domingo, 21 de outubro de 2012

"Se o CPC ficar do jeito que está, é melhor não sair"


Sem mudança



No Brasil, a excessiva judicialização dos conflitos vem da omissão do Legislativo. “Os deputados e senadores estão mais interessados em Comissão Parlamentar de Inquérito”, na avaliação da processualista Ada Pellegrini Grinover. Em entrevista à revista Consultor Jurídico, a professora da Faculdade de Direito da USP nascida na Itália não só relembrou a infância como comparou o Judiciário brasileiro ao de países europeus. Segundo ela, a Administração Pública na França, por exemplo, mesmo sem ter a palavra final, resolve as questões de sua competência, satisfatoriamente. No Brasil, “a Administração se omite, o Legislativo não decide e tudo vai parar no Judiciário”.

O cidadão é obrigado a procurar a Justiça, segundo Ada, pela omissão legislativa e pelos vários projetos de lei que esperam vez no Congresso Nacional — isso deixa "temas polêmicos no Brasil", como união homoafetiva e os limites do controle de políticas públicas, nas mãos de juízes, desembargadores e ministros.

Autora do livro Teoria Geral do Processo, referência nos cursos de Direito, Ada criticou o projeto do novo Código Civil que, para ela, se resume ao aperfeiçoamento do Código de 1973. Poucas questões estão classificadas por ela no grupo de melhorias, a maioria, como a Ação Declaratória Incidental, a Reconvenção, e os Embargos Infringentes, são questões que “ainda não estão boas”. Para ela, se o Código permanecer do jeito que está, “é melhor que não saia”.

Durante a entrevista, foi possível conhecer um pouco da vida da processualista: as fotos de família estão em porta-retratos espalhados pelos móveis e os livros, alinhados na prateleira, ocupam uma grande parede da sala de sua casa. Uma estátua japonesa separa o cômodo em dois ambientes. Na mesa de centro, duas garruchas, um revólver e adagas — lembranças que trouxe da Itália.

Após duas horas de conversa e seis cigarros, Ada se despediu e voltou para os livros, alunos, e aulas. “Eu nunca trabalhei tanto como depois que fui aposentada compulsoriamente. Aliás, ninguém deveria ser aposentado compulsoriamente aos 70 anos.”

Leia a entrevista com Ada Pelegrini.

ConJur — Como a senhora vê o novo projeto do Código de Processo Civil?

Ada Pellegrini — Não se trata de um novo Código de Processo Civil, é, na verdade, um aperfeiçoamento do Código de 1973 com algumas modificações. É claro que um Código novo é mais homogêneo, tem mais harmonia interna, mas eu costumo dizer que nós ainda estamos reformando o Código de 1973, que, por sua vez, tinha reformado o Código de 1939. Então, nada de novo ao sol do Brasil. Se esse Código sair do jeito que está no substitutivo da Câmara dos Deputados, é melhor que não saia.

ConJur — Por quê?

Ada Pellegrini — Ainda tem muitos defeitos, muitos erros. Mas a situação política é que está muito confusa na Câmara. O Sérgio Barradas, relator da comissão, que está revendo o projeto de lei na Câmara, é suplente de deputado. Ele já teve de sair do cargo uma vez porque o titular reassumiu a função. Nessa época, ele foi substituído pelo Paulo Teixeira, os dois do PT. O Paulo Teixeira deu uma abertura maior do que o Barradas. Ele ouviu mais especialistas, fez mais audiências públicas. Agora, o Barradas reassumiu, e ele está ligado a um professor de Processo Civil da Bahia, muito bem qualificado, mas que, infelizmente, não consegue trabalhar em equipe. Então, na verdade, o primeiro trabalho que traz o nome do Barradas é um projeto feito por uma só pessoa.

ConJur — O que foi feito em relação a isso?

Ada Pellegrini — Houve uma gritaria muito grande dos especialistas. Nós fizemos uma reunião, convocada pelo Barradas e pelo vice relator Paulo Teixeira, em Brasília, e conseguimos corrigir alguns defeitos que tínhamos apontado. Mas não corrigimos tudo. Em parte porque não deu tempo, em parte por causa desse professor fez a redação final — muito personalista. Agora, o relatório final do Barradas foi apresentado, mas não está bom.

ConJur — Quais são os pontos que não estão bons?

Ada Pellegrini — Na Câmara, o projeto retomou muito mais coisas do Código de 1973 do que no Senado. Então, diversos institutos que o Senado havia suprimido voltaram. Como exemplo podemos citar a Ação Declaratória Incidental, a Reconvenção, os Embargos Infringentes. Além disso, a Ação Monitória foi reintroduzida, sendo que ela ainda precisa ser melhorada. Ainda há um problema com os honorários advocatícios, causados, em parte pela Fazenda Pública, que desfavorece muito o trabalho do advogado. São várias coisas que ainda queremos melhorar.

ConJur — O que foi melhorado?

Ada Pellegrini — A conciliação e a mediação judiciais. Conseguimos reintroduzir a estabilização da Tutela Antecipada — mas se mantém uma terminologia totalmente diferente da tradicional, introduzida, primeiro, pela doutrina, e, depois, pelo Código de 1973.

ConJur — Pode haver alguma mudança nesse relatório final?

Ada Pellegrini — Eu não sei o que vai acontecer, porque parece que, de novo, o Barradas vai sair da relatoria. Não sei quando e nem o motivo. Mas está em uma situação de precariedade. E, certamente, não vai dar tempo do relatório final do Barradas, que ainda tem tantos equívocos, ser submetido ao Plenário antes dele sair. Se ele sair, e o Paulo Teixeira reassumir a relatoria, nós teremos um pouco mais de tempo e de espaço para trabalhar. Não acredito que haja uma tramitação que permita a aprovação do substitutivo da Câmara antes da saída do Barradas. Então, retomaria o Paulo Teixeira, e os juristas, penalistas e processualistas estão em contato com ele. Mas, se o projeto for aprovado do jeito que está, vai voltar para o Senado, que, provavelmente, vai retomar muitos pontos que já haviam decidido. Ainda temos um longo caminho pela frente.

ConJur — A centralização de ações semelhantes em um juiz monocrático é uma solução pontada para resolver o maior número de processos, mas funciona para as ações repetitivas?

Ada Pellegrini — Conseguimos introduzir essa questão nesse substitutivo do Barradas, em uma tentativa de coletivização do processo. O projeto prevê o incidente para julgar uma causa só e aplicar o julgamento as outras, mas nós queríamos a possibilidade de transformação de ações individuais em uma ação coletiva. Então, nós introduzimos dois dispositivos no novo texto: quando há repetição de diversas ações individuais com o mesmo objeto, o juiz notifica aquele que pode ajuizar uma Ação Civil Pública. Se ele quiser, a Ação Civil Pública vai absorver as ações individuais. E mais, quando se tratar de uma ação individual, que na verdade tem efeitos coletivos, como, por exemplo, nos casos de telefonia, o juiz transforma a ação individual em processo coletivo — já que ele vai ter que atingir da mesma maneira a todos que se encontram na mesma situação jurídica.

ConJur — A quem caberia transformar a ação individual em ação coletiva?

Ada Pellegrini — Ao juiz, tanto em primeiro quanto em segundo grau. Atualmente, eles não podem fazer isso porque muda a causa de pedir, muda o pedido e deve haver uma regra expressa.

ConJur — A mediação deveria ser obrigatória?

Ada Pellegrini — A tentativa de mediação e a audiência de conciliação devem ser obrigatórias. Assim, a parte tem, pelo menos, a oportunidade de conhecer essas novas técnicas, e pode escolher uma delas. Conseguimos, nessa ultima reunião, que ainda que uma das partes diga que não está interessada na audiência de conciliação, a audiência acontecerá. Mas se as duas partes disserem que não estão interessadas na audiência de conciliação, começa o prazo para defesa.

ConJur — Quem deveria mediar?

Ada Pellegrini — O mediador. Nós temos a resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça que instituiu e regulamentou a mediação e a conciliação judiciárias. Elas devem ser mediadas por terceiros facilitadores com capacitação mínima para exercerem a sua função. Não deve ser o juiz, como constava no primeiro projeto do Senado.

ConJur — Alguns juízes apontam como um fator de insegurança jurídica a qualidade das leis no Brasil. Esse quadro ainda vigora?

Ada Pellegrini — No direito material, sem dúvida.

ConJur — E como a senhora vê o projeto de elaboração de leis aqui do Brasil?

Ada Pellegrini — Seria preferível o que se faz na Itália e na França: uma lei quadro sai do executivo — de especialistas — e fixa as diretrizes principiológicas ou até, em determinadas matérias, mais específicas, que o Congresso tem que levar em conta para legislar. É a lei quadro ou a lei de delegação em que os especialistas do executivo, nem sempre são ótimos, mas pelo menos são considerados especialistas da matéria.

ConJur — A elaboração desses anteprojetos deveriam vir do Ministério da Justiça, por exemplo?

Ada Pellegrini — Se for implantado esse processo legislativo, a ideia é que o Ministério da Justiça crie comissões especialistas, e depois o Congresso apenas detalha e especifica. Esse seria o sistema ideal, mas não é o nosso. Qualquer deputado e qualquer senador têm iniciativa para fazer uma proposta de projeto de lei. E com esse cipoal de leis que aparece, uma contradizendo a outra, uma revogando a outra, não dá para saber qual está em vigor. Com a Internet ficou um pouco mais simples.

ConJur — A Constituição Brasileira completa 24 anos neste mês de outubro. Por que ela não está totalmente em vigor até hoje?

Ada Pellegrini — Ela é muito detalhada. Uma Constituição não pode falar da amamentação, por exemplo. Nós temos uma Constituição tão rica em direitos fundamentais e prestacionais que acaba causando, na prática, um problema. Basta ver a greve no funcionalismo público, pela qual o Supremo Tribunal Federal teve, em um Mandado de Injunção, que diz como tratar o assunto enquanto não vem a lei. E mesmo depois desse julgamento a lei ainda não veio. Por outro lado, o legislativo brasileiro está muito mais interessado atualmente em comissões parlamentares de inquérito do que legislar. Atribuição parlamentar dá mais holofote e visibilidade, e é isso que os nossos deputados e senadores querem. Em terceiro lugar, há, sem dúvida, uma omissão legislativa muito grande. Nos temas polêmicos do Brasil, embora haja diversos projetos de lei no Congresso tentando resolver os assuntos, o Legislativo não legisla união homoafetiva nem limites do controle de política pública. O Judiciário ocupa o lugar que seria do Legislativo, e o STF tem decidido questões que o Legislativo deixou de decidir. E isso acarreta na excessiva judicialização dos conflitos. Tudo vai parar no Poder Judiciário, porque o Legislativo não resolve ou porque a Administração Pública se omite. Em outros países, como na França, tudo relativo a pedidos da área da saúde, por exemplo, é decidido administrativamente.

ConJur — Na França, são quatro instâncias administrativas antes de chegar no Judiciário. Seria possível seguir um modelo desse no Brasil?

Ada Pellegrini — Claro. Mas alguém tem que criar...

ConJur — Na Argentina aprovaram uma lei recente...

Ada Pellegrini — Mas é preciso criar órgãos que, efetivamente, se interessem pela atuação positiva, que resolvam rapidamente o problema, sem necessidade de ir ao Judiciário. No Brasil, a Administração não se organiza. As agências reguladoras, por exemplo, não fazem o seu papel em beneficio do consumidor. E ele vai ao Judiciário.

ConJur — A Administração não tem a palavra final, não é?

Ada Pellegrini — A Administração na França e na Argentina também não tem a palavra final, mas, pelo menos, resolve a questão. E quando a questão é resolvida satisfatoriamente e com Justiça, não é preciso recorrer ao Judiciário. No Brasil, os nossos órgãos administrativos, que julgam conflitos entre contribuinte e o fisco, têm uma atuação tão pífia, tão ligada ao executivo, que é necessário ir ao Judiciário para rever a decisão. Não adianta pensar em eliminar sobrecarga dos tribunais, porque é isso que acarreta o excesso de trabalho que os tribunais. Todo mundo é obrigado a ir ao Judiciário, porque a administração não resolve.

ConJur — A inclusão social e a judicialização dos conflitos está transformando as questões ligadas ao Direito em um assunto quase que popular. O caráter contramajoritário, necessário para ter uma decisão serena, vem sendo exercido pelo Judiciário?

Ada Pellegrini — Sim. Mas por quanto tempo? Com que efetivo conhecimento dos fatos? O Judiciário tem assumido esse papel. Mas o juiz se encontra diante dos casos sem nenhuma assessoria especifica. Então, ele exerce uma Justiça, que eu chamo de Justiça de misericórdia, para salvar uma vida, talvez, sem nenhum conhecimento mais profundo dos fatos. Não é possível tolher do indivíduo o exercício de seu direito subjetivo individual de pedir remédio, internação hospitalar, ou cirurgia no exterior, e o juiz se encontra diante desses casos sem nenhuma assessoria especifica. Essa decisão dando a uma pessoa aquilo que outra pessoa, nas mesmas condições, não tem, porque não foi ao Judiciário pedir, quebra a igualdade, quebra a universalidade, que é um preceito da política de saúde pública. O juiz se sente completamente perdido. Ele atua. Mas será que está atuando equilibradamente, com Justiça? Será que ele está sabendo qual é o reflexo que a sua decisão vai ter sobre os recursos destinados à saúde para todos? Essa judicialização leva a um estrutura institucional que deve, pelo menos, se preocupar em fornecer ao juiz todos os elementos necessários para que ele possa julgar com justiça, e tentando ao máximo, preservar a igualdade.

ConJur — O juiz precisa de apoio para lidar com políticas públicas?

Ada Pellegrini — Por isso fizemos esse anteprojeto de lei que está sendo discutido para o novo processo de cognição mais profunda e de contraditório mais amplo, para que um juiz possa efetivamente intervir em políticas públicas, ou ações individuais que tenham reflexos em políticas públicas, de maneira prudente, ponderada, justa e dando decisões exequíveis. O juiz tem que ser informado, assessorado, consciente do que está fazendo, porque está mexendo em uma política pública que tem que ser universal e igualitária por definição.

ConJur — Como a senhora vê o fenômeno do ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa ser eleito pela mídia, pela população em geral, como um herói nacional?

Ada Pellegrini — A mídia pré-julgou.

ConJur — No caso do mensalão?

Ada Pellegrini — A mídia sempre pré-julga. E no caso do mensalão, pré-julgou. A pessoa que corresponde às expectativas da mídia passa a ser o herói nacional e quem não corresponde passa a ser o vilão. Esse é um problema muito sério, que se vê, sobretudo, em casos criminais. O mensalão é um caso criminal, de pressão da mídia que forma a opinião pública. Não é a pressão da opinião pública, porque a opinião pública é manejada pela mídia. Eu não estou querendo defender a posição do relator ou do revisor, porque eu não conheço o processo. Mas nos casos criminais do Brasil, o que é proibido em outros países, a mídia condena sem processo e dificilmente absolve. As interceptações telefônicas, por exemplo, devem correr em segredo de Justiça, mas sai tudo no jornal! Isso é crime. Mas quem é que forneceu a informação? Quem tem interesse em fornecer a informação? Ninguém nunca foi atrás.

ConJur — Nesses casos a imprensa deveria ser responsabilizada pelo vazamento?
ConJur — O sigilo de fonte é garantido pela Constituição...

Ada Pellegrini — Mas sigilo da fonte em um crime, que é violar a interceptação telefônica? Isso é crime. A imprensa deveria se auto-censurar. Quem tem interesse de vazar a informação? A defesa certamente não. O interesse é de um órgão público. Ou é a Polícia, ou é o Ministério Público, ou o técnico. Não é um país sério. A conduta é criminalizada, a imprensa não se preocupa com isso, porque não tem nem previsão de criminalização. Ninguém vai atrás de quem fez. Isso me incomoda muito. A interceptação é publicada, com perguntas e respostas que precisam ser interpretadas, e logo o sujeito é condenado e preso.

ConJur — Mas a prova indiciária é valida?

Ada Pellegrini — Claro. Quanto mais próximo for o fato a ser provado do fato que é o indicio, mais sólida é a conclusão a que se pode chegar. Mas normalmente, deve haver vários indícios, todos convergindo para a mesma persuasão lógica. Se a causa e efeito forem bem construídos, você pode usar prova indiciária.

ConJur — O Supremo restringiu o uso de Habeas Corpus substitutivo do Recurso Ordinário. A senhora concorda?

Ada Pellegrini — Está certo. O Habeas Corpus está sendo utilizado para tudo. É impressionante o que a Defensoria Pública, em todo Brasil, em vez de recorrer, entra com Habeas Corpus. O Habeas Corpus é um remédio Constitucional destinado a preservar a liberdade ainda que indiretamente. Quando o processo penal, por exemplo, não tem a aparência do direito então pode entrar com Habeas Corpus. Entrar com Habeas Corpus no lugar de recurso é uma aberração.

ConJur — O papel da jurisprudência está sendo reforçado nesse novo Código de Processo Civil?

Ada Pellegrini — Esse novo Código não traz praticamente nada de novo em relação a jurisprudência. Mas vem sendo reforçada por técnicas, como a súmula vinculante, a súmula impeditiva de recursos, o caso piloto. O papel da jurisprudência no Brasil não assumiu ainda a posição igual nos países de Commom Law, mas hoje podemos dizer que, também no Brasil, a jurisprudência não é só interpretação, mas também fonte do Direito.

ConJur — Temos um sistema misto de Commom Law e Civil Law?

Ada Pellegrini — Cada vez mais a Commom Law se aproxima. Até hoje, cabe-se perguntar se vale a pena distinguir como radicalmente diferentes o sistema de Commom Law e de Civil Law.

ConJur — O que falta?

Ada Pellegrini — Coerência nos tribunais para que não haja decisões contraditórias do mesmo tribunal durante anos, principalmente dos tribunais superiores. O STF não pode mudar, de repente, toda a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como aconteceu com o Cofins. Isso dá uma grande insegurança jurídica. A jurisprudência também necessita ser mais coerente internamente, a técnica da uniformização da jurisprudência é pouco usada.

ConJur — A súmula vinculante vem sendo bem aplicada no Brasil?

Ada Pellegrini — Não. Invoca-se a súmula vinculante para casos completamente diferentes, sem seguir o caminho lógico, razoável, que levou à elaboração daquela súmula, e a que fatos aquela súmula pode aplicar-se e a que fatos não deve aplicar-se.

ConJur — Como a senhora vê a composição do Supremo, a aposentadoria compulsória e o fato de ter uma troca tão grande de ministros em um curto espaço de tempo?

Ada Pellegrini — Eu não gosto do sistema de escolha brasileiro de ministros do Supremo, porque é indicação do presidente da República. Já viu algum candidato ser reprovado na sabatina do Senado?

ConJur — Há candidatos que estão entrando sem notável saber jurídico?

Ada Pellegrini — Com certeza.

ConJur — E a que a senhora atribui isso?

Ada Pellegrini — O apadrinhamento do Executivo e fechar de olhos do Legislativo. O Senado não vai a fundo, não examina essa questão, não sei se ministro do Supremo deveria ser aposentado compulsoriamente aos 70 anos. Eu nunca trabalhei tanto como depois que fui aposentada compulsoriamente. Aliás, ninguém deveria ser aposentado compulsoriamente aos 70 anos. Teria que fazer uma prova de aptidão, física e mental. A aposentadoria se faz mais para renovar os tribunais, do que por uma presunção relativa de incapacidade.

ConJur — Os ministros deveriam passar por uma sabatina pública?

Ada Pellegrini — Poderia ser como acontece nos tribunais, até no Superior Tribunal de Justiça: primeiro os ministros são indicados — não pela Ordem dos Advogados e nem pelo Ministério Público, porque aí  vamos ter o que está acontecendo nas indicações, nas listas sêxtuplas desses órgãos, que é um absurdo. Representantes da sociedade científica organizada poderiam, pelo menos, fazer a primeira indicação para o presidente da República. Deixar mais participativa a nossa sociedade organizada.

ConJur — Isso, de certa forma, não gera efeito por meio dos contatos que a própria sociedade científica tem no Legislativo e no Executivo? Ou teria que ser um processo formal?

Ada Pellegrini — Não. O presidente da República escolhe quem quer, quem mais interessa e pode ser favorável ao governo. Ele não vai atrás da sociedade científica. Pior é que é o governo, não é o Estado.

http://www.conjur.com.br/2012-out-21/entrevista-ada-pellegrini-grinover-processualista

Dois aspectos relevantes para a rejeição de Serra



Realmente, creio que o grande problema de Serra seja a hipocrisia e o oportunismo político. E creio também que isso, ao longo do tempo e de forma articulada, pode sim explicar o mal-estar do eleitor com ele. Mas sublinharia dois aspectos relevantes. O primeiro, a presença constante em São Paulo em quase todos os pleitos majoritários desde meados dos anos 1990. Há um desgaste natural de qualquer candidato pois não dá tempo do eleitor respirar. Então, mesmo aqueles defeitos que se poderiam relevar se tornam insuportáveis, por que reiterados frequentemente. Isso serve para o caso de Serra, mas não apenas. Político muito exposto, com frequência inusual, perde o ineditismo de suas falas e propostas e permite sublinhar seus defeitos. No caso de Serra, por exemplo, seu oportunismo foi ficando a cada eleição mais evidente. Nunca me esquecerei dos panfletos distribuídos por sua campanha a presidente, no Rio, em 2010, em que ao lado de sua foto sorridente vinha a frase: "Jesus Cristo é a verdade e a Luz" - José Serra. Aquilo era o apogeu do oportunismo. Constrangia os eleitores clássicos do PSDB e provavelmente não angariaria um único voto nem do mais empedernido evangélico.

Mas há outro fator importante, ao meu ver. Não é curioso que Serra tenha construído sua carreira pública alicerçando-se sempre no discurso da eficiência, da gestão e do planejamento mas na maioria absoluta das vezes sequer apresente um plano de governo? Não é absurda essa história de que ele "faz acontecer"? Não é coisa de político "não técnico" dizer que teve idéia a ou b ao visitar tal ou qual lugar? Ou seja, ele se vende como o mais preparado, mas não apresenta nada nesse sentido, não apresenta nada que tenha preparado para apresentar. Se vende como um político ultra-moderno mas seu discurso é de político tradicional. Por exemplo, Lula se vende como político tradicional e seu discurso é tradicional. Dilma foi apresentada como gestora, bem como Haddad agora o é, e suas falas, seus discursos eleitorais, suas formas de se apresentar são técnicos. Fernando Henrique, por exemplo, ao assumir o papel de pai do real, elegeu-se falando tecnicamente. Ou seja, o político não pode criar, para o eleitorado, uma imagem difusa, uma personalidade ambígua. Isso é muito forte em tudo que se faz numa campanha. É por isso que uma campanha define uma identidade visual, por isso que a "arte" da campanha, com o nome do candidato e seu número bem legível, sem nenhum detalhe dispensável, é sempre tão clara: não há espaço para ambiguidade. E Serra é, essencialmente e gradativamente mais, ambíguo. É o técnico do planejamento que não apresenta plano de governo, que não possui metas, indicadores, nada.

Enfim, poder-se-ía perguntar, então: mas será que Serra não sabe disso tudo? Será que um homem inteligente, estudado, que vive a política desde sempre não sabe disso tudo que nós, meros mortais, ficamos aqui esquadrinhando a partir de obervações muitas vezes feitas a partir da leitura de jornais e de blogs etc? Minha hipótese é a de que sabe disso tudo e muito mais. Mas é de uma soberba ímpar. É esta soberba que o faz acreditar naquilo que a Veja diz sobre ele: de que seria Serra a elite da elite. Como ele é esse creme do creme, ele pode falar em planejamento e gestão sem de fato realizar isso por que ele dará conta disso. Qualquer outro precisaria estudar, escrever, etc. Ele não. E por que se percebe tão acima da média, se permite golpes oportunistas: somente um idiota (o que ele evidentemente não é) ou alguém muito prepotente abraçaria o conservadorismo tosco com a desfaçatez que ele abraçou. Ele é tão superior que vê a todos como inferiores e, portanto, enganáveis. Não foi ele que foi a Recife ou Salvador, ainda em março de 2010, num evento qualquer e se deixou filmar/fotografar dando banho em um cadeirante no mar? E não saiu de lá perguntando aos repórteres: filmou direitinho?

Resta evidente que o eleitorado não é burro. Faz muitas escolhas estapafúrdias, sim, usa critérios heterodoxos muitas vezes, sim, mas não é burro. Sabe muito bem interpretar os sinais emitidos pelos políticos, mesmo quando são ambíguos. E, talvez, justamente quando se tornam muito ambíguos é que passam a ser mais e mais rejeitados.

http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/dois-aspectos-relevantes-para-a-rejeicao-de-serra

O Erro de Russomano

Por Sergio Saraiva

* PIG ( Partido da Imprensa Golpista )

Não creio que Russomano foi invenção do PIG.

O PIG não o suporta. Note-se,  Russomano vem do meio deles.

Porque não o acolheram, como por exemplo acolhem Miro Teixeira? Questões contratuais, Russomano pode até prestar alguns serviços na modalidade "free-lance", mas é antes de tudo alguém com visão de autônomo. Sempre quis ter o seu próprio negócio. E aí, sem subordinação não dá.
Russomano foi criação dele mesmo apoiado no no que imaginava ser PENP - Partido Evangélico Neo-Pentecostal. Houve outros, Francisco Rossi e Garotinho, por exemplo. Oportunistas, e talvez preconceitosos, tomam esse segmento da população como néscios facilmente manobráveis. Invariavelmente quebram a cara - o tal PENP já deu mostra de não existir. Ainda que seja um poderoso veículo de divulgação da campanha. Aliás como os púlpitos sempre foram.

Ocorre que apartir de um determinado momento passou a ser útil, uma coincidência feliz. Tomava votos de ambos os candidatos na periferia, mas como a periferia é, ou era, a pátria do PT na cidade de São Paulo, tomava mais votos de Haddad do que de Serra.

Daí a constatação óbvia, Russomano era útil para tomar de Haddad o segundo lugar. Um segundo turno entre Serra e Russomano seria tudo que o PIG desejaria nos seus melhores sonho.

O PIG tem material para detonar Russomano, por que não fizeram? Porque ele era-lhes útil. Não que tenha saído ileso. Aplicaram-lhe alguns jabs. E só. Jab é um bom golpe para manter o adversário cauteloso.

O erro do PIG foi acreditar em Russomano tanto quanto Russomano acreditava em sí próprio. E rezar para que o elitorado também passasse a crer. Que mais poderiam fazer.

Não deu, quando Haddad passou a se manteve, nas pesquisas do PIG, em "empate técnico" por tanto tempo com Serra, acendeu a luz de alerta no QG do PIG, a estratégia poderia inverter-se e dar Russomano  e Haddad. Em menos de duas semanas Russomano derreteu, fundiram-no.

http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/o-erro-de-russomanno

As bravatas do campeão de votos Eduardo Paes

Edgard Catoira

20.10.2012 09:09



Tudo como d’antes…

No Rio de Janeiro, a eleição para prefeito não terá segundo turno. Eduardo Paes ganhou logo no primeiro, com maioria esmagadora de votos.

Bastou sair o resultado e o alcaide começou a botar as unhas de fora. Simplesmente abandonou sua postura de político subalterno e voou para Brasília com seu “chefe” Sérgio Cabral – que anda calado, em fase de “muda” – e, atabalhoadamente foi comemorar com a presidente Dilma o resultado das urnas no Rio.

No encontro, aproveitando o embalo, já indicou o governador Cabral para vice na chapa da presidente nas próximas eleições, em 2014. Para lembrar: Cabral e Paes são do PMDB, partido aliado do PT. Mas o vice-presidente, Michel Temer, também é do PMDB. Gafe de Paes? Foi. Mas vale. De repente, ele garante uma vaguinha de ministro para Cabral continuar sob os holofotes nos próximos dois anos.

Seria uma solução para encaixar confortavelmente algumas peças do tabuleiro fluminense: Cabral ministro ganha tempo para que a população esqueça as festinhas de Paris; o vice-governador, Pezão, assume e governo e trabalha, com a máquina do Estado, para se eleger governador em 2014.
Para Paes, agora se sentindo imperador do Rio, o resto é o resto.
Esqueçam…

Há menos de uma semana, Mino Carta lembrou neste espaço que FHC, negando a si mesmo, pediu: “Esqueçam o que eu disse”. Pois bem, Eduardo Paes também já partiu para essa máxima: apesar de, em campanha ter prometido não aumentar impostos, agora, firme, diz que o IPTU terá aumento. E se nega a voltar ao assunto. Portanto, senhores eleitores, podem preparar o bolso para mais esse aumento logo no primeiro mês do ano que vem.


E mais: os moradores de Copacabana – que pagam alto IPTU – serão alijados do direito de ir e vir também na noite de Natal. Paes convidou o adorável Steve Wonder para cantar na praia exatamente nesse dia, isolando, como de costume, todo o bairro.

Além do incômodo, quanto custará isso? Que ganho a cidade terá, numa época do ano em que está lotada? Mas, tudo bem, no réveillon, como já é tradição, teremos mais gente na praia de Copa. Como diria meu neto Victor, “fica frio, vai ser suave”. À parte o fato de que locais próprios para shows, no resto da cidade, ficam sem uso – estádios, salões de eventos, Sambódromo, vamos nós aturar mais esse uso indevido da praia mundialmente conhecida por sua beleza.

Sem se importar com o vereador Eliomar, Paes segue com seu marketing


Imagem: Reprodução

Agora, o lado que o prefeito reeleito vai ter que baixar a bola, e se defender: o vereador do PSOL, Eliomar Coelho, também reeleito, andou fazendo contas: em 2012, os gastos da prefeitura do Rio em publicidade alcançaram a cifra de R$ 34,5 milhões. Esse valor excede à média de R$ 19,6 milhões gastos nesse item nos três últimos anos, o que, pela legislação brasileira, é proibido.

O vereador, dizendo-se assustado com a quantidade de dinheiro que a gestão do alcaide Eduardo Paes gasta com publicidade e propaganda, resolveu entrar com representação no Ministério Público Eleitoral.
Irritado, Eliomar Coelho lembra que “se essa ação for pra frente, Paes pode ficar inelegível nos próximos oito anos e ter seu diploma de prefeito cassado.”

Será? Vamos acompanhar os, agora seguros, passos do prefeito. Ainda nesta sexta-feira, dia 19, estamos com mais um caderno do Globo – “projeto de Marketing” – em que Paes fala bem dele mesmo: uma maravilha.

Internautas ironizam as atitudes do prefeito

Em tempo de novas providências anunciadas: as passagens de ônibus, no Rio, custarão mais de três reais – provavelmente R$ 3,05 a partir de janeiro. Na internet, o pessoal já está brincando. Enfim, viva o povo carioca!

http://www.cartacapital.com.br/politica/as-bravatas-do-campeao-de-votos-eduardo-paes/



Genoino: 'Nunca entreguei ninguém na vida. Nem no pau de arara'

Cearense de Quixeramobim, Genoino entrou aos 22 anos no PC do B e participou da Guerrilha do Araguaia. Ficou preso entre 1972 e 1977, foi um dos fundadores do PT e cumpriu seis mandatos como deputado federal do partido, do qual se tornou presidente. Deixou o comando do PT em 2005, no início da crise do mensalão. Foi assessor especial do Ministério da Defesa. É suplente de deputado e tem 66 anos.

José Genoino diz que não prejudicará companheiros - Clayton de Souza/AE
Clayton de Souza/AE
José Genoino diz que não prejudicará companheiros
Cercado por livros no pequeno escritório, instalado no quarto dos fundos de sua casa, o ex-presidente do PT José Genoino diz que lutará "todos os dias, semanas, meses e horas" para provar sua inocência no processo do mensalão. Na primeira entrevista exclusiva concedida desde que foi condenado por corrupção ativa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Genoino afirma, porém, que sua estratégia de defesa não aponta o dedo para companheiros. "Nunca entreguei ninguém na minha vida. Nem no pau de arara. Muito menos num processo que virou um grande espetáculo midiático", argumenta.

Acompanhado de seu advogado, Luiz Fernando Pacheco, o ex-presidente do PT recebeu o Estado em sua casa, no Butantã, na sexta-feira. Em quase duas horas de entrevista, fumou dez cigarros, ficou com a voz embargada em alguns momentos e citou passagens do livro Memórias de um Revolucionário, com páginas marcadas em papel amarelo nas quais escreve palavras como "Verdade", "Coragem" e "Totalitarismo".
Ex-guerrilheiro do Araguaia e deputado federal por 24 anos, até 2010, Genoino carrega um terço nas mãos para diminuir a tensão. "Quem tem a consciência do inocente não se curva, não se dobra", diz. Para ele, as crises na seara política não serão resolvidas pelo Judiciário. "A Justiça trabalha, muitas vezes, com o retrovisor. A política trabalha com o para-brisa."

O sr. foi condenado por corrupção ativa pelo STF, acusado de participar de esquema para desviar recursos públicos e comprar apoio político no governo Lula. Disse que a Corte errou, mas que interesse o STF teria em condená-lo sem provas?

Foi uma condenação injusta porque se baseou na tirania da hipótese pré-estabelecida. Eu era presidente do PT e participava de todas as reuniões políticas do PT e com partidos da base aliada. Essa minha função de presidente do PT é que me levou a essa injustiça monumental. Eu não cuidava das finanças do partido e a minha relação com a política é pública e transparente. Dizer que eu participei de corrupção ativa é uma grande injustiça. Em juízo, o tesoureiro informal do PTB, Emerson Palmieri, disse que nunca participou de reunião envolvendo dinheiro. Vadão Gomes disse que ouviu falar, mas em juízo não confirmou. E o Roberto Jefferson, dependendo do dia e do local, afirmava uma coisa ou outra. No meu modo de entender é a ideia de verossimilhança. Usam-se deduções. Era possível ou impossível? O julgamento penal precisa se basear em provas concretas.

O relator do processo, Joaquim Barbosa, votou por sua condenação no crime de formação de quadrilha, mas o revisor, Ricardo Lewandowski, o absolveu e ainda não há conclusão. Para Barbosa, o sr. era "interlocutor político do grupo criminoso" comandado pelo então chefe da Casa Civil José Dirceu. Como o sr. responde a essa acusação?

Chamar o PT e os militantes do PT de quadrilha é algo muito grave, na minha avaliação. Era minha tarefa defender o governo Lula, a relação com os movimentos sociais e a unidade da bancada num momento difícil. Que associação ilícita? É um absurdo falar isso. A minha associação foi em 1968 com o movimento estudantil. Na guerrilha, no PC do B, cinco anos preso, na fundação do PT, deputado, constituinte, 24 anos de mandato. Sempre defendi, inclusive quando estava na oposição, que a política se baseia em disputa e negociação. Muitas vezes fui posição minoritária no PT. Nunca tratei de dinheiro, de pagamento, de qualquer atividade criminosa. Participei de negociações políticas. Misturar negociações políticas, articulações e alianças com crime significa criminalizar a política. Eu não aceito essa acusação de ter integrado quadrilha. O PT não é um partido de quadrilheiro, de mensaleiro. Isso é uma afronta à nossa história. O PT precisava fazer aliança ao centro para ganhar a eleição e para governar.

Na política, os fins justificam os meios?

Os métodos que construímos, a vitória do Lula e a sustentação do governo foram democráticos, transparentes e de negociação. Não tem essa de que os fins justificam os meios. Se queremos construir uma coisa grandiosa, temos de ter atitudes e meios grandiosos.

O sr. afirma que os empréstimos feitos ao PT pelo Banco Rural e pelo BMG existiram, mas tanto o STF como a Justiça Federal em Minas sustentam que essas operações eram fictícias. O sr. assinava os papéis sem ler?

Esses empréstimos se constituem, na minha modesta compreensão jurídica, em atos jurídicos perfeitos. A minha função na presidência do PT era política e cada secretaria tinha a sua responsabilidade. Eu assinava os empréstimos porque eram legais, necessários e foram apresentados a mim pelo tesoureiro (Delúbio Soares), que era o secretário de Finanças. Os dois empréstimos foram feitos porque o PT precisava resolver problemas financeiros imediatos. Eu os avalizei na condição de presidente do PT, sem nunca ter feito qualquer conversa ou negociação com os bancos, até porque nunca estive nesses bancos. Registrei os empréstimos na prestação de contas do PT, que está no Tribunal Superior Eleitoral, de 2004, 2005 e 2006. Quando eu deixei de ser presidente do PT, os empréstimos foram cobrados judicialmente. Eu não tinha bens. Minha conta foi bloqueada e só foi aberta porque era conta salário. Eu procurei o deputado Ricardo Berzoini, que era presidente do PT, e disse que os dois empréstimos estavam na prestação de contas do partido. Ele iniciou, então, uma negociação com os dois bancos. O PT começou a pagar os empréstimos em 2007 e terminou em 2011. Os empréstimos não são falsos nem fictícios. Pagamos com renovações e com documentos assinados pelos advogados dos bancos e chancelados pelo Judiciário.

Mas a Justiça de Minas o condenou por falsidade ideológica no caso do BMG...

Eu peço licença para mostrar a perseguição. Fui diplomado no dia 18 de dezembro de 2006. No dia anterior, às 18h30, o Ministério Público entrou na 4.ª Vara da Justiça Federal para apresentar a denúncia. O juiz a recebeu em 20 minutos. Alguns ministros do Supremo até comentaram essa rapidez. Quando eu virei deputado, o processo foi para o STF. Entramos com habeas corpus para que o STF reexaminasse o recebimento da denúncia (porque, segundo Genoino, havia sido feito em tempo recorde e no último dia da inexistência do foro por prerrogativa de função). Quem desempatou o pedido de habeas corpus foi a então presidente do STF, Ellen Gracie, porque se tratava de matéria constitucional. Essa ação ficou no STF em 2007, 2008, 2009 e 2010. No início de 2011, eu deixei de ser deputado e a ação foi para a 4.ª Vara. Ficou um ano e meio lá. Numa decisão monocrática, a juíza soltou a sentença e mandou um ofício para o relator da Ação Penal 470 (Joaquim Barbosa). É muita coincidência e a maneira como se deu o processo é prova de perseguição política. Não é por acaso. É com o objetivo de me atingir. Eu não sou ingênuo. Vou recorrer.

Os ministros do STF alegam que os empréstimos eram renovados sucessivamente e que o PT não tinha lastro para pagar isso.

O PT tinha lastro.

E por que não quitava nada?

O orçamento anual do PT era de R$ 40 milhões por ano. O partido estava numa situação de insolvência, com muitos diretórios solicitando verba para resolver o básico - de passagem aérea a reuniões - e havia previsão de aumentar o orçamento com a contribuição dos parlamentares.

O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, também condenado por corrupção, era o presidente de fato do PT quando o sr. comandava o partido?

Eu não faço comentário sobre companheiros do processo. Conheço o Zé Dirceu desde 1968, fiz muitas disputas com ele no movimento estudantil, no PT e no Parlamento.

Ele mandava e o sr. executava?

O PT é um partido de militância, os dirigentes são eleitos, se expõem e não escondem a cara. Ele era ministro da Casa Civil e eu era presidente do PT.

Logo que o PT chegou ao poder o sr. disse, em entrevista ao Estado, que pelo então presidente Lula fazia tudo e nunca negaria um pedido dele. Foi isso o que aconteceu, de 2003 a 2005?

Eu tenho uma relação excepcional com Lula e grande respeito com um dos maiores políticos que eu convivi e que conheço. Estabeleci uma relação com ele de muita admiração. Não é algo pessoal. É uma causa. É um objetivo. Esse projeto que está mudando o Brasil incomoda e revolta setores preconceituosos, conservadores, que não aceitam a vitória de 2006, com Lula, e de 2010, com a eleição da presidenta Dilma. Eu disse, naquela entrevista, que o ataque era pelo êxito das mudanças que o governo Lula estava fazendo no Brasil. Não foram fáceis. Eu cheguei a ser vaiado em reuniões do PT, cheguei a ser criticado na bancada. Em Porto Alegre, quando o Lula decidiu ir para o Fórum de Davos, eu recebi um bolo na cara como protesto. Eu sempre botei a cara naquilo em que acredito. Eu acredito muito no PT, no Lula, na Dilma e no que nós estamos fazendo. A minha geração é vitoriosa, apesar das adversidades. Nunca fiz emenda no orçamento e era criticado por isso. Nunca fiz uma indicação para qualquer cargo em governo. Sempre fui um lutador de ideais e de causas.

Se o PMDB tivesse entrado no governo Lula, logo no início da administração, teria ocorrido esse varejo partidário em busca de apoio parlamentar?

O PT aprendeu que sem aliança não ganharia a eleição e não governaria. Eu sempre fui um defensor das alianças ao centro, mesmo quando era minoria. Sempre defendi a aliança com o PMDB. Não houve crime de compra de votos nem compra de deputados.

O que houve, então?

É da natureza do Parlamento fazer acordos eleitorais, alianças, inclusive com a oposição. Essa criminalização da política é um caminho às avessas para enfraquecer os poderes.

Mas teve dinheiro no meio desses acordos. O sr. acha plausível a tese de que tudo era caixa 2?

Eu participei de acordos eleitorais e políticos e nunca discuti dinheiro nem financiamento de campanhas e muito menos cargos com os partidos. Eu não cuidava disso. As alianças foram para aprovar o Bolsa Família, o pré-sal, o PAC, as leis que melhoraram o quadro institucional do País.

Tudo era responsabilidade do tesoureiro do PT, Delúbio Soares?

Eu não falo de nenhum companheiro do processo.

Nas reformas tributária e da Previdência houve denúncias de coincidência de votações com pagamentos de parlamentares...

Eu acompanhei as polêmicas da reforma da Previdência, porque tinha deputado do PT contra, deputado da oposição favorável. Teve polêmica, disputa, briga. Fiz reuniões terríveis com o movimento sindical dos servidores públicos. Dizer que houve esse tipo de coisa na reforma da Previdência é desconhecer como o Congresso funciona. A mesma coisa na reforma tributária, que foi feita de maneira fatiada. Eu negociava com a bancada do PT e dizia: "Vocês votem a favor e digam que são contra". Foi duro o que eu passei.

Houve deslumbramento com o poder por parte de petistas?

Não. Eu acho que o PT assumiu a Presidência numa situação muito delicada, que era governar com o País correndo o risco de quebrar. Nunca esqueço que Lula disse para nós que não ia deixar o Brasil quebrar na mesa dele. E que iria tomar medidas duras, mas necessárias, para que o País voltasse a crescer. Isso deu certo. Houve divergência dentro do PT. Fizemos um trabalho político legítimo, que deu ao Lula as condições para o êxito do seu governo, da sua reeleição. É o projeto que mudou o Brasil, de diminuição da desigualdade social, de defesa da soberania, de geração de empregos, de recuperação do papel do Estado para garantir os investimentos.

O sr. foi traído?

Na minha vida política nunca conheci essa palavra. Nem na guerrilha nem na prisão nem no Parlamento nem no PT. Entrei no partido em 1980 e sou o número sete do diretório do Butantã. Eu me emociono quando falo da militância do PT. A quantidade de visitas e de telefonemas que estou recebendo, de e-mails e mensagens, você não tem ideia. Nunca esqueço uma cena em Leme, quando mataram dois boias frias e a polícia botou a culpa no PT. Eu era um dos deputados que estavam lá. Desmontamos aquela armação. Quando fui profundamente atacado em 2005, uma companheira me pediu para ir lá. Ela pegou o carro de som e ficava comigo andando e falando quem eu era. O PT é minha vida. Não existe essa palavra de desconfiança.

Se não foi traído, o sr. admite que foi omisso?

Não, eu não me omiti em defender o governo Lula. Sem aliança ampla a gente não governaria o País e o País poderia quebrar. Sou um militante que aprendeu que se ganha coletivamente. Não acredito em vitória do ‘eu sozinho’.

Nas conversas ali, o sr. nunca desconfiou que poderia estar havendo alguma ilegalidade?

Eu vivia inteiramente, 24 horas do dia dedicado à política, que era muito intensa. Reuniões intensas do diretório, da bancada, com os aliados, ministros. Eu vivo a política de maneira integral. Nem quando fazia minhas campanhas para deputado federal eu cuidava da administração. Eu gosto é de conversar, dialogar, convencer. A direção do PT é colegiada. O presidente do PT assina os documentos porque é exigência estatutária quando presta contas. Minha relação com os companheiros do PT sempre foi muito franca e muito sincera. Relação de militantes e combatentes.

O sr. já conhecia o empresário Marcos Valério?

Eu conheci Marcos Valério de vista, em julho de 2003, numa visita a Ipatinga, na Usiminas. Isso está nos autos do processo. Nunca tratava com ele. Nunca fiz reuniões com bancos nem para tratativa de dinheiro. Eu me dedicava à política.

Qual sua relação com o ex-ministro José Dirceu?

Estive com ele na última reunião do Diretório Nacional, recentemente. Quando tem reuniões do PT eu me encontro com esses companheiros. Tenho relação partidária.

E com o ex-presidente Lula?

Lula sempre conversa comigo, fala comigo. Tenho respeito pela grande figura humana que é ele e por sua genialidade política.

A punição aplicada ao núcleo político do PT representa a condenação moral do governo Lula?
Eu não aceito que essa condenação seja justa porque não está baseada em provas, em consistências de documentos, de perícias. São narrativas com deduções, ilações e criando a história da verossimilhança. Entendo que o método do juiz não é igual ao da acusação. Essa é uma lição que eu aprendi quando tentei fazer Direito, mas fui cassado. Esse julgamento vai ser muito discutido, no meu modo de entender. O julgamento do governo Lula foi realizado em 2006 e em 2010, quando ele elegeu a presidenta Dilma sua sucessora.

Ele disse isso em entrevista ao La Nación...

Eu concordo e estou reafirmando.

O sr. se sente abandonado pelo PT?

Considero essa pergunta ofensiva, com todo respeito. Tenho recebido inúmeras manifestações. Meu telefone não para. Essa casa é visitada permanentemente. Tenho recebido solidariedade do Brasil inteiro. Falei com a presidenta Dilma. Disse para ela o que escrevi na Carta Aberta ao Brasil: "Retiro-me do governo com a consciência dos inocentes". Não quero criar qualquer tipo de embaraço para o governo da presidenta Dilma. Tenho relação de muito respeito por ela, pela sua competência e coragem. Sempre fui tratado com muito carinho. Foi a militância do PT que segurou a minha eleição (para deputado federal), em 2006. Quando entrei na reunião do Diretório Nacional (no último dia 10), militantes de todas as tendências, de pé, gritaram o meu nome. A história do PT é a minha história porque não foi em vão nem foi fácil tudo isso que foi feito. Tenho recebido do PT solidariedade e apoio, o que me orgulha muito.

No PT usa-se o argumento de que o mensalão começou em Minas, no governo de Eduardo Azeredo, do PSDB. O sr. considera aceitável que o PT, sempre pregando a ética na política, tenha seguido o mesmo caminho? Uma coisa justifica a outra?

Não vou entrar nessa discussão sobre processos de outros partidos. Não vou opinar. O meu silêncio é quem fala. Quero discutir minha condenação, que foi injusta. Vou discutir até o fim. Serei obrigado a cumprir as imposições da Corte, mas vou discuti-las. Sou da geração em que é proibido proibir.

O sr. vai recorrer à Corte internacional?

Temos de esperar o término do processo. Vou lutar de todas as formas para provar a minha inocência. Eu já vi na história culpados serem inocentados. A minha geração aprendeu uma coisa: "Não se dobra". As noites escuras são longas, mas a minha paciência é maior. Aprendi isso na vida.

O sr. foi preso político por ter militado na guerrilha do Araguaia, na ditadura militar. Agora, pode retornar à prisão sob a democracia. Isso não o abala?

As cicatrizes nos preparam melhor para enfrentar os golpes da vida. O meu estado de espírito é de um lutador. É como se eu estivesse em 1968, no Araguaia, na prisão política, na Constituinte, nas obstruções do Congresso, na fundação do PT. Quem tem a consciência do inocente não se curva, não se dobra. Não me dobrarei. Minha vida não foi para fazer riqueza nem para aumentar patrimônio. Minha vida foi para lutar por sonhos e causas. A palavra de ordem é resistir e preparar a luta dentro dos marcos da democracia.

Sua vida política acabou?

(Pausa) Não. A vida política de nenhum cidadão se acaba. Às vezes a situação fica mais difícil, mas a gente sempre encontra formas de lutar. Os valores que fazem parte da minha vida são perenes e eu luto por eles como um democrata, um socialista, um militante que fica indignado com as injustiças. A frase que mais me marcou do Che foi quando ele disse que um militante jamais pode aceitar a injustiça. Eu não aceito. Cumprirei as decisões que me forem impostas, mas vou lutar com os meios que eu tiver. Eu já lutei com tribuna, com microfone, com reunião e, nos anos 70, com outros instrumentos. Eu não vivo sem luta, não vivo sem política e não vivo sem ideal. Aprendi a lutar em qualquer situação. Até para quebrar a minha incomunicabilidade na prisão, eu e meus companheiros esvaziávamos a água do vaso sanitário para nos comunicar por ali. A gente chamava aquilo de telefone. Para me comunicar na cadeia eu aprendi o Código Morse, em São Paulo, em Brasília e no Ceará. A luta é um gesto, é um assobio, é um canto. A gente era proibido de cantar "Para não dizer que não falei das flores" na cadeia. Quando cantava, a gente sofria. Era proibido cantar "Apesar de você". Quando cantava, era uma vitória. Eu sou de uma época em que não podia entrar num restaurante, nos anos 70, porque tinha um cartaz com os dizeres "Procurado". Fiquei no Dops, no Carandiru, penitenciária, Barro Branco e presídio Paulo Salazar, no Ceará. Muitos culpados a história provou que eram inocentes. As pessoas dentro e fora do PT que confiam em mim podem continuar confiando, porque esse cidadão não vai se curvar. Vou lutar todos os dias, semanas, meses e horas para defender minha inocência.

Mas, para se defender, o sr. não precisa entregar alguns companheiros?

Nunca fiz isso na minha vida (bate com um livro na mesa). Nunca entreguei ninguém. Nem na tortura nem no pau de arara. Muito menos num processo que virou um grande espetáculo midiático, que a gente está enfrentando. Um grande amigo meu (Ozeas Duarte, ex-dirigente do PT) dizia para mim, em 2005: "Você tem que falar, você tem que falar". E eu disse: "Eu aprendi, com 24 anos, que para eu me defender não preciso prejudicar ninguém". A minha verdade sou eu e minha consciência.

Mas há uma história a ser contada aí...

Qual história?

Eu é que pergunto. O sr. disse que não se defende prejudicando os outros. Está protegendo alguém?

Não. A história que tem que ser contada, e a gente tem que ter paciência, é porque a verdade sempre prevalecerá. O que há de terrível e belo é que, quando procuramos a verdade, dizia um ensaísta francês, nós a encontramos. É do livro Memórias de um Revolucionário (1901-1941), de Victor Serge. Não sou da geração que se empolga com cargo, dinheiro, prestígio, vantagem. Sou da geração que ficou um ano em solitária e não perdeu a esperança.

O PT precisa fazer uma autocrítica de suas práticas depois das eleições?

Estamos tendo grande vitória política e eleitoral e estou torcendo para que a gente consolide isso no segundo turno. O PT aprendeu que na unidade, ganha; quando se divide, perde. Não pode se isolar e é necessário fazer alianças. O PT é vitorioso politicamente e é nesse clima que tem de discutir a sua história, a sua experiência. Um partido é como a vida: a gente vai vivendo, aprendendo e amadurecendo. É legítimo um partido querer continuar no poder. Se há uma grande questão a ser colocada na pauta pelo PT é discutir uma reforma política profunda, com base no financiamento público e na fidelidade partidária. Não se trata de acerto de contas. A tarefa do PT é muito grande para ficar se perdendo nessas questões.

Isso resolve?

Problemas sempre vão existir, mas a crise da política tem que ser resolvida pela política. Não é pelo Judiciário. A Justiça trabalha, muitas vezes, com o retrovisor. A política trabalha com para-brisa.

Por que o sr. diz que a Justiça trabalha com o retrovisor?

Ela trabalha com fatos acontecidos. A política é para o futuro. Será que existiria esse bichinho aqui (aponta para a Constituição de 1988, na prateleira) sem quebra-pau, sem briga?

O candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad, disse que as condenações no partido representam uma depuração na política. Não seria essa a autocrítica?

A missão do Haddad é vencer a eleição. E vai vencer. Ponto. Assim como vamos vencer em Fortaleza, em Campinas, em Salvador...

Como o sr. vê a tentativa do candidato do PSDB, José Serra, de vincular Haddad ao mensalão?

Eu conheço Serra porque fui constituinte e deputado com ele. Tenho uma relação pessoal respeitosa. Sinceramente, acho que essa atitude é desespero dele e uma decepção para mim.
Por que o sr. diz que a crise do mensalão foi o seu segundo AI-5?

Quando foi decretado o AI-5, eu entrei na clandestinidade e fui perseguido. Quando estourou a crise do PT de 2005 e se iniciou a Ação Penal 470, a maneira como alguns segmentos trataram o partido e a minha pessoa foi de perseguição e isso me lembrou o Ato Institucional n.° 5. Tentaram me interditar e não conseguiram.

Como é uma pessoa com sua trajetória política ser tachada agora de corrupto?

Eu não sou corrupto. Nunca pratiquei qualquer ato de corrupção. Nunca pratiquei qualquer associação criminosa e tenho a consciência tranquila. Estou sendo acusado e condenado numa injustiça monumental. Vou lutar com a energia do combatente que prefere correr risco a baixar a cabeça. Um grande amigo meu, político, mas não do PT, disse: "Genoino, somos de uma geração que foi encurralada, mas nós não nos dobramos".

O sr. se arrepende de alguma coisa? O que o sr. não faria novamente se o ex-presidente Lula ganhasse a eleição agora?

Na minha história, mesmo em momentos muito duros, não existe a palavra arrependimento. Tudo o que fiz foi legal e politicamente legítimo. Fiz coisas corretas, conscientes, para construir uma causa justa, que está se materializando em melhorar a vida das pessoas. Nunca esqueço quando Lula me chamou no Palácio e disse: "Estou comunicando que o salário mínimo de 2004 que vou assinar é esse (R$ 260). Eu não posso assinar mais do que isso porque boto o País em risco". Aí eu fui para a rua e fui criticado. Mas não me arrependo. Era muito fácil, depois do que aconteceu no Araguaia, eu culpar alguém. Todas as minhas escolhas foram conscientes e eu assumo a responsabilidade por elas. (Genoino mostra uma charge dele na parede, feita no programa Roda Viva, com o título "Eu sou o responsável"). Eu nunca fugi da briga, da responsabilidade e do risco. A política não é uma coisa que você faça cálculo para tirar esse ou aquele proveito. A política para mim é paixão. Sempre defendi a mais ampla negociação possível, mas sei o lado da cadeira em que me sento. Tenho muitos amigos em partidos que não apoiam o governo. Um deles me disse: "Eu acredito em você porque o conheço". Então, é isso que me vale. Sei separar a relação humana da ideologia e da política.

É verdade que o seu pai perguntou ao sr. por que Lula fazia muito pelo Brasil, mas não o ajudava?

Meu pai, Sebastião Genoino Guimarães, vai fazer em novembro 90 anos. Vive com uma pensão do INSS, mora na mesma casa em que eu nasci, no Encantado (CE). Ele disse para mim o seguinte: "Meu filho, eu quero entender. Você é filho mais velho e ia ser o doutor da família. A política o tirou da universidade. Você queria sair da roça para estudar e voltou para a roça para fazer guerrilha. Você virou deputado famoso por São Paulo e não ficou rico. O Lula está melhorando demais a nossa vida, mas e isso que está acontecendo com você? É o destino?" Aí eu disse: "É, pai, é o destino da luta". Ele ficou calado. Sempre que estou com meu pai ele faz essas perguntas. Lá onde ele mora a comunidade é muito feliz com o governo Lula.

O sr. disse que o seu julgamento não foi isento e que os ministros do STF foram pautados por comentaristas políticos. O ex-presidente Lula e a presidente Dilma escolheram mal os representantes do STF, já que são responsáveis pela indicação de 8 dos 11 ministros?

O governo do PT nunca usou critérios de posições políticas para indicar ministros do STF. Não estou avaliando esse ou aquele ministro. Estou falando de fato concreto, de decisões sobre o meu julgamento.

O sr. ficou decepcionado com o voto do ministro José Antonio Dias Toffoli, que foi advogado do PT e o condenou?

Sempre tive uma relação formal com o ministro Toffoli. E essa relação formal e respeitosa me coloca na seguinte situação: sobre o voto do ministro Toffoli quem fala é o meu silêncio.

O sr. defende o controle do Judiciário?

A Emenda Constitucional n.º 96, que estabeleceu o controle externo através do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público é de minha autoria. O Judiciário é um poder autônomo, que a gente respeita e tem independência em relação a governos, partidos, mídia e opinião pública. A atividade jurisdicional não pode ser controlada. Agora, há uma coincidência matemática do julgamento com as eleições. Mesmo sendo obrigado a cumprir (a sentença), tenho o direito de discutir qualquer decisão do Judiciário.

No dia da votação, o sr. disse que a ditadura, hoje, é a da caneta e que jornalistas são abutres que torturam a alma humana. O sr. quer controlar a mídia?

Eu defendi na Constituinte a plena liberdade da imprensa e ajudei a aprovar a Lei de Acesso à Informação. O meu desabafo ocorreu porque fui procurado naquele dia por um grupo de jornalistas. Eu disse: "Não vou falar". A maioria respeitou. Apenas um jornalista me seguiu até a cabine, colocou um gravador na minha boca e começou a fazer perguntas em voz alta, me provocando. Eu disse que ele se comportava como abutre que tortura a alma humana. Sou contra o controle da imprensa e é necessário que se respeite o direito à informação. Mas, assim como a liberdade de imprensa é cláusula pétrea, os direitos individuais também fazem parte disso e temos que equilibrar para que o monopólio dos meios de comunicação não dê a última palavra.

A carta de sua filha, Miruna, dizendo que sua família entra agora num período de incertezas, o emocionou?

Muito. Aliás, é a segunda carta da Miruna que me emociona muito. A primeira foi quando aconteceu a crise de 2005, assim como a carta desse aí (aponta para o filho, Ronan, e fica com a voz embargada). Porque eles nasceram e se criaram aqui. Eles sabem o que eu ofereci: uma relação muito franca, de amor muito profundo. Eu disse para meus filhos o seguinte: "O pai de vocês não tem riqueza, mas tem honra e dignidade e vocês jamais terão vergonha dele. Diante da humilhação e da servidão, o pai de vocês prefere o risco do combate". Eles concordam comigo.






Entre o jogo do poder e o teatro da política



Quando foi conveniente para os dois, Luizianne Lins e Cid Gomes fizeram juras de fidelidade política. Ao longo dos últimos seis anos, interesses eleitorais falaram mais alto. Mas há quem diga que a rixa em Fortaleza é pontual


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Nas extremidades, a prefeita Luizianne e o governador Cid: aliança com provocações de lado a lado, sempre de olho nas urnas
Agora que estão em lados opostos do ringue na disputa pela Prefeitura de Fortaleza, nas propagandas políticas e em debates acalorados entre militantes, a prefeita da Capital, Luizianne Lins (PT), e o governador Cid Gomes (PSB) parecem inimigos mortais. Em meio a ofensivas de ambas as lideranças, o clima do segundo turno passa a mostrar, com mais clareza, o abismo político entre os chefes dos executivos municipal e estadual.

Embora tenham constituído forte aliança por seis anos no Ceará, Cid e Luizianne nunca viveram em “um mar de rosas”. Nem mesmo o objetivo comum de eleger a presidente Dilma Rousseff (PT), em 2010, diminuiu a distância entre eles. Na época, os dois passaram os quatro meses de campanha sem dividir o mesmo palanque. Só haviam se encontrado em junho daquele ano, no encontro estadual do PT, quando Cid aceitou apoiar o agora senador, José Pimentel (PT), e, em troca, o PT abriu mão de indicar a vice do governador.

Para além dessa “incompatibilidade de agendas”, vários episódios de desavenças marcaram os seis anos de aliança. Desde 2008, por exemplo, a indicação por Cid de Tin Gomes (PHS) como vice de Luizianne foi motivo de divergências. Em 2010, a tentativa frustrada de construção de um estaleiro em Fortaleza, como queria o governador, e a indicação do vice de Cid pelo PT, como queria a prefeita, também apontavam para um esfacelamento da união.

As trocas de agressão do chefe da Casa Civil do Governo do Estado, Arialdo Pinho, e o irmão do governador, à época chefe de gabinete de Cid, Ivo Gomes (PSB), contra a prefeita, que responsabilizou a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) pela maior parte dos buracos de Fortaleza, renderam, ainda, muito desgaste para a já fragilizada aliança entre PT e PSB na Capital.

Jeito parecido
Apesar das desavenças, a trajetória política de Cid e Luizianne e a maneira como fazem articulações nos mostram muitos pontos de convergência entre as duas lideranças. Tanto ele quanto ela possuem estilo centralizador de construir parcerias e trazem para si, por meio de seu personalismo, a tarefa de conduzir os processos decisivos e aglutinar aliados.

Os dois são os dirigentes estaduais de suas siglas e têm o controle partidário, que os credencia para definirem os principais caminhos a serem seguidos por suas legendas, como a escolha de nomes e a composição de alianças em torno das candidaturas que defendem e que atendem às suas ambições políticas.

Até mesmo o fato de terem passado tanto tempo aliados é, em si, um ponto de convergência entre os dois. O deputado estadual petista e secretário de Desenvolvimento Agrário do Governo Cid, Nelson Martins, por exemplo, destaca que o impasse “da eleição da Prefeitura de Fortaleza é uma questão pontual. Eles continuaram tendo aliança no primeiro turno, em vários municípios, e no plano nacional”. Ele afirma que ambos são “excelentes” articuladores políticos. “A prova maior disso é que eles conseguiram aglutinar vários partidos ao redor das suas candidaturas”, completa Nelson.

A ideia é endossada pelo também deputado do PT Dedé Teixeira, que está mais engajado na campanha petista na Capital. Mas com um destaque: “a Luizianne é muito política, faz muito bem a política. O governador tem um semblante mais de gestor, mas também conhece a política”. (Ranne Almeida - ranne@opovo.com.br)

Frase

A prova maior disso (tendência de reaproximação) é que eles conseguiram aglutinar vários partidos ao redor das suas candidaturas

Nelson Martins , deputado estadual pelo PT de Luizianne e integrante do Governo Cid


http://www.opovo.com.br/app/opovo/politica/2012/10/20/noticiasjornalpolitica,2939986/entre-o-jogo-do-poder-e-o-teatro-da-politica.shtml

O embate por trás das candidaturas

 Ou o que significa, para Luizianne Lins (PT) e Cid Gomes (PSB), a vitória ou a derrota de seus afilhados políticos na definição do 2º turno em Fortaleza



Para quem achava pouco provável que dois candidatos desconhecidos da maioria do eleitorado de Fortaleza fossem para o segundo turno das eleições, uma surpresa. Sob as bênçãos da prefeita da Capital, Luizianne Lins (PT), Elmano de Freitas (PT) conseguiu ir para a disputa final, junto com Roberto Cláudio (PSB), candidato que conta com o irrestrito apoio do governador Cid Gomes (PSB). A uma semana da eleição que apontará o próximo prefeito de Fortaleza, a aliança que uniu PT e PSB por seis anos, agora, coloca frente a frente, medindo forças, Luizianne e Cid, os dois principais representantes das duas legendas.

Durante debate exibido pela TV O POVO, na última quinta-feira, os dois candidatos confirmaram, em meio à troca de farpas, que existem politicamente graças às duas lideranças. É tanto que a maior parte das provocações mútuas não foi direcionada para os próprios prefeituráveis, mas para os dois “projetos políticos” que ali representavam.

O resultado das urnas no dia 28 - primeiro confronto entre as duas lideranças -já terá efeito direto na eleição de 2014. Caso o candidato petista vença a disputa, Luizianne Lins sai fortalecida para conduzir o PT na corrida pelo Governo do Estado. Já o sucesso de Roberto Cláudio abre caminho para que a sucessão de Cid Gomes seja uma das mais fáceis e previsíveis dos últimos tempos.

Questionamentos
Independente de quem vença a eleição, as marcas nos dois partidos serão inevitáveis. Luizianne e Cid foram aliados apenas por circunstâncias e conveniências, ou tinham um projeto que visava uma melhor gestão para Fortaleza?

O que os uniu e o que os tornou, agora, inimigos tão ferrenhos? O que levou Cid a conviver com o PT, apesar de desavenças pontuais com a prefeita? O que levou Luizianne a aceitar a convivência com o grupo dos Ferreira Gomes, antes tão rejeitado pelo PT?

http://www.opovo.com.br/app/opovo/politica/2012/10/20/noticiasjornalpolitica,2939975/o-embate-por-tras-das-candidaturas.shtml

Haddad diz que será caluniado na reta final da campanha



O Blog foi ao comício de sábado de Fernando Haddad no ginásio da Portuguesa, evento que contou com toda a cúpula do Partido dos Trabalhadores, incluindo a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, assistidos por uma impressionante massa humana.

Do “chiqueirinho” da imprensa – um palanque para jornalistas montado em frente ao palco em que estrelas petistas revezavam-se ao microfone –, espantou a quantidade de militantes que para lá acorreram.
A imprensa fala em 3 mil pessoas, o comando da campanha de Haddad fala em 7 mil. É difícil dizer quem tem razão, mas o fato é que a quantidade de militantes que ali compareceu foi impressionante.

Além de Lula e Dilma, falaram Aloizio Mercadante, Marta Suplicy, Michel Temer e Gabriel Chalita, entre outros políticos de expressão. Contudo, foi da fala de Haddad que transpareceu endosso a boato que vem se espalhando desde meados da semana passada.

O grande fato do comício foi produzido pelo próprio Haddad, quem, em sua fala, afirmou que, durante esta semana final da campanha, entrará em campo um terceiro adversário: a “mentira”.

A insinuação do candidato atende a expectativa sempre presente sobre denúncia de última hora contra petistas em campanhas eleitorais, o que já se tornou corriqueiro devido à inevitável ocorrência em todas as eleições mais visíveis que envolvam o PT.

Estranhamente, porém, a edição de Veja desta semana não trouxe a esperada “bala de prata” que a revista costuma disparar contra petistas às vésperas de eleições. Desde 2006, a cada eleição majoritária que envolve um petista e José Serra as denúncias da publicação sempre comparecem.

Essa  denúncia de última hora da campanha de Serra ou – mais provável – da mídia aliada ao PSDB, porém, já demorou mais do que o normal. Se não vier até terça ou quarta-feira, seja qual for o teor dificilmente elidirá diferença tão grande entre o petista e o tucano.

Durante a campanha, houve só uma denúncia (fraca) contra Haddad por parte da Folha de São Paulo, mas não prosperou. Esse histórico sugere que os adversários do petista não conseguiram encontrar nada que valesse a pena usar.

Chega a ser temerário dizer que pode não aparecer denúncia, mas o tempo para aparecer e ter chance de funcionar já está praticamente esgotado.

O Blog conversou com políticos como o coordenador da campanha petista, vereador Antonio Donato, com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e com o vereador e ex-presidente do PT paulistano José Américo.

Todos esses expoentes do PT pareceram extremamente confiantes na vitória de Haddad, apesar de todos parecerem igualmente confiantes no surgimento da tal denúncia tucano-midiática.

Encontrei Lula, também. Estava muito suado, bem mais do que outros que estiveram consigo no palanque. Ganhei um dos abraços com que costuma brindar a todos. Após o cumprimento, disse que não iria dar entrevistas porque não se sentia bem.

http://www.blogdacidadania.com.br/2012/10/haddad-diz-que-sera-caluniado-na-reta-final-da-campanha/

Supremo blindado


Depois de reforçar a segurança para o julgamento do mensalão, o STF vai contratar mais 90 homens para fazer a escolta pessoal dos ministros

Josie Jeronimo

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TUDO DOMINADO
Para evitar incidentes, o STF já havia contratado 40
seguranças para atuar durante o julgamento do mensalão

A capa preta e a caneta do relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, fizeram com que o magistrado fosse comparado a um herói justiceiro dos quadrinhos na internet. Na vida real, porém, Barbosa tem recorrido a guarda-costas para se proteger. Desde o início do julgamento, o ministro não dá um só passo sem a escolta de sete homens, que ele requisitou ao Supremo Tribunal Federal. A operação de blindagem que alterou a vida do relator do mensalão desde o início do processo não será exclusividade dele. Na próxima terça-feira, o STF vai contratar 90 homens para fazer a segurança pessoal dos magistrados. A Corte está preocupada com a proteção dos ministros após o fim do julgamento. O preço do serviço é estimado em R$ 6,3 milhões, registra o edital do pregão, e o número de seguranças que escoltará cada ministro será uma decisão pessoal dos magistrados. O ministro Marco Aurélio de Mello, por exemplo, mais preocupado em manter a privacidade, terá apenas quatro seguranças. “Continuo protegido pelos meus jurisdicionados”, brincou. A maioria dos ministros terá escolta de oito seguranças. Joaquim Barbosa, por sua vez, que assumirá a presidência do STF em novembro, aumentará sua segurança. Contará com a proteção de dez homens divididos em dois turnos, quatro de dia e seis à noite. Para entrar na vida dos magistrados e fazer a segurança pessoal, os guarda-costas terão remuneração de R$ 8 mil mensais, receberão treinamento especial, além de informações sobre os hábitos, rotina e vida familiar dos ministros. Também precisarão assinar um termo de sigilo, que os impede de revelar a terceiros dados sobre a intimidade das autoridades, explica o especialista em segurança Irenaldo Pereira Lima, presidente do Sindicato das Empresas de Segurança do Distrito Federal. A arma-padrão para o serviço é uma pistola calibre 38, guardada em um coldre embaixo da axila.

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SEM SUSTOS
A Corte está preocupada com a proteção dos ministros após o fim do
julgamentodo mensalão. A maioria dos ministros terá escolta de oito seguranças

O efetivo já havia sido reforçado para fazer a segurança do STF durante o julgamento do mensalão. O contrato do serviço recebeu um aditivo para que, do dia 2 de agosto ao dia 1º de outubro, 40 homens se juntassem ao “exército” de 295 vigilantes do Supremo para evitar qualquer surpresa desagradável. Os funcionários foram alertados sobre a possibilidade de pequenos atentados envolvendo militantes políticos e grevistas, que em agosto protestavam na Esplanada dos Ministérios. O planejamento de proteção aos ministros começou em maio. Naquele mês, três experientes profissionais da área de inteligência e ações práticas de órgãos policiais foram cedidos ao STF para coordenar os trabalhos. A preparação para enfrentar qualquer tipo de incidente durante o julgamento histórico também contou com a compra de modernos dispositivos de monitoramento das instalações do prédio da Corte e dos veículos usados pelos ministros. Para isso, no início do ano, o Supremo adquiriu aparelhos de rastreamento de carros por satélite, fechou contrato com uma empresa que fornece programas de detecção de rostos e placas para equipar a garagem e comprou novo aparelho de varredura contra grampos telefônicos, ao preço de R$ 182 mil.

Para evitar o contato dos magistrados com passageiros no aeroporto de Brasília, uma sala especial de embarque também foi alugada desde agosto. Custa R$ 18 mil mensais. A estratégia de segurança também passou pela troca de fechaduras de portas e gavetas. Em junho, o STF abriu concorrência para contratação de serviços de reparo e troca de segredo de 650 trancas e confecção de novas chaves, a um custo de R$ 66 mil. O zelo aparentemente extremo é comum e faz parte das medidas preventivas de proteção adotadas em todo o mundo, explica o especialista em segurança Jorge Lordello. Ele lembra o recente flagrante da funcionária do setor de limpeza de um tribunal nos Estados Unidos, que arrombou uma gaveta para furtar documentos. De acordo com Lordello, as salas dos ministros também devem ser locais reservados, para evitar o roubo ou do acesso a documentos sigilosos.

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A última fase do julgamento, na próxima semana, é um momento especialmente tenso, aponta o especialista, pois durante o anúncio das penas os magistrados estarão selando o destino de muitos réus: “No Brasil existem grupos organizados criminosos. Isso infelizmente é comum. Os ministros não estão livres dessa atuação. O trabalho deles gera contrariedade em vários níveis. Esse julgamento todo é crítico. E o momento da dosimetria das penas leva a uma maior tensão.” Os magistrados lhe dão razão. Dias atrás, um dos ministros comentou não manter nenhuma ilusão de ser “invunerável”.

http://istoe.com.br/reportagens/247289_SUPREMO+BLINDADO

A politica das agressões


O candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, José Serra, esquece as propostas para a cidade, parte para o ataque contra o concorrente do PT, Fernando Haddad, agride verbalmente jornalistas e despenca nas pesquisas às vésperas do 2° turno

Pedro Marcondes de Moura e Alan Rodrigues

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DESTEMPERO
A 17 pontos do petista Fernando Haddad, Serra se desespera e
passa a utilizar uma tática agressiva na reta final da campanha

Vendo que a distância para o concorrente Fernando Haddad (PT) aumenta a cada nova pesquisa de intenção de voto, a uma semana do segundo turno da eleição à Prefeitura de São Paulo, o candidato do PSDB, José Serra, reedita a malfadada estratégia usada contra Dilma Rousseff na disputa presidencial de 2010. Diante das projeções nada alvissareiras para ele – o instituto Datafolha aponta uma vantagem de 17 pontos para Haddad –, Serra passou a enxergar na tática das agressões a única forma de evitar a derrota que parece se avizinhar. Destemperado e irascível no trato com jornalistas e até correligionários, o tucano acionou a metralhadora giratória nos últimos dias. Em atos públicos e, principalmente, nas inserções de rádio e televisão, Serra desferiu uma série de ataques ao oponente. Insistiu na tentativa de vincular Haddad aos réus do mensalão e explorou de maneira equivocada a confecção do chamado “kit gay” pelo petista durante sua gestão no Ministério da Educação.

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“Isso não é combater homofobia, é uma espécie de doutrina. O problema do kit gay é acima de tudo pedagógico”, declarou o candidato do PSDB. O ataque se voltou contra ele próprio, quando o jornal “Folha de S.Paulo” revelou, durante a semana, que material semelhante destinado a tentar combater o preconceito a homossexuais havia sido distribuído em 2009, pelo governo de Serra, para escolas públicas paulistas. Questionado sobre a contradição, Serra tentou, em vão, diferenciar as duas iniciativas, perdeu a cabeça e mergulhou sua campanha numa agenda negativa na reta final da eleição.

Ataques a jornalistas Descontrolado, Serra agrediu verbalmente jornalistas em três ocasiões. Na segunda-feira 15, indagado por uma repórter do portal UOL se o tom mais agressivo de seu primeiro programa do segundo turno guardava relação com a diferença então de dez pontos percentuais em relação a Haddad nas pesquisas, disse que ela estava ajudando a campanha petista.

Na terça-feira 16, quando a mesma profissional perguntou se o tucano concordava ou não com o uso de materiais de combate à homofobia nas escolas, Serra esquivou-se de responder e sugeriu que a repórter deveria ir trabalhar no comitê do PT. Já em entrevista à rádio CBN, o ex-governador incomodou-se com questões colocadas pelo jornalista Kennedy Alencar, a quem chamou de mentiroso e acusou de fazer campanha para o adversário.

A postura adotada pelo tucano foi criticada por Soninha Francine, do PPS, candidata derrotada no primeiro turno e apoiadora da campanha do PSDB. “Eu não concordo com esse jeito dele de reagir. Mas, infelizmente, ele (Serra) é assim, não tem paciência com a imprensa.” O resultado não poderia ser pior. Nos últimos dias, as propostas para a cidade, que é o que importa para o eleitorado, foram relegadas a segundo plano pelo candidato do PSDB. E sua rejeição junto à população bateu incríveis 52%.

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Na batalha pelo comando da capital paulista, José Serra parece mandar às favas a premissa do marketing político segundo a qual “quem bate, perde”. Pesquisa da empresa Controle da Concorrência aponta que, durante o primeiro turno, o ex-governador gastou 16,57% de suas 4.874 inserções no horário comercial televisivo em ataques ao adversário petista, mesmo com a liderança de Celso Russomanno (do PRB) até as vésperas do pleito. Foram 666 inserções endereçadas apenas a atacar Haddad e outras 142 que citavam, além do ex-ministro da Educação, outros postulantes. No mesmo período, Haddad destinou 7,75% do seu espaço a críticas ao adversário tucano. O petista elencou como principais motes a renúncia de Serra ao cargo de prefeito em 2006 e a administração do prefeito Gilberto Kassab, considerada ruim ou péssima por 42% dos eleitores. O coordenador-geral da campanha tucana, o deputado federal Edson Aparecido, tenta minimizar os efeitos da estratégia, que, até agora, se revela equivocada. “Mostrar as falhas de Haddad no comando do Ministério da Educação é discutir a capacidade dele de gerir uma cidade como São Paulo”, diz Aparecido. “Isso não pode ser confundido com agressividade. Faz parte de qualquer campanha”, comenta.

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Tática de risco Para o consultor político Gaudêncio Torquato, no entanto, trata-se de uma tática muito arriscada e que, normalmente, não gera resultados. “Em grandes centros urbanos, os ataques pessoais, acusações ou tentativas de destruir a imagem de candidatos não costumam produzir resultados. Apenas reforçam a opinião daqueles que já são eleitores deste ou daquele partido”, comenta o professor da Universidade de São Paulo (USP). Segundo Torquato, o eleitor, em geral, prefere uma campanha baseada em propostas. “O eleitorado quer uma campanha propositiva em que o candidato se mostre capaz de solucionar os problemas da cidade”, analisa. Para o estudioso, o único ataque capaz de alterar votos é aquele que consegue desconstruir as propostas feitas pelo opositor. Foi o que ocorreu com o Celso Russomanno (PRB) no primeiro turno da eleição paulistana. “O Russomanno caiu vertiginosamente depois de baterem em sua ideia de atrelar o preço das tarifas de ônibus às distâncias percorridas pelo passageiro”, lembrou Torquato.
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Diante do cenário favorável apontado pelas pesquisas, a ordem no QG do concorrente de José Serra, o petista Fernando Haddad, é usar materiais negativos apenas para neutralizar eventuais ofensivas do tucano Serra. Foi seguindo esta estratégia que Had­dad propôs a Serra, durante o debate da Rede Bandeirante na quinta-feira 18, uma espécie de armistício para retirar as ofensas da pauta do segundo turno e promover uma campanha voltada a ideias para a cidade. “Fica o meu convite para que as duas equipes se reúnam amanhã e estabeleçam um protocolo para que esses ataques pessoais saiam de cena e tenhamos uma semana mais propositiva”, propôs Haddad. “Temos que discutir exclusivamente as propostas”, afirmou. Nos bastidores do staff do PT sabe-se, no entanto, que até a eleição do domingo a escalada de agressões tende a crescer. Vislumbrando possíveis denúncias do lado tucano, os petistas guardam munições nas mangas. “Se a campanha do Serra vier com algum denuncismo de última hora, vamos trazer à tona temas que envolvem crimes financeiros de pessoas próximas a ele”, diz um dos coordenadores da candidatura petista.

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Crítica de aliados Apesar de o núcleo da campanha do PSDB ainda manter discurso otimista e desqualificar os resultados das pesquisas que apontam uma diferença de 16 a 17 pontos de vantagem de Haddad sobre Serra, dirigentes da legenda já admitem que as chances do ex-governador vencer a corrida pela prefeitura de São Paulo tornaram-se remotas. O tucano passa por uma trajetória de queda até entre o eleitorado cativo do partido. Em conversas com interlocutores, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou duramente a condução da campanha. “A campanha de Serra flerta com o conservadorismo”, disse FHC, presidente de honra do PSDB. O ex-governador Alberto Goldman também demonstrou contrariedade com o tom adotado por Serra. “Se fosse ele, não alimentaria o debate sobre o kit gay. Diria que não tem nada a ver com a eleição”, afirmou Goldman. O uso do kit gay por Serra irritou até o presidente do PSDB, Sérgio Guerra. “Em São Paulo, a campanha resvala para elementos que não são os mais relevantes. Se foi mamãe que fez o kit gay ou se foi vovó que assinou”, criticou Guerra.

Antes de aceitar ser candidato ao Executivo Paulistano, José Serra comparava a atual disputa eleitoral a um funeral. Se vencesse, receberia honras militares. Porém, se perdesse, seria “enterrado como indigente”. No domingo 28, as urnas nortearão o seu destino.
Fotos: Ale Cabral/Futura Press; Marlene Bergamo/Folha Imagem
Fonte: Controle de Concorrência
Fotos: Adriana Spaca/Brazil Photo Press/Folhapress; Paulo Pinto
Fotos: HELVIO ROMERO/AG. ESTADO/AE; joão castellano/ag. istoé


http://istoe.com.br/reportagens/247319_A+POLITICA+DAS+AGRESSOES