terça-feira, 31 de maio de 2011

Quais são as vidas que valem mais?

Quais são as vidas que valem mais?








Bin Laden provocou a morte de cerca de duas mil e seiscentas pessoas nos EUA, audácia que foi punida com seu assassinato. O sérvio Radko Mladic ordenou a morte de oito mil europeus brancos e será julgado no Tribunal Penal Internacional. Bernard Munyagishari, um dos líderes do genocídio de Ruanda (foto), levou a cabo a execução de 800 mil negros africanos, numa das mais tristes tragédias do século XX. De sua captura nem se ouviu falar. Atentados no solo da potência hegemônica, genocídio de brancos na Europa e genocídio de negros na África são crimes muito diferentes? Quais são as vidas que valem mais? O artigo é de Larissa Ramina.





Por Larissa Ramina (*)





Por ocasião do assassinato de Bin Laden, muitas declarações de autoridades ao redor do globo atestaram que a justiça fora feita. Evidente inverdade. Não se trata de defender o terrorismo, a Al Qaeda ou o próprio Bin Laden. Por óbvio, ninguém poderá ser insensível à tragédia de 11 de setembro, nem tampouco desejar que os culpados não sejam julgados e condenados. Entretanto, para condenar é necessário julgar.





Não é possível falar em justiça quando um homem é assassinado por um comando em um país estrangeiro ao seu, ainda que seja um terrorista do calibre de Bin Laden. Trata-se da aplicação da Lei de Talião: olho por olho, dente por dente, ou em outras palavras, vingança. Ao contrário da justiça, a vingança não impõe uma investigação que confronte os fatos, a produção de provas, o trabalho de advogados e promotores, com respeito ao princípio da legalidade, da ampla defesa e do contraditório. A vingança não exige uma condenação com circunstâncias atenuantes ou agravantes, e uma pena dela resultante. Assassinar um terrorista não é, portanto, fazer justiça. É assassinato. Podemos ponderar que mesmo o julgamento de Nuremberg seria mais legítimo do que a morte de Bin Laden.





A operação norte-americana que assassinou o terrorista em Abbottabad faz lembrar a tentativa de resgate dos reféns da Embaixada dos EUA em Teerã, por ocasião da Revolução Islâmica comandada pelo Aiatolá Khomeini em 1979. Jimmy Carter, na época, orquestrou uma operação militar audaciosa que foi mal-sucedida, fazendo com que perdesse a reeleição para Ronald Reagan. Provavelmente Obama não amargará sorte semelhante, apesar de ter violado a soberania do Paquistão e princípios fundamentais do direito internacional e dos direitos humanos.





Poucos dias depois da operação em Abbottabad, a Sérvia anunciou a prisão de Radko Mladic, que será levado a julgamento perante o Tribunal Penal Internacional sediado em Haia. Provavelmente a localização de Bin Laden fez com que a Sérvia, que pretende abrir caminho para uma futura adesão à União Europeia, perdesse argumentos para continuar acobertando o “Açougueiro da Bósnia” ou o “Átila dos Balcãs”.





Mladic é responsabilizado pelo massacre de Srebrenica de julho de 1995, o pior extermínio étnico perpetrado em solo europeu após a 2ª Guerra Mundial. Oito mil homens e meninos bósnios-muçulmanos foram exterminados num campo de refugiados sob proteção de trezentos soldados das Nações Unidas. Falha inexplicável, agravada pela lentidão da reação ocidental, que veio somente após três dias de matança.





Nesse mesmo dia, foi anunciada a prisão no Congo de Bernard Munyagishari, líder da milícia hutu Interahamwe e um dos responsáveis pelo genocídio de Ruanda, em 1994. Na ocasião, oitocentos mil tutsis e hutus moderados foram assassinados, e milhares de mulheres tutsis foram estupradas sob os olhos inertes da comunidade internacional. O acusado será julgado no Tribunal Penal Internacional para a Ruanda, com sede na Tanzânia, mas a notícia não mereceu a devida atenção da mídia ocidental.





Quais são as razões para tratamentos tão diferentes? Bin Laden provocou a morte de cerca de duas mil e seiscentas pessoas em solo norte-americano, audácia que foi punida com seu assassinato. Mladic ordenou a morte de oito mil europeus brancos, será julgado no Tribunal Penal Internacional, e sua captura foi festejada no Ocidente como o fim do isolamento internacional da Sérvia. Munyagishari, um dos líderes do genocídio na Ruanda, levou a cabo a execução de oitocentos mil negros africanos, numa das mais tristes tragédias do século XX. De sua captura nem se ouviu falar. Atentados no solo da potência hegemônica, genocídio de brancos na Europa e genocídio de negros na África são crimes muito diferentes? Quais são as vidas que valem mais?





http://mundonasminhasmaos.blogspot.com/2011/06/quais-sao-as-vidas-que-valem-mais.html



(*) Doutora em Direito Internacional pela USP, Professora da UniBrasil e do UniCuritiba.





Fonte: Carta Maior

Jornalista Syed Saleem Shahzad foi assassinado

terça-feira, 31 de maio de 2011







Syed Saleem Shahzad





De: Asia Times Online - 31/5/2011Asia Times Online journalist feared deadTraduzido pelo pessoal da Vila Vudu







Syed Saleem Shahzad, 40 anos, editor-chefe da sucursal de Asia Times Online em Islamabad, Paquistão – que estava desaparecido desde domingo à noite, quando não compareceu a entrevista marcada numa rede de televisão – pode ter sido assassinado, segundo informou hoje a polícia paquistanesa. Corpo ainda não identificado, mas que pode ser do jornalista, foi encontrado hoje num canal em Mandi Bahauddin na província de Punjab, cerca de 150 km ao sul de Islamabad onde o carro do jornalista fora localizado. (Agora, às 15h53, a notícia já foi confirmada.)



Para Ali Dayan Hasan, pesquisador da organização Human Rights Watch, Shahzad foi sequestrado e morto, provavelmente, por causa de artigo publicado dia 27/5 em Asia Times Online, no qual informa sobre infiltração da al-Qaeda na Marinha do Paquistão. ________________________________________Aqui vai, traduzido, o artigo do dia 27/5/2011, de Syed Saleem Shahzad, jornalista paquistanês que descobrimos na internet, que aprendemos a admirar, e do qual traduzimos vários artigos. A luta sempre continua.________________________________________



Al-Qaeda avisou que atacaria no Paquistão

27/5/2011, Syed Saleem Shahzad, Asia Times Online Al Qaeda had warned of Pakistan strikeTraduzido pelo Coletivo da Vila Vudu



ISLAMABAD. A al-Qaeda atacou a base naval paquistanesa PNS Mehran, em Karachi, dia 22 de maio, depois que fracassaram as negociações entre a Marinha do Paquistão e a al-Qaeda para a libertação de vários oficiais da marinha presos sob a acusação de trabalharem como contatos da al-Qaeda – como revelaram investigações conduzidas pelo jornal Asia Times Online.



As forças de segurança do Paquistão enfrentaram 15 horas de combate para reocupar a base naval, depois de a base ser invadida e ocupada por pequeno grupo de militantes fortemente armados.



Houve pelo menos 10 mortos e foram destruídas duas aeronaves de patrulha marítima e detecção de submarinos fabricadas nos EUA, P3-C Orion, no valor, cada uma, de 36 milhões de dólares, antes de alguns dos militantes conseguirem furar o cerco de milhares de soldados, e escapar.



Declaração oficial fala de seis militantes atacantes, dos quais quatro teriam sido mortos e dois teriam escapado. Fontes não oficiais dizem que os militantes que ocuparam a base eram 10, dos quais seis escaparam. Fontes de Asia Times Online confirmam que os militantes atacantes eram, todos, membros da Brigada 313, de Ilyas Kashmiri – o braço operacional da al-Qaeda.



Três ataques contra ônibus da Marinha, no qual morreram pelo menos nove pessoas, mês passado, foram ‘avisos’, e visavam a pressionar o comando da Marinha paquistanesa no sentido de libertar os oficiais suspeitos presos, como a al-Qaeda desejava.



O assassinato de Osama bin Laden dia 2 de maio no Paquistão, empurrou os vários grupos da al-Qaeda na direção de um consenso que até então não havia, sobre o ataque à base em Karachi – em parte vingança pela morte do líder, e, simultaneamente, ataque contra a capacidade de vigilância do Paquistão, sempre em disputa contra a Marinha indiana.



Mas o motivo mais profundo e de mais peso foi, sem dúvida, a reação contra a perseguição e a prisão em massa de simpatizantes e afiliados da al-Qaeda que há dentro da Marinha paquistanesa.



Um vulcão de militantes



Há várias semanas, a inteligência da marinha rastreou e localizou células da al-Qaeda em operação dentro de várias bases em Karachi – a maior cidade e porto chave no país.



“Sentimentos islâmicos são comuns e frequentes nas forças armadas” – disse a Asia Times Online alto oficial da Marinha que pediu para não ser identificado porque não tem autorização formal para falar à mídia.



“Jamais nos sentimos ameaçados por esses ou quaisquer outros sentimentos religiosos. Todos os exércitos do mundo, americano, britânico, indiano, todos eles, extraem da religião algum tipo de inspiração que ajuda a motivar os soldados, contra o inimigo. O Paquistão é resultado da teoria segundo a qual indus e muçulmanos são mundos separados e, portanto, não há como separar o Islã e os sentimentos islâmicos, e as forças armadas do Paquistão” – disse a esse jornalista o mesmo oficial.



“Apesar disso, observamos um movimento diferente, de formação de novos grupos, em várias bases navais em Karachi. Embora não se possa impedir soldados de praticar a religião ou de estudar o Islã, constatamos que esses novos grupamentos pregavam a rebelião contra a disciplina das forças armadas. A partir daí, iniciamos uma operação de inteligência na Marinha, para identificar responsáveis por pregação não desejada.”



O mesmo oficial explicou que os novos grupamentos estavam-se organizando contra a liderança das forças armadas – e contra, sobretudo, a aliança com os EUA contra a militância islâmica. Foram interceptadas mensagens que se interpretaram como planos para atacar oficiais norte-americanos em visita ao país. Nesse ponto, a inteligência paquistanesa interveio e foram detidos dez oficiais de Marinha, a maioria dos quais de baixo escalão, em várias ações.



“Foi o começo de graves problemas” – disse o oficial.



Os detidos estavam sendo mantidos num dos escritórios da inteligência em Karachi, mas antes que pudesse começar qualquer interrogatório, o encarregado das investigações foi diretamente ameaçado por militantes, que não deixaram qualquer dúvida de que sabiam exatamente onde os acusados estavam presos.



Imediatamente os acusados foram transferidos para local mais seguro, mas as ameaças continuaram. Para oficiais encarregados do caso, os militantes temiam que os interrogatórios levassem à revelação de outros membros da mesma organização também infiltrados nos quadros da Marinha. A partir daí, os militantes passaram às ameaças diretas. Deixaram bem claro que, se aqueles detidos não fossem libertados, começariam os ataques contra instalações navais.



Não havia qualquer dúvida de que os militantes continuavam a receber informação atualizada, porque sempre sabiam onde os detidos estavam, o que indicava infiltração considerável, pela al-Qaeda, nos quadros da Marinha. Convocou-se reunião de alto escalão da Marinha, na qual um oficial da inteligência insistiu em que o assunto fosse conduzido com extremo cuidado, para evitar consequências desastrosas. Todos concordaram, e decidiu-se abrir uma linha de comunicação direta com a al-Qaeda.



Abdul Samad Mansoori, estudante e ex-ativista sindical, hoje integrado à Brigada 313, criado em Karachi, mas que vive atualmente na área tribal do Waziristão Norte, foi contatado. E iniciaram-se as conversações. A al-Qaeda exigiu que todos os detidos fossem imediatamente libertados, sem mais interrogatórios. A exigência não foi aceita.



Os detidos foram autorizados a falar com familiares, que constataram que estavam sendo bem tratados, mas os oficiais da Marinha estavam interessados demais em interrogá-los, para poderem avaliar a extensão da penetração da al-Qaeda. A al-Qaeda foi informada que, depois de completado o interrogatório, os homens seriam expulsos da Marinha e libertados. A decisão não atendia aos interesses da Al-Qaeda. Como resposta, foram atacados os ônibus da Marinha, em abril.



Essa reação da al-Qaeda sugeriu aos agentes de segurança que haveria mais em jogo, do que a única célula da al-Qaeda que a Marinha já identificara. A partir desse momento, a segurança do Paquistão passou a temer que, se o problema da infiltração da al-Qaeda na Marinha não fosse adequadamente resolvido, logo poderiam surgir riscos graves também contra as linhas de suprimento da OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte].



Os comboios da OTAN são rotineiramente atacados depois de já terem partido de Karachi para o Afeganistão. Dada a situação em Karachi, os mesmos comboios ficariam expostos a ataques já no porto de Karachi. E os norte-americanos que frequentemente visitam as instalações navais na cidade também ficariam expostos a grave risco de ataque.



A Marinha então aprofundou as investigações e fez mais presos. Dessa vez, foram detidos oficiais de diferentes origens étnicas. Um dos detidos vinha da tribo Mehsud do Waziristão do sul, e parecia ter recebido ordens diretas de Hakeemullah Mehsud, chefe do grupo Tehrik-e-Taliban Pakistan (“Talibã Paquistão”). Outros eram originais da província Punjab e de Karachi, capital da província Sindh.



Depois que Bin Laden foi morto pelos SEALs da Marinha dos EUA em Abbottabad, 60 km ao norte de Islamabad, os militantes decidiram que o momento estava maduro para ações de maiores proporções.



Em uma semana, membros infiltrados da al-Qaeda na base aeronaval de Mehran forneceram mapas, fotos de várias rotas de entrada e saída, tomadas durante o dia e à noite, a localização dos hangares e detalhes da provável reação das forças externas de segurança.



Por isso, os militantes conseguiram entrar e sair da base, apesar de ser muito fortemente protegida. Dentro da base, um grupo destruiu as duas aeronaves, um segundo grupo cuidou da defesa contra o primeiro assalto das forças de segurança, e um terceiro grupo garantiu cobertura de retaguarda aos demais. Vários conseguiram escapar, graças a essa cobertura. Todos os que ficaram na retaguarda foram mortos.