domingo, 22 de julho de 2012

Médicos do Sírio e do Einstein abrem clínica particular em Heliópolis


Ocimara Balmant - Agência Estado
Bem na entrada da favela de Heliópolis, entre uma agência bancária e uma loja de departamentos, desponta uma clínica médica que só realiza consultas particulares. Não vale convênio, tampouco cartão do SUS.

O criador do Dr. Consulta, Thomaz Srougi, e o diretor-geral, Cesar Camara - Daniel Teixeira/AE
Daniel Teixeira/AE
O criador do Dr. Consulta, Thomaz Srougi, e o diretor-geral, Cesar Camara
Quem passa ali, estranha. Muitos moradores custam a ter coragem de entrar. Só perdem o medo na medida em que o boca a boca se espalha ou quando leem um cartaz bem à frente do portão que informa, em linguagem clara e direta, o valor das consultas: R$ 40 para clínico-geral e R$ 60 para qualquer uma das dez especialidades oferecidas, que pode ser dividido em duas parcelas.
"Quem disse que essa população não pode ir ao médico particular?", questiona o criador do Dr. Consulta, Thomaz Srougi. Ele se refere ao seu público-alvo: gente sem plano de saúde e cansada das filas dos postos públicos. O perfil exato dos moradores da maior favela da cidade.
Para atendê-los, a estrutura é simples, porém bem equipada. Nos consultórios - separados por divisórias de fórmica e com cadeiras de plástico -, há equipamentos caros, como o usado em exames oftalmológicos e o de ultrassonografia, além do eletrocardiograma. Em casos mais sérios, em que seja necessária a internação, os pacientes são encaminhados ao hospital público.
O atendimento é feito por uma dúzia de médicos, todos formados em universidades conceituadas e integrantes do corpo clínico de hospitais de ponta, como o Sírio-Libanês e o Albert Einstein. O diretor da clínica, por exemplo, é Cesar Camara, indicado por Miguel Srougi, um dos urologistas mais conceituados da cidade e pai de Thomaz.
Na quarta-feira passada, Cesar saiu de Heliópolis e tomou o metrô Sacomã em direção ao Sírio, para atender um dos seus pacientes. Em seu consultório, a consulta custa R$ 450, sete vez o que pagou cada um dos dez pacientes atendidos naquela tarde.
"Engajei-me no projeto porque consigo garantir um atendimento humanizado. Tem consultas em que levo 40 minutos, mesmo tempo que pratico no consultório particular, o que seria impossível na realidade dos convênios."
Todos os médicos dali já haviam atendido por planos privados e recebem em Heliópolis o mesmo que ganhariam em um convênio: cerca de R$ 40 por hora. A diferença é que estão livres das conhecidas metas de atendimento que encurtam as consultas a cada dia. "Selecionamos os médicos por esse perfil humanizado. É importante serem egressos das melhores universidades, mas isso não basta", diz Cesar.
De longe. Mesmo que a maioria do público não se atente ao nome do Sírio-Libanês costurado no jaleco do urologista - "a população daqui nunca ouviu falar do hospital", brinca Cesar -, já começa a pipocar por ali um ou outro paciente vindo de longe. Dia desses, Cesar atendeu um homem que havia se locomovido do Paraíso (bairro de classe média alta e a pelo menos meia hora de distância, de carro).
Se a pessoa tinha ou não dinheiro para pagar mais pelo atendimento, não interessa, diz Thomaz. "Essa procura é boa. Sinaliza que há muito espaço de crescimento."
Desde sua inauguração, em agosto de 2011, a clínica tem crescido 40% por mês e hoje realiza 600 procedimentos a cada 30 dias. A conta ainda não fecha porque houve investimento de cerca de R$ 1 milhão em estrutura, mas a receita tem aumentado à medida que a população descobre o local. Dos 300 mil habitantes da microrregião, só 10% conhecem a clínica, segundo pesquisa encomendada por Thomaz.
Nos sonhos do administrador, ele vê uma clínica em cada um dos 96 distritos da capital. Só para garantir o público, as próximas unidades devem ser instadas em bairros periféricos, como Itaquera e São Miguel Paulista, na zona leste. "Inspirei-me em projetos parecidos em países como Guatemala e México. Testei, adaptei e agora quero crescer, sempre seguindo essa lógica simples, de gerar renda ao mesmo tempo em que agrego um valor muito importante à população." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Thomaz Srougi, diretor geral do Dr. Consulta, e Dr. Cesar Camara, urologistaDANIEL TEIXEIRA/AE

Super-ricos brasileiros armazenam em paraísos fiscais a quarta maior fortuna do mundo: R$ 1 tri


O dinheiro não traz felicidade. Mas leva… Estudo divulgado neste domingo (22) revela que os super-ricos do Brasil armazenam em contas abertas em paraísos fiscais o equivalente a um terço do PIB nacional.
Os brasileiros respondem pela quarta maior fortuna do mundo depositada nesse tipo de conta bancária, a salvo de tributação. Deve-se o levantamento (The Price of Offshore Revisited) ao economista americano James Henry.
Ele cruzou dados do Banco de Compensações Internacionais, do FMI, do Banco Mundial e de governos nacionais. Verificou que os endinheirados do Brasil escondiam do fisco em paraísos fiscais cerca de US$ 520 bilhões em 2010. Em reais: mais de R$ 1 trilhão. Nessa época, o PIB brasileiro somava R$ 3,6 trilhões.
O trabalho perscrutou o movimento de fuga da riqueza de 139 países. Entre 1970 e 2010, os milionários dessas nações elevaram o montante depositado em paraísos fiscais de US$ $ 7,3 trilhões para US$ 9,3 trilhões. O autor do estudo classifica essa dinheirama de “um enorme buraco negro na economia mundial.”
O levantanento foi encomendado pela Tax Justice Network, organização que combate os paraísos fiscais. Diretor da entidade, John Christensen comentou: “As elites fazem muito barulho sobre os impostos cobrados delas, mas não gostam de pagar impostos.”
Acrescentou: “No caso do Brasil, quando vejo os ricos brasileiros reclamando de impostos, só posso crer que estejam blefando. Porque eles remetem dinheiro para paraísos fiscais há muito tempo.” Bingo.

‘Não sou comentarista do Datafolha’, foge Serra


Para um político, às vezes, o caminho mais curto entre uma pergunta incômoda e uma resposta é o ziguezague. José Serra, por exemplo, passou o final de semana zeguezageuando ao redor da última pesquisa Datafolha.
A sondagem trouxe dados desagradáveis para o candidato tucano. Estacionado nos30%, Serra assiste à aproximação de um rival insuspeitado. Celso Russomano, do inexpressivo PRB, com seus 26%, já está tecnicamente empatado com o líder.
Como se fosse pouco, o Datafolha revelou também que o prefeito Gilberto Kassab, aliado de primeira hora de Serra, é o prefeito mais mal avaliado das principais capitais do país. Obteve nota vermelha do eleitorado: 4,4, numa escala até dez.
Instado a comentar a nota atribuída ao aliado, Serra saiu pela tangente. Zigue: “Pesquisa de avaliação vai e vem.” Zague: “Não sou comentarista do Datafolha.” A economia vernacular do candidato é compreensível.
Quem guindou Kassab à prefeitura foi Serra, ao escolhê-lo para vice, em 2004. Tirou o gênio da garrafa ao renunciar ao mandato de prefeito. E não há na história quem tenha conseguido obrigar o gênio a entrar de novo.
Serra visitou neste domingo (22) uma biblioteca e um parque. Distribuiu sorrisos e abraços. Posou para fotos. Súbito, permitiu-se subir num skate. Descobriu que é mais fácil ziguezaguear com a língua do que com o corpo (repare na foto).

A república de São Bernardo


O Prefeito (Foto: Nilton Fukuda/AE)
Em janeiro do ano passado, o município de São Bernardo do Campo, na região metropolitana de São Paulo, ganhou um morador ilustre: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele ocupa a cobertura de um edifício residencial na Avenida Prestes Maia, no bairro Santa Teresinha, próximo ao centro da cidade em que se projetou, nos anos 1980, como líder do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. De lá para cá, a visibilidade do município – e sua prosperidade – só tem crescido. É de São Bernardo o prefeito Luiz Marinho, escolhido por Lula para ser o articulador político de seu grupo dentro do PT. No dia 5 deste mês, Marinho recebeu a visita de Dilma Rousseff na inauguração de uma unidade de saúde – ele foi o único prefeito petista candidato à reeleição que teve a oportunidade de posar para uma foto com a presidente. Marinho é amigo do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, que nasceu no Rio de Janeiro e foi criado em São Bernardo. Lewandowski foi o revisor do processo do mensalão e participa do julgamento que mobilizará o país a partir do dia 2 de agosto. Os três – Marinho, Lewandowski e o próprio Lula – são frequentadores do restaurante São Judas Tadeu e amigos do dono, Laerte Demarchi, um são-bernardense da gema. Laerte se orgulha de ter assistido, no estabelecimento famoso pelo frango com polenta, ao nascimento do partido político que há dez anos governa o Brasil.
Marinho, Lewandowski, Demarchi e Lula pertencem a um mesmo círculo de amigos – e o relacionamento dos quatro vem se estreitando nos últimos tempos. O prefeito Marinho é um homem afeito a celebrações públicas. Nos últimos dois anos, organizou três homenagens a Lewandowski, cuja família fez história em São Bernardo. Lewandowski esteve presente a todas. A mais recente foi no dia 28 de março, na Faculdade de Direito de São Bernardo, controlada pelo município. Lewandowski, com Marinho a seu lado, deu uma aula magna a um auditório lotado e foi saudado como o mais ilustre ex-aluno e ex-professor da faculdade. Um mês antes, Marinho inaugurara uma escola de educação infantil com o nome da mãe do ministro, Karolina Zofia Lewandowska, morta em 2010. Em 2011, Marinho já homenageara Lewandowski por ele ter sido o primeiro presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural (Compahc) do município.

Lewandowski ingressou na vida pública pelas mãos dos Demarchis. Quando Walter Demarchi, irmão de Laerte, era vice-prefeito de São Bernardo, entre 1983 e 1988, ele convidou o então advogado a ocupar a Secretaria de Assuntos Jurídicos. O então prefeito, Aron Galante, mal conhecia Lewandowski. Ele recorda: “Foi a família Demarchi que indicou o secretário jurídico. Disseram: ‘Nós temos o Lewandowski’. Eu respondi: ‘Traz ele aqui’. Nem o conhecia direito”.

As famílias Lewandowski, de origem suíça, e Demarchi, sobrenome italiano, se conheceram em São Bernardo no final do século passado e se estabeleceram no mesmo pedaço de terra que hoje abriga o bairro Demarchi. Os Lewandowskis tinham um sítio onde fica hoje o condomínio de alto padrão Swiss Park, ao lado do restaurante e onde os Lewandowskis mantêm uma casa. A família Demarchi se orgulha de ter sugerido o nome de Lewandowski quando surgiu uma vaga no Supremo. “O único favor que pedimos ao Lula, que foi meu irmão Laerte quem pediu, foi para que ele colocasse o Ricardo como ministro, porque não sei que ministro ia se aposentar (era Carlos Velloso). O Lula falou: ‘Tudo bem’”, afirmou Walter Demarchi a ÉPOCA. E Lewandowski se tornou ministro em 2006.
O juiz (Foto: divulgação)
Quis o destino que ele fosse o revisor do processo do mensalão, o maior escândalo político do governo Lula. ÉPOCA passou quase um mês visitando a cidade e conversando com interlocutores do presidente, do prefeito e de seus amigos. Todos reverberam a “preocupação do Lula e do Marinho com o uso político” do julgamento – e relatam a pressão, de forma direta ou indireta, sobre Lewandowski. Laerte Demarchi diz que a família do ministro anda preocupada com a pressão sobre “Ricardo”. Ele relatou uma conversa que teve com Anita Lewandowski no dia 30 de junho, quatro dias depois de o ministro ter apresentado seu voto revisor do mensalão após uma reprimenda pública do presidente do Supremo, Carlos Ayres Brito. Anita desabafou: “Vocês viram o que estão fazendo com o Ricardo?”.
Laerte respondeu: “Mas não é isso o que ele queria, ser ministro do Supremo? Agora, aguenta. Por que ele está preocupado? Se não tem nada (para condenar os réus), então não tem nada. Não vai ter problema”. A conversa foi relatada por Laerte a ÉPOCA numa mesa do restaurante. Ele torce pela absolvição do ex-deputado José Dirceu, um dos réus no processo: “Podem falar o que quiserem, mas eu realmente acredito nesse homem”. Sobre o julgamento, Walter Demarchi afirmou: “Lewandowski não passará um réu no moedor de carne sem ter certeza de sua culpa”. ÉPOCA perguntou aos irmãos Laerte e Walter se haviam conversado com o amigo Lewandowski sobre o assunto. Os dois disseram que não. Apesar de as famílias se frequentarem e os Lula da Silva também serem próximos de Lewandowski e de sua irmã. Lula e Laerte Demarchi também passaram juntos parte das férias de julho numa chácara.

Prosperidade
O município de São Bernardo, que ostenta em sua bandeira a figura de um bandeirante e de um indígena, vive um bom momento não apenas pelo protagonismo de seus filhos e moradores ilustres na vida pública brasileira. Há também prosperidade na área das verbas públicas. No primeiro semestre deste ano, São Bernardo ganhou R$ 79,3 milhões em transferências da União, R$ 20 milhões a mais que Guarulhos, cidade também administrada pelo PT, porém com quase 500 mil habitantes a mais que o município comandado por Marinho.
Lewandowski não passará um réu no moedor sem ter certeza de sua culpa "
WALTER DEMARCHI 
Além de dinheiro, Marinho tem poder. Ele foi encarregado por Lula de cuidar das costuras políticas com os diretórios do PT e aliados. Foi ele quem ajudou a convencer Lula a posar para a já famosa foto ao lado do deputado federal Paulo Maluf em São Paulo. Marinho também negociou a aproximação do PT com Gilberto Kassab (PSD), seu parceiro em São Bernardo. Segundo um dirigente do PSD ouvido por ÉPOCA, Marinho “aproximou” Kassab a Lewandowski no momento em que o STF analisava o pedido do partido de Kassab para ter direito ao tempo gratuito de TV nas eleições neste ano – a causa foi vitoriosa. Transformar Marinho num líder nacional do PT é hoje uma obsessão de Lula. Foi ele quem pediu a Dilma que ela participasse da inauguração de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) no dia 5 deste mês. O evento conferiu o prestígio que faltava a Marinho, hoje identificado dentro do partido como “o homem que conversa com o Lula”. À medida que ele, ex-sindicalista como Lula, se fortalece como administrador e articulador, o ex-presidente ganha um ator fiel a seu projeto de não perder o controle do PT para o grupo rival – aquele que começa a se formar em torno de Dilma e tem como estrelas os ministros mais próximos da presidente, como Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Aloizio Mercadante (Educação). Marinho também é uma opção de Lula para a disputa do governo de São Paulo em 2014.

O conselheiro (Foto: reprodução)
A aliança entre Lula e Marinho causa desconforto em petistas paulistanos, que não aceitam a intromissão de Marinho no comando da candidatura de Fernando Haddad a prefeito de São Paulo. Segundo eles, Lula quer impor um líder assim como impôs Haddad candidato. A confiança de Marinho na própria reeleição é tamanha, e seus projetos tão mais amplos, que ele diz: “Abro mão da presença dele, Lula (na minha campanha), para que ele possa ir a Santo André, Mauá e São Paulo”. Se o projeto de Lula e Marinho der certo – e se o voto de Lewandowski acompanhar os vaticínios dos irmãos Demarchi –, a vitória poderá ser creditada à “República de São Bernardo”.

Ideli Salvatti, a soldada de Dilma


A trajetória, as convicções e o poder da ministra que recebe os políticos e tenta administrar seu apetite insaciável

LUIZ MAKLOUF CARVALHO

O Fi não gostou”, disse a ministra Ideli Salvatti, das Relações Institucionais, numa tarde do mês passado. Ela estava na sala de reuniões, geminada a seu gabinete, no 4º andar do Palácio do Planalto. O assunto era uma foto que se alastrara pela internet: Ideli, então senadora, em dezembro de 2007, parece dar um sufocante beijo na boca do senador José Sarney.
Fi, o que não gostou, é Jeferson Figueiredo, marido de Ideli, subtenente músico do Exército. “Não é que ele não tenha gostado da minha postura. Ele se incomodou, muito, foi com a forma como isso é usado.” Naquele dezembro de 2007, última sessão do ano, senadores e senadoras trocavam despedidas, com beijos, abraços e tapinhas nas costas. O repórter fotográfico Lula Marques, do jornal Folha de S.Paulo, viu quando Ideli partiu para Sarney. Fotografou, de cima, a sequência de salamaleques. Sabia que o ângulo faria parecer um beijo na boca – e caprichou. “Meus Deus amado!”, diz Ideli. “Aquilo é ângulo de máquina! Tem várias vezes que você pega capa de jornal com a presidente Dilma quase beijando na boca. É ân-gu-lo-de-má-qui-na! Ou você acha que eu ia dar um beijo na boca do Sarney?”
OLHAR DESCONFIADO A ministra Ideli Salvatti, fotografada na semana passada no Palácio do Planalto. “Dilma é muito exigente. Mas a exigência número um é com ela mesma”  (Foto: Celso Junior/ÉPOCA)
“A ministra tem razão: foi um beijo no rosto”, diz Marques. Na biografia de Sarney, da jornalista Regina Echeverria, Ideli é citada só uma vez, no capítulo que conta como Sarney, bombardeado por denúncias, escapou de ser levado à Comissão de Ética, em 2009. Ideli defendeu Sarney – contra integrantes de seu próprio partido. Até hoje ela acha que estava certa: “Não tenho problema nenhum com o que aconteceu na situação do Sarney. Fizemos o enfrentamento, mas perdemos a eleição. O Sarney ganhou, com votos de boa parte daqueles que depois queriam tirá-lo. Para assumir quem? O Marconi Perillo, o vice-presidente? Aí não conte comigo, porque é questão de governabilidade. Ajudo a colocar e depois vou dar um jeito de tirar? Não conte comigo, porque posso ser tudo, menos louca, nem doida e nem burra”.
Família e poder (Foto: arq. pessoal (2) e Lula Marques/Folhapress)

No escândalo do mensalão, em 2005, Ideli bateu-se em defesa do governo e dos acusados, como o então ministro da Casa Civil, José Dirceu. “Sobre o qual temos certeza de que em nenhum momento possa pairar qualquer tipo de dúvida”, disse, no Senado, quando Dirceu renunciou ao ministério para reassumir o mandato de deputado (posteriormente cassado). O que ela diz, hoje, sobre o iminente julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF)?

– Na posição em que estou, é melhor não dizer nada. Da mesma forma como a CPI é assunto do Legislativo, o julgamento é assunto do Judiciário. A única coisa que espero, como cidadã, é que seja feito pela prova dos autos.
– E, como cidadã, a senhora acha que houve mensalão – pagamentos para parlamentares votarem com o governo?
– Eu estava no Congresso, acompanhava as votações, inclusive na condição de líder. Não confere, nem coincide, não bate com a realidade.
Leia esta reportagem completa na edição de ÉPOCA que chega às bancas e ao seu tablet(baixe o aplicativo) neste fim de semana.

Golpe certeiro contra a Aids



A liberação da venda do primeiro remédio para prevenir a 

infecção pelo HIV abre uma nova fronteira para frear a expansão 

da epidemia

Cilene Pereira, Mônica Tarantino e Monique Oliveira
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Na semana passada, o governo dos Estados Unidos deu um passo inédito na escolha de novas armas para conter o HIV, vírus que causa a Aids. Na terça-feira 17, a agência americana que regula medicamentos, o FDA, autorizou, pela primeira vez, a venda de um medicamento para ser tomado de forma regular e continuada por pessoas saudáveis para protegê-las da infecção pelo vírus. O remédio, que se chama Truvada, acondiciona na mesma cápsula azul duas substâncias já usadas contra o HIV, o tenofovir e a emtricitabina. 

De acordo com o FDA, a droga pode ser receitada a indivíduos altamente vulneráveis ao risco de contrair o HIV por meio de atividade sexual. Pela ampla definição do órgão americano, portanto, estão incluídos trabalhadores do sexo, heterossexuais e homossexuais que têm múltiplos parceiros e companheiro não contaminado em casais nos quais um deles é soropositivo (chamados de casais discordantes). Nos casos em que a seguradora de saúde não assumir o pagamento do remédio, o interessado em tomá-lo precisará desembolsar cerca de US$ 12 mil por ano.
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PREVENÇÃO
O publicitário Danilo participou dos testes com o Truvada no Brasil
Fabricado pelo laboratório Gilead Sciences, na Califórnia, o Truvada já é usado em 93 países como um dos componentes do coquetel de medicamentos dado aos pacientes. A decisão de disponibilizá-lo a pessoas não infectadas foi tomada com base nas conclusões de quatro testes internacionais. O primeiro desses estudos, cujos resultados foram publicados em 2010 pelo “The New England Journal of Medicine” – prestigiada publicação científica –, avaliou o desempenho da medicação entre 2.499 homens que fazem sexo com homens, distribuídos em seis países. O estudo teve a participação de 11 instituições de pesquisa. Entre elas a Unidade de Pesquisa Clínica de São Paulo, ligada à Universidade de São Paulo. O publicitário paulistano Danilo Poveza, 31 anos, foi um dos recrutados. “Achei importante participar”, conta. Homossexual e soronegativo, Danilo tomou a medicação todos os dias por um ano.
Nesse trabalho, ficou demonstrado que o nível de proteção oferecido pela droga variou de 43% a 73%. Outros dois estudos mostraram níveis de proteção similares. O quarto, realizado com mulheres no continente africano, foi interrompido por causa dos resultados ruins e da baixíssima adesão ao tratamento. Os trabalhos foram feitos de forma independente do fabricante do remédio. Receberam patrocínio de entidades como a Fundação Bill e Melinda Gates e do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos.
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RISCOS
Rosenthal teme a falsa sensação de segurança que a droga pode dar. Kallás (abaixo)
foi um dos coordenadores do trabalho sobre a nova medicação feito no Brasil
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A decisão americana causou impacto. As autoridades da saúde da França, por exemplo, pretendem aguardar novos estudos antes de adotar a estratégia. No Brasil, onde o remédio está aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, mas nem sequer integra o coquetel distribuído na rede pública, a posição do governo foi de cautela. “Mesmo que três estudos tenham mostrado bons resultados em populações expostas a alto risco de infecção pelo HIV, ainda há muitas incertezas quanto à sua utilização na vida real”, disse o infectologista Dirceu Greco, diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde. Isso quer dizer, portanto, que por aqui ainda não se sabe se o Truvada será oferecido, seja como tratamento, seja como preventivo.

Até agora, o que existia para conter o vírus era aplicado depois que a pessoa já havia tido contato com ele. Nesses casos, o indivíduo tem até 72 horas após ter se exposto ao risco para começar a receber o coquetel com medicações contra o vírus – o mesmo usado pelos pacientes. Os remédios devem ser tomados por quatro semanas. Por isso, entre os médicos e outros profissionais que atuam no combate à doença, é consenso que, do ponto de vista científico, a aprovação do Truvada como recurso de prevenção deve ser comemorada. “Ele amplia os recursos para prevenir a disseminação do HIV”, afirmou o infectologista Esper Kallás, da Universidade de São Paulo. O médico participou do primeiro estudo com o remédio e agora está concluindo novas análises sobre sua ação. “Estamos observando que os voluntários do estudo que apresentavam quantidade do remédio detectável no sangue, o que significa que tomavam a medicação corretamente, chegaram a ter até 93% de proteção.”
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ATIVISMO
Nunes Neto acredita que o remédio vai beneficiar
casais em que um dos parceiros é soropositivo
Na opinião de Gottfried Hirnschall, diretor do departamento de HIV/Aids da Organização Mundial da Saúde, a profilaxia pré-exposição é um enfoque promissor. “Acreditamos que, provavelmente, seja um instrumento de intervenção a grupos nos quais outras prevenções podem não ser acessíveis ou difíceis de implementar”, disse. Segundo o infectologista Artur Timerman, do Hospital Edmundo Vasconcelos, de São Paulo, o medicamento pode ser um bom protetor, por exemplo, para usuários de drogas injetáveis. “Eles integram um grupo de extrema vulnerabilidade à contaminação pelo HIV”, diz. O ativista Américo Nunes Neto, fundador do Instituto Vida Nova, que atende soropositivos em São Paulo, por sua vez, acredita que o remédio pode ser um bom recurso para os casais nos quais um dos parceiros está contaminado. “Temos muitos casais nessas condições”, afirma. A assistente de responsabilidade social Silvia Almeida, orientadora de mulheres portadoras no Grupo de Incentivo à Vida, compartilha a mesma opinião. “Há muita gente que não se sente segura nem usando a camisinha”, diz. “Dependendo da compreensão do casal, pode haver uma combinação dos dois.”

Uma das principais preocupações entre os especialistas, no entanto, é a de que a liberação do Truvada como remédio preventivo seja a senha para um relaxamento na prevenção. “As pessoas podem se sentir ilusoriamente protegidas e deixar de usar a camisinha”, afirma Timerman. “E os grupos para os quais o remédio é indicado com essa finalidade já são normalmente refratários à utilização do preservativo.” O infectologista Caio Rosenthal, do Instituto de Infectologia Emilio Ribas, de São Paulo, trata pacientes com Aids há mais de 15 anos. Ele considera a droga um bom instrumento, mas concorda com o colega Timerman. “O remédio pode dar uma falsa sensação de segurança”, diz. “Sou a favor da liberação desse tipo de medicamento para casais discordantes que estejam em relações estáveis”, defende.
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Além disso, há outras ponderações. “O Truvada ou a associação de tenofovir com emtricitabina, uma combinação que está disponível no Brasil há um bom tempo e tem efeito igual, não é um mar de rosas. O bom resultado depende do comprometimento em tomar o remédio todos os dias, pois não pode haver falhas, e de suportar os efeitos colaterais”, explica o infectologista Rosenthal. Entre os efeitos estão náuseas e o risco de desenvolvimento de osteoporose (doença caracterizada pelo enfraquecimento dos ossos). Existe também a possibilidade de o mau uso levar à criação de resistência a um dos componentes do remédio. “Mas os resultados dos estudos feitos até agora mostraram que a ocorrência de resistência é rara”, afirma Kallás.

O consenso é que o Truvada deve ser entendido – e usado – como uma arma de prevenção de fato poderosa, mas que integra um arsenal mais amplo criado com essa finalidade. “Ele inclui outras medidas, como a prática do sexo seguro”, diz o pesquisador Kallás. É por essa razão que todas as iniciativas não medicamentosas adotadas até hoje precisam ser mantidas e aprimoradas. “A base para a prevenção é o diálogo dirigido para cada grupo e o uso do preservativo”, argumenta Zarifa Khoury, coordenadora da Assistência do Programa Municipal de DST/Aids da cidade de São Paulo.
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Na área de tratamentos, a comunidade científica teve outro motivo para festejar na semana passada. Pesquisadores do The Scripps Research Institute, dos Estados Unidos, anunciaram a descoberta de um composto que, em laboratório, praticamente eliminou a presença do HIV de dentro das células. A façanha foi registrada inclusive nas células extraídas dos chamados reservatórios, locais nos quais as medicações costumam não ter efeito, o que inviabiliza, hoje, a eliminação total do vírus do corpo. “O composto teve ação sobre essas células nas quais o HIV se esconde”, afirmou Susana Valente, coordenadora do trabalho.

Foram notícias como essas que aumentaram o otimismo dos principais pesquisadores de Aids do mundo, reunidos também ao longo da semana passada em Washington, nos Estados Unidos, em um encontro sobre a doença – que ainda atinge 34,2 milhões de pessoas no planeta e que provoca a morte de cerca de dois milhões de indivíduos por ano. Um dos mais famosos, o infectologista Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e de Doenças Infecciosas dos Estados Unidos, por exemplo, fez uma previsão fabulosa. “Se todos os recursos que temos hoje forem disponibilizados amplamente para quem precisa, pode ser possível que tenhamos uma geração livre da Aids”, afirmou. “Isso significa que as crianças de hoje poderiam, um dia, viver em um mundo no qual a infecção pelo HIV e as mortes por Aids sejam raras.”
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No rastro de Elize



ISTOÉ revela os bastidores da vida, do crime e da farsa que Elize 

Matsunaga montou para se livrar da polícia após ter assassinado 

e esquartejado o marido

Antonio Carlos Prado
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FOTO INÉDITA
Marcos e Elize felizes no casamento, em 
julho de 2009: três anos depois, viria a tragédia
Foi no quarto da jiboia. Não foi na banheira nem foi na cama de casal king size como tanta gente pensou e tanta gente falou. Foi no quarto da jiboia que Elize Matsunaga esquartejou o seu marido, Marcos Kitano Matsunaga, após lhe dar um tiro na cabeça na noite de 19 de maio. O esquartejamento em seis pedaços se deu em um dos quartos de hóspedes do duplex no qual Elize e Marcos moravam, em um prédio no bairro da Vila Leopoldina, na zona oeste de São Paulo – e esse quarto de hóspedes cumpriu bem a sua função hospedando por bom tempo, em seus seis metros quadrados, uma jiboia de dois metros de comprimento. Essa história foi revelada à ISTOÉ na semana passada por diversos amigos e amigas que freqüentavam a residência do casal Matsunaga. ISTOÉ também teve acesso a diversos laudos, depoimentos e documentos inéditos que revelam detalhes sobre os bastidores da vida, do crime e da alucinada tentativa de fuga de Elize entre os dias 20 de maio e 4 de junho, quando foi presa pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa após investigação chefiada pelo delegado Mauro Dias e coordenada pelo delegado Jorge Carrasco, diretor-geral do DHPP. A existência da jiboia é importante porque ela foi um dos motivos que levou o casal a começar a viver uma rotina de brigas. Segundo amigos de Elize e Marcos, assim que engravidou ela não quis mais saber do animal, e aí foram nove meses de discussões até que Matsunaga se desfez da cobra quando a criança nasceu. 

As mesmas pessoas íntimas do casal, que costumavam ir ao duplex de mil metros quadrados onde moravam o ex-diretor da Yoki e a bacharel em Direito, enfermeira e ex-garota de programa Elize, contaram também que ela lhes pediu indicação de médicos para submeter-se a tratamento hormonal uma vez que não conseguia engravidar. “Isso a irritava muito”, diz uma das fontes ouvidas por ISTOÉ. “Mas ficou muito feliz quando engravidou e se tornou uma amorosa e cuidadosa mãe.”
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MARCOS E A AMANTE
Elize blefou quando disse que já tinha em
mãos esse vídeo provando a traição do marido
A presença do bebê deu novo alento à família e não há quem não relate que, nesse momento da vida, marido e mulher eram felizes. A história de ambos começou em 2004 quando se conheceram por meio do site de acompanhantes Mclass, dois anos depois Elize ingressou na faculdade de Direito e, mais três anos e meio, eles estavam casados. Amigos do tempo de universidade lembram que Elize ajudava financeiramente os colegas pobres, dava-lhes mesmo o dinheiro ao invés de emprestá-lo. Se alguém insistia em pagar-lhe o empréstimo, a moça pegava a quantia e a repassava imediatamente a outro estudante que dela necessitasse para honrar as mensalidades. Recordam-se também que Elize faltava bastante às aulas, viajando sempre de forma repentina, por dois ou três dias, e, de regresso, exibia fotos suas que alguém tirara – e nessas fotografias aparecia sempre desacompanhada. Reservada, Elize não costumava se abrir nem fazer os trabalhos solicitados pelos professores. Seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), por exemplo, versou sobre as mães barriga de aluguel e, segundo declarações colhidas por ISTOÉ, foi feito por outros alunos e “comprado” por Elize. 

Segundo amigos próximos, Elize estava bem financeiramente. Ela teria se tornado dona de metade do duplex: Marcos lhe teria feito essa doação, embora a certidão de casamento aponte comunhão parcial de bens. Foi já com a filhinha quase a completar um ano, que despontou em Elize a desconfiança de que o marido tinha uma amante, garota de programa sete anos mais nova do que os 30 anos que ela tem, mas em contrapartida infinitamente menos aquinhoada pela sorte material. O ciúme fala mais alto, ela se enerva e chega ao ponto de contratar na surdina, por R$ 7 mil pagos em duas vezes, o detetive particular William Coelho de Oliveira para seguir o marido. No mesmo dia 17 de maio em que toma os serviços profissionais do detetive, Elize viaja para o Paraná deixando ordens expressas a uma das empregadas para municiar tanto a ela quanto a Oliveira com informações sobre os horários de saída de Marcos do apartamento. Retorna a São Paulo 48 horas depois. Vem então a noite fatídica: em meio a uma discussão no apartamento na qual ela teria sido ofendida verbal e fisicamente, e com uma pizza esfriando na mesa, Elize apanha uma pistola semiautomática .380 (ao contrário do que se disse não foi uma .765) e dispara um projétil (velocidade de 330 metros por segundo e alto poder de perfuração) na cabeça de Mauro. Entre policiais e amigos, comenta-se que o barulho do tiro não foi abafado porque os vidros do apartamento são à prova de som, como Elize declara, mas foi abafado, isso sim, porque ela teria se valido de um silenciador na arma. Revelado agora por ISTOÉ, a presença do silenciador contraria bastante a versão inicial de como o assassinato teria ocorrido – e há policiais que ainda insistem em descobrir como e onde Elize se desfez dele. Com o marido morto, ela coloca então em ação o seu plano para se livrar da polícia.
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Todo o projeto que ela desenvolveu para não ser incriminada manteve-se em pé por apenas 15 dias. De acordo com especialistas criminais ouvidos por ISTOÉ, a peça-chave de sua estratégia foi um e-mail de 53 caracteres que ela enviou do endereço eletrônico do morto, e em nome do morto, como se ele estivesse vivo. A mensagem foi endereçada ao seu cunhado Mauro Matsunaga e nela se lê: “Avisa pra Elize e pra mamãe que eu to bem, só não posso falar agora.” Antes disso, no entanto, no dia 20 de maio, Elize desfez-se das partes do corpo que esquartejara e escondera dentro de sacos plásticos em três malas, na região da cidade paulista de Cotia onde um dos melhores amigos de Marcos, Horácio D’Abramo, tem um sítio ao qual o casal costumava ir frequentemente. 

Enquanto “desovava” as partes do cadáver em diferentes pontos, Elize fez 15 telefonemas para a babá que ficara no apartamento cuidando de sua filha, conforme aponta o mapa de interceptação de seu celular, feita com ordem judicial. No dia seguinte Elize foi ao escritório do detetive que contratara para apanhar os CDs que ele gravara flagrando Marcos com a amante, e é aqui que se descobre um blefe: na noite do crime, antes de puxar o gatilho, Elize disse para Marcos que tinha em mãos imagens provando a sua traição. Diante disso Marcos a teria esbofeteado. Agora se sabe que, na verdade, até aquele momento, Elize não vira vídeo algum, apenas ouvira falar dele.
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De posse do CD, ela parte então no dia 23 de maio para a essência do seu plano de despiste e dispara o e-mail falso para Mauro, em nome do morto e através de seu endereço eletrônico. Era a sua carta marcada para dizer que o marido ainda vivia e, a partir daí, passa insistentemente a alimentar a suspeita da polícia e de familiares de que ele fora sequestrado, tocando sempre na mesma tecla: Marcos enviara um e-mail para o seu irmão. 

No dia 30 de maio, Elize telefonou desesperada para a residência de um dos padrinhos de sua filha, foi convidada a ir até ela para consolar-se e chegou por volta das 11 horas. Segundo depoimento desse padrinho, a que ISTOÉ teve acesso, de óculos escuros e muito abalada, Elize lhe disse que haviam localizado o corpo de Marcos com um tiro na cabeça. Também para essa residência foi Cecília Yone Nishioka, prima de Marcos e ex-namorada desse mesmo padrinho, após receber inúmeras chamadas de Elize em seu celular. Nesse encontro, Elize pediu a Cecília que a levasse à casa da mãe de Marcos, no que foi prontamente atendida. Lá também se falou sobre a identificação do corpo, Elize chorou e manteve a história de sempre. Desde então passou a conversar com Cecília quase que diariamente, inclusive sobre o velório, mas nunca abandonou o tema do sequestro – o que só viria mesmo a acontecer quando foi presa no dia 4 de junho. “Eu gostava muito do casal, só agora estou conseguindo dormir direito. Vivo um momento completamente sem expectativas e não sei quando verei novamente a Elize ou a criança”, disse o padrinho à ISTOÉ, pedindo que não fosse identificado. “A Elize deveria ganhar um prêmio de atriz, conseguiu enganar toda a família. Poderia ganhar o Oscar”, declarou Cecília em depoimento. Resta saber, agora, para quem Elize deu o primeiro telefonema após o assassinato, e isso a Justiça descobrirá em breve porque já determinou a quebra de seu sigilo telefônico. E resta saber, também, se Elize já estava atuando como atriz quando telefonou em abril para a Polícia Militar indagando se era crime trocar as fechaduras do apartamento numa oportunidade em que o marido estivesse fora dele, uma vez que desconfiava que estivesse sendo traída. Finalmente, será que Elize já era candidata à estatueta, à qual Cecília se refere, quando ligou para amigos no início de maio pedindo indicações de advogados de família e voltou a ligar no fim do mesmo mês querendo indicação de um advogado em direito penal, sem explicar o motivo do pedido? Entre um telefonema e outro, ela assassinou Marcos. E tentou então conseguir o impossível: com um e-mail falso, fazer de conta que nada acontecera no quarto da jiboia. 
Os passos da espionagem
Foi no dia 17 de maio que o detetive particular William Coelho de Oliveira começou a trabalhar para Elize Matsunaga na captura de imagens que provassem a traição de seu marido. Fixou o preço de seu trabalho em R$ 7 mil, parcelado em duas vezes. Isso consta de documentos aos quais ISTOÉ teve acesso na semana passada. Quarenta e oito horas depois, Marcos, o marido espionado, morreu com um tiro na cabeça, disparado pela própria Elize, e teve o corpo por ela esquartejado. O detetive Oliveira, que obviamente jamais desejou esse final trágico, conseguira flagrá-lo e gravara as cenas que a esposa tanto desejava e, ao mesmo tempo, tanto temia.
A pedido da própria contratante do serviço – que naquele mesmo dia viajara para o Paraná mentindo ao detetive ao dizer que iria para o interior de São Paulo –, a equipe de Oliveira a mantinha informada pelo celular sobre todos os passos do marido e também sobre as filmagens que ela exigia serem bastante nítidas. Na noite de 18 de maio, Marcos e a mulher com a qual ele traía a esposa, a garota de programa Nathalia, foram seguidos em um restaurante japonês. Ao saírem dele, rumaram para o Café Vipiteno, tradicional e sofisticado ponto de São Paulo. A última parada deu-se no hotel Mercure. Pronto, as imagens estavam concluídas e o trabalho feito. Oliveira admite, no entanto, que se sentiu surpreso quando, no dia 21 de maio, Elize esteve em seu escritório. A esposa do homem que ele seguira comunicou-lhe justamente o desaparecimento do marido, e falou da possibilidade, bastante concreta segundo ela, de que tivesse ocorrido um sequestro. Oliveira, imediatamente, fez-lhe perguntas básicas e se prontificou a ajudá-la em sua localização. Estranhou muito quando ouviu um não. Mais: ouviu que era para ele esquecer completamente o caso. Elize, é claro, sabia que Marcos já estava morto. O detetive, não.
fotos: arquivo pessoal
fotos: Diogo Moreira e reprodução/Folhapress; Futura Press
fotos: Jefferson Coppola/Folhapress; reprodução

Um vestido para Dilma



Ex-guerrilheiro curdo, embaixador do Iraque aguarda audiência 

no Planalto para entregar roupa típica à presidenta

Adriana Nicacio
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No Brasil desde outubro de 2010, o embaixador do Iraque, Baker Fattah Hussen, não vê a hora de ser recebido pela presidenta Dilma Rousseff. Na audiência oficial, cuja data ainda depende de confirmação do Palácio do Planalto, Baker levará um longo vestido de seda colorido, bordado à mão com delicadas lantejoulas douradas. Trata-se de um traje de festa usado pelas mulheres curdas. Na avaliação de Baker, a história de superação curda no Iraque se assemelha com a de pessoas como a presidenta Dilma Rousseff, que pegaram em armas para enfrentar regimes ditatoriais. “Estou ansioso para entregar esse presente por tudo o que a presidenta representa”, disse o embaixador. O gesto seria impossível há uma década, quando os curdos eram considerados inimigos do regime iraquiano e quase foram exterminados. Em 1980, recém-formado em química, Baker sentiu-se obrigado a aderir à guerrilha, que começava a se instalar nas montanhas de Sulaimaniya, na região do Curdistão, norte do país. Pela sua formação, logo foi alçado ao topo da liderança da resistência, traçou estratégias com seus companheiros, enviou códigos cifrados por rádios clandestinas, lutou e conseguiu sobreviver a nove anos de luta armada. “Não queríamos a guerra, mas não havia diálogo. Os curdos analfabetos eram presos. Os que sabiam ler, degolados. Vilas inteiras foram destruídas. Minha mãe e meu irmão foram presos e eu precisei lutar para viver”, disse Baker. 

O diplomata conta que, todos os dias, sua meta era simplesmente manter-se vivo. Para isso, passava semanas sem poder descer das montanhas, escondido dentro de cavernas e só saía à noite para beber leite de cabra e comer pão. A fase mais difícil foi entre 1980 e 1984, quando cerca de cinco mil peshmergas – nome dado aos guerrilheiros que significa em curdo “aqueles que enfrentam a morte” – viviam sem nenhum tipo de ajuda estrangeira. Mas também foi uma época feliz para ele, quando conheceu a também guerrilheira, hoje embaixatriz, Kajal Ahmad Ali, mulher de olhar firme, cabelos compridos e traços elegantes. Em 1985, a força curda contra Saddam triplicou. As pessoas saíam das cidades em direção às regiões proibidas e a guerrilha tinha mais de 15 mil militantes. O governo iraquiano havia mandado evacuar toda a área de fronteira com a Síria, Turquia e o Irã, e era justamente nesse local que eles se concentravam. “Todo o nosso povo nos ajudou. Quando descíamos das montanhas, encontrávamos casa e comida. Foram tempos duros, mas desfrutei de uma liberdade indescritível”, diz Baker.
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Com marcas pelo corpo de estilhaços de bomba e sem poder dobrar dois dedos da mão esquerda, Baker conta que chegava a passar 14 horas seguidas com o fuzil em punho. Lembra em particular de uma manhã em novembro de 1987, quando os soldados de Saddam Hussein jogaram armas químicas contra seu grupo. “Quando caem no chão, as bombas químicas estouram e se dividem em grandes pedaços. A fumaça tem um cheiro específico. Mas só sabia disso porque sou químico”, conta. Em março de 1988, cinco mil curdos de Halabja não tiverem a mesma sorte.

Os curdos são descendentes do antigo Império Persa e, a exemplo dos palestinos, buscam a formação de um Estado próprio com mais força desde 1960. Em 1986, a campanha de Anfal, cujo nome saiu de um capítulo do Alcorão que significa “pilhagem de guerra”, matou mais de 200 mil curdos. “Na guerrilha, éramos um para cada 200, 300 soldados”, afirma Baker. Em 1989, Baker pediu asilo político ao Irã e foi nomeado representante do seu atual partido, a União Patriótica do Curdistão (UPK). Depois seguiu para Espanha, Itália e, em 2009, no governo do atual presidente, o curdo Jalal Talabani, foi nomeado ministro de Assuntos Exteriores em Bagdá, de onde seguiu para o Brasil. “Aqui é o paraíso”, diz.

Na visita à presidenta Dilma, além do presente e de sua história, Baker diz que vai levar números de grande interesse para o governo brasileiro, que em março inaugurou uma embaixada em Bagdá, depois de 21 anos sem representação diplomática. Um relatório da Arab Investment and Export Credit Guarantee Corporation mostra que o Iraque deverá crescer 12% este ano, o melhor desempenho do mundo árabe. 
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Todos passam por BH



Personagens centrais da disputa presidencial de 2014 medem 

forças na eleição da capital mineira. O racha entre PT e PSB locais 

nacionalizou a campanha

Pedro Marcondes de Moura
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Até o final do último mês, a reeleição do prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB), apoiada por PT e PSDB, era considerada favas contadas. O racha entre o PT e o PSB locais, no entanto, alterou totalmente o quadro eleitoral na capital mineira. A disputa ganhou ares de embate nacional ao levar para o jogo potenciais candidatos a triunfar na corrida presidencial de 2014: o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) e o senador Aécio Neves (PSDB), articuladores da reeleição de Lacerda, e a presidenta Dilma Rousseff, que se transformou na principal madrinha da candidatura de Patrus Ananias (PT). Ao lado de São Paulo, a disputa tornou-se determinante para quem está de olho na eleição para o Palácio do Planalto daqui a dois anos. Graças à articulação de Dilma, Patrus Ananias também terá o apoio do PSD de Gilberto Kassab e do PMDB de Michel Temer, outros dois importantes protagonistas políticos da próxima eleição presidencial. 

A presidenta Dilma elegeu a capital mineira como sua prioridade, pois entende que sua reeleição começa a ser jogada durante a disputa eleitoral de BH. Principal cabo eleitoral de Lacerda, Aécio deve rivalizar com ela em 2014. E o socialista Eduardo Campos, outro apoiador do atual prefeito, também começa a ganhar musculatura política, seja para um vôo solo ao Planalto, seja para ocupar a vaga de vice em uma das chapas, que pode ser até a de Aécio, numa dobradinha PSDB-PSB. Por isso, além de atrair o PMDB e o PSD, a presidenta comandou pessoalmente a entrada de Fernando Pimentel, ex-prefeito de Belo Horizonte e ministro do Desenvolvimento, na campanha, removendo arestas no PT local. Pimentel era até pouco tempo desafeto de Patrus. Com uma vitória petista na cidade, Dilma conquistaria um palanque privilegiado e, ao mesmo tempo, prejudicaria dois possíveis rivais.
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INÁBIL
Sem visibilidade, governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia,
não conseguiu manter aliança costurada por Aécio Neves
A reeleição de Márcio Lacerda também virou um teste de fogo para o senador Aécio Neves. Em caso de vitória, Aécio consolida seu poder político em Minas Gerais. Em caso de derrota do prefeito, no entanto, Aécio corre o risco de perder sua máquina política, o que diminuiria sua força para concorrer à Presidência da República. O desfecho da eleição na capital mineira norteará o futuro político de Eduardo Campos, que há tempos se cacifa com uma estratégia pendular de ora apoiar o PT ora marchar ao lado do PSDB. 

O estopim para o racha entre o PT e o PSB foi a decisão socialista de rejeitar a exigência petista de coligar-se também na disputa à Câmara Municipal. Faltou também habilidade política ao governador Antonio Anastasia (PSDB), gestor de um governo sem visibilidade, para manter a ampla aliança costurada por Aécio no passado. Foi o sinal verde para o PT lançar a candidatura de Patrus. Agora, os personagens centrais de 2014 passam pela eleição em BH. O jogo presidencial já começou.
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A difícil tarefa de trocar o altar pelo palanque



A Igreja Católica tem sido mais rígida com seus sacerdotes para 

conter a onda dos que pretendem disputar as eleições deste ano

Rodrigo Cardoso
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Política é uma maneira nobre e exigente de servir ao próximo”. As palavras são do italiano que ficou conhecido como Paulo VI, papa que administrou o Vaticano entre 1963 e 1978. Por aqui, no Congresso Nacional, há atualmente quatro padres fazendo política partidária no cargo de deputado federal. Esse número representa o dobro do que a casa apresentava em 2010. O avanço estatístico, porém, mascara um retrocesso sentido pelos sacerdotes que desejam se candidatar a cargos públicos no próximo pleito, em outubro. Diferentemente do que preconizava Paulo VI, fazer política – apesar de não configurar pecado – desagrada à Santa Sé e, por tabela, aos bispos diocesanos. Esses, por sua vez, fazendo valer a possibilidade prevista no Código de Direito Canônico, o conjunto de normas que regulam a Igreja Católica no mundo, têm afastado do uso das ordens religiosas os subordinados padres que lançam uma candidatura. Na prática, isso significa o afastamento imediato de celebrações como casamentos, batizados e missas.
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RESTRIÇÕES
O deputado João Siqueira (PT-MG) só
pode fazer celebrações em capelas
Somente este ano, três foram as vezes em que párocos brasileiros se reuniram para discutir o quanto a relação deles com os bispos diocesanos se torna angustiosa no momento em que manifestam o desejo de disputar uma eleição por algum partido. Os eventos, batizados de “Encontro mineiro de padres na política”, ocorrem em Minas Gerais desde 1999. “Tem havido um endurecimento por parte da Igreja ultimamente”, afirma um dos participantes, o padre João Siqueira, 45 anos. Hoje deputado federal pelo PT, o religioso conta que entre 2002 e 2010, quando cumpria mandato de deputado estadual, d. Luciano Mendes de Almeida, então bispo da Arquidiocese de Mariana (MG), o permitia realizar celebrações e, inclusive, confiava a ele a administração de uma paróquia. Dois anos atrás, o cenário mudou ao informar o desejo de tentar a vaga de deputado federal. “O bispo me disse que, se eu não abandonasse a candidatura, sofreria restrições ao uso das ordens”, recorda. “Como não voltei atrás, o bispo só me permite fazer celebrações em capelas, hospitais ou asilos, por exemplo.”
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"Mesmo que algum padre abandone a política, 
o retorno ao posto não é garantido"

Dom Delson Pedreira, de Caicó (RN)
O argumento mais utilizado pela alta cúpula católica é o de que a política divide a comunidade religiosa. “Os padres se tornam lideranças em comunidades e a Igreja tem medo de perdê-las para a política”, opina o padre Jocimar Dantas, que tentará a reeleição a prefeito de Seridó (RN). Na diocese de Caicó (RN), o bispo d. Delson Pedreira, afirmou que, mesmo que algum padre abandonasse a política, o retorno ao antigo posto não era garantido. Há 11 anos como sacerdote em Bragança, cidade a 220 quilômetros de Belém, no Pará, Nelson Magalhães sofreu isso na pele. Perdeu a eleição à prefeitura, em 2008, e diz que só conseguiu assumir as funções religiosas que desempenhava antes da derrota nas urnas após uma intervenção do conselho presbiterial da diocese local.  
fotos: Robson Davila; Beto Oliveira/Câmara dos Deputados; Saci/DN/D.A Press