dramático desfecho do governo interrompido e omitem que lhes coube a criação do monstro.


Os leitores recordam certamente a expressão “caçador de marajás”. Pois nasceu no berço esplêndido da TV Globo e foi desfraldada à exaustão pela capitânia da esquadra abriliana. Ocorre que o naufrágio collorido não foi obra desta ou daquela, e sim do motorista Eriberto, que prestava serviço entre o gabinete presidencial do Planalto, o escritório de PC Farias e a Casa da Dinda. Localizado pela sucursal de IstoÉ em Brasília ao cabo de uma exaustiva investigação, trouxe as provas que a CPI não havia produzido. É a verdade factual, oposta à versão da última edição de Veja.


Lembro aquele sábado de 1992 em que IstoÉ foi às bancas com as revelações decisivas, de sorte a obrigar os jornalões, a começar pelo O Globo, a reproduzir as informações veiculadas pela semanal que então eu dirigia. A entrevista de Pedro Collor a Veja, do abril anterior, não bastaria para condenar o irmão presidente, tanto que a CPI se encaminhava para o fracasso. Pedro, de resto, nada de novo dissera na entrevista, a não ser a referência a certos, surpreendentes supositórios de cocaína. No mais, repetira, um ano e meio depois, uma reportagem de capa de IstoÉ.


No fim de setembro de 1990, Bob Fernandes passou a acompanhar os movimentos de PC Farias por mais de um mês para desnudar, ao fim da tocaia, que o levou inclusive a hospedar-se no mesmo apart-hotel da eminência parda do governo, a culpa em cartório do presidente e seu preposto à corrupção. No dia do fechamento de IstoÉ, tarde de uma sexta-feira, fui visitado por um ex-colega, intermediário da tentativa de impedir a publicação. Veio ele melífluo, portador de um pedido partido de altos escalões (depois naquelas alturas identificaria a ministra Zélia, mais talhada para dançar bolero do que carregar a pasta da Economia), e eu prontamente apontei-lhe o caminho da rua. Nem por isso deixei de declinar a minha condição de empregado e admitir que meu patrão quem sabe pudesse ser seduzido com ouro, incenso e mirra. Não sei por que evoquei os magos na noite de Belém.


Logo, na prática, a sedução foi ensaiada em dólares, a bem da contemporaneidade, e Domingo Alzugaray, dono da Editora Três, recusou dignamente de 1 milhão a 5 milhões, até hoje ignoro o nível atingido pela derradeira oferta. Constatei depois, na costumeira troca de opiniões com meus botões, que os dólares teriam sido gastos inutilmente. A reportagem de capa caiu como pedra no pântano, não houve quem a repercutisse. Foi um daqueles momentos em que se recomenda o recurso à omissão.


Era cedo demais, teve de passar um ano e meio para que a mídia da casa-grande se convencesse de que o pedágio cobrado por Collor e PC era exorbitante. Apelou-se para o Pedro rebelde. Este episódio, desdobrado em pouco mais de dois anos de governo do “caçador de marajás”, é simbólico dos comportamentos dos nossos donos do poder, a partir da própria opção por Collor como anti-Lula. A tigrada em risco se dispõe a agarrar em fio desencapado.


O emblema é, porém, mais abrangente. Na sua patética edição desta semana Veja consegue demonstrar apenas que a lâmpada da capa é a enésima mentira. A série de textos pendurada no varal vejano estica-se na treva mais funda. Não se trata simplesmente de um manual de como o jornalismo pátrio atua, a inventar, omitir e mentir, mas também de mediocridade, parvoíce e ignorância. Em matéria, nos deparamos com uma obra-prima recheada por capítulos extraordinários na sua capacidade de suscitar tanto a hilaridade quanto o espanto.


Sem pretender hierarquizar na avaliação do ridículo e do grotesco, vale a afirmação de Veja que se apresenta como vítima do ataque conjunto da imprensa ligada aos setores radicais do PT e pela internet, entregue a robôs de militância petista. Programados pelos cientistas (aloprados?) do partido da presidenta e do ex-presidente? O Brasil, segundo a semanal da Abril, confunde-se com Rússia, Cuba e Venezuela, onde a liberdade de imprensa é violentamente cerceada, e com a China, de internet robotizada. Talvez a rapaziada de Veja tenha de racionar suas idas ao cinema para assistir à ficção científica estilo Matrix. Claríssima é, contudo, uma área que a Skuromatic não logra alcançar: a proposta de censura à internet, estampada com todas as letras por quem se apresenta como paladino da liberdade de expressão.


Passagem empolgante aquela em que Veja define Antonio Gramsci, notável pensador do século passado morto na cadeia fascista às vésperas da Segunda Guerra Mundial depois de 11 anos de cativeiro, autor de uma obra monumental intitulada Cadernos do Cárcere, que ele considerava como ensaio daquela a ser escrita em liberdade. A revista da Abril decreta: Gramsci é um terrorista vermelho, não menos que Lenin e Stalin. Pois é do conhecimento até do mundo mineral que Gramsci plantou as raízes da transformação do partidão italiano, enfim capaz de abjurar os dogmas marxista-leninistas e de se afastar do Kremlin para desaguar no eurocomunismo de Enrico Berlinguer, de pura, autêntica marca social-democrática. Permito-me propor à redação de Veja os nomes de um punhado de terroristas: Sócrates, Jesus Cristo, Montano, Lutero, Maquiavel, Pascal, Voltaire, Caravaggio, Daniel Defoe, Jonathan Swift, Garibaldi, Bolívar, Dostoievski, Espinoza. Há muitos outros, mas são estes que me ocorrem de chofre.


Não faltam, para fechar o círculo, as omissões. Por que não consta entre as façanhas vejanas a fantástica revelação das contas clandestinas no exterior de figurões variados do governo Lula, encabeçada por aquela do próprio presidente? E por que não se evoca a reportagem de sete anos atrás, sobre os dólares destinados a abastecer as burras petistas, chegados de Cuba em garrafas, com as mensagens dos náufragos? De rum, imaginariam vocês. Nada disso, de uísque. Nunca fica tão evidente, de limpidez ofuscante, que Veja é a revista do inventor da lâmpada Skuromatic.


Quando me demiti da direção da redação de Veja e de integrante do conselho editorial da Editora Abril, disse ao chairman of the board, Victor Civita: “Por nada deste mundo hoje trabalharia na Abril, entre outros motivos porque seu filho Roberto é um cretino”. O patrão retrucou, sem irritação evidente: “Não diga isso, diga ingênuo”. Dois dias antes, fevereiro de 1976, o filho me confessara, candidamente, que o então ministro da Justiça (Justiça?) Armando Falcão pedia a minha cabeça como condição do fim da censura e de um empréstimo de 50 milhões de dólares pela Caixa Econômica Federal.


É uma longa história, que já contei mais de uma vez. E eu me demiti, ao contrário do que escreveu Mario Sergio Conti, sabujo emérito, pronto a adotar a versão patronal, porque não queria um único, escasso centavo do inventor da lâmpada Skuromatic. Ou não seria lanterna, com a vantagem de ser carregada onde o usuário bem entenda?


P.S.: Não consigo entender por que Marco Antonio Barbosa, figura altamente confiável, não está entre os integrantes da Comissão da Verdade, alguns altamente inconfiáveis.