quarta-feira, 30 de março de 2011

Assassinos! Criminosos de guerra Cameron, Obama e Sarkozy lançam ataque terrorista






Timothy Bancroft-Hinchey





A tinta ainda estava fresca na Resolução 1973, e na mídia ocidental já estavam falando sobre os ataques aéreos e como ajudar os rebeldes. Dois erros aqui - em primeiro lugar, não é esse o âmbito do documento e, segundo, por que o Presidente Obama e o primeiro-ministro Cameron deliberadamente citam de forma errada as palavras de Muammar Al-Kadafi?



“OTAN” e “terrorismo” são a mesma coisa e as últimas ações desta ala militar do lobby do petróleo, que gravita em torno da Casa Branca, demonstram de forma evidente que essa força maligna segue endemicamente uma política de violência para perpetrar a sua ganância. Na Líbia, a OTAN, mais uma vez, errou monumentalmente.



A tinta ainda estava fresca na Resolução 1973, e na midia ocidental já estavam falando sobre os ataques aéreos e como ajudar os rebeldes. Dois erros aqui - em primeiro lugar, não é esse o âmbito do documento e, segundo, por que o Presidente Obama e o primeiro-ministro Cameron deliberadamente citam de forma errada as palavras de Muammar Al-Qathafi?



O Líder Fraternal do Grande Jamahiriya Socialista Popular Líbia Árabe não havia jurado não mostrar misericórdia para com o povo de Benghazi - ele tinha dado aos “rebeldes” (grupos armados de criminosos), uma janela para deporem as armas e tinha dito que ele não mostraria misericórdia para aqueles que não o fizeram. Ele não estava falando acerca do massacre de civis em Benghazi - onde, aliás, muitos dos seus apoiadores, indefesos, que já foram assassinados pelos “rebeldes”. A sangue frio.



É legal ou aceitável a França, Inglaterra ou nos Estados Unidos da América para pegar em armas, transformar edifícios em tochas, massacrar civis desarmados (os "rebeldes" fizeram isso em Benghazi) e cometer atos de terrorismo? Não? Nem é na Líbia.



O fato que o presidente Obama e o primeiro-ministro Cameron deliberadamente distorceram as palavras do estadista líbio, citando-o de forma errada e fora de contexto não faz nada para promover a noção de que eles sejam razoáveis, ou equilibrados, ou competentes para desempenharem seus papéis. O que eles fizeram é juntar-se ao Presidente Sarkozy para cometer um ato de terrorismo contra a Líbia. A Cruzada começou, e a Líbia é apenas a primeira etapa.



O adágio da OTAN no Iraque era “hoje, uma criança - amanhã, um terrorista” e a política de jogar bombas de fragmentação em áreas civis é prova disso. Depois, entraram as empresas petrolíferas. O adágio da OTAN na Líbia parece ser proteger o povo líbio aliando-se com Al-Qaeda, instigar a revolta na zona rica em petróleo endemicamente separatista da Cirenaica, Benghazi sendo a sua cidade capital, para depois instalar um regime amigável... E depois, as companhias de petróleo entrarão.



Para o povo da Líbia, se o Grande Plano der resultado, vai desaparecer o alojamento gratuito, idem o sistema de educação livre, idem o sistema de saúde excelente e gratuito, idem os enormes benefícios sociais distribuídos entre a população. Líbia vai-se tornar a prostituta do Ocidente, os seus recursos estuprados enquanto pessoas à margem da sociedade da Líbia são colocados em posições de poder. Marquem as minhas palavras.



Para os (agora) criminosos de guerra Cameron, Obama e Sarkozy, algumas perguntas. Vocês sabiam que em 1951, a Líbia foi a nação mais pobre do mundo? Vocês sabiam que hoje tem o maior índice de desenvolvimento humano em África? Algum de vocês três implementaram programas habitacionais gratuitos? Não, vocês destruíram as esperanças dos seus cidadãos através da criação de sistemas nos quais as pessoas não têm recursos para manter suas casas.



Algum de vocês já implementou sistemas de cuidados de saúde gratuitos? Não, vocês tornaram a saúde num negócio. Algum de vocês distribuiu terras gratuitamente? Doaram equipamentos agrícolas de graça? Não, vocês impõem tarifas sobre as importações provenientes dos países pobres e dão subsídios aos seus fazendeiros, fingindo seguir, de forma hipócrita, os preceitos da OMC.



Como vocês justificam os ataques a alvos civis da noite passada? Estes são crimes de guerra. Vocês sabiam que os três centros médicos foram atingidos? Que tipo de "ditador" distribui armas para um milhão de cidadãos? Onde está a zona de exclusão aérea sobre o Bahrein e Iêmen, onde civis desarmados estão sendo massacrados pelos seus amigos?



E agora, o Sr. Cameron. Você se preocupou em explicar ao seu povo, confrontado com o selvagem, bárbaro e desumano ataque contra a sociedade britânica pela implementação de seus ridículos e totalmente desnecessários cortes de gastos públicos, quanto custa participar neste ato descarado de terrorismo? Então eu lhe informarei que o custo por aeronave por dia está na região de 200.000 libras esterlinas. Isso é 35,000-50,000 GBP por hora de voo por aeronave - do dinheiro dos contribuintes. Como você justifica os gastos nesse bombardeio de hospitais e alvos civis, quando você corta os gastos para o Serviço Nacional de Saúde?



Cortes dos gastos públicos, qual o quê?



Agora a verdade: A “rebelião” na Líbia está baseada em torno de fundamentalistas islâmicos no ponto quente historicamente separatista de Benghazi. Os líbios chamam-lhes “os barbudos”. A “rebelião” foi lançada pelo Ocidente. Falhou, e quando as forças militares do coronel Al Kadafi ganharam a iniciativa, eles entraram em pânico. Eles recusaram a resolução patrocinada pelos russos de um cessar-fogo na ONU e tentaram fazer passar uma resolução que permitia uma invasão militar em larga escala.



Esta resolução foi anulada pela Rússia, China, Índia, Brasil e Alemanha, e o resultado foi uma zona de exclusão aérea e permissão para usar a força militar para proteger os civis. Mas as autoridades líbias não estão lutando contra “civis”. Eles, como no Ocidente, estão lutando contra terroristas islâmicos.



E os presidentes Obama e Sarkozy e o primeiro-ministro Cameron tem os assassinatos de 64 pessoas nas suas mãos. Estes homens são responsáveis pelo uso indiscriminado dos recursos militares contra alvos civis na Líbia, incluindo alegadamente três centros médicos, fora do âmbito de aplicação da Resolução das Nações Unidas. Senhoras e Senhores, Cameron, Obama e Sarkozy são responsáveis por crimes de guerra.



ONU: Traição e hipocrisia contra a Líbia




“Se você quer uma imagem de como será o futuro, imagine um coturno militar esmagando a cabeça de um homem – para sempre”. George Orwell.



29/3/2011, Felicity Arbuthnot, Palestine ChronicleLibya, Hipocrisy and Betrayal by the UNTraduzido pelo pessoal da Vila Vudu



A Líbia começará [começou] a ser atacada no dia, ou quase no dia, que marca o 8º aniversário do início da destruição do Iraque, 20 de março, pelo calendário europeu. E, como o Iraque, a Líbia também será destruída – escolas, sistema educacional, sistema de água, a infraestrutura, os hospitais, os prédios públicos. Haverá quantidade enorme de “trágicos erros”, “danos colaterais”, pais, mães, crianças, filhos, irmãos, bebês, avós, avôs perdidos, e serão inauguradas escolas para mutilados, para cegos, para surdos e o rol completo das ações humanitárias, que sempre vêm depois que os países são destruídos, arrasados. E, com o tempo, a história da Líbia, como aconteceu no Iraque e no Afeganistão, será apagada da memória humana.



A infraestrutura nacional destruída e com as sanções e embargo vigentes, nenhuma reconstrução será possível sem a participação dos “libertadores” ocidentais. EUA, Grã-Bretanha e França se reunirão e decidirão que o país tem de ser “estabilizado” antes de ser “reconstruído”: a destruição da Líbia, como a destruição do Iraque não tem história; é como se não tivesse acontecido. Em seguida, os mesmos EUA-França-Grã-Bretanha se (re)instalarão na Líbia, neossenhores dos campos de petróleo, das refinarias, da água. O povo líbio será apenas uma inconveniência, um incômodo; bem rapidamente, com a ajuda dos jornais e televisões, o povo líbio passará a ser chamado de “o inimigo”. Então haverá “insurgentes”, “terroristas”, e o povo líbio será morto a tiros, ou em antros de tortura – e EUA-França-Grã-Bretanha instalarão na Síria um governo-fantoche seu aliado.












Os invasores e ocupantes invadem e ocupam com exércitos, mas também com suas empresas, e algumas daquelas empresas serão premiadas com contratos “de reconstrução”. O dinheiro – como o dinheiro líbio que já foi confiscado e está congelado em bancos também invasores e ocupantes – como que desaparecerá sem deixar rastros. E a ação humanitária de EUA-França-Grã-Bretanha na Líbia deixará sobre a terra exclusivamente seu rastro de ruínas, roubos e mortes.



E as televisões e rádios em toda a Europa e nos EUA festejarão a “ação humanitária do ocidente” e da “coalizão internacional”, como aconteceu no Iraque. Europeus e norte-americanos voltarão para casa, certos de que não lhes choverão bombas sobre o telhado, que os bebês não terão surtos de tremores incontroláveis, que não acordarão no meio da noite, aos gritos, em pânico, ao mais remoto sinal de som de algum avião que cruze o céu.



Estamos assistindo à operação “Choque e pavor” versão Líbia. Vergonha. Só vergonha cobre hoje os EUA, a França, a Grã-Bretanha e a ONU. É mentira que tenham sequer tentado “salvar do horror da guerra sucessivas gerações”.



Cada viúva, cada criança morta ou mutilada para sempre, na Líbia, como no Iraque, terão esses nomes – EUA, França, Grã-Bretanha, ONU – gravados a fogo na própria carne, para sempre. Para toda uma geração de árabes, de fato, em todo o mundo, EUA, França, Grã-Bretanha e ONU já são sinônimos de morte.



E a imprensa divulgará os ataques que o ocidente move contra povos soberanos, ataques de guerra, gestos assassinos – como se fossem gestos de amizade, para levar democracia, para libertar a Líbia do “novo Hitler”, do “açougueiro de Bengazi”.



Os mesmos países que se associaram em gangue, dessa vez, para derrubar o governo soberano da Líbia, pode-se dizer, repetem os crimes que já foram julgados e condenados em Nuremberg: “Supremo crime internacional, que só difere de outros crimes de guerra porque carrega em si o mal acumulado de todos os crimes contra todos os povos”. De diferente que, dessa vez, embora os criminosos sejam os mesmos de sempre, a vítima é outra. O governo da Líbia é governo soberano. Nenhuma falsa “legalidade” que esconde o próprio crime por trás de uma ‘resolução’ arrancada à ONU por chantagem enganará todos, por muito tempo. O mundo já viu o que agora apenas se repete.



No que tenha a ver com os salvadores ocidentais de povos árabes e portadores de ‘democracia’ à ponta de sabres, muito cuidado com o que se pede a Deus. Em seis meses, a maioria dos líbios, e por pior que tenha sido a história dos últimos 40 anos, estarão maldizendo o dia em que entregaram seu país aos invasores, ocupantes, assaltantes de sempre.




O colapso da globalização

terça-feira, 29 de março de 2011







Chris Hedges





28/3/2011, *Chris Hedges, TruthdigThe Collapse of GlobalizationEnviado pelo pessoal da Vila Vudu



Os levantes do Oriente Médio, a agitação e a guerra que destroçam países, hoje, como a Costa do Marfim, o descontentamento que faz ferver a Grécia, a Irlanda, a Grã-Bretanha e todas as lutas dos trabalhadores em estados como Wisconsin e Ohio anunciam o colapso da globalização. São a voz de um mundo no qual recursos vitais, como comida e água, empregos e segurança, são cada dia mais escassos e mais difíceis de encontrar. Anunciam a certeza de miséria sempre crescente para centenas de milhões de pessoas que se veem presas em estados fracassados, sofrendo violência cada dia maior e vendo aumentar, só, a miséria e o medo.



Tudo o que milhões e milhões veem no futuro é controle draconiano cada dia maior, cada dia mais violência e força. – E quem duvide veja o que está sendo feito hoje contra o soldado Bradley Manning – controle, violência e força, que a elite das corporações usa para arquitetar a desgraça de milhões de seres humanos.



Temos de abraçar, e abraçar imediatamente, uma nova ética radical de simplicidade e rigorosa proteção de nosso ecossistema – com atenção especial ao clima – ou estaremos pendurados à vida por um fio, pela ponta dos dedos. Temos de reconstruir movimentos sociais radicais que exijam que os recursos do Estado e da nação sejam empregados para prover o bem-estar dos cidadãos e que a mão pesada do Estado seja usada para proibir a ação deletéria da elite do poder das corporações. Temos de ver os capitalistas das corporações, que assumiram controle integral sobre nosso dinheiro, nossa comida, nossa energia, nossa educação, nossa imaprensa, nosso sistema de saúde, nosso governo e nossa democracia, como nossos inimigos mortais a serem derrotados.



Nutrição adequada, água limpa e segurança básica já estão muito além do alcance de talvez mais da metade da população do mundo.



Segundo o Fundo Monetário Internacional, os preços dos alimentos subiram 61% globalmente desde dezembro de 2008. O preço do trigo explodiu, mais do que dobrou nos últimos oito meses. Quando metade da nossa renda é gasta em comida – como em países como Iêmen, Egito, Tunísia e Costa do Marfim, aumentos dessa magnitude trazem consigo, consequência inevitável, desnutrição e fome.





Manifestantes carregam um

boneco de Ronald McDonald.



Nos EUA o preço dos alimentos subiu 5% nos últimos três meses, em números anualizados. Há cerca de 40 milhões de pobres nos EUA, que gastam 35% da renda que lhes resta depois de pagos os impostos, para comer. Os preços dos combustíveis sobem, à medida que as mudanças climáticas atingem a produção agrícola e as populações são acossadas pelo desemprego, os norte-americanos também nos vemos envolvidos na mesma e sempre crescente agitação global. Já são inevitáveis, nos EUA, agitações sociais e “guerras do pão”. Mas nada disso significa nem jamais significará mais nem melhor democracia.



As instituições liberais – inclusive a imprensa, as universidades, os movimentos de trabalhadores e o Partido Democrata –, que se negam a encarar para desmascarar todos os delírios utópicos de que o mercado poderia educar seus líderes e os eleitores, liberaram as corporações, os bancos e as empresas de investimentos para que prossigam o assalto aos cidadãos. Hoje, especulam com commodities, fazem aumentar o preço dos alimentos e matam milhões de pessoas, de fome. Hoje, para manter altos os preços do carvão, do petróleo, do gás natural, dedicam-se a combater a divulgação e até a pesquisa de fontes alternativas de energia e matam milhões, obrigados a respirar gases de efeito estufa.



As instituições liberais – inclusive a imprensa, as universidades, os movimentos de trabalhadores e o Partido Democrata – liberaram o agrobusiness para destruir todos os sistemas de agricultura local, sustentável, e plantar soja e milho em todo o planeta, para produzir etanol.



As instituições liberais – inclusive a imprensa, as universidades, os movimentos de trabalhadores e o Partido Democrata – autorizam a indústria da guerra a drenar metade de tudo que o estado teria para gastar, e a gerar trilhões de déficits e a lucrar com as guerras no Oriente Médio, guerras que nem os EUA nem qualquer “coalizão” têm qualquer chance de vencer.



As instituições liberais – inclusive a imprensa, as universidades, os movimentos de trabalhadores e o Partido Democrata – autorizam as grandes corporações a escapar de todos os controles sociais, até dos mais básicos, a escapar de todas as regulações, para construir, em vez de instituições democráticas, uma espécie de neofeudalismo global.



Ninguém jamais elegeu diretamente acionistas de grandes corporações ou os especuladores de Wall Street, mas são eles que detêm o poder de produzir a nossa comida e de dirigir nossa vida social e política. E nada disso mudará, enquanto os EUA não derem as costas aos delírios do Partido Democrata, não aprenderem a denunciar as ortodoxias que se infiltraram nas universidades e na imprensa dos EUA, lá metidos pelos apologistas do mercado e das grandes corporações.



A única salvação que resta aos norte-americanos é construir outra oposição ao estado governado pelas corporações e por Wall Street, uma oposição a ser construída de baixo para cima. Não é fácil de fazer, nem se faz rapidamente. Antes, os norte-americanos têm de aceitar o status de párias econômicos e sociais e políticos – sobretudo hoje, quando a franja mais lunática do establishment político nos EUA parece ganhar mais poder, a cada dia, e parece governar sem oposição.



O estado Wall Street nada tem a oferecer nem à esquerda nem à direita, além do medo. E usa o medo – medo do humanismo secular e medo do cristianismo fascista e medo dos muçulmanos fascistas – para fazer, do eleitor, seu cúmplice passivo. Enquanto o medo paralisar os EUA, nada será jamais alterado.



Friedrich von Hayek e Milton Friedman , dois dos principais arquitetos do capitalismo sem regulações jamais poderiam ter sido levados a sério. Mas a propaganda das grandes corporações e o dinheiro das grandes corporações, na universidade e na imprensa, fazem milagres e converteram essas figuras marginais na história do pensamento, em reverenciados profetas nas universidades, nos think tanks, nas “consultorias”, na imprensa, nos corpos legislativos, nas cortes de justiça e nos conselhos de administração das próprias corporações.



Hoje, quando Wall Street já só sobrevive porque mamou nas tetas do Tesouro dos EUA até secá-las, ainda se ouve pelas televisões e se lê nos jornais a cantilena desacreditada daquelas teorias econômicas. Wall Street insiste na especulação que já fez sumir 40 trilhões de dólares da riqueza do mundo. O mercado já fracassou. E ainda somos ensinados, por todos os sistemas de informação, a repetir o mantra de que o mercado “sabe”.



É como se não importasse, como John Ralston Saul escreveu, que todas as promessas da globalização tenham sido desmascaradas e já se saiba que são mentiras. É como se não importasse que a desigualdade econômica tenha aumentado e que praticamente toda a riqueza do mundo esteja hoje concentrada em poucas mãos. É como se não importasse que as classes médias – o único coração vivo de qualquer democracia – esteja sumindo nos EUA e que os direitos e o salário dos trabalhadores estejam despencando, ao mesmo ritmo em que foram demolidas todas as organizações e todas as regulações de proteção ao trabalho e ao trabalhador.



É como se não importasse que, nos EUA, as corporações tenham usado a desregulação do trabalho como mecanismo para massiva evasão de impostos – tática que permite que conglomerados como a General Electric já praticamente nem paguem impostos. É como se não importasse que os conglomerados globais explorem até a morte os ecossistemas dos quais a espécie humana depende para viver.



A barreira de mentiras disseminadas pelos sistemas de propaganda das grandes corporações, propaganda que se faz pela imprensa e pelas universidades, sistemas nos quais as palavras são substituídas por imagens, infográficos e música, é absolutamente impermeável à verdade. O único deus cujo poder jamais é desafiado pela razão é o deus mercado. E os dissidentes dessa religião de loucos – seja Ralph Nader, seja Noam Chomsky – são banidos como hereges.



O objetivo do estado Wall Street não é alimentar, vestir, dar teto às massas, mas concentrar todo o poder econômico, social e político, e toda a riqueza, nas mãos do minúsculo estrato das próprias corporações globais. É inventar um mundo no qual os “altos executivos” ganham 900 mil dólares por hora, enquanto famílias de quatro membros têm de trabalhar, todos, para sobreviver. Essa desigualdade só pode ser mantida, se as corporações se dedicarem a enfraquecer o estado, as organizações sociais, as organizações políticas e a destruir todas as instituições democráticas. Universidades privadas, escolas privadas, exércitos de mercenários, sistema privatizado de saúde para enriquecer as corporações e matar os doentes – com privatização de todos os serviços públicos, do padre-pastor da paróquia aos agentes da inteligência, tudo para gerar lucros para a besta privada, à custa de vidas humanas públicas, sociais, a nossa vida.



A dizimação dos sindicatos, o enviezamento de toda a educação social, convertida a educação em training vocacional sem sentido, e o desmonte dos serviços sociais, converteu os EUA em estado escravo dos objetivos das grandes corporações globais. A intrusão das corporações na esfera pública destruiu o conceito de bem comum. Apagou a linha que separava o interesse público e o interesse privado. Criou um mundo que só sabe procurar a autossatisfação de autointeresses.



Os ideólogos da globalização – Thomas Friedman, Daniel Yergin, Ben Bernanke, Anthony Giddens – são produtos atrozes do poder autocentrado, autorreferente, materialista, das corporações no poder. Usam a ideologia utopista da globalização como justificativa moral para o que não é senão autorreferência, auto-obcecação da elite, em seus privilégios. Não questionam o projeto imperial dos EUA, a miséria crescente dentro dos EUA, a desigualdade dentro dos EUA, não veem as diferenças em segurança e em riqueza que há entre aquele pequeno grupo e o resto dos seres humanos que há no planeta. Abraçaram a globalização porque essa ideologia, como outras ideologias teológicas, justificam o privilégio e o poder de uns, e a desgraça e a miséria de outros. Como outros fundamentalistas religiosos, os crentes fiéis fundamentalistas que cultuam o mercado dizem que a globalização não é uma ideologia, mas a expressão de verdade incontroversa. Desmascarar a fraude, é pecado.



E, porque a verdade sempre foi ocultada, toda a ideologia econômica e política da globalização foi excluída das discussões públicas. A globalização foi vendida ao mundo como qualquer outro produto, sem defeitos, só com qualidades. A discussão que não se fez publicamente, socialmente, nos tempos triunfalistas da globalização, muito menos se fará agora, em tempos do colapso.



A defesa da globalização marca um ponto de ruptura perturbadora, na vida intelectual dos EUA. O colapso da economia global em 1929 desacreditou os ideólogos da desregulamentação dos mercados. Abriu espaço para visões alternativas, muitas das quais, fruto dos movimentos socialistas, comunistas e anarquistas que houve um dia nos EUA e, então puderam ser ouvidos. Os EUA reagiram à realidade política. A capacidade de criticar cânones políticos e econômicos resultaram no New Deal, que desmantelou monopólios, mas desmantelou também as regulações a que estavam submetidos bancos e grandes corporações.



Mas hoje, porque as corporações controlam todo o sistema de comunicação de massa, e porque milhares de economistas, professores de administração de empresa, analistas de finanças, jornalistas e gerentes de empresa apostaram seus currículos, sua credibilidade e suas carreiras profissionais na utopia global, os cidadãos, entre si, só discutem bobagens, trivialidades, ou falam sobre o que não entendem. Como se os EUA ainda seguissem o conselho de Alan Greenspan, que dizia que Ayn Rand, romancista de quinta categoria seria grande “guru econômico”, ou de Larry Summers, cujo programa de desregulação dos bancos, quando foi secretário do Tesouro do presidente Bill Clinton, ajudou a capar alguma coisa como 17 trilhões em salários, aposentadorias e poupanças pessoais.



Candidatos à presidência como Mitt Romney dizem aos cidadãos que cortes de impostos devidos pelas grandes empresas as forçariam a “repatriar”, de volta para os EUA, os lucros e empregos que “exportaram”. Essa foi ideia de um gerente de fundo de investimentos que fez fortuna a partir de um programa de demitir empregados e é bom exemplo de a que ponto de minúcia chegou a máscara racional que se encontrou para encobrir a irracionalidade do discurso político da globalização.



Civilizações em declínio muitas vezes preferem qualquer esperança, por absurda que seja, à verdade. A mentira torna a vida mais suportável. Por isso os apologistas da globalização ainda encontram defensores. E seu sistema de propaganda construiu uma vasta cidade-Potemkin chamada de “entretenimento”. As dezenas de milhões de norte-americanos empobrecidos, acossados pela miséria, são invisíveis. Não chegam às televisões. Como outros milhões de pobres, que vivem em favelas, em todo o mundo. Não os vemos sofrer e morrer. Discutimos outras coisas, sempre tolices. Discutimos incansavelmente teorias absurdas. Investimos nossa energia emocional em “reality shows” que celebram o excesso, o hedonismo, a boa forma física. A vida opulenta e ociosa de uma oligarquia, oferecida como se fosse uma espécie de espelho macabro: 1%, a oligarquia nos EUA, come mais vitaminas que os 90% restantes da população, somados. (...) O curto circuito de todos os valores e a perversão da consciência social pela “ideologia global”, ideologia das corporações, do estado Wall Street, desenharam uma paisagem na qual figuras “corporativas” como Donald Trump podem pensar em concorrer à presidência: dado que sabe acumular quantidades astronômicas de dinheiro privado... com certeza será presidente sábio. (...)



Os propagandistas da globalização, do globalismo, creem no crescimento natural dessa imagem, em mundo culturalmente analfabetizado. Fala-se sobre teoria política e economia, em frases clichês, ocas. Mobilizam-se os desejos mais irracionais, os medos. Selecionam-se alguns números, alguns dados isolados, para usá-los como demonstração... do que se queira demonstrar. Pregam e ensinam a ignorância, como se fosse saber: a globalização fez dos EUA, potência. Somos grandes. A mentira é verdade. Guerra é paz.



Enquanto os EUA não acordarem desse sono de autoilusão, continuaremos andando na direção errada. É hora de os EUA acordarem e começarem a agir. Temos de reencontrar nossa perdida potência, a prática norte-americana de atos de desobediência civil, contra o estado Wall Street, contra o estado dominado pelas corporações. Temos de nos separar de todas as instituições liberais que servem às corporações, da imprensa, das universidades e dos partidos do establishmen tcorporativo – é hora, sobretudo, de os norte-americanos nos separarmos do Partido Democrata que já nos está empurrando para uma guerra global – antes que nos empurre, de vez, para uma catástrofe global.





*Chris Hedges escreve todas as segundas –feiras no Thrudig , é associado ao The Nation Institute, vencedor do Prêmio Pulitzer de jornalismo; é autor da obra “Death of the Liberal Class”

terça-feira, 29 de março de 2011

Não há “business” como o guerra-“business”

"É a água, estúpido!"

Pepe Escobar


There’s no business like war business

Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu



Mentiras, hipocrisias e agendas ocultas. Eis os temas dos quais o presidente Barack Obama não tratou, ao explicar aos EUA e ao mundo a sua doutrina para a Líbia. A mente se perde, vacila, ante tais e tantos buracos negros que cercam essa esplêndida guerrinha que não é guerra (é “ação militar com escopo limitado por prazo limitado”, nos termos da Casa Branca) – complicados pela inabilidade do pensamento progressista, que não consegue condenar, ao mesmo tempo, tanto a crueldade do governo de Muammar Gaddafi quanto o “bombardeio humanitário” dos exércitos de EUA-anglo-franceses.



A Resolução n. 1.973 do Conselho de Segurança da ONU operou como cavalo de Tróia: permitiu que o consórcio EUA-anglo-francês – e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) – se convertesse em força aérea da ONU usada para apoiar um levante armado. Aparte nada ter a ver com proteger civis, esse arranjo é absoluta e completamente ilegal em termos da legislação internacional. O objetivo final aí ocultado, que até as crianças subnutridas da África já viram, mas que ninguém assume ou confessa, é mudar o governo na Líbia.



O tenente-general Charles Bouchard do Canadá, comandante da OTAN para a Líbia, que insista o quanto quiser, repetindo que a missão visa exclusivamente a proteger civis. Pois os “civis inocentes” lá estão, dirigindo tanques e disparando Kalashnikovs, brigada de farrapos que, de fato, são soldados em guerra civil. O problema é que, agora, a OTAN foi convertida em força aérea daquele exército, seguindo as pegadas do consórcio EUA-franco-inglês.



Ninguém diz que a “coalizão de vontades” que hoje combate o governo líbio é coalizão de apenas 12 vontades (das 28 vontades representadas na OTAN), mais o Qatar. Isso absolutamente nada tem a ver com a “comunidade internacional”.



O veredicto sobre a zona aérea de exclusão ordenada pela ONU só será conhecido depois que houver governo “rebelde” na Líbia e terminar a guerra civil (se terminar rapidamente). Só então se poderá saber se, algum dia, os Tomahawks e bombas-em-geral foram algum dia justificados; o porquê de os civis de Cyrenaica terem sido “protegidos”, ao mesmo tempo em que os civis em Trípoli foram Tomahawk-eados; quem, afinal eram os ditos “rebeldes” ditos “salvos”; se a coisa toda, desde o início, em algum momento deixou de ser ilegal; como aconteceu de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU ser usada para acobertar golpe de Estado (digo, “mudança de regime”); como o caso de amor entre “revolucionários” líbios e o Ocidente pode acabar em divórcio sangrento (lembrem o Afeganistão!); e quais os atores ‘ocidentais’ que lucrarão mais, imensamente, com a exploração de uma nova Líbia – seja unificada seja balkanizada.



Pelo menos por hora, é muito fácil identificar os que já estão lucrando.



O Pentágono



Robert “O Supremo do Pentágono” Gates disse no fim-de-semana, na maior cara dura, que só há três regimes repressivos em todo o Oriente Médio: Irã, Síria e Líbia. O Pentágono se encarrega agora do elo mais fraco – a Líbia. Os outros dois sempre foram figuras chaves da lista dos neoconservadores, de governos a serem derrubados. Arábia Saudita, Iêmen, Bahrain etc. são exemplos de democracia.



Como nessa guerra de prestidigitação “agora se vê, agora não se vê”, o Pentágono obra para lutar não uma, mas duas guerras. Começou pelo AFRICOM – Comando dos EUA na África –, criado no governo George W Bush, reforçado no governo Obama, e rejeitado por legiões de governos, intelectuais, organizações de direitos humanos e especialistas africanos. Agora, a guerra está em transição, passando para as mãos da OTAN, que é o mesmo que a mão pesada do Pentágono sobre seus asseclas europeus.



É a primeira guerra africana do AFRICOM, comandada agora pelo general Carter Ham diretamente de seu quartel-general nada-africano em Stuttgart. O AFRICOM é fraude, como diz Horace Campbell, professor de estudos afro-norte-americanos e ciência política na Syracuse University: fundamentalmente, é uma frente de operação comercial, para que empresas contratadas pelos militares nos EUA – Dyncorp, MPRI e KBR possam fazer negócios na África. Os estrategistas dos EUA que muito se beneficiaram na porta giratória que se criou entre as privatizações e as guerras estão adorando a intervenção na Líbia, como magnífica oportunidade para dar credibilidade político-militar ao AFRICOM-business.



Os Tomahawks do AFRICOM-EUA atingiram também – metaforicamente – a União Africana (UA) a qual, diferente da Liga Árabe, não se deixa facilmente comprar pelo ocidente. As petro-monarquias do Golfo, todas, festejaram o bombardeio; Egito e Tunísia, não.



Só cinco países africanos não são subordinados ao AFRICOM-EUA: Líbia, Sudão, Costa do Marfim, Eritreia e Zimbabwe.



A OTAN



O plano máster da OTAN é dominar o Mediterrâneo, como lago da OTAN. Sob essa “ótica” (no jargão do Pentágono), o Mediterrâneo é infinitamente mais importante hoje, como teatro de guerra, que o “AfPak”.



Apenas três, das 20 nações do ou no Mediterrâneo não são da OTAN ou aliadas de seus programas “de parceria”: a Líbia, o Líbano e a Síria. O Líbano já está sob bloqueio da OTAN desde 2006. Atualmente, já há bloqueio também contra a Líbia. Os EUA – via OTAN – já praticamente conseguiram fazer do círculo, o quadrado. Que ninguém se engane: a Síria é o próximo alvo.



A Arábia Saudita



Excelente negócio! O rei Abdullah vê-se livre de Gaddafi, seu arqui-inimigo. A Casa de Saud – do modo abjeto que é sua marca registrada – rende-se ao atraso, para beneficiar o ocidente. A atenção da opinião pública ganha objeto alternativo, para distrair-se: os sauditas invadem o Bahrain, para esmagar movimento popular legítimo, pacífico, pró-democracia.



A Casa de Saud vendeu a ficção segundo a qual “a Liga Árabe” teria votado unanimemente a favor da zona aérea de exclusão. É mentira.



Dos 22 membros da Liga Árabe, só 11 estiveram presentes à sessão que aprovou a “no-fly zone”; seis desses são membros do Conselho de Cooperação do Golfo, gangue da qual a Arábia Saudita é o cão-chefe.



A Casa de Saud teve de aplicar uma chave-de-braço em três. A Síria e a Argélia estavam contra a “no-fly zone” contra a Líbia. Tradução: só nove, dentre 22 países árabes, votaram a favor de implantar-se a zona aérea de exclusão na Líbia.



Agora, a Arábia Saudita já pode até mandar que o presidente do Conselho de Cooperação do Golfo Abdulrahman al-Attiyah declare sem piscar que “o sistema líbio perdeu a legitimidade”. Sobre a Casa de Saud e os al-Khalifas do Bahrain... não faltará quem os indique para o Hall da Fama da Assistência Humanitária.



O Qatar



O país que hospedará a Copa do Mundo de Futebol de 2022 sabe, sim, amarrar negócios. Seus Mirages já ajudavam a bombardear a Líbia, enquanto Doha preparava-se para vender aos mercados ocidentais o petróleo da Líbia. O Qatar foi o primeiro país a reconhecer o governo dos “rebeldes” líbios como único governo legítimo; fê-lo um dia depois de ter fechado o negócio do varejão do petróleo líbio no ocidente.



Os “rebeldes”



Sem desrespeitar as importantes aspirações democráticas do movimento da juventude líbia, fato é que o grupo mais bem organizado da oposição a Gaddafi é a Frente Nacional de Salvação da Líbia – há anos financiada pela Casa de Saud, pela CIA e pela inteligência francesa. O “rebelde” “Conselho Nacional do Governo de Transição” é praticamente a velha Frente Nacional, acrescida de alguns militares desertores. A “coalizão” “protege” essa “elite” de “civis inocentes”, hoje.



Nessa linha, o “Conselho Nacional do Governo de Transição” acaba de nomear novo ministro das finanças: Ali Tarhouni, economista formado nos EUA. Foi ele quem disse que vários países ocidentais há lhe haviam dado créditos, sob garantias do fundo soberano líbio; e que os britânicos lhe deram acesso a 1,1 bilhão de dólares do dinheiro de Gaddafi.



Significa que o consórcio EUA-anglo-francês – e agora a OTAN – só terão de pagar a conta da compra das bombas. No que tenha a ver com histórias da imundície das guerras, essa é impagável: o ocidente está usando o dinheiro da Líbia para pagar um bando de líbios oportunistas interessados em derrubar o governo da Líbia. França e Inglaterra gozam, de tanto que amam as bombas. Nos EUA, os neoconservadores devem estar se estapeando, lá entre eles, de inveja: por que o vice-secretário de Defesa Paul Wolfowitz não teve a mesma ideia, para o Iraque, em 2003?



A França



Oh la la, a coisa bem poderia servir de substrato para romance proustiano. A coleção estrela da primavera francesa nas passarelas parisienses é o show de moda-fantasia de Nicolas Sarkozy: uma zona aérea de exclusão na Líbia, rebordada com ataques-acessórios pelos jatos Mirage/Rafale. Todo o show e pirotecnia foi concebido por Nouri Mesmari, chefe de protocolo de Gaddafi, que desertou e fugiu para a França em outubro de 2010. O serviço secreto italiano vazou para jornalistas e jornais selecionados os detalhes da deserção e da fuga. O papel do DGSE, serviço secreto francês, está mais ou menos explicado no e-jornal (só para assinantes) Maghreb Confidential.



A verdade é que o coq au vin da revolta de Benghazi já estava cozinhando em fogo baixo desde novembro de 2010. Os galos-estrelas foram Nouri Mesmari; Abdullah Gehani, coronel da Força Aérea da Líbia; e o serviço secreto francês. Mesmari era chamado “o WikiLeak líbio”, porque vazou quase todos os segredos militares de Gaddafi. Sarkozy adorou, furioso desde que Gaddafi cancelou gordos contratos para comprar aviões Rafales (para substituir os Mirages líbios que, hoje, estão sendo bombardeados por Mirages franceses) e usinas nucleares francesas.



Isso explica por que Sarkozy, que estava tão animadinho, posando de neoliberador de árabes, foi o primeiro líder europeu a reconhecer “os rebeldes” (para tristeza de muitos, na União Europeia) e o primeiro a bombardear as forças de Gaddafi.



Vê-se aí também exposto o papel do desavergonhado filósofo e autopropagandista Bernard Henri-Levy, que se esfalfou enchendo a mídia mundial com notícias de que ele telefonara a Sarkozy, de Benghazi, e assim despertou o filão humanitário no coração do presidente. Ou Levy é o otário da hora, ou é uma conveniente cereja “intelectual” acrescentada ao já assado bolo-bomba contra Gaddafi.



Ninguém detém Sarkozy, o Terminator. Já avisou todos os governos árabes que estão na mira para serem bombardeados ao estilo Líbia se espancarem manifestantes. Até já avisou que a Costa do Marfim seria “a próxima”. Bahrain e Iêmen, claro, não têm com o que se preocuparem. Quanto aos EUA, mais uma vez os EUA apoiam golpe militar (não deu certo com o Omar “Sheikh al-Tortura" Suleiman no Egito. Talvez funcione na Líbia).



Al-Qaeda



O coringa sempre conveniente renasce. O consórcio EUA-franco-inglês – e agora também a OTAN – outra vez combatem aliados à al-Qaeda, dessa vez representada pela al-Qaeda no Maghreb (AQM).



Abdel-Hakim al-Hasidi, líder dos “rebeldes” líbios – que combateu ao lado dos Talibã no Afeganistão – confirmou, com detalhes, para a mídia italiana, que recrutara pessoalmente “cerca de 25” jihadistas na região de Derna no leste da Líbia para combater os EUA no Iraque; e que agora “eles estão na linha de frente em Adjabiya”.



Isso, depois de o presidente do Chad Idriss Deby ter dito que a al-Qaeda no Maghreb assaltou arsenais militares na Cyrenaica e provavelmente já têm alguns mísseis terra-ar. No início de março, a al-Qaeda no Mahgreb apoiou publicamente os “rebeldes”. O fantasma de Osama bin Laden deve estar rindo como o gato Cheshire de Alice; mais uma vez, conseguiu por o Pentágono a trabalhar para ele.



Os privatizadores da água



Poucos no ocidente sabem que a Líbia – como o Egito – repousa sobre o Sistema Aquífero do Arenito Núbio [ing. Nubian Sandstone Aquifer]: é um oceano de extremamente valiosíssima água doce. Ah, sim, sim, essa guerra de prestidigitação “agora se vê, agora não se vê”, é crucial guerra pela crucial água.



O controle do aquífero é patrimônio sem preço: além da água para beber, o prestígio para dominar: a EUA-França-Inglaterra “resgatando” valiosos recursos naturais, das mãos dos árabes “selvagens”.



É um Aquedutostão – enterrado fundo no coração do deserto. São 4.000 quilômetros de dutos. É o Maior Projeto de Rio Criado pelo Homem [ing. Great Man-Made River Project (GMMRP)], que Gaddafi construiu por 25 bilhões de dólares sem tomar emprestado nem um centavo nem do FMI nem do Banco Mundial (mais um exemplo de barbárie de Gaddafi, que não se deve deixar vazar para o resto do mundo subdesenvolvido).



O sistema GMMRP fornece água para Trípoli, Benghazi e todo o litoral da Líbia. A quantidade de água disponível, estimada por especialistas, é o equivalente à toda a água que corre pelo Nilo por 200 anos. Comparem-se esses números os números das chamadas “Três Irmãs” – empresas Veolia (ex-Vivendi), Suez Ondeo (ex-Generale des Eaux) e Saur – as empresas francesas que controlam mais de 40% do mercado global de água.



Todos os olhos devem-se focar, atentos, para ver se algum dos aquedutos da GMMRP serão bombardeados. Cenário altamente possível, caso sejam bombardeados, é que imediatamente comecem a ser negociados os gordos contratos de “reconstrução” – que beneficiarão a França. Será o passo final para privatizar toda aquela – até o momento gratuita – água. Da doutrina do choque, chegamos à doutrina da água.



Essa lista dos que ganham com a guerra está longe de ser completa – ainda não se sabe quem ficará nem com o petróleo nem com o gás natural da Líbia. Enquanto isso, o show (das bombas) tem de continuar.

Congresso precisa debater guerra dos EUA na Líbia

27/03/2011 - 10:43

Mark Weisbrot
Washington






"O presidente não tem poder, sob a Constituição, de autorizar unilateralmente um ataque militar em uma situação que não envolva a detenção de uma ameaça efetiva ou iminente à nação".



Estas foram as palavras do então senador Barack Obama ao se opor, em 20 de dezembro de 2007, à ideia de que o presidente Bush poderia bombardear o Irã sem a aprovação do Congresso. Agora, no entanto, ele faz exatamente o que condenou quando ainda não representava o establishment da política externa dos EUA - em outras palavras, um império.





As pessoas que fundaram este país não estavam interessadas em governar o mundo inteiro. Foi por isso que elas escreveram uma Constituição que deu aos representantes do povo no Congresso a autoridade de declarar guerra.



O norte-americano médio, ao contrário do que diz a mitologia popular, vive muito mais próximo desses princípios do que a elite da política externa. Para apoiar uma guerra em qualquer lugar, o cidadão geralmente precisa ouvir mentiras durante anos e ser convencido de que existe uma séria ameaça à nossa segurança. O Iraque é apenas o mais ostensivo e recente exemplo, no qual 70% das pessoas foram convencidas de que Saddam Hussein estava envolvido nos massacres do 11 de Setembro. Ainda assim, a maioria dos norte-americanos era contra a invasão do Iraque antes de ela ocorrer.



Para a elite da política externa, a despeito de suas divergências sobre o Iraque, a guerra é apenas uma extensão da política por outros meios. Seus filhos não têm de lutar nelas nem voltar para casa inválidos ou mortos, e eles não arcam com os custos econômicos.



Esta diferença de atitude explica por que o governo foi à guerra na Líbia sem consultar o Congresso, apesar de trabalhar com o Conselho de Segurança da ONU e a Liga Árabe. Há bons motivos para um representante eleito pensar duas vezes antes de apoiar o envolvimento dos EUA em mais uma guerra em um país muçulmano distante que pouco ou nada tem a ver com nossa segurança nacional.



Não sabemos quanto essa guerra vai durar; ela pode se prolongar por anos. A história mostra que é muito mais fácil entrar em uma guerra do que sair; ainda há 100 mil soldados dos EUA no Afeganistão nove anos depois, apesar de uma pesquisa recente do Washington Post ter mostrado que quase dois terços dos norte-americanos acreditam que a guerra não vale a pena.



Em apenas alguns dias de bombardeios contra a Líbia, gastamos centenas de milhões de dólares - e a conta certamente chegará aos bilhões. O parlamentar Barney Frank falou por milhões de norte-americanos ao declarar que esta ação militar é um "problema fiscal" e que alguns norte-americanos vão morrer porque estamos demitindo bombeiros e policiais. Mas sempre há, de algum modo, alguns bilhões extras para a guerra.



Os norte-americanos estão compreensivelmente céticos quanto à ideia de que nosso envolvimento em mais uma guerra em um país petrolífero é motivado por preocupações humanitárias. Nossos líderes parecem não se importar muito com o povo do Iêmen enquanto dezenas de manifestantes pacíficos são massacrados por um governo apoiado pelos EUA. Além disso, se Washington e seus alidados estivessem realmente tentando evitar o derramamento de sangue na Líbia, haveria um esforço verdadeiro para encontrar uma solução negociada para o conflito - o que não ocorre.



A intervenção externa em uma guerra civil frequentemente torna as coisas piores ao inflamar conflitos étnicos. Mais de um milhão de iraquianos estão mortos como resultado da invasão norte-americana, que, entre outras coisas, promoveu uma sangrenta guerra civil. A invasão do Afeganistão também agravou dramaticamente a guerra civil no país.



Alguns membros do Congresso, entre eles John Larson, líder do caucus democrata na Câmara, exigiram que o presidente Obama solicite aprovação parlamentar para essa guerra. Esperemos que mais congressistas tenham a coragem de juntar-se a eles. Do contrário, o próximo presidente poderá concluir que tem o direito de decidir bombardear o Irã.



* Mark Weisbrot é co-diretor do Center for Economic and Policy Research (Centro de Pesquisa Econômica e Política), em Washington. Também é presidente de Just Foreign Policy. Publicado originalmente pelo Centro de Pesquisa Econômica e Política.



http://operamundi.uol.com.br/opiniao_ver.php?idConteudo=1426



segunda-feira, 28 de março de 2011

28/3/2011, Land and People


The plot sickens
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Ontem, Ali Abunima (avinunu) twitou o seguinte:



“As revoluções árabes queriam ser meios para *diminuir* não para *aumentar* a intervenção, a penetração imperial na região”.



Hoje, Angry Arab escreveu o seguinte sobre a onda de contrarrevolução que cresce em todo o mundo árabe:



“Vou escrever sobre como começou essa imunda contrarrevolução.



Acho que a Arábia Saudita (com apoio de Israel) decidiu fazer abortar, ou capturar, os levantes árabes. Começou logo depois da queda de Mubarak, quando as relações entre a Arábia Saudita e os EUA complicaram-se, porque a Arábia Saudita protestou contra o ‘apoio’ dos EUA à ‘democracia no Egito’ (como se os EUA já não estivessem fazendo de tudo para salvar Mubarak). Mas os EUA logo baixaram a crista e agora EUA e Arábia Saudita voltaram a entender-se e são 100% parceiros, como sempre.



Ontem, ouvi, na Al Jazeera, uma “notícia” muito esquisita: diziam que uma delegação de EUA e da União Europeia está no Iêmen, trabalhando para construir a “transição pacífica” no Iêmen. Ora! No Iêmen, os EUA já construíram ou serviram de instrumento para construir todo o regime e todo o aparato militar-inteligência! Os EUA farão, no Iêmen o que bem entenderem. A relação íntima que há entre o príncipe Saud Faysal e Tantawi do Egito é mais um ingrediente desse complô sinistro.



Os EUA e a Arábia Saudita (com Israel ali, junto) tentarão garantir a qualquer custo que os novos governos sejam tão ruins quanto, ou se possível piores, que os antigos.



Logo estaremos assistindo os movimentos deles para por Rif no lugar de Al-Asad e Abdul-Halim Khaddam com os elementos mais reacionários da Fraternidade Muçulmana da Síria, no poder.



Trata-se agora de lutar contra todas as ditaduras que há e contra, também, os “regimes democráticos” que sejam postos no lugar das ditaduras e que serão, sempre, fantoches de EUA-Arábia Saudita.



A boa notícia é a seguinte: façam os EUA o que quiserem, vencemos o medo e ninguém, nunca mais, conseguirá encabrestar a rua árabe.”



Agora, então, o Império passou para o Plano Z e está usando diferentes meios:



-- intervenção militar da Arábia Saudita no Bahrain (que é praticamente intervenção dos EUA, delegada formalmente a um fantoche-aliado, para proteger as bases navais dos EUA no Bahrain);



-- intervenção imperial direta na Líbia (delegada formalmente à OTAN), para garantir que o próximo governo seja “aliado” (leia-se “subserviente”);



-- manipulação política na Tunísia e no Egito;



-- corrupção do levante no Iêmen, com a entrada forçada de Ali Muhsin no cenário – aparece e, repentinamente, já é líder do levante, pronto para “tomar o poder” de Ali Abdallah Saleh, com as bênçãos dos EUA (já escrevi sobre Ali Muhsin, sem gosto, sem cara, ambicioso e ligado aos sauditas);



-- e em seguida metem-se na Síria, onde, por todos os lados, opera a mão dos EUA-Sauditas.



Os companheiros e camaradas revolucionários na Síria enfrentarão um difícil dilema político.



Pessoalmente, apoio a posição do Angry Arab: derrubar as ditaduras que havia e também os governos ditos “democráticos” que os EUA imponham, e que sejam governos-fantoches dos norte-americanos.

Libia: A guerra inconstitucional de Obama.

Bruce Ackerman,
Foreign PolicyObama’s Unconstitutional


Traduzido pelo pessoal da vila vudu

Ao decidir por guerra contra a Líbia, Obama arrasta os EUA para presidência mais imperial do que Bush jamais tentou.



Ao arrastar os EUA à guerra contra a Líbia, o governo de Barack Obama inaugura nova frente na construção de governo imperial –, dessa vez governo de presidente executivo que cada vez dá menos importância a representação dos cidadãos, no Congresso, nos EUA e em todo o mundo. A Resolução do Conselho de Segurança da ONU legitimou uma decisão de bombardear país soberano e membro da ONU, nos termos da lei internacional. Mas nenhuma decisão da ONU sobrepõe-se à Constituição dos EUA, que dá ao Congresso, não ao presidente, o poder de “declarar guerra”.



Barack Obama



Depois da Guerra do Vietnã, o Congresso dos EUA aprovou a Resolução sobre Poderes de Guerra, que dá ao presidente o poder, por 60 dias, para agir unilateralmente e declarar guerra, “no caso de emergência nacional criada por ataque contra os EUA, territórios e propriedades, ou contra suas Forças Armadas.” A lei garante ao chefe do Executivo mais 30 dias para promover o desengajamento, no caso de, no período legal, não obter a aprovação do Congresso.



Evidentemente, essas provisões legais não se aplicam na discussão sobre a constitucionalidade da intervenção dos EUA na Líbia, dado que a Líbia não atacou “nossas Forças Armadas”. O presidente esqueceu-se de anotar esse ponto essencial, no documento pelo qual levou ao conhecimento do Congresso a decisão unilateral que tomara sobre a Líbia, obedecendo outra determinação legal. Não tendo havido “ataque” armado contra os EUA, nada autoriza o presidente a desconsiderar a opinião do Congresso em questão crucial de guerra e paz. O paradoxo é claro: se não houve ataque armado aos EUA, nada há a comunicar ao Congresso. Se o presidente tomou decisão unilateral de ir à guerra e entende que haja o que comunicar ao Congresso... Falta o ataque armado contra os EUA.



Todo esse caso parece muito gravemente anômalo, uma vez que, no caso da Líbia, o presidente teve tempo de sobra para encaminhar consulta e pedir o apoio do Congresso. Uma ampla coalizão – do senador John McCain ao senador John Kerry — ter-se-ia mobilizado a favor de uma resolução conjunta dos dois partidos, enquanto o governo cuidaria da diplomacia internacional. Aparentemente, Obama considerou muito mais importante mobilizar seu lobby para convencer a Liga Árabe, do que para convencer o Congresso dos EUA.



Ao excluir o Congresso, Obama supera até o dúbio precedente criado pelo presidente Bill Clinton quando bombardeou o Kosovo em 1999. Daquela vez, o Gabinete do Assessor Constitucional do Departamento de Justiça concluiu que o Congresso manifestara, sim, sua aprovação, ao definir fundos para a campanha do Kosovo. Foi interpretação muito elástica da lei, se se consideram os fatos. Mas Obama não conseguirá beneficiar-se nem dessa interpretação desesperada: o Congresso não aprovou nem definiu quaisquer fundos para a guerra da Líbia.



O presidente Obama, simplesmente, usou dinheiro que o Pentágono destina a outras finalidades previstas em lei, e desviou-o para pagar a atual guerra aérea contra a Líbia.



A Resolução sobre Poderes de Guerra não autoriza nem admite nem um único dia de bombardeio contra a Líbia. No máximo, oferece uma linha de fuga, ao declarar que a resolução “não visa a modificar os poderes constitucionais garantidos ao Congresso ou ao Presidente”. Assim sendo, Obama alegará que o poder constitucional que tem, como comandante-em-chefe, basta-lhe para declarar guerra sem o Congresso... Apesar de a Constituição declarar insistentemente que esse poder não basta ao presidente, para declarar guerras.



Muitos presidentes modernos usaram esse argumento, e Harry Truman baseou-se nele, na Coreia. O que surpreende é ver Obama às vésperas de ratificar esses tristes precedentes. Obama foi eleito como reação nacional aos argumentos unilateralistas de John Yoo e outros, empregados para defender e “legalizar” as ilegalidades da era George W. Bush. Agora, Obama já avança para ilegalidades em campos aos quais nem Bush jamais chegou.



Depois de muito argumentar em defesa de seus poderes inerentes, Bush conseguiu, finalmente, que o Congresso autorizasse suas guerras no Afeganistão e no Iraque. Agora, Obama já aciona a mesma conversa infindável dos tempos de Bush, para justificar o que os EUA estão fazendo na Líbia... mas sem qualquer autorização do Congresso!



A insistência com que o presidente Obama repete que a campanha tem escopo e duração limitados não lhe serve de desculpa. São essas, precisamente, as questões a serem definidas em colaboração com o Congresso. E, agora, Obama fala de seus poderes inerentes. Terá poderes inerentes também para redefinir, unilateralmente, o que interessa aos EUA e seus interesses? Sem ouvir o Congresso? Hoje, de fato, o mais importante é conseguir impedir que outros presidentes, a partir do precedente que Obama tenta criar, encontrem vias para justificar decisões ainda mais unilateralmente agressivas.



O Capitólio enfrenta dilema grave. Como sempre, o unilateralismo presidencial põe o Congresso em posição difícil. O Congresso não pode suspender imediatamente o uso de fundos, suspensão que poria em risco vidas de norte-americanos e de aliados dos EUA. Mas pode, sim, aprovar leis que cortem, decorridos três meses, todos os posteriores desembolsos de dinheiro para financiar guerras que o Congresso não aprove. Essa medida conseguiria evitar, pelo menos, que presidentes belicistas se pusessem a expandir missões militares dos EUA pelo mundo, sem a expressa autorização do Congresso.



O congresso dos EUA deve tomar também outras medidas mais fundamentais para pôr sob controle a presidência imperial de Obama.



Depois do escândalo de Watergate, o Congresso avançou ainda além da Resolução sobre Poderes de Guerra, e aprovou vários estatutos tentando obrigar a presidência a reger-se pela Constituição. Vários daqueles estatutos jamais funcionaram como se esperava que funcionassem, mas mesmo assim são produto de séria investigação conduzida pelo senador Frank Church e pelo deputado Otis Pike nos anos 1970s.



Hoje, é urgentemente necessário que se empreenda trabalho semelhante. Em vários aspectos, a guerra de Bush contra o terrorismo implicou agressões mais graves à lei constitucional dos EUA, que tudo que Richard Nixon tentou fazer em Watergate. Mas o Congresso manteve-se calado, confiando que Obama providenciaria, ele mesmo, a necessária limpeza.



Agora, com declarar guerra à Líbia, o presidente Obama mostra que não merecia a confiança dos que o elegeram. Se o Congresso não reagir e responder vigorosamente contra essa declaração de guerra presidencial à Líbia, os EUA terão dado passo muito grave, na direção de presidente e presidencialismo cada vez menos democráticos e mais imperiais.

Jornalista pede demissão de jornal depois de ter parte de entrevista com Ivete Sangalo censurada










"Comunico que hoje, 28 de março, pedi demissão de A Tarde, jornal onde trabalhei nos últimos quatro anos como estagiária do Alô Redação, repórter de Local e, nos últimos 12 meses, repórter da Muito. Faço isso após o editor-chefe, Ricardo Mendes, determinar a supressão de trecho de entrevista que fiz com a cantora Ivete Sangalo, a ser publicada no próximo domingo, 3 de abril, na edição 157 da Muito.

O referido trecho diz respeito a duas perguntas referentes, respectivamente, à crise na sua empresa, a Caco de Telha, e ao processo envolvendo seu ex-baterista, Tonho Batera. As duas perguntas foram pronta e educadamente respondidas pela cantora, sem qualquer indicação de que eu não pudesse publicá-las. Foram feitas após sua assessoria explicar que Ivete só não falaria: 1 - sobre sua vida pessoal e 2- sobre polêmicas envolvendo outros cantores. Portanto, sem que nem mesmo a assessoria da cantora me censurasse antecipadamente.

Quando saí da redação para fazer a entrevista na última sexta-feira, 25 de março, estava ciente de que o foco principal era o Troféu Dodô & Osmar, promovido e realizado pelo Grupo A Tarde, no qual Ivete Sangalo será mestre de cerimônias, e que se tratava de uma edição especial em homenagem ao prêmio. Sei que todas as empresas de jornalismo desse país possuem interesses econômicos. Não estou saindo da empresa com uma ideia romântica do que é a minha profissão ou do que não vá enfrentar novamente. Mas para mim, neste momento, publicar uma entrevista de capa, com oito páginas internas de perguntas e respostas, em que, aos olhos do leitor, não se toca em dois dos assuntos mais relevantes envolvendo a cantora (isso pelo menos nos últimos três meses) é praticar um anti-jornalismo ao qual, em quatro anos de profissão, não estou acostumada.

Mais ainda quando se trata da primeira oportunidade em que Ivete falou sobre o caso em uma entrevista, de forma paciente e educada, longe dos bastidores do show business, sem nenhum tipo de pressão, e explicou qual sua versão dos fatos, afirmando que o irmão continua à frente dos negócios mesmo à distância – uma informação nova, de extrema relevância para o caso, ainda mais se dita por ela. Deixo claro que tomo esta decisão após solicitar ao mesmo editor-chefe que eu não assinasse a matéria por respeito à minha consciência e ao leitor, que certamente achará estranho uma entrevista tão longa ignorar o caso Caco de Telha. O pedido foi prontamente negado por ele.

Quero agradecer a todos os colegas com quem trabalhei, em especial Marlene Lopes, quem primeiro me incentivou a fazer um bom trabalho nesta empresa, Kátia Borges, editora das mais competentes e sábias que conheci, e Nadja Vladi, que vem fazendo, semana a semana, um ótimo trabalho na Muito. Se um jornal tem em mãos um material de relevância jornalística e decide não publicá-lo para não correr o risco de ferir suscetibilidades ou atender a qualquer outro interesse que não o de informar, nada mais faz do que pôr em risco a própria credibilidade. Da minha, eu não abro mão".

Emanuella Sombra
 
http://maureliomello.blogspot.com/2011/03/sai-maior-quem-nao-tem-medo-de-censura.html

Declaração da UNIÃO AFRICANA sobre a Líbia









Segunda reunião em Addis Ababa, 25/3/2011



A comissão ouviu uma delegação do governo da Jamayhri árabe líbia



Para distribuição à imprensa (em inglês)



(Tradução de trabalho, não oficial, realizada pelo pessoal da Vila Vudu)



Addis Ababa, 25/3/2011: Como parte dos procedimentos previstos no communiqué correspondente à reunião dessa Comissão ad hoc de Alto Nível da União Africana sobre a Líbia realizada dia 19/3/2011 em Nouakchott, Mauritânia, essa Comissão ad hoc realizou sua segunda reunião em Addis Ababa, dia 25/3/2011, de ministros de Relações Exteriores, como ficou decidido pelo Conselho de Segurança e Paz dessa União Africana do dia 10/3/2011.



Deve-se lembrar que, durante sua reunião em Nouakchott, essa Comissão ad hoc convidou autoridades do governo líbio e do Conselho Nacional de Transição da Líbia para que participassem das consultas que agora se realizaram em Addis Ababa.



O governo líbio fez-se representar na reunião de Addis Ababa, mas nenhum membro do Conselho de Transição da Líbia compareceu.



Essa Comissão ad hoc reuniu-se com aqueles representantes do governo da Jamahiriya árabe, aos quais apresentou o Mapa do Caminho proposto pela União Africana, para solução pacífica da crise na Líbia, nos termos articulados no parágrafo 5 do communiqué de Nouakchott datado de 19/3/2011 [1].



Essa Comissão formalmente reitera a aceitação incondicional do Mapa do Caminho da União Africana pelo representante do governo líbio.



Destaca também o comprometimento das autoridades líbias com um cessar-fogo efetivo e confiável.



Destaca ainda, para essa finalidade, a disposição do governo líbio para facilitar o estabelecimento e os deslocamentos de uma comissão para monitorar e verificar o imediato cessar-fogo.



A delegação líbia também manifestou a disposição e a prontidão do governo líbio para implementar os outros aspectos do Mapa do Caminho da União Africana, inclusive a adoção e a implementação, por vias pacíficas e democráticas, de reformas políticas que satisfaçam as aspirações do povo líbio.



Essa Comissão ad hoc registra a posição manifesta pela delegação do governo da Líbia e seu continuado engajamento com o que aqui ficou acordado.



Essa Comissão ad hoc reitera sua disposição para prosseguir nos passos para engajar o Conselho Nacional de Transição, nos termos do Mapa do Caminho da União Africana, com foco urgente e específico na cessação de hostilidades.



Em conclusão, os ministros presentes trocaram ideias sobre os próximos passos a serem dados para implementar o mandato dessa Comissão ad hoc. Quando a isso, concordaram em viajar o mais rapidamente possível à Líbia, no nível de comitiva de Chefes de Estado, com mandato dessa Comissão ad hoc de Alto Nível da União Africana sobre a Líbia.



Uma solución africana para a Libia.

25/3/2011, Página 12, Buenos Aires. Ar.


Traduzido pelo pessoal do vila vudu

Enquanto o francês Nicolás Sarkozy anunciava que França e Reino Unido preparavam uma "iniciativa" para resolver pela via “política e diplomática” a situação na Líbia, com autorização da ONU, o regime líbio anunciou sua disposição para “aplicar o mapa do caminho” [orig. Road Map] o plano apresentado pela União Africana (UA), que propõe imediata cessação das hostilidades e abertura de diálogo entre os líbios, como primeiro passo para uma “transição democrática”. Segundo autoridades líbias, morreram pelo menos 114 pessoas, com 445 feridos, desde o início dos bombardeios pela coalizão internacional.



“Estamos dispostos a aplicar o plano” proposto pela União Africana, inclusive “uma política que responda às aspirações do povo líbio de forma pacífica e democrática”, disseram os representantes do regime de Gadafi em reunão da UA em Adís Abeba, à qual não compareceu nenhum delegado dos “rebeldes”. Mas o que hoje se passa na Líbia é problema estritamente dos africanos e só pode ser resolvido pela União Africana” (24/3/2010, em: The African Union ad hoc High-Level Committee on Libya convenes its second meeting in Addis Abab).



Antes, o presidente francês havia garantido que a coalizão manterá o controle político de todas as operações, apesar de a coordenação das ações militares passar para a OTAN, como já anunciado há dois dias. O primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, afirmou que seu país aceitará que a OTAN dirija as operações contra a Líbia, em associação com a Liga Árabe e a União Africana, “para evitar que se cometam os mesmos erros já cometidos no Iraque e no Afeganistão”.



Sarkozy, quem mais fortemente insistiu em que o CSONU aprovasse a intervenção militar no norte da África, anunciou que está prevista, para a reunião dos membros da coalizão que opera na Líbia marcada para 2ª-feira em Londres, a proposição de uma “via comum”.



“Haverá uma iniciativa franco-britânica para mostrar que a solução não é só militar, mas também política e diplomática” – disse o presidente francês em entrevista coletiva depois da reunião de chefes de estado e de governo da União Europeia, segundo informou a Agência EFE.



Na mesma coletiva, Sarkozy lembrou que a OTAN “não pode absorver” países não membros, como o Qatar e os Emiratos Árabes Unidos que participam do esforço internacional. “Não é possível. Faríamos um favor a Muammar Khadafi se disséssemos que é operação só da OTAN, que não há coalizão”, disse o presidente francês aos jornalistas. (...) Mas a França não convidou a Turquia para a reunião em Paris, que decidirá sobre os ataques à Líbia.



Cercar a Rússia, visar a China: “O verdadeiro papel da OTAN na grande estratégia dos EUA”

2/12/2010, Diana Johnstone, Counterpunch


NATO’S True Role in US Grand StrategyTraduzido por Margarida Ferreira, para ODiario.info



IntroduçãoEmbora escrito antes da Cimeira da OTAN em Lisboa, este texto de Diana Johnstone mantém toda a atualidade. Depois de desmascarar os objetivos da OTAN, a autora conclui: “Os governos euro-atlânticos proclamam a sua «democracia» como prova do seu direito absoluto de intervir nos assuntos do resto do mundo. Com base na falácia de que os «direitos humanos são necessários para a paz», proclamam o seu direito a fazer a guerra. Uma questão crucial é se a «democracia ocidental» ainda tem força para desmantelar esta máquina de guerra antes que seja tarde demais” (ODiario.info)



Nos dias 19 e 20 de Novembro, reúnem-se em Lisboa dirigentes da OTAN numa cimeira designada por “Conceito Estratégico da OTAN”. Entre os tópicos para discussão encontra-se uma série de “ameaças” assustadoras, desde a guerra cibernética até à alteração climática, assim como belas coisas protectoras como armas nucleares e uma inútil Linha Maginot de alta tecnologia destinada a fazer parar os mísseis inimigos em pleno voo. Os dirigentes da OTAN não conseguirão evitar falar da guerra no Afeganistão, essa cruzada interminável que une o mundo civilizado contra o esquivo Velho da Montanha, Hassan i Sabah, chefe dos Assassinos do século onze na sua mais recente encarnação como Osama bin Laden. Sem dúvida vai haver muita conversa sobre os “nossos valores comuns”.



A maior parte do que vai ser discutido é ficção com uma etiqueta de preço.



A única coisa que falta na agenda da cimeira Conceito Estratégico é uma discussão a sério sobre estratégia.



Isto, em parte, resulta de a OTAN, enquanto tal, não ter qualquer estratégia, e não poder ter a sua própria estratégia. A OTAN é na verdade um instrumento da estratégia dos Estados Unidos. O seu único Conceito Estratégico operacional é o que é posto em prática pelos Estados Unidos. Mas até esse é um fantasma esquivo. Segundo parece, os dirigentes americanos preferem posições impressionantes, “soluções espetaculares”, em vez de definirem estratégias.



Um dos que pretende definir uma estratégia é Zbigniew Brzezinski, padrinho dos mujahidin afegãos quando estes podiam ser utilizados para destruir a União Soviética. Brzezinski não se coibiu de declarar abertamente o objetivo estratégico da política dos EUA no seu livro de 1993, O Grande Tabuleiro de Xadrez: “A supremacia americana”. Quanto há OTAN, descreveu-a como uma das instituições que servem para perpetuar a hegemonia americana, “fazendo dos Estados Unidos um participante chave até nos assuntos intra europeus”. Na sua “rede global de instituições especializadas”, que obviamente incluem a OTAN, os Estados Unidos exercem o seu poder através de uma “permanente negociação, diálogo, difusão e procura de um consenso formal, apesar de o poder ser sempre proveniente duma única fonte, nomeadamente, Washington, D.C.”



Esta descrição assenta como uma luva na conferência “Conceito Estratégico” de Lisboa. Na semana passada, o secretário-geral dinamarquês da OTAN, Anders Fogh Rasmussen, anunciou que “estamos muito perto de um consenso”. E este consenso, de acordo com o New York Times, “seguirá provavelmente a formulação do Presidente Barack Obama: trabalhar para um mundo não nuclear mantendo embora um dissuasor nuclear”.



Esperem aí, será que isto faz sentido? Não, mas é o tipo de consenso da OTAN. A paz através da guerra, o desarmamento nuclear através do armamento nuclear, e acima de tudo, a defesa dos estados membros enviando forças expedicionárias para enfurecer os nativos de países distantes.



Uma estratégia não é um consenso escrito por comissões.



O método americano de “permanente negociação, diálogo, difusão e procura de um consenso formal” neutraliza qualquer resistência que possa aparecer ocasionalmente. Assim, a Alemanha e a França resistiram inicialmente à entrada da Geórgia para a OTAN, assim como ao célebre “escudo anti-míssil”, considerados ambos como provocações abertas capazes de provocar uma nova corrida às armas com a Rússia e de prejudicar as frutuosas relações da Alemanha e da França com Moscovo, sem qualquer resultado útil. Mas os Estados Unidos não aceitam um não como resposta, e continuam a repetir os seus imperativos até esmorecer a resistência. A única exceção recente foi a recusa da França em aderir à invasão do Iraque, mas a reação irritada dos EUA assustou a classe política conservadora francesa o que levou ao apoio de Nicolas Sarkozy, pró-americano.



À procura de “ameaças” e “desafios”



O verdadeiro sumo do que passa por um “conceito estratégico” foi declarado pela primeira vez e posto em ação na primavera de 1999, quando a OTAN desafiou a lei internacional, as Nações Unidas e a sua própria carta inicial entrando numa guerra agressiva, fora do seu perímetro de defesa, contra a Iugoslávia. Esse passo transformou a OTAN de uma aliança defensiva para uma aliança ofensiva. Dez anos depois, a madrinha dessa guerra, Madeleine Albright, foi escolhida para presidir ao “grupo de especialistas” que passaram vários meses a realizar seminários, consultas e reuniões para preparação da agenda de Lisboa. Entre os mais importantes nesses encontros, estavam Lord Peter Levene, presidente do Lloyd’s de Londres, a gigantesca seguradora, e o antigo diretor executivo da Royal Dutch Shell, Jeroen van der Veer. Estas figuras da classe dirigente não são propriamente estrategistas militares, mas a sua participação serve para garantir à comunidade internacional de negócios que vão ser tidos em consideração os seus interesses em nível mundial.



É bem verdade que o rol de ameaças enumeradas por Rasmussen num discurso do ano passado dava a entender que a OTAN estava trabalhando para a indústria dos seguros. Disse ser necessário que a OTAN tratasse do combate à pirataria, da segurança cibernética, da alteração climática, de incidentes radicais do clima tais como tempestades e inundações catastróficas, da subida dos níveis do mar, da movimentação em grande escala de populações para áreas desabitadas, por vezes atravessando fronteiras, da escassez de água, secas, da diminuição da produção de alimentos, do aquecimento global, das emissões de CO2, do recuo dos gelos do Ártico, que revelam recursos até agora inacessíveis, da eficiência de combustíveis, da dependência de recursos externos, etc.



A maior parte das ameaças apresentadas nem mesmo de longe podem ser interpretadas como exigindo soluções militares. Obviamente, não são os “estados vilões” nem os “bastiões de tirania” nem os “terroristas internacionais” que são responsáveis pela alteração climática, no entanto Rasmussen apresenta-os como desafios para a OTAN.



Por outro lado, alguns dos resultados destes cenários, como os movimentos de populações provocados pela subida dos níveis do mar ou pela seca, podem, de fato, ser considerados como potenciais causas de crises. O aspecto sinistro desta enumeração é precisamente que esses problemas são avidamente agarrados pela OTAN como exigindo soluções militares.



A maior ameaça para a OTAN é estar obsoleta. E a procura de um “conceito estratégico” é a procura de pretextos para se manter em ação.



A Ameaça da OTAN para o Mundo



Embora ande à procura de ameaças, é a própria OTAN que constitui uma ameaça crescente para o mundo. A ameaça básica é a sua contribuição para o reforço da tendência liderada pelos EUA para abandonar a diplomacia e as negociações a favor da força militar. Isto percebe-se claramente quando Rasmussen inclui os fenômenos climáticos na sua lista de ameaças para a OTAN, quando eles deviam ser, pelo contrário, problemas para a diplomacia e negociações internacionais. O perigo crescente é que a diplomacia ocidental está moribunda. Os Estados Unidos deram o tom: nós somos virtuosos, nós temos o poder, o resto do mundo tem que obedecer, senão…



A diplomacia é desprezada como sendo uma fraqueza. O Departamento de Estado há muito que deixou de estar no centro da política externa dos EUA. Com a sua ampla rede de bases militares em todo o mundo, assim como adidos militares em embaixadas e inúmeras missões em países clientes, o Pentágono é incomparavelmente mais poderoso e influente no mundo do que o Departamento de Estado.



Os últimos Secretários de Estado, longe de procurarem alternativas diplomáticas à guerra, desempenharam, de fato, um papel preponderante na defesa da guerra em vez da diplomacia, desde Madeleine Albright nos Balcãs ou Colin Powell acenando com falsos tubos de ensaio no Conselho de Segurança das Nações Unidas. A política é definida pelo Conselheiro de Segurança Nacional, por diversos grupos de opinião financiados por privados e pelo Pentágono, com a intervenção de um Congresso que, por sua vez, é formado por políticos ansiosos em obter contratos militares para as suas clientelas.



A OTAN está arrastando os aliados europeus de Washington pelo mesmo caminho. Tal como o Pentágono substituiu o Departamento de Estado, a OTAN está sendo utilizada pelos Estados Unidos como um potencial substituto para as Nações Unidas. A “guerra do Kosovo” de 1999 foi um primeiro passo importante nessa direção. A França de Sarkozy, depois de ter entrado no comando conjunto da OTAN, está destruindo os serviços de estrangeiros franceses, tradicionalmente competentes, reduzindo a sua representação civil em todo o mundo. Os serviços de estrangeiros da União Europeia que estão sendo criados por Lady Ashton não vão ter nem política nem autoridade próprias.



Inércia burocrática



Por detrás dos seus apelos aos “valores comuns”, a OTAN é impulsionada, sobretudo, pela sua inércia burocrática. A própria aliança é uma excrescência do complexo militar-industrial dos EUA. Há sessenta anos que as aquisições militares e os contratos do Pentágono têm sido uma fonte essencial da investigação industrial, dos seus lucros, de empregos, de carreiras no Congresso e até mesmo de financiamentos universitários. A interação destes diversos interesses converge para determinar uma estratégia implícita dos EUA de conquista do mundo.



Uma rede global sempre em expansão de umas 800 a mil bases militares em solo estrangeiro.



Acordos militares bilaterais com estados clientes que oferecem formação em troca da compra obrigatória de armas feitas nos EUA e da reestruturação das suas forças armadas, trocando a defesa nacional pela segurança interna (ou seja, repressão) e a possível integração nas guerras de agressão lideradas pelos EUA.



Utilização dessas relações estreitas com as forças armadas locais para influenciar a política interna de estados mais fracos.



Exercícios militares permanentes com estados clientes, que fornecem ao Pentágono um conhecimento perfeito sobre o potencial militar dos estados clientes, os integram na máquina militar dos EUA e alimentam uma mentalidade de “prontos para a guerra”.



Posicionamento estratégico da sua rede de bases, exercícios com “aliados” e militares de forma a cercar, isolar, intimidar e acabar por provocar importantes nações consideradas potenciais rivais, nomeadamente a Rússia e a China.



A estratégia implícita dos Estados Unidos, tal como as suas ações dão a entender, é uma conquista militar gradual para garantir o domínio do mundo. Uma característica original deste projeto de conquista do mundo é que, embora extremamente ativo, dia após dia, é praticamente ignorado pela grande maioria da população da nação conquistadora, assim como pelos seus aliados mais estreitamente dominados, ou seja, pelos estados da OTAN.



A propaganda infindável acerca das “ameaças terroristas” (as pulgas do elefante) e outras diversões mantêm a maioria dos americanos totalmente inconscientes quanto ao que se está passando, tanto mais facilmente quanto os americanos praticamente desconhecem o resto do mundo e portanto não se interessam minimamente. Os EUA podem varrer do mapa um país antes que a grande maioria dos americanos saiba onde é que ele se encontra.



A tarefa principal dos estrategistas dos EUA, cujas carreiras passam pelos grupos de opinião, conselhos de diretores, firmas de consultoria e governo, é muito mais justificar este gigantesco mecanismo do que tentar dirigi-lo. Em grande medida, ele dirige-se a si mesmo.



Desde o colapso da “ameaça soviética”, que os políticos andam à procura de ameaças invisíveis ou potenciais. A doutrina militar dos EUA tem como objetivo atuar preventivamente contra qualquer rival potencial para a hegemonia mundial dos EUA. Desde o colapso da União Soviética, é a Rússia que mantém o maior arsenal bélico para além dos Estados Unidos e a China está crescendo rapidamente em poder econômico. Nenhum deles ameaça os Estados Unidos ou a Europa ocidental. Pelo contrário, ambos estão dispostos e desejosos de se concentrarem em negócios pacíficos.



Mas encontram-se cada vez mais alarmados com o cerco militar e com os exercícios militares provocatórios realizados pelos Estados Unidos mesmo à sua porta. A implícita estratégia agressiva pode ser obscura para a maioria dos americanos, mas de certeza absoluta que os dirigentes dos países visados percebem o que se está a passar.



O Triângulo Rússia-Irã-Israel



Atualmente, o principal “inimigo” explícito é o Irã.



Washington afirma que o “escudo antimíssil”, que está tentando impor aos seus aliados europeus, se destina a defender o ocidente do Irã. Mas os russos vêem muito claramente que o escudo antimíssil está virado contra eles. Primeiro de tudo, sabem perfeitamente bem que o Irã não tem mísseis desses nem nenhum motivo para os usar contra o ocidente. É perfeitamente óbvio para todos os analistas bem informados que, mesmo que o Irã desenvolvesse armas nucleares e mísseis, seriam destinados a funcionar como dissuasor contra Israel, a superpotência nuclear regional que tem mãos livres para atacar os países vizinhos. Israel não quer perder essa liberdade de atacar, e naturalmente opõe-se ao dissuasor iraniano.



Os propagandistas israelenses clamam em voz alta contra a ameaça do Irã, e têm trabalhado incansavelmente para infectar a OTAN com a sua paranóia.



Israel até já foi descrita como o “29º membro da OTAN global”. Os funcionários israelenses têm trabalhado assiduamente junto de uma Madeleine Albright receptiva para se assegurarem de que os interesses israelenses são incluídos no “Conceito Estratégico”. Nos últimos cinco anos, Israel e a OTAN tomaram parte em exercícios navais conjuntos no Mar Vermelho e no Mediterrâneo, assim como em exercícios terrestres conjuntos desde Bruxelas até à Ucrânia. Em 16 de Outubro de 2006, Israel tornou-se no primeiro país não europeu a fazer um acordo chamado “Programa de Cooperação Individual” com a OTAN para cooperação em 27 áreas diferentes.



Vale a pena notar que Israel é o único país fora da Europa que os EUA incluem na área da responsabilidade do seu Comando Europeu (em vez do Comando Central que cobre o resto do Oriente Médio).



Num seminário de Relações OTAN-Israel em Herzliya em 24 de Outubro de 2006, o ministro dos estrangeiros israelense na altura, Tzipi Livni, declarou que “A aliança entre a OTAN e Israel é uma coisa natural… Israel e a OTAN partilham uma visão estratégica comum. Sob muitos aspectos, Israel é a linha da frente que defende o nosso estilo de vida comum”.



Nem todos nos países europeus consideram que as colôniass israelenses na Palestina ocupada refletem “o nosso estilo de vida comum”.



Esta é sem dúvida uma das razões por que o aprofundamento da união entre a OTAN e Israel não assumiu a forma aberta de membro da OTAN. Principalmente depois do selvagem ataque a Gaza, uma decisão dessas iria levantar objeções nos países europeus. No entanto, Israel continua a fazer-se convidado para a OTAN, apoiado ardentemente, claro, pelos seus fieis seguidores no Congresso dos EUA.



A causa principal desta crescente simbiose Israel-OTAN foi identificada por Mearsheimer e Walt: é o vigoroso e poderoso lobby pró-Israel nos Estados Unidos. [1]



Os lobbies israelenses também são fortes em França, na Grã-Bretanha e no Reino Unido. Têm desenvolvido com entusiasmo o tema de Israel como a “linha da frente” na defesa dos “valores ocidentais” contra o Islã militante. O fato de o Islã militante ser principalmente um produto dessa “linha da frente” cria um círculo vicioso perfeito.



A atitude agressiva de Israel para com os seus vizinhos regionais seria uma responsabilidade grave para a OTAN, capaz de ser arrastada para guerras do interesse de Israel que não interessam mesmo nada à Europa.



Mas há uma sutil vantagem estratégica na conexão israelense que, segundo parece, está sendo usada pelos Estados Unidos… contra a Rússia.



Subscrevendo a histérica teoria da “ameaça iraniana”, os Estados Unidos podem continuar a afirmar, sem corar, que o planejado escudo antimíssil é dirigido contra o Irã, e não contra a Rússia. Não é que esperem convencer os russos. Mas pode ser utilizado para fazer com que os protestos deles pareçam “paranóicos” – pelo menos aos ouvidos dos ingênuos ocidentais. Meu caro, de que é que eles se queixam, se nós “restabelecemos” as nossas relações com Moscou e convidamos o presidente russo para a nossa alegre assembleia de “Conceito Estratégico?



No entanto, os russos sabem muito bem que:



O escudo antimíssil vai ser construído em volta da Rússia, que tem mísseis, que mantêm como dissuasores.



Neutralizando os mísseis russos, os Estados Unidos ficam de mãos livres para atacar a Rússia, sabendo que a Rússia não pode retaliar.



Portanto, digam o que disserem, o escudo antimíssil, se funcionar, servirá para facilitar uma eventual agressão contra a Rússia.



O cerco em volta da Rússia



O cerco em volta da Rússia continua no Mar Vermelho, no Báltico e no círculo Ártico.



Funcionários dos Estados Unidos continuam a afirmar que a Ucrânia deve integrar a OTAN.



Ainda esta semana, numa coluna do New York Times, Ian J. Brzezinski, filho de Zbigniew, avisou Obama quanto ao perigo do abandono da “visão” de uma Europa “unida, livre e segura” incluindo “a inclusão da Geórgia e da Ucrânia na OTAN e na União Europeia”. O fato de a grande maioria da população da Ucrânia ser contra a entrada na OTAN não foi tida em consideração.



Para o atual rebento da nobre dinastia Brzezinski é a minoria que conta. Abandonar a visão “isola os que, na Geórgia e na Ucrânia, vêem o seu futuro na Europa. Reforça as aspirações do Kremlin a uma esfera de influência…”



A noção de que “o Kremlin” aspira a uma “esfera de influência” na Ucrânia é absurda, considerando os laços históricos extremamente fortes entre a Rússia e a Ucrânia, cuja capital Kiev foi o berço do estado russo. Mas a família Brzezinski é proveniente da Galícia, a parte da Ucrânia ocidental que pertenceu outrora à Polônia, e que é o centro da minoria antirrussa. A política externa dos EUA é demasiado frequentemente influenciada por essas rivalidades estrangeiras que a grande maioria dos americanos ignora completamente.



Os EUA continuam com a sua insistência incansável em absorver a Ucrânia apesar de isso implicar a expulsão da frota russa do Mar Negro da sua base na península da Crimeia, onde a população local é esmagadoramente de língua russa e pró-russa. Isto é a receita para uma guerra com a Rússia, se alguma vez ocorrer.



E, entretanto, os funcionários americanos continuam a declarar o seu apoio à Geórgia, cujo presidente, treinado pelos americanos, espera abertamente levar a OTAN a apoiar a sua próxima guerra contra a Rússia.



Para além das manobras navais provocatórias no Mar Negro, os Estados Unidos, a OTAN e a Suécia e a Finlândia que não são (ainda) membros da OTAN, realizam regularmente importantes exercícios militares no Mar Báltico, praticamente à vista das cidades russas de São Petersburgo e Kaliningrad. Estes exercícios envolvem milhares de efetivos terrestres, centenas de aeronaves, incluindo os caças a jato F-15, aviões AWACS, assim como forças navais que incluem o U.S. Carrier Strike Group 12, barcos de desembarque e navios de guerra de uma dúzia de países.



Talvez o mais sinistro disto tudo, os Estados Unidos têm envolvido persistentemente, na região do Ártico, o Canadá e os estados escandinavos (incluindo a Dinamarca através da Groenlândia) num posicionamento estratégico militar abertamente dirigido contra a Rússia. O objetivo deste posicionamento no Ártico foi afirmado por Fogh Rasmussen quando referiu, entre as “ameaças” que a OTAN tem que enfrentar, o fato de que o “gelo do Ártico está recuando, libertando recursos que até agora têm estado cobertos pelos gelos”.



Ora bem, podíamos pensar que esta descoberta de recursos seria uma oportunidade para a cooperação na sua exploração. Mas não é essa a disposição oficial dos EUA.



Em Outubro passado, o almirante americano James G. Stavridis, comandante supremo da OTAN na Europa, disse que o aquecimento global e a corrida aos recursos podia levar a um conflito no Ártico. O almirante Christopher C. Colvin, da Guarda Costeira, responsável pela linha costeira do Alasca, disse que a atividade mercante marítima russa no Oceano Ártico constituía uma “preocupação especial” para os EU e pediu mais recursos militares na região.



O Serviço Geológico dos EUA crê que o Ártico contém um quarto dos depósitos mundiais inexplorados de petróleo e de gás. Sob a Convenção da Lei dos Mares das Nações Unidas, de 1982, um estado costeiro tem direito a uma EEZ [Zona Econômica Exclusiva] de 200 milhas náuticas e pode reclamar mais 150 milhas se provar que o fundo do mar é a continuação da sua plataforma continental.



A Rússia está requerendo esta pretensão.



Depois de pressionar o resto do mundo a adotar a Convenção, o Senado dos Estados Unidos ainda não ratificou o Tratado.



Em Janeiro de 2009, a OTAN declarou que o “Alto Norte” era de “interesse estratégico para a Aliança” e, desde então, a OTAN tem realizado vários importantes jogos de guerra nitidamente em preparação de um eventual conflito com a Rússia sobre os recursos do Ártico.



A Rússia desmantelou fortemente as suas defesas no Ártico depois do colapso da União Soviética e tem apelado para a negociação de compromissos quanto ao controle de recursos.



Em setembro passado, o primeiro-ministro Vladimir Putin apelou esforços conjuntos para proteger o frágil ecossistema, atrair o investimento estrangeiro, promover tecnologias amigas do ambiente e tentar solucionar as disputas através da lei internacional.



Mas os Estados Unidos, como de costume, preferem resolver as questões pela força. Isso pode levar a uma nova corrida ao armamento no Ártico e até mesmo a confrontos armados.



Apesar de todas estas movimentações provocativas, é muito pouco provável que os Estados Unidos procurem uma guerra com a Rússia, embora não se possa excluir confrontos e incidentes aqui e ali. Segundo parece, a política dos EUA é cercar e intimidar a Rússia de tal modo que ela aceite um estatuto de semi-satélite que a neutralize no futuro conflito previsível com a China.



O alvo China



A única razão para ter a China no ponto da mira é o mesmo da razão proverbial para subir a uma montanha: está ali. É grande. E os EUA têm que estar no topo de tudo.



A estratégia para dominar a China é a mesma seguida para com a Rússia. É a guerra clássica: cerco, assédio, apoio mais ou menos clandestino a problemas internos. Como exemplos desta estratégia:



Os Estados Unidos estão aumentando provocativamente a sua presença militar ao longo das costas chinesas do Pacífico, oferecendo “proteção contra a China” a países asiáticos do leste.



Durante a guerra-fria, quando a Índia recebia o seu armamento da União Soviética e assumia uma postura não alinhada, os Estados Unidos armaram o Paquistão enquanto seu principal aliado regional. Agora os EUA estão desviando os seus favores para a Índia, a fim de manter a Índia fora da órbita da Organização de Cooperação Xangai e de a utilizar como um contrapeso para a China.



Os Estados Unidos e seus aliados apoiam qualquer dissidência interna que possa enfraquecer a China, seja o Dalai Lama, os Uighurs, ou Liu Xiaobo, o dissidente na prisão.



O Prêmio Nobel da Paz foi atribuído a Liu Xiaobo por uma comissão de legisladores noruegueses chefiados por Thorbjorn Jagland, o eco de Tony Blair na Noruega, que foi primeiro-ministro e ministro dos estrangeiros da Noruega, e tem sido um dos principais defensores da OTAN do seu país.



Numa conferência patrocinada pela OTAN de parlamentares europeus no ano passado, Jagland declarou: “Quando somos incapazes de impedir a tirania, começa a guerra. É por isso que a OTAN é indispensável. A OTAN é a única organização militar multilateral com raízes na lei internacional. É uma organização que a ONU. pode usar quando necessário – para impedir a tirania, tal como fizemos nos Balcãs”. Isto é uma espantosa adulteração dos fatos, considerando que a OTAN desafiou abertamente a lei internacional e as Nações Unidas quando declarou guerra nos Balcãs – onde na realidade havia conflitos étnicos, mas não havia “tirania” nenhuma.



Ao anunciar a escolha de Liu, a comissão norueguesa do Nobel, chefiada por Jagland, declarou que “há muito que considerava que há uma estreita ligação entre os direitos humanos e a paz”. A “estreita ligação”, para seguir a lógica das próprias afirmações de Jagland, é que, se um estado estrangeiro não respeita os direitos humanos segundo as interpretações ocidentais, pode ser bombardeado, tal como a OTAN bombardeou a Iugoslávia. De fato, os mesmos poderes que mais barulho fizeram sobre os “direitos humanos”, nomeadamente os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, são os que mais guerras fazem em todo o mundo. As afirmações do norueguês tornam claro que a atribuição do Prêmio Nobel da Paz a Liu (que passou algum tempo na Noruega quando jovem) correspondia, na realidade, a uma confirmação da OTAN.



“Democracias” para substituir as Nações Unidas



Os membros europeus da OTAN pouco acrescentam ao poder militar dos Estados Unidos. A sua contribuição é acima de tudo política. A sua presença mantém a ilusão duma “Comunidade Internacional”. A conquista do mundo que está sendo tentada pela inércia burocrática do Pentágono pode ser apresentada como a cruzada das “democracias” do mundo para espalhar a sua ordem política esclarecida pelo resto de um mundo recalcitrante.



Os governos euro atlânticos proclamam a sua “democracia” como prova do seu direito absoluto de intervir nos assuntos do resto do mundo. Com base na falácia de que os “direitos humanos são necessários para a paz”, proclamam o seu direito a fazer a guerra.



Uma questão crucial é se a “democracia ocidental” ainda tem força para desmantelar esta máquina de guerra antes que seja tarde demais.



Nota: Agradecimentos a Rick Rozoff pelo seu permanente fluxo de importantes informações.



* Diana Johnstone é analista de política internacional escpecializada em assuntos militares



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Nota de tradução[1] No seu livro “The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy” (2007), descreve este lobby como uma “coligação informal de indivíduos e organizações que trabalham ativamente para guiar a política externa dos EUA numa direção pró-Israel”. O livro “concentra-se principalmente na influência do lobby sobre a política externa dos EUA e nos seus efeitos negativos para os interesses americanos”.