domingo, 24 de julho de 2011

Atirador da Noruega usou bala especial, para causar dano máximo



DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

O responsável pelo massacre de sexta-feira na Noruega usou balas especiais no massacre da ilha de Utoeya, onde quase 90 jovens morreram, de acordo com informações de um dos médicos que atenderam as vítimas no Hospital de Ringriket, nas cercanias da capital Oslo.

O médico Colin Poole, chefe da divisão de cirurgia desse hospital afirmou à agência Associated Press que em pelo menos 16 corpos não foi possível recuperar as balas.

"Aquelas balas mais ou menos explodiram dentro do corpo. (...) Essas balas infligiram danos internos que são absolutamente horríveis", comentou.

Especialistas em balística afirmaram que as balas chamadas "dum-dum", a provável munição usada pelo atirador, são mais leves que as balas comuns, além de serem melhores para tiros à longa distância, sendo utilizadas regularmente por caçadores.

VÍTIMAS

O número de vítimas fatais no duplo atentado na última sexta-feira na Noruega foi para 93 neste domingo com a morte de um dos feridos.

Com isso, subiu de 85 para 86 o total de vítimas no tiroteio em um acampamento de verão da juventude do Partida Trabalhista na ilha de Utoeya. Outras sete pessoas foram mortas, cerca de duas horas antes, na explosão de uma bomba nos arredores da sede do governo, em Oslo.

Mais cedo, o suspeito de ser autor dos dois ataques na Noruega, Anders Breivik Behring, disse à polícia de Oslo ter agido "sozinho" no massacre.

"Durante o interrogatório ele disse que estava sozinho. Vamos tentar descobrir se isso é verdade em nossa investigação", disse Sveinung Sponheim, um oficial da polícia de Oslo.

Depoimentos de alguns sobreviventes deram a entender que poderia haver outro atirador.

MISSA

Centenas de pessoas participaram hoje de uma missa celebrada em Oslo em memória às vítimas dos ataques duplos de sexta-feira na Noruega. O último balanço aponta para ao menos 93 mortos e 96 feridos.

Os arredores da catedral de Olso, no centro da capital e a poucos metros do distrito governamental alvo do carro-bomba do primeiro atentado, estão tomados policiais, militares e bombeiros, mobilizados pelos incidentes.

O papa Bento 16 lembrou na missa dominical do Ângelus as vítimas dos atentados da última sexta-feira na Noruega e pediu que se abandone "para sempre a via do ódio" e se fuja "da lógica do mal".

O papa, que neste sábado enviou um telegrama de condolências ao rei Harald da Noruega, reiterou a "profunda dor" pelo duplo atentado.

Wolfgang Rattay/Reuters
O primeiro-ministro Jens Stoltenber e sua mulher Ingrid Schulerud fazem homenagem antes de missa que lembrou as vítimas
O premiê Jens Stoltenber e sua mulher Ingrid Schulerud fazem homenagem antes de missa que lembrou as vítimas

PLANOS

Um documento de 1.500 páginas redigido aparentemente pelo norueguês que matou 93 pessoas em dois atentados em Oslo, na sexta-feira, revela que o ataque já era preparado desde o outono (boreal) de 2009.

O documento, publicado na internet diariamente, inclui um manual sobre como montar bombas e um discurso contra o Islã e o marxismo.

Anders Behring Breivik, um norueguês de 32 anos, detalha os preparativos de sua ação, destacando "o uso do terrorismo como um meio de despertar as massas", e admite que será lembrado como "o maior monstro nazista desde a Segunda Guerra Mundial".

Com várias referências históricas, o manifesto inclui numerosos detalhes da personalidade do agressor, seu modus operandi para fabricar bombas e seu treinamento de tiro, além de um minucioso diário dos três meses que precederam o ataque.

O texto, escrito em inglês, tem o título "A European Delaration of Independence - 2083" (Uma declaração de Independência Europeia - 2083) e é firmado sob o pseudônimo "Andrew Berwick".

France Presse
Imagens retiradas da página no Facebook do atirador Anders Behring Breivik
Imagens retiradas da página no Facebook do atirador Anders Behring Breivik

BREIVIK

"Meu nome, Breivik, remonta à época anterior a dos vikings. Behring é um nome germânico pré-cristão que deriva da palavra Behr, que em alemão significa urso (...) e Anders (Andreas) é o equivalente escandinavo de (...) Andrew", explica.

"Um alvo prioritário é a reunião anual do partido socialista/social democrata", diz o texto, que também explica como montar uma empresa de fachada, mineradora ou agrícola, para adquirir explosivos.

O documento acaba assim: "Acredito que será minha última postagem. Estamos na sexta-feira, 22 de julho, às 12h51", apenas três horas antes da explosão de uma bomba no centro de Oslo e do posterior ataque à colônia de férias do Partido Trabalhista.

Behring admitiu hoje que participou dos ataques, que "foram planejados há muito tempo", informou seu advogado Geir Lippestad.

O acusado foi membro do partido Progressista (FrP, da direita populista) e de seu movimento jovem, além de participar de um fórum neonazista sueco na internet.

O FrP confirmou que Behring se filiou ao partido em 1999, mas saiu da lista de membros em 2006. Ele também foi o responsável local do movimento juvenil do FrP entre 2002 e 2004.

A polícia definiu Behring como um "fundamentalista cristão" de direita, hostil ao islamismo.

De acordo com Mikel Ekman, investigador da Fundação Expo, com base em Estocolmo, que monitora grupos de extrema direita, Behring criou um perfil em 2009 sob um pseudônimo que pode ser rastreado para seu endereço de e-mail em um fórum neonazista sueco chamado Nordisk.

Fundado em 2007, o Nordisk conta com 22 mil membros na região.

Editoria de Arte/Folhapress

Terrorismo da extrema-direita

 
 
 
 
 

 

 

Anders Behring Breivik


Publicado em 23/07/2011 por *Rui Martins

Alguns jornais americanos e europeus mais apressados foram logo atribuindo à Al-Qaeda os atentados cometidos em Oslo, na Noruega, no qual morreram 92 pessoas e restam cinco desaparecidas. A razão invocada parecia evidente - seria em represália aos soldados noruegueses no Afganistão, à participação nos bombardeios líbios ou às caricaturas de Maomé.

Mas se enganaram. O autor dos atentados não usa turbante, nem se chama Mohamed ou Mustafá, nem tem barba, nem grita Alá é Grande e nem se suicidou como costumam fazer os kamikases islamitas.

É um autêntico escandinavo, alto e magro como um manequim, de cabelos loiros, rosto branco longo, bem escanhoado e olhos azuis. Suas fotos estão hoje em todos os jornais, na televisão, na Internet e na memória dos pais que perderam seus filhos queridos.

Anders Behring Breivik, legítimo descendente dos vikings, é o que as mulheres chamariam de um homem bonito com cara de anjo, que qualquer pai deixaria sair de noite com sua filha.

Engano fatal. Anders Behring Breivik é um assassino, cruel, impiedoso, que, na ilha de Utoya, passou uma hora e meia descarregando seu fuzil-metralhadora nos jovens participantes de um acampamento promovido pelo Partido dos Trabalhadores e teria matado um número maior, se não fosse a chegada de policiais alertados por desesperados twiters.

Ex-membro de um partido nacionalista, da direita populista da Noruega, na verdade da extrema-direita. O Partido do Progresso, seu nome, reúne os defensores dos ideais conservadores e quer a proteção da Noruega contra a invasão dos imigrantes estrangeiros, coisa de 10% de trabalhadores, que deixaram seus países ensolarados para terem emprego e bom salário no frio mas rico país exportador de petróleo.

Anders Behring Breivik é nacionalista, defende os valores culturais e religiosos do cristianismo fundamentalista, é contra o Islã ou religião muçulmana, contra o multiculturalismo, contra a mestiçagem da sociedade ocidental, contra os imigrantes e contra o socialismo trabalhistas democrático que governa o país. Frequentou um clube de tiro ao alvo, donde sua precisão no massacre perpretado, tinha revólver e fuzil-metralhadora em casa e aprendeu a fazer bomba com adubo agrícola. Bombas, diga-se de passagem, mais potentes que as usadas pela Al-Qaeda.

O bonito e angelical norueguês lembra um americano também capaz de colocar em prática seu ódio ideológico. Lembra Timothy McVeigh, do atentado também contra um prédio administrativo em Oklahoma City, no qual morreram 168 pessoas, em abril de 1965. Timothy era branco, jovem de 26 anos, e se sentia atraído pelas idéias extremistas dos neonazistas. E igualmente não se suicidou após o massacre cometido. Talvez se possa dizer que tanto Timothy como Anders sentiram-se satisfeitos por terem concluído seus projetos de ódio.

E se o autor dos atentados fosse islamita? Provavelmente, haveria uma represália e se responsabilizaria a coletividade muçulmana. Porém, como Anders é norueguês, militante de extrema-direita como provam seus escritos sob pseudônimo na Internet e seu plano de massacre datado de 2009, não haverá uma responsabilização do fundamentalismo cristão, nem da ideologia da extrema-direita, que cresce nos países escandinavos. Se não aparecerem cúmplices nos atentados, Anders será considerado simplesmente um louco solitário e ponto final.

*Rui Martins, Berna, Suiça - Jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é líder emigrante, ex-membro eleito no primeiro conselho de emigrantes junto ao Itamaraty. Criou os movimentos Brasileirinhos Apátridas e Estado dos Emigrantes, vive em Berna, na Suíça. Escreve para o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência

Atualizado às 16:04
O Brasil Visto de Fora
Marcos Coimbra
Passamos um pedaço da semana ocupados com um assunto menos importante que parece. Foi suscitado pelo correspondente do jornal espanhol El País, em artigo em que discorria sobre sua dificuldade de entender por que os brasileiros não ficam “indignados” com o Brasil. Em especial, por que não saem às ruas para protestar contra a falta de ética e a corrupção.
O texto foi republicado por O Globo, três semanas depois de ter saído na Espanha. Parece que a direção do jornal carioca ficou indignada com a falta de repercussão do texto original. Resolveu traduzi-lo e mandou fazer reportagem de capa a respeito do tema.
O autor, Juan Arias, deve ter ficado satisfeito com a deferência de seus colegas. Voltou à discussão na terça feira, dessa feita em matéria intitulada “A imprensa se converte no paladino contra a corrupção no Brasil”. Titulo tão surpreendente para quem conhece as corporações da mídia brasileira que só pode ser explicado como retribuição ao destaque que recebera.

Suas ideias foram encaixadas no modelo de interpretação de nossa realidade que é típico das redações dos grandes jornais. Nele, tudo é explicado a partir de uma premissa: os males do Brasil são culpa de Lula e do PT.
É fácil interpretar nossa realidade política e social sabendo, de antemão, a resposta a todas as perguntas. Qualquer coisa pode ser assim compreendida, incluindo a “apatia da sociedade” que não se indigna e não reage contra tudo de errado que existe.
Como afirmou o editorial de O Globo: “O fenômeno da inapetência política diante do assalto aos cofres abastecidos pelos pesados impostos pagos pelo contribuinte tem múltiplas raízes. A mais profunda deriva da bem-sucedida execução de um projeto de cooptação com dinheiro público...(através de organizações) convertidas em correias de transmissão do lulopetismo”.
O engraçado no raciocínio é que a “raiz profunda” da pequena disposição contestatória da população teria nascido outro dia. Se foi obra do “lulopetismo”, é de imaginar que, antes que Lula chegasse ao poder, o problema inexistisse.
Na visão singela do editorialista, talvez fossemos, até 2002, uma sociedade de ampla participação popular, onde o povo vigiava os políticos e só tínhamos a corrupção que passava despercebida. Foi quando veio Lula e estragou tudo.
Não parece que Juan Arias concordaria com uma tese tão superficial. Seu texto não atribuía ao “lulopetismo” a responsabilidade pela situação que o deixava perplexo. O que discutia eram os traços gerais de nosso sistema político, em nada circunscritos a um partido ou governante. A “indignação” que cobrava não seria do povo contra o governo federal, mas também o Congresso, a política nos estados e nos municípios.
O texto tratava Dilma de maneira peculiar. Para ele, “(...) curiosamente, a mais irritada com o ataque dos políticos aos cofres públicos parece ser a primeira presidente mulher”. Ou seja, apesar da lamentada ausência do “povo nas ruas”, ela seria “indignada” o suficiente para não aceitar a corrupção e estaria dando mostras disso no modo como enfrentou os casos Palocci e Alfredo Nascimento.
Nem se precisa dizer que essa avaliação esteve totalmente ausente nas repercussões do texto no Globo. Admiti-la implicaria abrir mão do modelo em que o “lulopetismo” é o grande culpado.
O assunto acabou fazendo um percurso curioso. Primeiro, um correspondente estrangeiro escreveu um artigo com o olhar característico de quem vê de fora nossos problemas. Daí, achando que era instrumental, um jornal local o importou, adaptando-o à sua visão.
Foi buscar lá fora argumentos que referendavam suas ideias e lhes davam certo ar cosmopolita, mesmo algumas que o texto inicial não subscrevia. Terminou como se o El País condenasse o “lulopetismo”.
Não era isso, mas quem se importa? Em redações como a desse jornal, a única coisa relevante é combater.
Por Beto Vasquez

Primeiro, importante lembrar que Juan Arias era um velho dinossauro inconveniente e, pra poderem se livrar dele, lhe "promoveram" com a sucursal brasileira do jornal El Pais (se fosse político, diríamos que se trata de uma embaixada).

No mais, o "neutro" Arias, foi o mesmo que ano passado, 6 meses antes da eleição escreveu um artigo dizendo que o Serra, e não Dilma, seria o verdadeiro candidato de Lula...sei, sei, sei...visão imparcial e justa. Neutralidade e ascepcia típicas de um analista internacional que vë com "distanciamento" os problemas tupiniquins...conta outra. É tudo farinha do mesmo saco. Só faltava agora o Coimbra tentar aliviar a barra do Arias como se ele fosse o bom e ingenuo gringo que apenas relata a "verdadeira realidade" brasileira.

Después de Lula ¿qué?

O presidente brasileiro renunciou a disputar um terceiro mandato que poderia ter ganhado facilmente. Seus possiveis sucessores, a ex-guerrilheira Dilma Rousseff e o social-democrata José Serra, seguirão seu caminho

Juan Arias 15/02/2010

A pergunta: depois de Lula, o que?, ou seja, como será o Brasil sem Lula, não é retórica. É uma pergunta que começa a ser feita não apenas por analistas políticos, mas pelo homem comum. Uma coisa é certa: vai haver, historicamente, um antes e um depois de Lula, o ex-torneiro mecânico que tomou o controle do país faz oito anos e conseguiu colocar o Brasil entre as potências emergentes do mundo junto com a Índia e a China.

Lula deixa um país com 20 milhões a menos de miseráveis que ascenderam à categoria de cidadãos e entraram no mercado de consumo. Hoje, o Brasil, com seus quase 200 milhões de habitantes, pretende ter um assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Lula tornou visível o Brasil e suas possibilidades econômicas e culturais no cenário mundial.

Não se deixou levar pelo sonho de tentar uma terceira vitória eleitoral, modificando a Constituição, alegando, em claro espírito democrático, que "melhor que a continuidade do poder é a alternância, para a saúde da democracia". Se pode afirmar sem dúvida que se trata de um gesto de generosidade político levando em conta que, se tivesse se apresentado para um terceiro mandato, teria ganho plebiscitariamente.

O presidente ex-sindicalista conseguiu algo que, quando chegou ao poder em 2003, parecia impossível: descolar-se da esquerda de seu partido, o Partido dos Trabalhadores (PT) e por em marcha, durante seus dois mandatos, uma política econômica neoliberal que deu segurança e outras garantias aos investidores estrangeiros. Às vezes -- em uma espécie de quadratura do círculo -- tem sabido conjugar essa política, aplaudida pelos banqueiros, com fortes e vistosas políticas sociais, com as quais conquistou milhões de pobres, diante dos quais se apresentou como um bom pai, ainda que a oposição classifique isso de assistencialismo. "Hoje os pobres tem mais comida na mesa e podemos ter um cartão de crédito", me dizia um jardineiro, orgulhoso de ter podido abrir uma conta no banco com 10 reais (4 euros).

Lula sai de cena, mas sabe que voltará, talvez já em 2014. Mas no momento sai. E a partir de primeiro de janeiro próximo o Brasil será um Brasil sem Lula. O que vai acontecer? Nada. Seguirá sendo um país com instituições democráticas consolidadas; um país que não só conseguiu sair, sem quebrar, da crise financeira mundial, mas que já está crescendo; um país sem possibilidade de golpes de qualquer tipo e, apesar de alguns impulsos populistas em alguns momentos -- pela influência sobretudo do chavismo -- que não se deixou arrastar pelo populismo em voga na América Latina.

O Brasil é um país que vai continuar sendo respeitado e admirado no mundo, inclusive sem o Lula, porque foi ele quem teve coragem de respeitar as bases democráticas construídas pelos oito anos do governo antecessor, o do social-democrata Fernando Henrique Cardoso.

Faltam quatro meses para uma contenda presidencial que vai ser dura e disputada, mas democrática. Se não houver surpresas de última hora, nenhum analista político apostaria em um cenário diferente do que está se formando, com duas únicas candidaturas capazes de ganhar as eleições de outubro: a da ministra e ex-guerrilheira, Dilma Rouseff, de origem húngara, que é a candidata preferida de Lula, uma espécie de sombra. Se ela vencer as eleições, será na realidade um terceiro mandato de Lula e asseguraria a continuidade de um certo lulismo, a política pessoal que Lula levou a cabo, afastando-se inclusive das diretrizes de seu partido.

Mas Dilma, ao mesmo tempo, não é Lula. É quase um anti-Lula, porque mais que uma iluminada ou uma improvisadora como ele, é uma gestora, que carece do carisma de seu chefe, que nunca disputou anteriormente eleições, nem para prefeita, e que chegou tarde ao Partido dos Trabalhadores, que oficialmente vai escolhê-la como candidata nas próximas semanas, ainda que não fosse Dilma a sua escolha preferida. Foi sempre e somente de Lula, que a escolheu por ser mulher, por ser dura e forte de caráter. O mandatário pensa que se Dilma foi capaz de sobreviver à tortura, poderá ser firme na direção do país. Além disso, vai seguir mais a direção de Lula que a do seu partido [o PT].

Dilma é mais de esquerda que Lula, que na verdade nunca foi de esquerda. Dilma militou nos movimentos revolucionários de extrema esquerda que lutavam em favor da ditadura do proletariado durante a ditadura militar. Foi encarcerada e torturada pelos militares e hoje daquele passado resta apenas um forte sentido social. Sua paixão é a gestão do poder.

Se ganhar Dilma, dizem os especialistas, terá ganhado Lula, sua força de convicção. Se perder, seria a perda dela, que não teria sabido capitalizar o apoio de Lula que, faz um ano, a leva pelo braço por todas as partes, até a uma audiência, no ano passado, com o papa Bento 16.

Hoje, as pesquisas dão Dilma como perdedora ante o social-democrata e governador de São Paulo, José Serra, ainda que a cada mês ela vá aumentando seu índice de aprovação, que está em torno de 30% diante de 40% de seu adversário. Dilma cresce à medida que os pobres descobrem que ela é a candidata preferida de Lula.

Serra representaria a alternância normal do poder, interrompendo de alguma forma a continuidade do PT no poder e do lulismo. Como Dilma, o governador de São Paulo, um fã da política que foi parlamentar e duas vezes ministro, além de prefeito da cidade de São Paulo e hoje governador do dito estado com altíssimos índices de aprovação, é também mais um gestor que um carismático. É uma pessoa séria, ainda que afetuosa, nada populista, que já disputou em 2002 as eleições presidenciais com Lula, que levou ao segundo turno e de quem sempre foi amigo pessoal. Sua campanha não seria "contra Lula", mas "depois de Lula". Se situa à esquerda de Lula e acentuaria algumas políticas deixadas pelo governo atual.

Com Serra, o Brasil seria um país sem Lula, mas ainda com Lula, no sentido de que o governador paulista não nega nenhuma das conquistas sociais de seu governo, nem o brilho que o ex-metalúrgico deu ao Brasil no mundo. Serra lutou nos movimentos estudantis durante o tempo da ditadura e teve que exilar-se por vários anos.

Lula deseja que a campanha seja uma espécie de plebiscito entre o que fez pelo país e o que fez seu antecessor por oito anos, o que já conseguiu. Seria como perguntar às pessoas se querem seguir com as conquistas conseguidas por ele ou voltar ao passado. Sem dúvida é uma falso dilema que Serra, se aceitar ser candidato, se encarregará de desmascarar.

Para Serra, seu governo não seria uma fotocópia do passado social-democrata de Cardoso, mas uma página nova. Seu programa, que estaria sendo preparado por uma equipe de sábios, teria como foco "aperfeiçoar" o que Lula começou e não quis ou não pode levar a cabo, e em melhorar aqueles campos nos quais os cidadãos se sentem mais frustrados e ainda insatisfeitos, como a educação, a saúde, a segurança cidadã, a reforma política, a reforma fiscal, a luta contra a corrupção, sem contar a ainda grande injustiça do Brasil: a tremenda disparidade entre ricos e pobres, entre os brancos e os de cor, entre escolarizados e analfabetos.

Sem Lula agora e quem sabe com Lula amanhã de novo, o Brasil é um país que escolheu o caminho certo, que o levará a consolidar o milagre de seu desenvolvimento. As diferenças do possível sucessor de Lula, que não será um líder carismático, não vão afastar o Brasil de seu objetivo de ser levado em conta no cenário mundial, de sua aposta na democracia e de uma certa e indiscutível liderança na América Latina e, quem sabe, algum dias, mais além.

Modelo de gestão do Dnit é caótico, com mais de 150 sistemas e falta de controle - O Globo

 

BRASÍLIA - Por trás de dirigentes e servidores acusados de corrupção, prospera no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) uma engrenagem azeitada para impedir o controle e engavetar toda e qualquer proposta moralizadora. Consultores terceirizados emitem projetos de engenharia apócrifos e de baixa qualidade, que resultam em obras com múltiplos termos aditivos para ampliar custos e prazos. Há mais de 150 sistemas de informação na sede e nas 23 superintendências regionais, e eles são incompatíveis. A estrutura é coroada com a indicação de apadrinhados para coordenadorias vitais, subordinadas às diretorias ocupadas por partidos: Planejamento, Rodoviária, Ferroviária e Aquaviária.


As falhas estruturais são conhecidas há tempos. O Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria Geral da União (CGU) já cansaram de emitir alertas, mas a adoção de propostas moralizadoras engatinha. Um plano de Gestão e Ética, elaborado pelos funcionários, chegou a ser encaminhado ao diretor-geral afastado Luiz Antonio Pagot. Entre as sugestões, identificar áreas suscetíveis a desvios, nomear comissões de ética nos estados e julgar todos os procedimentos disciplinares abertos, estabelecendo metas e controle como na iniciativa privada. O material chegou às mãos de Pagot em junho de 2010, mas não saiu do gabinete.

No Dnit, órgão técnico com orçamento de R$ 13 bilhões este ano, os cursos de capacitação para gerência de pavimentos e gestão de projetos são substituídos por aulas de qualidade de vida, "entusiasmo" e Língua Brasileira de Sinais (Libras), segundo o plano de capacitação de servidores, aprovado pela diretoria colegiada do órgão.

A multiplicação de termos aditivos em obras bilionárias - usual meio de desvios que deflagrou a crise das últimas semanas - deve-se, em parte, ao fracasso na gestão de projetos. Não há softwares ou escritório de gerenciamento dos estudos que fundamentam as obras. "Não se utilizam ferramentas consagradas, como o método do valor agregado, eficaz no monitoramento de prazos e custos de projeto. Hoje, o Dnit atua de forma compartimentada, havendo desconexão entre seus diferentes setores", pontua um diagnóstico sobre o Dnit elaborado pelo governo e obtido com exclusividade pelo GLOBO.

Especialista em engenharia da Universidade de Brasília (UnB), Dikran Berberian diz que a combinação entre comando político e governança capenga só interessa a quem deseja lucrar com dinheiro público:

- Eles nomeiam um vassalo do capeta para ser um gestor de um pedaço do céu. O diabo é hábil. É astuto e hábil.

Auditorias do TCU sobre a gestão do Dnit mostram que a Diretoria de Planejamento e Pesquisa, responsável pelos projetos, não interage com aquela que deveria ser sua irmã siamesa: a Diretoria Rodoviária, que toca as licitações. Com isso, inúmeros canteiros são instalados a partir de pleitos "alheios", não raro políticos, sem origem nos setores responsáveis pelo planejamento.

Nada menos que 66% dos projetos elaborados entre 2003 e 2008 não tinham provocado licitações para obras em 2009, ficando nas prateleiras. O estoque de estudos engavetados é imenso, mas eles faltam na hora de lançar editais para obras prioritárias, segundo os auditores do TCU.

O engenheiro de uma empreiteira que tem contratos com o Dnit contou que essa é a senha para a multiplicação de preços. O Dnit contrata projetos a toque de caixa e, depois, os empreiteiros ganham com os reajustes provocados pelos "nós" estruturais que aparecem no meio da obra. Exemplos estão espalhados pelo país, como nas obras da Rio-Santos ou da BR-101 Sul, entre Palhoça (SC) e Osório (RS).

- Eles não fiscalizam o canteiro de obras. Indiscutivelmente, esse é o sistema propício para ocorrer falcatruas - disse o consultor de projetos, na condição do anonimato.

Também é imenso o número de investimentos, fruto de pressões políticas, iniciados sem garantia orçamentária. O diretor-geral demissionário do Dnit, Luiz Antonio Pagot, admite que pelo menos cem obras que começaram a partir de emendas de parlamentares ao Orçamento da União estão paradas, pois o governo não autorizou a liberação total do dinheiro.

Deputados, senadores e prefeitos colheram dividendos políticos com a promessa dos empreendimentos, mas a população não desfruta dos benefícios. Exemplos são o Anel Viário de Ji-Paraná (RO), orçado em R$ 28,8 milhões; a construção de ponte sobre o Rio Itajaí-Açu na BR-470, em Santa Catarina (R$ 38,8 milhões); e a implantação de um trecho da BR-070 na cidade goiana de Aragarças (R$ 9 milhões).

Embora projete, em média, R$ 4 bilhões em obras por ano, o Dnit só contrata o equivalente a R$ 1,8 bilhão, aponta o TCU. Mesmo assim, peca ao fiscalizar a execução de seus recursos limitados. Atualmente, faltam 600 engenheiros no quadro para supervisionar o trabalho de empreiteiras. Com isso, resta ao órgão terceirizar essas funções, nem sempre desempenhadas a contento.

A "falta de atenção" que impera no setor de projetos se estende para outro centro nevrálgico na estrutura do órgão: o monitoramento das licitações no âmbito da Diretoria Executiva, ocupada até semana passada por José Henrique Sadok de Sá, o diretor demitido porque direcionava obras para a empreiteira da mulher.

Relatório da Controladoria Geral da União (CGU), elaborado em 2010, afirma que é "praticamente inviável" a análise adequada de 114 licitações - o volume avaliado pelo órgão em 2009. E que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) só faz aumentar a saturação da comissão de licitações.

Desde terça-feira, O GLOBO solicita entrevista com o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, para ouvi-lo sobre a gestão do Dnit. Mas o ministério informou que ele não poderia atender. A pasta limitou-se a informar que a reestruturação dos Transportes passa também pela gestão de processos do Dnit.

Cabral exporta corrupção para Argentina



Cabral, com Maradona e a presidente Cristina Kirchner, em foto reproduzida da reportagem da revista Veja (edição desta semana)
Cabral, com Maradona e a presidente Cristina Kirchner, em foto reproduzida da reportagem da revista Veja (edição desta semana)


Como mostra esta semana, a revista VEJA, o esquema montado por Cabral com o empresário Ronaldo de Carvalho, através da Metalúrgica Valença, a fábrica que não fabrica nada, está dando frutos e chegou à Argentina. Na edição desta semana, uma reportagem mostra mais algumas novidades.

Cabral mentiu e não foi Eike Batista quem bancou as UPPs como foi dito. Foi o governo do Estado que bancou tudo.

Além dos R$ 4 milhões emprestados pelo governo Cabral a Ronald de Carvalho para implantar a fábrica que não fabrica nada, ainda recebeu uma generosa isenção fiscal de R$ 45 milhões. E tenho informações que a isenção fiscal depois foi ampliada, é maior que esse número.

E um detalhe que não vem na matéria, a viagem de Cabral à Argentina aconteceu justamente quando o Rio sofreu uma derrota histórica no Congresso e nos tomaram os royalties. Cabral estava preocupado era com os negócios com os amigos.


Reprodução da revista Veja
Reprodução da revista Veja

Coletânea de Gretchen revela presente de Jorge Ben Jor

A música foi gravada pela rainha do rebolado em 1983 e permanece praticamente desconhecida até hoje. CD produzido pelo pesquisador Rodrigo Faour resgata faixas lançadas pela artista que vendia milhões no começo da década de 1980

DANILO CASALETTI

EM CD Coletânea traz músicas gravadas pela artista entre o final da década de 70 e o início dos anos 80
“Dizem que sou boa cantora, mas quem vende disco é o bunda da Gretchen.” A afirmação consta de qualquer coletânea de frases ditas pela cantora Elis Regina (1945-1982) e serve para ilustrar o sucesso popular que a “rainha do rebolado” fez entre o final da década de 1970 e o início da de 1980. É justamente esse período do auge da “cantora” que foi reunido na coletânea Gretchen – Charme, talento e gostosura (Microservice).

As 14 faixas do CD foram lançadas em LP’s e compactos pela antiga Copacabana Discos. Coube ao jornalista e pesquisador musical Rodrigo Faour remexer o arquivo para juntar grandes sucessos, como "Freak le boom boom" (1979), "Conga conga conga" (1980) e "Melô do piripipi" (1981), com canções que passaram desapercebidas pelo público, entre elas um cover de Freddie Mercury em "I was born to love you" e "Melô do Pata pata", uma versão do sucesso da sul-africana Miriam Makeba. O álbum ainda traz a reprodução de todas as capas originais dos discos.

Entre as raridades, está a faixa "Ela tem raça, charme, talento e gostosura", um presente de Jorge Ben Jor, à época, apenas Ben, feito especialmente para Gretchen, lançada em 1983 e que permanece quase inédita até hoje. (ouça abaixo). Poucas receberam esse tipo de mimo do músico. Gal Costa ganhou uma chamada “Miss Gal”, mas nunca gravou a canção.

Para Faour, Gretchen não fez o sucesso que fez à toa. Orientada pelo produtor argentino Mister Sam, Gretchen foi preparada para ser um produto de massa, um prato cheio para os programas de TV da época que precisavam empolgar o auditório e encher os olhos do telespectador no sofá da sala. Artistas como a Gal Costa, Fafá de Belém, Simone, Ney Matogrosso e As Frenéticas já vinham liberando o lado da sensualidade. Gretchen, segundo Faour, foi por um viés menos sofisticado, mas direto ao ponto. “Ela foi tachada de vulgar, mas tinha também um lado moleca, agradava às crianças. Um verdadeiro sucesso”, diz o pesquisador.

Faour reconhece que Gretchen nunca foi propriamente uma cantora, mas afirma que é preciso observar a qualidade musical que as gravações dela traziam. O pop brasileiro ainda engatinhava e os registros dançantes de Gretchen ainda eram raros. “Mister Sam colocava nas músicas break, samba-rock, samba-funk, ritmos que só fariam sucesso lá na frente”, diz Faour.

Gretchen tem substituta? Na mesma década de 1980 a chacrete Rita Cadillac – que também encantava os marmanjos com suas medidas – gravou algumas músicas (impossível não se lembrar da infame “É bom para o moral”), mas não conseguiu o mesmo sucesso que a rainha do rebolado. Para Faour, Gretchen realmente não tem uma substituta. Ele diz que encontra alguma semelhança - mas sem o lado lúdico que a cantora tinha - no samba de roda pop do grupo baiano É o tchan, que trazia dançarinas e coreografias, e no funk carioca, com suas “popozudas” e “mulheres frutas. “Não dou cinco anos para que o trabalho do É o tchan vire cult”, diz o pesquisador.

Atualmente, Gretchen, vez ou outra, aparece na mídia por conta de notícias popularescas. Fez um filme pornô, casou e separou por inúmeras vezes, brigou publicamente com a filha. Sua assessoria faz questão de divulgar até mesmo as datas de suas cirurgias plásticas. Era melhor ter ficado no "Melô do piripipi". Diante de tudo isso, a dancinha, de fato, parece coisa de criança.

Agência Nacional da Propina (trecho)

ÉPOCA obteve vídeos, documentos e cheques que revelam como o aparelhamento partidário transformou a Agência Nacional do Petróleo numa central de achaque e extorsão

Diego Escosteguy, com Murilo Ramos

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PROVAS DA EXTORSÃO
Com a ajuda do MP, a advogada Vanuza Sampaio gravou um encontro que manteve com dois assessores da ANP, que exigem propina de R$ 40 mil para resolver um problema de um cliente dela. Abaixo, trecho do depoimento prestado pela advogada ao MP, no qual ela detalha o caso, e o cheque que um dos assessores da ANP recebeu de um advogado ligado ao maior adulterador de combustível do país

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Às 16h23 do dia 5 de maio de 2008, uma segunda-feira, dois assessores da Agência Nacional do Petróleo (ANP) encaminharam-se discretamente ao escritório da advogada Vanuza Sampaio, no centro do Rio de Janeiro. Os dois, Antonio José Moreira e Daniel Carvalho de Lima, acomodaram-se na sala de reuniões do escritório, tomaram cafezinho e conversaram por alguns minutos sobre amenidades. Ato contínuo, a advogada Vanuza assomou à porta. Vanuza é a advogada com mais volume de processos na ANP; conhece profundamente a agência. Tem como clientes distribuidoras de combustível, postos e empresários do setor de petróleo e gás – todos dependem da ANP para tocar seus negócios. Depender da ANP, conforme investigou ÉPOCA nos últimos dois meses, significa sofrer continuamente o assédio de tipos como Moreira e Daniel. Não são os únicos. Há muitos como eles. Mas, para a turma que transformou a ANP num cartório de extorsão, aquela não era uma segunda-feira tão ordinária. Daquela vez, dois deles foram gravados em vídeo, em pleno expediente subterrâneo. ÉPOCA obteve cópia dessa gravação, que integra uma investigação sigilosa do Ministério Público Federal e da Polícia Federal.
A pedido de ÉPOCA, a autenticidade do vídeo foi atestada pelo perito Ricardo Molina. “A gravação é autêntica e não sofreu nenhuma manipulação”, disse Molina. O vídeo tem 53 minutos, três personagens e um repertório espantoso de ilegalidades, abusos e escracho com a coisa pública. São 53 minutos de corrupção exposta em seu sentido mais puro. Não há nenhum vestígio de decoro. O eventual medo de ser pilhado desaparece e cede lugar ao deboche. Não há diálogo em código ou fraseado evasivo. É tudo dito na lata. Esse descaso pode ser explicado pela impunidade com que a longeva máfia dos combustíveis atua no país. Nos últimos anos, a PF e o MP já produziram provas robustas contra expoentes desse grupo. Até o Congresso criou uma CPI para investigar os crimes – que engendrou ainda mais corrupção.
Usina de malfeitores
Propina de R$ 40 mil, divisão de dinheiro sujo, achaque a empresas: há de tudo no vídeo de corrupção da ANP

“Quarenta mil reais é razoável?”Neste trecho, os dois assessores da ANP (Antonio José Moreira e Daniel Carvalho de Lima) dizem à advogada Vanuza Sampaio que a Petromarte, cliente dela, terá de pagar R$ 40 mil de propina para resolver uma pendência na agência – com o aval do então superintendente de abastecimento da ANP, Edson Silva, dirigente do PCdoB

Moreira: Eu conversei com o Edson (superintendente da ANP) e ele não tinha muita noção de valores, você entende? Aí ele falou que era possível, que ia mexer. Mas ele é lento. Advogada: É baiano.
Moreira: Baiano... Aí ele me falou: “Ó, você não quer conversar agora em torno de 40 mil reais? Você acha razoável? Quanto você acha razoável?”. Falei “não sei, Edson, não sei quantificar, não sei valor”. E foi a primeira vez que aconteceu alguma coisa. A gente pode estabelecer um bom relacionamento. Aí ele falou isso, que ficaria com 25 (mil reais) e daria 15 (mil reais) pra vocês. Esse é do Rodomarte. É... É do Petromarte.


"É para arrancar dinheiro mesmo?"
Depois de cobrar a propina, os assessores oferecem uma parceria à advogada Vanuza. Querem que ela achaque a empresa Rodonave, objeto de um processo na ANP.
Vanuza se espanta:
“Mas é para arrancar dinheiro mesmo?”

Moreira: Tá na minha mão um processo... O interesse é muito grande. (Empresa) tradicional chamada Rodonave, de Manaus. Advogada: Mas por que querem cancelar o registro dela? (...) É para arrancar dinheiro? Moreira: Não sei... não, eu acho que não é para arrancar dinheiro (...) Eu também não queria me indispor, chegar e ligar para a Rodonave... Então, se você tiver interesse, te dou uma orientada.


Lógica Petista
Em seguida, os três põem-se a discutir as diferenças entre os corruptos da agência. Roberto Ardenghy, antecessor de Edson Silva na Superintendência de Abastecimento, é citado como exemplo de negociante voraz. Diz o assessor Moreira: “Ele tinha uma lógica muito à petista. Era muito para ele”

Advogada: Ele (Ardenghy) sempre me travou de uma forma muito inteligente. Só hoje consigo ver o que ele ganhava de um outro lado.
Moreira: (...) Era uma lógica muito à petista. Era muito pra ele e ele avançava também para todos os lados (...) Uma vez eu trouxe um caso, ele queria cobrar muito. Falei “Ardenghy, não é o momento de cobrar muito”. Ele falou “não, mas se a gente não cobrar muito (...) Se a gente cobrar pouco, você vê fantasmas todos os dias”.

 


     

    No fim de 2006, Erenice Guerra rejeitou uma proposta de investigação sobre denúncias graves que envolviam o Ministério dos Transportes

     

    Leonel Rocha e Murilo Ramos

    Andre Dusek/AE e Tulio Santos/EM/D.A Press
    NÃO CHECADO

    A ex-ministra Erenice, que atuava como assessora de Dilma na Casa Civil quando a denúncia chegou ao Planalto, e Hideraldo Caron, diretor do Dnit até a semana passada. No destaque, trecho da planilha com a denúncia citando Caron
     
    Em novembro de 2006, a então secretária executiva da Casa Civil da Presidência da República, Erenice Guerra, recebeu uma carta com denúncias graves. A correspondência falava sobre como grandes empreiteiras pagavam propina aos dois últimos ministros dos Transportes, Anderson Adauto e Alfredo Nascimento, a políticos do PL e a diretores do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) durante o primeiro governo Lula. Endereçada à então chefe de Erenice, Dilma Rousseff, ministra da Casa Civil na ocasião, a denúncia detalhava valores de obras, citava quem pagava e quem recebia dinheiro. Tudo muito semelhante ao esquema revelado no atual escândalo do Ministério dos Transportes.

    A carta denúncia chegou ao governo depois de recebida em casa por um alto funcionário da Secretaria de Controle Interno do Palácio (Ciset), órgão que fiscaliza a lisura dos contratos firmados pela Presidência. O funcionário diz que a carta era anônima. Apesar de apócrifa, os auditores do Palácio se convenceram da necessidade de apurar. Diante do conteú­do delicado do documento, decidiram procurar Ere-nice Guerra. ÉPOCA ouviu dois funcionários da Ciset que acompanharam a história para saber o que aconteceu. De acordo com eles, depois de ler a carta, Erenice pediu um tempo para reflexão. Mais tarde, no mesmo dia, informou que não aceitaria a recomendação – mandar investigar a denúncia – para não criar problemas com a base governista no Congresso Nacional.

    Hoje, lendo a carta com atenção, chega-se à conclusão de que, se as acusações tivessem sido apuradas, boa parte das suspeitas de corrup-ção surgidas nas últimas semanas – que levaram à demissão de mais de uma dúzia de funcionários dos transportes, entre eles o ministro Alfredo Nascimento – teria sido evitada.

    O documento apócrifo pedia providências para que, no segundo mandato do presidente Lula, não fosse mantido o esquema de corrupção montado pelo Partido Liberal, o PL, no Ministério dos Transportes. Depois do escândalo do mensalão, em 2005, o PL mudou de nome e passou a se chamar Partido da República, PR. O remetente anexou cinco extratos de contrato do Dnit com empreiteiras e uma planilha que relaciona os pagamentos feitos pelo governo às empresas, com distribuição de propina. Esses contratos teriam rendido R$ 866,6 milhões a cinco construtoras.

    Segundo a denúncia, essas empreiteiras teriam repassado R$ 41,8 milhões de propina a políticos e funcionários do Dnit por intermédio de outra empresa, chamada EMPS. A maior parte dos pagamentos ilegais (R$ 25,9 milhões), segundo a planilha, foi feita ao PL, cujos dirigentes também teriam recebido outros R$ 4,3 milhões. São citados como beneficiários desse dinheiro os deputados federais Valdemar Costa Neto e Milton Monti, ambos de São Paulo. Ainda segundo o documento, alguns diretores e altos funcionários do Dnit tam-bém teriam sido beneficiados:

    1) Mauro Barbosa, na ocasião diretor-geral do Dnit, com R$ 8,6 milhões, equivalente a 1% das verbas liberadas;

    2) Hideraldo Luiz Caron, diretor de Infraestrutura do Dnit até a semana passada, com R$ 1,5 milhão;

    3) Luiz Prosel Jr., coordenador de Construção Rodoviária do Dnit na ocasião, com R$ 800 mil;

    4) Márcio Guimarães de Aquino, que era chefe da Comissão Permanente de Licitação do Dnit, com R$ 400 mil;

    5) Hugo Sternick, ex-chefe da Divisão de Projetos, com R$ 200 mil.

    Segundo funcionários, Erenice disse que não investigaria para não criar problemas com a base
    Os dois primeiros nomes da lista foram diretamente atingidos pelo escândalo atual. Barbosa era o chefe de gabinete do então ministro Alfredo Nascimento até três semanas atrás. Caiu na primeira leva de demissões determinadas por Dilma.

    No final da tarde da última sexta-feira, Caron pediu demissão depois de 15 dias de pressão. Desde o começo da crise, ele foi citado por integrantes do PR como o representante do PT na máquina de aditivos de contratos do Dnit. Contra ele, pesam cerca de 100 pro-cessos no Tribunal de Contas da União (TCU). Num deles, foi condenado em maio a restituir R$ 4,2 milhões aos cofres públicos, co-mo revelou ÉPOCA na semana passada.

    As pessoas e empresas citadas no documento apócrifo foram procuradas por ÉPOCA. Por meio de sua assessoria, Dilma encaminhou a seguinte nota: “Não há registro de entrada desta denúncia na Ciset na ocasião citada. A Ciset recebeu hoje (22/7) um e-mail com remeten-te não identificado com relato de fatos que podem corresponder às denúncias narradas pela revista Época. Esses fatos serão apurados por processo administrativo”. Erenice Guerra não foi encontrada.

    O deputado Valdemar Costa Neto, secretário-geral do PR, diz que a denúncia não tem sustentação. Para o PR, essas acusações, como todas as outras que vieram a público nas últimas semanas, devem ser apuradas pela Polícia Federal.

    Cinco empreiteiras são acusadas na carta de pagar propinas por obras na BR-101, no Rio de Janeiro e no Nordeste. A construtora Queiroz Galvão afirmou que refuta “toda e qualquer acusação de pagamento de propina e contratação de empresa para a realização deste tipo de pagamento”.

    O Grupo ARG também negou pagamentos ilegais. As outras empreiteiras citadas no documento não responderam às ligações. Procurado para falar sobre os cinco funcionários citados na denúncia, o Dnit informou que todos desconhecem as acusações e negam qual-quer irregularidade. Na entrevista em que anunciou sua demissão, Caron disse que tinha sido procurado por ÉPOCA para falar sobre uma denúncia. Sem entrar em detalhes, afirmou: “Qualquer acusação é absolutamente mentirosa. Espero que quem escrever tenha no mínimo prova”.

    A prudência e o benefício da dúvida recomendam que se deve tratar com muito cuidado qualquer denúncia anônima. Todas as normas de boa conduta dos servidores públicos, porém, determinam que as acusações de irregularidades devem ser apuradas para que não pairem dúvidas sobre os responsáveis pelo uso do dinheiro público. A dimensão do escândalo atual mostra que a carta enviada ao Palácio do Planalto em 2006, embora apócrifa, trazia o roteiro de um grande foco de corrupção.

    Rodovia federal no Ceará obriga motoristas a seguir na contramão

    DE SÃO PAULO

    O repórter Pedro Leal Fonseca percorreu cem quilômetros da BR-020, que liga Fortaleza ao interior do Ceará, no trecho entre a capital cearense e o município de Canindé. O jornalista verificou que o motorista precisa atravessar 40 quilômetros em baixa velocidade, desviando de crateras de até 10 metros de extensão com a visão prejudicada pelo barro que toma o lugar do asfalto.


    Só em 2011, esse trecho concentrou 320 acidentes, com 18 mortes. O vídeo acima mostra as condições da estrada. A íntegra da reportagem está disponível para assinantes do jornal e do UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha.

    Numa espécie de rali em rodovia federal, carros, carretas, motos e ônibus sobem e descem nas encostas, invadem o acostamento (onde ele existe) e, eventualmente, sem alternativas, param e esperam que os veículos da pista contrária passem, para então seguir na contramão.

    DISSOLVEM COM ÁGUA

    Investigações conduzidas pela Justiça Federal apontam relação de causa e efeito entre os desvios no Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e as más condições das rodovias federais no Estado, informa reportagem de Marco Antônio Martins publicada na Folha deste domingo (íntegra disponível para assinantes do jornal e do UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha).

    Em decisão obtida pela Folha, o juiz Luís Praxedes Vieira da Silva, da 1ª Vara Federal do Ceará, acusa o Dnit de fazer estradas solúveis. "Os descalabros nas nossas estradas federais (...) são vergonhosos. Agora vem a lume a crassa corrupção que envolvia todo o sistema", escreveu, em 1º de junho.

    Em maio, a situação motivou o governador Cid Gomes (PSB) a chamar o Dnit de "antro de roubalheira" e o então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento (PR), de "incompetente e desonesto". Toda a cúpula da pasta cairia dois meses depois, sob acusações de corrupção.

    Leia mais na Folha deste domingo, que já está nas bancas.