sábado, 8 de março de 2014

Eles querem desossar a reeleição



Processada nos EUA por cumplicidade com fraudes que precipitaram a crise, a agência de risco S&P desembarca no Brasil para dizer se o governo é ou não confiável

por: Saul Leblon



Incapaz de criar fatos que o resgatem da irrelevância propositiva, o conservadorismo salta de um lado a outro à procura de um galho que lhe dê alguma luz.

O resultado desanima até a condescendência da mídia amiga.

Entre a toga colérica, que rasgou a fantasia ética com a própria boca, e as máscaras incendiárias, que mais assustam do que contagiam, o saldo aderna.

A oito meses das eleições, uma nova esperança está prestes a entrar em campo.

Com poderes para dizer se o Brasil vai ou não ‘cumprir suas obrigações fiscais’, se o ‘governo é ou não confiável’, ‘se a política econômica está ou não no caminho certo’, a ilustre visita atende pelo nome de Standard & Poor’s.

Fosse um bicho, teria a morfologia de um cão farejador.

Sendo uma agência de risco, desembarca seu focinho tecnocrático para vasculhar até que ponto as contas do governo garantem o pagamento de juros aos rentistas da dívida pública (leia mais sobre a questão fiscal na coluna de Jaciara Itaim; nesta pág)

É nessa condição de quem ostenta uma coleira conduzida por poderosas mãos invisíveis –que também costumam asfixiar o pescoço de governos-- que os emissários da ‘S&P’ terão acesso às contas brasileiras.

Reuniões em Brasília já estão agendadas para essa finalidade.

O gênero dos economistas de bancos, tão previsível quanto seus power points, também será ouvido, a exemplo das consultorias afinadas pelo diapasão do Brasil aos cacos.

A semelhança com as missões do FMI, ou os atuais comitês interventores da Troika, na Europa, não é coincidência.

O espírito é o mesmo.

Métodos e métrica, idem. E por uma razão muito simples.

Os interesses que movem os ternos negros em todo o mundo são os mesmos.

O apetite do capital rentista utiliza regularmente a matilha carimbadora de ‘ratings’ para devolver governos e nações à disciplina dos bons supridores de juros ao capital financeiro.

O capital pode ser volátil; as políticas fiscais, não.

Não importa a que custo para a sociedade.

É com base nessa tradição que o conservadorismo e seus jornalistas isentos esperam que a S&P reforce o seu palanque espetando um downgrade no coração da candidatura Dilma.

Ou seja, rebaixando a nota de risco que mede a capacidade de um Estado honrar os títulos que financiam sua dívida.

A mídia isenta não concebe a hipótese de a ‘S&P’ decepcionar.

Em junho do ano passado, quase em sintonia com os protestos, a agencia, com escritórios em 23 paíss já havia revisado a perspectiva do país de "estável" para "negativa".

Não importa que as justificativas tenham sido desmentidas pelos fatos.

O PIB de 2013 cresceu mais do que estimava a torcida que agora aposta em um novo empurrão par abaixo.

A taxa de expansão da economia brasileira, de 2,3%, foi o dobro daquela do México, por exemplo, cuja nota de risco foi elevada no mês passado por outra agencia, a Moody’s.

A do Brasil, ao contrário, caiu dois graus abaixo da classificação festejada pelo ‘amigável’ presidente mexicano, Enrique Peña Nieto -- comprometido com as ‘reformas’, explica o jornalismo comprometido com os interesses que delas se beneficiam.

O descontrole fiscal, ‘a gastança’ –o voluntarismo petista, diria FHC-- outra justificativa para o rebaixamento brasileiro, tampouco se confirmou.

O Brasil mantém uma relação dívida bruta/PIB estável; exibe ademais uma das menores proporções de endividamento líquido (descontadas as reservas internacionais) do mundo.

No ano passado ela caiu para 35% do PIB.

Era superior a 60% há dez anos; um legado de FHC que os festejos dos 20 anos do Real omitiram distraidamente.

A elevada expectativa conservadora, bem como a tensão dentro do governo, com a chegada dos paletós pretos, não encontra lastro na respeitabilidade intrínseca da ‘S&P’.

No início de 2013, o Departamento de Justiça norte-americano abriu um processo por fraude contra ela.

Foi o primeiro grande processo contra uma agência de risco por sua cumplicidade com as práticas de mercado que resultaram na explosão da bolha imobiliário nos EUA, em 2008, e que acionaria o gatilho da maior crise mundial do capitalismo desde 1929.

A ‘S&P’, que ora vem cobrar rigor nas contas brasileiras e arguir as autoridades quanto a consistência das metas fiscais para 2014, enfrenta acusações por agir de forma algo discrepante em seu país.

Entre elas a de blindar com a nota mais alta (o almejado triplo-A) papéis e investimentos financeiros congenitamente insolventes, como era o caso das subprimes e seus derivativos de fragilidade ainda superior.

Investidores e fundos previdenciários que se orientam pelos parâmetros supostamente ‘técnicos’ dos ratings emitidos pela ‘S&P’ empanturraram-se de material tóxico, imaginando-se a salvo da tempestade que já se desenhava no céu.

‘(...) “[A S&P] conscientemente e com a intenção de defraudar, participou e executou um esquema para enganar os investidores’ (...) [passou a falsa ideia de que as suas classificações] “eram objetivas, independentes e não influenciadas por conflitos de interesses”, acusa o documento levado aos tribunais pelo Departamento de Justiça dos EUA, segundo noticiou o New York Times.

Um grupo de 13 municípios australianos abriu processo idêntico contra a agencia alegando prejuízos milionários pelas mesmas razões.

Estima-se que se uma única dessas ações fosse consumada, o precedente poderia despejar na ‘S&P’, sobre cujas sentenças recai boa parte das esperanças eleitorais do conservadorismo brasileiro, ajuizamentos da ordem de US$ 200 bi.

Em 2011, na tentativa algo caricata de recuperar uma credibilidade rastejante, a agencia rebaixou a nota de risco dos EUA.

O tiro saiu pela culatra.

Não faltou quem lembrasse que o rigor de seus técnicos foi muito inferior ao concederem nota A –elevada segurança-- ao banco Lehman Brothers, cuja falência, em setembro de 2008, rompeu o dique da crise mundial.

O endosso da ‘S&P” à instituição símbolo da ruinosa supremacia das finanças desreguladas foi concedida em agosto, um mês antes da bancarrota.

Desconfia-se que já como parte da desesperada tentativa de continuar empurrando títulos do Lehman na goela dos incautos, como forma de mitigar as perdas dos grandes acionistas, diante da quebra inevitável.

Como corolário da impoluta trajetória ética e técnica recorde-se que o governo norte-americano encontrou um erro de cálculo de ‘apenas’ US$ 2 trilhões nas contas que orientaram a Standard & Poor’s a rebaixar o rating do país.

Esse é a folha corrida por trás da missão reverenciada com ansiedade pelo colunismo isento e as candidaturas pró-mercados.

A participação involuntária do governo Dilma nesse teatro de marionetes merece reflexão à parte.

Não é um problema do economicismo latente do governo –ou da complacência petista com o mercado, como se pode carimbar.

É mais grave que isso.

Decorre da paradoxal restauração de uma ordem iníqua apoiada nas ruínas de seus próprias dogmas e promessas.

É como se o Muro de Berlim desabasse e nenhuma sola de sapato consumasse a travessia, de um lado e outro.

O dique trincou, mas as águas congelaram diante da fenda.

A autoridade da ‘S&P’ emana dessa correlação de forças inercial cristalizada desde 2008.

Seu poder de chantagem agora se amplia, com a reabertura das rotas de fuga para as economias ricas, em ziguezagueante processo de recuperação.

De onde vem essa paralisia capaz de transformar a água em sua própria parede?

Vem da impotência anterior da democracia, que a tornou incapaz de renovar a sociedade e o desenvolvimento mesmo em meio a uma crise sistêmica da ordem neoliberal.

Desarmada pelas derrotas anteriores da esquerda, e a adesão de uma parte dela ao cuore neoliberal, o sistema representativo deparou-se com a fenda do dique sem dispor de canais de debate e organização para não só acolher como estruturar um jorro de vontade mudancista.

As ruas se encheram de indignação na Espanha, por exemplo.

Mas as urnas elegeriam Mariano Rajoy, herdeiro da cepa franquista, que calafetou a muralha com uma taxa de desemprego de 60% entre a juventude espanhola.

A prostração democrática não é uma fatalidade diante de uma crise sistêmica.

Ela é um produto histórico. De decisões políticas. E rendições ideológicas.

O campo progressista brasileiro tem nas eleições de outubro um poderoso instrumento para demonstrar que não é necessário que seja assim.

A ‘Standard & Poor’s desembarca com respaldo dos mercados, da mídia e do conservadorismo não apenas para chantagear o final do governo Dilma.

Mas para engessá-la no palanque de outubro.

No limite, desossar sua eventual reeleição.

O que significa frustrar o desejo mudancista do eleitor brasileiro, majoritariamente associado à sua condução do processo.

Se a uma organização com os atributos da ‘S&P’ é facultado o acesso a todas as informações de governo, ademais do tempo requerido de seus principais técnicos e assessores, algo equivalente deve ser feito na direção oposta.

Aquela que fortaleça a democracia, abrindo canais suplementares de participação da sociedade na discussão do passo seguinte do seu desenvolvimento.

O programa de governo da candidata Dilma Rousseff é a ponte entre a prostração democrática que favorece a chantagem dos mercados, e uma repactuação consistente do futuro, feita de prazos e metas críveis para a construção da cidadania plena no país.

O programa de governo da reeleição pode e deve ser construído em debate aberto com a sociedade através da rede já existente de sites e blogs progressistas.

O casamento da democracia com o desenvolvimento não acontecerá à margem do poder.

E não há nada mais poderoso do que uma plataforma de governo sedimentada em debate amplo, convergindo para círculos e conferencias presenciais da militância progressista.

Ilusão não é erguer pontes que materializem o horizonte de uma democracia social.

Ilusão é achar que ela pode ser construída sem essas pontes.

Ou escorada exclusivamente na busca de anuência da ‘Standard & Poor’s’ para as contas do país.

http://www.cartamaior.com.br/?%2FEditorial%2FEles-querem-desossar-a-reeleicao%2F30418

Como restaurar o STF

Provável saída de Joaquim Barbosa do tribunal abrirá espaço para consolidação de uma nova maioria. Expectativa é pela distensão do ambiente, hoje marcado por troca de acusações políticas 


Izabelle Torres (izabelle@istoe.com.br)
A menos que Joaquim Barbosa mude subitamente de ideia e volte atrás nos seguidos comunicados de que pretende antecipar a aposentadoria e deixar o Supremo Tribunal Federal (STF) nos próximos meses, o principal debate jurídico do País consiste em discutir como ficará a mais alta corte em sua ausência. Ministros e estudiosos do Supremo estão convencidos de que as mudanças serão muitas e de qualidade variada, até porque o novo presidente do tribunal será justamente Ricardo Lewandowski, o ministro que, por temperamento, por formação e também por visão nos fundamentos do direito, pode ser classificado como antípoda de Joaquim Barbosa.
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VÊM AÍ OS GARANTISTAS 
A nova composição fortalece uma visão garantista, corrente nascida no
direito italiano que privilegia as garantias oferecidas ao indivíduo
A primeira mudança deve ser justamente na forma de condução dos debates da Corte. “Haverá um ambiente de descontração e coleguismo, que já se nota quando Joaquim Barbosa se ausenta e Lewandowski assume a presidência”, prevê um doutor em direito que atua como assistente de um dos principais ministros da casa. Embora tenha construído uma popularidade capaz de fazer dele um nome presidenciável em 2014, Joaquim Barbosa passou as últimas semanas em posição de fraqueza, com a autoridade corroí­da pelo comportamento agressivo, num processo de desgaste interno reforçado pela suspeita, partilhada por alguns colegas, de que seria capaz de usar o tribunal como trampolim para seus projetos políticos. Mas, em meio ao clima beligerante que tomou conta do tribunal desde a concessão aos mensaleiros dos embargos infringentes, o presidente do STF não foi o único a ser acusado de agir politicamente. Ao votar contra a formação de quadrilha pelos réus do mensalão, o ministro Luiz Roberto Barroso foi criticado por Barbosa. Para ele, Barroso chegou ao STF em junho do ano passado com “voto pronto” e propósitos políticos. Essa tese encontra eco em outra ala do Supremo, da qual faria parte o ministro Gilmar Mendes.
Para evitar novos embates políticos, quando o que deveria prevalecer era a discussão jurídica, Lewandowski já avisou a dois colegas que sua prioridade quando assumir a presidência será estabelecer a cordialidade e o respeito ao contraditório dentro da própria Corte. Mas essa postura não envolve apenas uma questão de boas maneiras. O STF é um tribunal colegiado, que produz decisões coletivas, construindo sua jurisprudência em grupo – e este trabalho só é possível num ambiente de respeito mútuo e consideração pelas opiniões alheias, ainda que discordantes. Há uma contrapartida, porém. O estilo Lewandowski é bastante apreciado pelos colegas de plenário, mas, de olho no tratamento que o ministro recebe em aparições públicas, quando chega a ser criticado e até tratado de forma agressiva por cidadãos comuns, determinados ministros do STF julgam que o novo presidente terá de preocupar-se com a popularidade do tribunal – e dele próprio – se não quiser enfrentar manifestações de descontentamento no plenário. “Nenhum ministro ficará feliz se concluir que o tribunal está perdendo um prestígio que já teve de antes”, opina um dos mais antigos magistrados da Corte.
Por uma dessas coincidências especialmente curiosas, Lewandowski assume a presidência num momento em que começa a ser constituída uma nova maioria, a partir do ingresso na Corte de Luiz Roberto Barroso e Teori Zavascki. Em companhia de Lewandowski, de Antonio Toffoli e das ministras Rosa Weber e Carmen Lucia, o STF começa a girar em torno de um novo centro de gravidade, que na semana passada permitia prever com alguma margem segurança, mas sem certezas absolutas, que, nesta quinta-feira, na discussão sobre crime de lavagem de dinheiro, Joaquim Barbosa também possa ser derrotado na última votação sobre embargos infringentes da Ação Penal 470, que julga o mensalão.
No plano da jurisprudência, nem o mais atrevido dos futurólogos consegue enxergar tendências definitivas quando o STF começar a enfrentar o dilema que acompanha a rotina das cortes superiores do mundo inteiro – assumir a vocação de tribunal constitucional, dedicado à garantia de direitos e à interpretação da Lei Maior, ou um tribunal que atua como corte criminal, com a última palavra para casos específicos.
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Caso Joaquim confirme sua saída, serão abertas duas novas vagas no STF, pois Celso de Mello tem dito a colegas que planeja aposentar-se também em 2014, embora só vá atingir a idade limite de 70 anos no ano que vem. Parece inevitável, de qualquer modo, um recuo do “ativismo” judiciário que dominou a corte nos últimos tempos, quando os ministros se dedicavam a avançar uma jurisprudência que não se encontrava definida na Constituição, assumindo o comportamento de quem, nas palavras do jurista gaúcho Lenio Streck, em vez de fazer a “ filtragem das leis inconstitucionais”, passou a achar que sabia “mais do que o constituinte.”
Na nova composição, também parece provável o fortalecimento de uma visão “garantista”, corrente nascida no direito italiano que privilegia as garantias oferecidas ao indivíduo em detrimento da capacidade de punir assegurada ao Estado. Embora tenha sido um dos mais duros ministros da Ação Penal 470, Gilmar Mendes marcou sua passagem pela presidência do STF como um ministro preocupado com direitos fundamentais, capaz de criar uma súmula vinculante destinada a regulamentar o uso de algemas por parte da polícia cujo traço principal reside na preservação dos direitos individuais e num esforço contra abusos por parte da polícia.
Fotos: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr; Joédson Alves/IstoÉ; STF
http://istoe.com.br/reportagens/351246_COMO+RESTAURAR+O+STF

Atuação de juíza de Porto Alegre é alvo de críticas de MP e polícia


Conhecida no meio jurídico como "Iraque" pela violência dos réus que julga, a 1ª Vara Criminal do Tribunal do Júri de Porto Alegre é alvo de polêmica desde 21 de janeiro deste ano devido à atuação da juíza Sonáli da Cruz Zluhan, 54 anos, uma magistrada de perfil liberal. Designada por tempo indeterminado para o lugar de Volnei dos Santos Coelho, agora na Corregedoria do Tribunal de Justiça (TJ), ela já revogou as prisões de 31 réus no período de atuação, alguns de alta periculosidade. Membros do Ministério Público (MP) e da Polícia Civil estão indignados.
— Essa vara é o Iraque. Algo está errado. Ela faz um trabalho danoso em nome de uma ideologia de esquerda, marxista, que prega que todo mundo é vítima da sociedade. Vai repercutir diretamente no aumento da criminalidade — acredita o promotor Eugênio Amorim, da Promotoria de Justiça do Tribunal do Júri da Capital.
Alinhada ao direito alternativo, que recomenda que a aplicação de uma lei deve levar em conta o contexto social de cada caso, Sonáli Zluhan fez com que 20 presos voltassem às ruas — 11 dos 31 cumprem pena por outros crimes e seguiram detidos — em pouco mais de um mês em Porto Alegre. Na maioria dos casos, eles respondem por delitos como homicídio doloso, formação de quadrilha, tráfico de drogas e receptação.
— São reincidentes e perigosos. Deixá-los soltos pode motivar até atos de linchamento. Quando o Estado não se faz presente, as pessoas agem. Não acho que ela tenha de ser dura, apenas imparcial. Isso precisa ser denunciado para a sociedade. Qual é a responsabilidade do Judiciário com os homicídios em Porto Alegre? — questiona Amorim.
O histórico de polêmicas da magistrada não é de hoje. Quando trabalhou em Caxias do Sul, na Serra, ela permitiu, em 2004, a soltura de Cristiano Ribeiro, condenado por roubo e extorsão.
Em liberdade condicional, ele foi flagrado ao entrar no Presídio Industrial com drogas. Libertado novamente, participou de assalto que resultou na morte do comerciante Luiz Alberto Moretto, irmão do então bispo da cidade, dom Paulo Moretto.
Soltura de réus elimina provas, diz delegado
A promotora do Tribunal do Júri de Porto Alegre Lúcia Callegari argumenta que a postura da juíza aumenta a sensação de insegurança:
— Temos problemas em localizar as pessoas para as provas nos processos, e as revogações das detenções tendem a piorar o cenário, pois ninguém se sentirá motivado a depor com o suspeito livre. Isso vai de encontro a uma megaestrutura de 16 delegacias de polícia montada para combater os homicídios.
Para a Polícia Civil, o sentimento é de frustração. A soltura de réus, de acordo com o diretor de Homicídios do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, Cristiano Reschke, é decisiva para a coação de testemunhas e a eliminação das provas:
— É muito frustrante. Não podemos ser coniventes e aceitar calados tais liberalismos e excesso de garantismos. Quem assegura a integridade física, psíquica e a vida das testemunhas que passarão a sofrer ameaças graves para que não confirmem seus depoimentos no júri, uma vez que os autores dos crimes muitas vezes residem na mesma vila ou bairro que elas?
Por meio de uma nota (leia abaixo), o TJ limitou-se a comentar que a Corregedoria não interfere no conteúdo das decisões dos juízes. Zero Hora tentou contato com Sonáli durante toda a quinta-feira, mas, em férias, ela não foi encontrada.
CONTRAPONTO

O que diz Deborah Coleto Assumpção de Moraes, juíza da Corregedoria-geral da Justiça no Estado

"A Vara do Júri está vaga, atendida, por Juiz Substituto. A designação de Sonáli, juíza substituta de entrância final, na referida Vara, decorreu da necessidade de priorizar o atendimento à unidade mediante atuação de um Juiz com dedicação exclusiva. O conteúdo de suas decisões traduz aspecto de ordem jurisdicional, no que a Corregedoria-Geral de Justiça não interfere. Eventual inconformidade do promotor de Justiça deve ser veiculada na esfera recursal própria." 

http://jornalggn.com.br/noticia/atuacao-de-juiza-de-porto-alegre-e-alvo-de-criticas-de-mp-e-policia

“Macaco!!”: o silêncio ensurdecedor de Pelé nos casos escandalosos de racismo no futebol

Arouca, do Santos: "negro como o Rei Pelé"
Arouca, do Santos: “negro como o Rei Pelé”

O gênio de Mario Filho, o maior cronista esportivo do país, produziu em 1947 um clássico chamado “O Negro no Futebol Brasileiro”. Eu já mencionei o livro aqui.
Mario fala da ascensão dos atletas negros, de como eles transformaram o esporte, de como os times, notadamente os cariocas, foram aos poucos tendo de se render ao fato de que aqueles meninos pobres eram melhores que os meninos ricos.
Na edição de 1964, ele acrescentou dois capítulos e num deles cometeu um erro de avaliação — que pode ser creditado ao seu romantismo.
Escreve Mario sobre Pelé: “Dondinho era preto, preta dona Celeste, preta vovó Ambrosina, preto o tio Jorge, pretos Zoca e Maria Lúcia. Como se envergonhar da cor dos pais, da avó que lhe ensinara a rezar, do bom tio Jorge que pegava o ordenado e entregava-o à irmã para inteirar as despesas da casa, dos irmãos que tinha de proteger? A cor dele era igual. Tinha de ser preto. Se não fosse preto não seria Pelé”.
Prossegue: “Se era ‘Rei’, o que eram aqueles pretos admiráveis que o formaram, que o modelaram, que só lhe ensinaram o que era bom? Para isso, ele tinha de ser o que era: um preto. O Preto. O Crioulo”.
Cinquenta anos depois, o apelido Crioulo caiu em desuso e Pelé está calado, e provavelmente continuará assim, diante dos casos de racismo cada vez mais frequentes e absurdos. Torcedores do Mogi Mirim chamaram Arouca, do Santos, de macaco e o mandaram procurar uma “seleção africana para jogar”.
Tinga, do Cruzeiro, ouviu a torcida peruana do Real Garcilaso gritar a mesma ofensa — algo que já ocorrera com ele numa partida do Brasileirão contra o Juventude, em Caxias do Sul, quando atuava pelo Internacional. O árbitro Márcio Chagas da Silva não apenas foi xingado como encontrou bananas espalhadas sobre seu carro na saída de uma partida. O goleiro Felipe, quando no Corinthians, passou por situação do mesmo teor contra o Juventude. Zé Roberto, do Inter, também, num Gre-Nal.
Esses são apenas os casos que tiveram repercussão. A punição, quando há, é irrelevante. O clube paga uma multa e perde dois mandos de campo, se tanto, e vida que segue. Não é muito diferente no exterior, por orientação do presidente da Fifa, Sepp Blatter. O show tem de continuar.
Numa nota, Arouca lamentou: “Como se algumas das páginas mais bonitas da história da nossa seleção não tivessem sido escritas por jogadores como Leônidas, Romário e pelo Rei Pelé, também negros”.
E Pelé? Na idealização de Mario Filho, ele tem orgulho de sua cor e seu exemplo seria suficiente para que o racismo no futebol fosse mitigado. Mas ele é, na verdade, o oposto disso, a face da acomodação.
Não se posiciona, não defende ninguém ou nenhuma causa que não seja a própria, não enfrenta nada, não quer se indispor com quem ele sabe que manda no futebol — aqueles que mandavam no tempo de Mario Filho.
Não que tenha sido poupado na carreira. Pelé já relembrou episódios em que os membros da equipe do Santos foram chamados de “macaquitos” na Argentina e de como “ia lá e arrebentava os adversários” quando escutava coisas que “o chateavam”. Há três anos, porém, afirmou que casos de racismo no futebol eram “coisinhas”.
A democracia racial brasileira é uma peça de ficção e Pelé, de certo modo, também. Mario Filho fala de Robson, do Fluminense, que nos anos 50 deu uma declaração que caberia perfeitamente, hoje, na boca do Rei: “Eu já fui preto e sei o que é isso”. 
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-silencio-ensurdecedor-de-pele-nos-casos-de-racismo-no-futebol/

Na bizarra parceria entre Serra e a Globo, quem perdeu foi o contribuinte paulista

Feitos um para o outro
Feitos um para o outro

Quando você pensa que não existem mais motivos para você rejeitar ainda mais Serra, eis que ele sempre surpreende.
Agora, um caso relativamente antigo mostra a sorte que os brasileiros tiveram em se livrar da hipótese nefasta de um Serra presidente.
Estamos falando de como Serra lidou com um terreno público que a Globo, sem nenhuma cerimônia, tomou para si ao longo de anos.
O terreno, contíguo à sede da empresa em São Paulo, foi ocupado pela Globo. Você não podia entrar lá, mesmo sendo público. Seguranças da Globo detinham você.
O terreno virou coisa privada da Globo – numa parábola dramática do que a empresa faz com o Brasil.
O tema voltou à discussão agora por conta do paralelo que se faz com um terreno municipal que a justiça de São Paulo negou – acertadamente — ao Instituto Lula.
Kassab fizera a gentileza com aquilo que não é dele, um patrimônio municipal, e a justiça negou.
Num mundo menos imperfeito, Lula não teria aceito uma generosidade tão despropositada, até porque tem meios para bancar seu instituto. É um dos palestrantes mais bem pagos do mundo, e pode perfeitamente alugar uma sede para seu instituto sem tomar um prédio dos paulistanos.
Alguém imagina Mujica fazendo o mesmo em Montevidéu?
Mas este mundo é mesmo incrivelmente imperfeito, tanto que a Globo jamais foi incomodada pelo poder público ao usurpar um terreno público na São Paulo que seus acionistas, como bons cariocas, abominam e invejam ao mesmo tempo.
O furto da Globo só veio à luz porque a Record fez uma excelente reportagem.
O que a Folha — “um jornal a serviço do Brasil”, pausa para rir — fez com o escândalo? Nada. E a Veja, tão combativa, pausa para mais uma risada, fez? Nada.
Apenas para um exercício especulativo, e se São Paulo tivesse acionado a Globo e o processo fosse dar no STF de Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes e Ayres Britto? São todos chapas da Globo no famigerado Instituto Innovare, pretensamente destinado a premiar boas práticas jurídicas.
Mais uma pausa, agora para emitir um longo gemido de lamento impotente.
Serra governava São Paulo na época, e interpelado por um repórter da Record sobre o caso reagiu com sua habitual truculência arrogante.
Em vez de explicações, deu patadas. Se tivesse bom trânsito com Edir Macedo, ligaria, como tantas vezes fez, para pedir a cabeça do jornalista.
Denunciado o caso, já não havia como fingir que a Globo era dona do terreno.
A solução foi abjeta. A prevaricadora se associou, sob sorrisos, à vítima – o pobre paulista, representado pelo seu governo.
Montaram ali uma escola técnica, à qual se deu o nome de Roberto Marinho. Melhor: Jornalista Roberto Marinho, que era como o barão iletrado da mídia gostava de ser chamado.
Na escola, os temas estudados estão vinculados a interesses editoriais estratégicos da Globo.
A Globo não pediu desculpas aos paulistas. Não cogitou enfiar a mão no bolso para ressarcir os cofres públicos pelo que sonegou ao não pagar nenhum tipo de aluguel.
Num vídeo, você pode ver a cerimônia em São Paulo em que o governador Serra e Roberto Irineu Marinho assinam um contrato que é corrupto em cada vírgula.
Estão felizes. Roberto Irineu provavelmente contava os minutos para retornar à sua cidade, e Serra tinha aquele sorriso que ele reserva para campanhas eleitorais e para homens poderosos.
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/na-bizarra-parceria-entre-serra-e-a-globo-quem-perdeu-foi-o-contribuinte-paulista/

Arouca, Tinga e o duplo racismo de que são vítimas as mulheres negras

Tinga e a mulher
Tinga e a mulher
Dias atrás, publicamos no DCM um artigo do site Blogueiras Negras. Nele, a autora citava um tipo de racismo pouco falado: aquele de homens negros que ascendem em relação às negras.
Como notou a blogueira, é como se as negras desaparecessem, se tornassem invisíveis aos homens negros que ganham notoriedade e dinheiro.
O Brasil jamais teve um Malcom X, o ativista americano que dedicou sua vida a convencer as mulheres negras de que seus cabelos são lindos do jeito que são, e seus lábios, e seu nariz, e sua pele de azeviche.
Elas queriam ser brancas, e se sentiam inferiorizadas por não ser. Malcom X inventou o Orgulho Negro, e seu maior seguidor foi Muhammad Ali com seu grito épico: “Sou lindo.”
Arouca e a mulher em Orlando
Arouca e a mulher em Orlando
Numa fase ignorante de sua vida, Malcom alisava os cabelos e procurava brancas. Depois, nunca mais mexeu no cabelo natural, e nem desfilou com loiras como se fossem troféus.
Acordara para a necessidade vital de valorizar pessoas que se sentiam, como Michael Jackson, menores por não serem brancas.
Tudo isso me veio à cabeça quando li sobre os lastimáveis casos de racismo contra dois bons jogadores negros, Tinga e Arouca.
Antes de seguir adiante, fique claro: é um horror, um descalabro, e torcedor que xinga jogador de macaco deveria sair do estádio para a prisão, automaticamente.
Isto posto, o que os jogadores negros fazem para promover sua raça? Não peço que sejam Malcom X, mas que eles fazem em escala mais simples e mais modesta?
A triste resposta é: nada.
Ao contrário, eles indiretamente reforçam o racismo ao, ricos, imitar imediatamente o comportamento branco na aquisição de uma mulher branca.
É uma mensagem desoladora para as negras, como notou a blogueira cujo texto publicamos.
JB e namorada
JB e namorada
A esse lugar comum dos futebolistas brasileiros, oponho Mario Balotelli, o atacante italiano que em sua riqueza e fama mundiais optou por uma namorada negra. Balotelli está, assim, emitindo uma mensagem: as mulheres de nossa raça são lindas.
Clap, clap, clap. De pé.
A isso se chama consciência social e racial. Torço para que Balotelli não enverede, depois, pelo mesmo caminho racista de tantos jogadores negros.
O Brasil é um país racista.
E as mulheres negras são vítimas de racismo duplamente em suas relações amorosas: os brancos as querem para sexo e pouco mais. E os negros, quando viram famosos – outro exemplo notório é Joaquim Barbosa –, passam a ignorá-las.
Que os lastimáveis episódios de Arouca e Tinga joguem luzes sobre a discriminação ampla, geral e irrestrita de que são vítimas elas – as mulheres negras, tão lindas, tão altivas, tão resistentes e tão amplamente, tão cruelmente discriminadas. 
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-duplo-racismo-de-que-sao-vitimas-as-mulheres-negras/

Uma história real brasileira melhor que a de 12 Anos de Escravidão



O texto abaixo, de autoria de Rubens Ricúpero, foi publicado no site Unisinos.

O relato da vida de Luiz Gama, feito escravo no século XIX, é superior ao do filme candidato ao Oscar

Seis dos nove candidatos ao Oscar se basearam em histórias verdadeiras. Uma delas, a do músico sequestrado e escravizado por doze anos, me chamou a atenção pela semelhança com uma das raras histórias da escravidão brasileira que conhecemos pela pena do principal protagonista.

Trata-se da longa carta em que Luiz Gama conta sua vida. Resgatada do esquecimento em 1989 num artigo de Roberto Schwarz na revista do Cebrap, ela faz pensar, como observou o apresentador, na literatura brasileira que podia ter sido e não foi.

O documento começa desafiador: “Sou filho natural de uma negra, africana livre, da Costa Mina (Nagô de Nação) de nome Luiza Mahin, pagã, que sempre recusou o batismo e a doutrina cristã.” O pai “fidalgo” esbanjou a fortuna em jogatina, não hesitando em vender o próprio filho com 10 anos. Assim como o protagonista do filme, foi reduzido à escravidão criminosamente.

Trazido a São Paulo, onde viveria até sua morte aos 52 anos, em 1882, aprendeu a ler graças a um estudante de quem se tornou amigo. A leitura abriu-lhe o acesso à autoeducação, pela qual conseguiu as provas para a libertação, que deve a si mesmo como primeiro ato de sujeito de seu destino.

Na excelente tese que defendeu em Paris, Ligia Fonseca Ferreira resume a singularidade de Gama: “Ele foi dos raros intelectuais autodidatas do século XIX e o único a ter pessoalmente vivido a escravidão, experiência que lhe devia inspirar a missão de vida: libertar os escravos e fazer valer seus direitos.”

Encarnou o abolicionismo radical, popular, do meio urbano de São Paulo, ativo nos tribunais e na ação direta. Sua vida foi marcada por algumas constantes. A primeira, a insubmissão, da fuga do cativeiro até a demissão da Secretaria de Polícia “por turbulento e sedicioso”. A turbulência consistia em “promover processos em favor de pessoas livres criminosamente escravizadas” porque “detesto o cativeiro e todos os senhores, principalmente os Reis”.

Gama ressuscitou lei que “não tinha pegado”, a de 7 de novembro de 1831, que declarava livres todos os escravos introduzidos a partir daquela data. Como se tratava da quase totalidade dos escravos existentes, sua simples aplicação teria sido uma revolução, liquidando praticamente a escravatura.

Não fosse, é claro, a dificuldade de vencer a parcialidade e má vontade de juízes e governo identificados com os senhores. Essa é, portanto, a segunda constante da vida do rábula, do prático que nunca pisou academia, mas foi o maior advogado do Brasil: ter colocado todo seu conhecimento de Direito a serviço da liberdade de escravos que não tinham como pagá-lo.

Sílvio Romero o consagrou como “o mais apaixonado, o mais entusiasta, o mais sincero abolicionista brasileiro.” Seu maior título de glória, porém, é o que fixou no fecho da carta autobiográfica: “Saí para o foro e para a tribuna, onde ganho o pão para mim e para os meus, que são todos os pobres, todos os infelizes, e para os míseros escravos, que, em número superior a 500, tenho arrancado às garras do crime”. Uma história gloriosamente verdadeira e bem superior à do filme.

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/uma-historia-real-brasileira-melhor-que-a-de-12-anos-de-escravidao/

Por que Serra está na mira do MP


Conheça as investigações do Ministério Público que apontam o envolvimento do ex-governador tucano com a máfia dos trilhos em São Paulo. Depoimentos revelam que José Serra fez pressão para beneficiar empresas do cartel

Pedro Marcondes de Moura (pedro.marcondes@istoe.com.br)
Apesar das evidências do envolvimento do ex-governador José Serra (PSDB) com o cartel de trens e o propinoduto em São Paulo, desde o surgimento das primeiras denúncias em junho do ano passado o tucano tem procurado se desvincular do escândalo. Com verdadeiras ginásticas verbais, Serra tenta explicar o inexplicável. “Qualquer manual anticartel nos daria razão. Ganharíamos a medalha anticartel”, declarou Serra na última semana, sem levar em conta que foram as próprias empresas integrantes do cartel que confessaram a prática criminosa e lesiva aos cofres públicos paulistas durante os governos do PSDB, apontando inclusive a participação de políticos e agentes públicos no esquema. Agora, sobre a mesa do procurador-geral de São Paulo, Álvaro Augusto Fonseca, há dois procedimentos investigatórios sobre o envolvimento do tucano com a máfia dos trilhos. O primeiro refere-se à pressão exercida por Serra para que a empresa espanhola CAF vencesse uma licitação de fornecimento de trens para a CPTM durante sua gestão como governador (2007 e 2010). O outro apura a omissão do tucano diante das fraudes cometidas pelo cartel, já que ele, também na condição de governador, recebeu uma série de alertas do Tribunal de Contas, Ministério Público e até do Banco Mundial. Em paralelo, as autoridades ainda investigam contratos celebrados durante a administração de Serra que foram considerados lesivos ao erário. Entre eles, a bilionária modernização de trens do Metrô e a implementação do sistema CBTC. A obra encontra-se até hoje incompleta.
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IRREGULARIDADES
Para promotor do Ministério Público de São Paulo, licitações que
compreendem o período do governo Serra foram baseadas em atos ilícitos
Em ofício, o promotor Marcelo Milani diz haver indícios da ligação de Serra em licitações investigadas por fraudes na CPTM. “Segundo os delatores (executivos da Siemens), era realizada toda sorte de falcatruas e combinações para a conquista de contratos”, escreveu Milani. “Ficou claro que todas as licitações de determinado período (que compreende o governo Serra) foram baseadas em atos ilícitos”, complementou. Ao apurar o pagamento de propina e outras irregularidades em um acordo firmado entre a Alstom e a CPTM para manutenção de trens da série 7000, o MP chegou a um depoimento revelador dado à Polícia Federal. Nele, Nelson Branco Marchetti, ex-dirigente da Siemens, diz ter sido pressionado pelo próprio governador José Serra a desistir de medidas judiciais para anular a vitória da espanhola CAF, em um certame para o fornecimento de 320 vagões. A CAF não atendia a exigência mínima de capital social pedida no edital de licitação, em que a Siemens ficou na segunda colocação. Mesmo assim, Serra insistiu para que a Siemens não recorresse e, assim, beneficiasse a CAF. “Releva notar que o delator diz ter participado de tratativas, na Holanda, com agentes do governo do Estado de São Paulo. Especialmente o então governador José Serra”, diz o promotor. Ainda chamou a atenção das autoridades a proposta nada republicana oferecida pela cúpula do governo Serra para pôr fim ao imbróglio: que as empresas se acertassem entre si e a Siemens fosse subcontratada para tocar um terço do projeto. Para Milani, ao agir dessa maneira, o Estado, durante o governo Serra, acabou por incentivar a formação do cartel. Ao final, a sugestão não foi acatada e a CAF forneceu sozinha os trens, ou seja, aconteceu o que Serra almejava desde o início.
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PODE?
Autorizadas por José Serra, reformas de trens com mais de quatro
décadas de funcionamento custaram mais do que a aquisição de veículos novos
Em outro depoimento, desta vez ao Ministério Público, Marchetti narrou um insólito caso que demonstra a inequívoca ligação de Serra com as empresas do cartel de trens em São Paulo. Segundo Marchetti, durante o governo do tucano, tanto ele como executivos da Alstom foram convidados a um encontro por dirigentes do Metrô e da secretaria de Transportes Metropolitanos. Na reunião, os agentes públicos incentivaram as duas companhias a se associarem para vencer a licitação do sistema de sinalização dos trens das linhas 1, 2 e 3 do Metrô. Os executivos ainda sugeriram que a estatal licitasse a sinalização linha por linha, triplicando a concorrência. Mas integrantes do governo Serra sinalizaram que queriam a vitória de um consórcio formado pelas duas empresas para as três linhas. A Alstom acabou ganhando sozinha o contrato para o fornecimento do CBTC. O sistema até agora não foi plenamente instalado, gerando inúmeros problemas aos usuários e levando ao bloqueio de pagamentos pelo Metrô, na gestão do governador Geraldo Alckmin. A companhia francesa alega que foi decidido fazer a “implementação operacional em fases”.
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OPERAÇÃO CARTEL
Em depoimento ao promotor Marcelo Milani, delator disse que Serra atuou
em favor da CAF, empresa integrante do cartel de trens em São Paulo
Na gestão Serra, concentraram-se também os controversos contratos de reformas de trens com mais de quatro décadas de funcionamento. Em outros metrôs pelo mundo, as locomotivas estariam aposentadas. Não à toa, os veículos entregues apresentam problemas de operação. Na versão oficial, a modernização dos 98 veículos das linhas 1 e 3 do Metrô paulista trariam uma economia de 40%. No entanto, investigações do MP apuraram que as reformas custaram mais do que vagões novos vendidos pelas mesmas empresas em outros locais. A constatação veio com o depoimento de um ex-diretor do Metrô, Sérgio Correa. Ele revelou que a estatal não previa no orçamento “o chamado truque, bem como a caixa que importariam em 40% do custo final”. Mas esses e outros itens foram licitados e trocados. A falta de concorrência na disputa dos quatro lotes da “modernização” também fez com que os acordos fossem fechados a valores acima dos previstos em tomadas de preços com as próprias vencedoras dos certames. A reforma, que se encontra suspensa, foi alvo, segundo o MP, de superfaturamento de aproximadamente R$ 800 milhões. As autoridades tentam agora obter a devolução do dinheiro. A Alstom admite que está “enfrentando acusações”, mas ressalta que implementa regras “de conformidade e ética”. Autora de denúncia do cartel, a Siemens diz colaborar para que “as autoridades competentes possam prosseguir com suas investigações”. Procurados, a CAF e o ex-governador José Serra não responderam os questionamentos feitos por ISTOÉ.
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Outra investigação em curso pelo Ministério Público apura a prática do crime de improbidade administrativa pelo ex-governador do PSDB. O MP quer saber a razão de o tucano ter mantido a execução de contratos firmados por empresas do cartel com a CPTM e o Metrô, apesar de seguidos alertas dados pelos promotores e pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) dizendo que eles eram prejudiciais aos cofres públicos. A informação sobre os alertas, encaminhados a presidentes das estatais e publicados no “Diário Oficial”, foi revelada, em agosto, por ISTOÉ. Em fevereiro de 2009, por exemplo, o TCE constatou desvios e direcionamentos em licitações da CPTM. Ao analisar um recurso, o conselheiro Antonio Roque Citadini concluiu que a estatal adotou uma conduta indevida ao usar uma licitação para fornecimento de 30 trens com o consórcio Cofesbra, realizada em 1995, para comprar 12 novos trens mais de uma década depois. Citadini revelou à ISTOÉ que o governo foi avisado inúmeras vezes das evidências de falcatruas.
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TRATATIVAS ALÉM-MAR
O secretário de Transportes do governo Serra, José Eduardo Portella, participou
de reuniões na Holanda com diretor da Siemens, que confessou ter adotado práticas ilícitas
O Ministério Público também disparou vários avisos de irregularidades, que Serra preferiu ignorar. Ao apurar um acordo do Metrô com a CMW Equipamentos S.A, o órgão declarou: “A prolongação do contrato por 12 anos frustrou o objetivo da licitação, motivo pelo qual os aditamentos estariam viciados”. Na ocasião, a CMW Equipamentos foi incorporada pela Alstom. Os promotores também apontaram para fraudes numa série de contratos firmados com outras companhias. Ainda assim, Serra insiste em se dizer merecedor de uma medalha. 

http://www.istoe.com.br/reportagens/351245_POR+QUE+SERRA+ESTA+NA+MIRA+DO+MP?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage

MINO: JOAQUIM BARBOSA É UM JUIZ INCOMPETENTE

PML: NA DÚVIDA, CONTRA O RÉU. NÃO É PRECISO PROVA


“Lei de Execuções Penais mostra que perseguição a Delúbio e a Dirceu pode revogar seus direitos”


Conversa Afiada reproduz artigo de Paulo Moreira Leite, extraído da Revista IstoÉ, que achou o Cerra nos trilhos do trensalão:

DO IPM DA FEIJOADA A FEIJOADA DO RDD



Lei de Execuções Penais mostra que perseguição a Delúbio e a Dirceu pode revogar seus direitos




A feijoada permite um dos paralelos mais curiosos entre o Brasil de 1964 e a absurda situação de abuso contra presos da AP 470.

Vamos combinar: eles podem ter cometido todos os  crimes que você acredita que cometeram – eu discordo e posso argumentar — mas nem por isso devem ter seus direitos e garantias colocados sob ameaça. Uma das lições essenciais de 1964 foi a necessidade de respeitar os direitos humanos – que devem ser acessíveis a todos os bípedes que um dia desceram da árvore, não é mesmo?  

Também queremos uma Justiça isenta, sem partidarismos e sem projetos eleitorais, certo?  

Numa reportagem inesquecível sobre os primeiros anos do regime dos generais, Joel Silveira escreveu “A Feijoada que derrubou o governo.”

Cinquenta anos depois, com o nome de “alimentação inadequada”, a feijoada consta de um conjunto de itens reunidos pelo ministério público do Distrito Federal e pelo juiz Bruno Ribeiro com uma finalidade precisa e muito mais séria do que a maioria dos comensais deste blogue pode imaginar.

O célebre cardápio gastronômico da ala de 24 prisioneiros onde se Delubio se encontrava era um típico prato de cadeia: feijoada em lata. O jurídico é muito mais indigesto. Prepare o apetite para uma boa leitura – pois o assunto é suculento, mas bastante salgado.   

A questão envolve direitos e liberdades de toda pessoa, inclusive presidiários, não custa repetir.

Começando pelo torresmo dessa discussão, pela caipirinha. Nós sabemos que quando se demonstra que determinados presos cometeram “faltas disciplinares”, é possível diminuir seus direitos, agravar sua condição e prolongar o encarceramento. Assim, em vez de avançar na progressão da pena, que o favorece, promove-se a regressão, que o prejudica.

A Lei de Execução Penal prevê sanções e benefícios dessa natureza. O artigo 53, que prevê punições, estabelece como falta grave “incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina.” Outra falta grave consiste em “utilizar ou fornecer aparelho telefônico que permita comunicar-se com outros presos, ou com o ambiente externo.”

Acho que dá para imaginar o que está por trás do esforço para apurar se Dirceu falou ou não pelo telefone celular. A polícia do presídio já concluiu que a denúncia não pode ser provada mas o Ministério Público insiste que é preciso seguir em busca de provas. Quem sabe uma delação premiada? Ou um inquérito secreto, como aqueles que ajudaram a esconder provas que poderiam favorecer os réus no julgamento da AP 470?

Na dúvida, contra o réu. Esta é a jurisprudência em vigor. Não é preciso de provas. Basta a dúvida. 

Será que Delubio pode ser acusado de “incitar ou participar de movimento para subverter a ordem?” É óbvio que não.  

Mas é isso que se busca demonstrar com a investigação da feijoada. Imagine que, entre os fatos levantados para suspender o direito ao trabalho de Delúbio, incluíram-se visitas do deputado Chico Vigilante (PT-DF) ao estabelecimento. Pergunto: o que o Delúbio tem a ver com isso? Nada. Em primeiro lugar: ele não tinha  a chave de sua cela, muito menos da porta do presídio. Não poderia, portanto, ser acusado de permitir a entrada de qualquer pessoa no local. Nunca teve poderes sobre isso. Em segundo lugar: lei permite a um deputado do DF entrar em todo estabelecimento do Estado, sem aviso prévio, em horário de expediente. Se há algo de errado, os descontentes deveriam mudar a lei, convencendo a Assembleia Distrital, concorda?

Mas a feijoada – e aí voltamos ao imaginário de 1964 – ajuda a pintar um quadro de rebelião, desordem, subversão, anarquia.  É sintomático, nesse delírio, que fatos administrativos e as demagógicas denúncias de “privilégios” que envolvem José Dirceu tenham sido arrolados para incriminar Delúbio Soares. Será que vamos tentar provar que o “ núcleo político” desenhado pelo PGR continua em atividade? Dirceu mantém o domínio do fato sobre o Delúbio?

Eu acho que essa é a tese. Ou você enxerga outro sentido nas suspeitas lançadas contra o governador Agnelo Queiroz, petista como os dois?

Puxa…nem Ubaldo, o Paranoico, seria capaz de pensar nisso.

Aviso aos comensais: embora o STF tenha concluído que não houve crime de formação de quadrilha, o que já deveria ser motivo para passar a limpo e rever as suspeitas de sempre, está claro que assistimos a um processo de reconstrução da velha denúncia, uma nostalgia truculenta, que pretende caracterizar os presos politicamente relevantes da AP 470 como culpados por faltas graves e manter punições pesadas contra eles. O dia histórico em que Joaquim Barbosa foi derrotado no STF também foi aquele em que Delubio foi levado de volta para a Papuda e perdeu o direito ao trabalho.

Até então, a Vara de Execuções Penais multiplicava sinais de poderia considerar pleitos feitos pelos advogados dos réus.  

As faltas graves permitem recolher o preso em cela individual – a solitária –, diminuir visitas, banhos e sol e outras medidas mais duras. A remissão da pena, que o preso obtém com dias de leitura e de trabalho, por ser anulada. Sabe aquelas continhas que os jornais andaram publicando, num esforço para deixar o leitor menos avisado boquiaberto com o “país da impunidade?” Esquece.  

A  punição inclui até a transferência para o Regime Disciplinar Diferenciado, o RDD, num isolamento a que estão submetidos chefes nacionais do tráfico de drogas e de facções criminosas, pode ser feita, também.

Necessita  apenas “prévio e fundamentado despacho do juiz competente.” Sim, meus amigos. Bruno Ribeiro.

Já se ventilou a possibilidades dos presos da AP 470 serem transferidos para um presídio federal. O argumento é que no Distrito Federal não há a ordem necessária, nem eles se submetem a disciplina. Nesses presídios  federais funciona o RDD. Quem sabe a turma não vai cumprir pena no mesmo estabelecimento que Marcola, Fernandinho Beira-Mar? Não é isso o que ser quer? Não é esta a lógica que produziu – confessadamente – penas mais graves e inadequadas?

Ubaldo nem sempre era paranoico, ensinava Henfil. Podia ser profético. 

Estamos forçando a barra, selecionando indícios, torturando dados. Depois que se define feijoada como “alimentação inadequada” tudo é possível, embora este mesmo prato tenha sido servida aos 1600 presos da Papuda durante o carnaval e todos os seus ingredientes – todos – estejam a venda na cantina do Centro de Progressão Provisória, para serem cozidos num fogão de uma só boca a disposição dos detentos. Como se pode falar de um prato inadequado depois que se oferece o fogão e os ingredientes? 

Esse processo desmoraliza uma decisão do próprio STF, tomada no final de 2013, quando os ministros votaram o transito  em julgado dos réus da AP 470. Ouviu-se, então a promessa de que era uma medida favorável aos réus. Com o imediato cumprimento da pena, alegou-se, eles poderiam cumprir a sentença em regime semiaberto e descontar o período em regime fechado. Juristas que cobram 100 000 reais apenas para ouvir o caso de um candidato a cliente deram entrevistas explicando a coisa. Vai ser bom para eles, diziam.   

O que está ocorrendo é um processo em sentido inverso. Em vez de progressão da pena, em que direitos são ampliados, está em curso um movimento para promover uma regressão, quando eles são diminuídos e tolhidos. A votação do Supremo sobre quadrilha criou uma nova situação. Desde então, o Estado não tem o direito de manter Dirceu em regime fechado. Nem Delubio. Mas é assim que ele se encontra, desde 15 de novembro, ou seja, há quatro meses. Em nome de uma dúvida, revoga-se um direito. 

Agora, como sobremesa, depois da Feijoada do RDD, voltamos ao IPM da Feijoada.

Se você procurar aqueles episódios pequenos, vexaminosos, em que determinados seres humanos se comportam como insetos, com frequência irá descobrir que eles têm uma desconfiança terrível em relação a pessoas que se encontram numa feijoada. Talvez seja porque muitos acreditam que a feijoada foi criada pelos escravos e, para baratas de Franz Kafka, isso é motivo de suspeita e mesmo desprezo, embora permita hipocrisias em horas de desespero.

Logo depois do golpe de 64, apareceu um problema para o  governo militar. O governador de Pernambuco, Miguel Arraes, não parava de dar trabalho aos golpistas. Recusou-se a renunciar ao posto, com o argumento de que seu mandato pertencia ao povo. Mais tarde, Arraes refugiou-se na Embaixada da Argélia, onde passou a aguardar pelo salvo-conduto para deixar o país.

Inconformado com a situação, que expunha com fatos desagradáveis um regime que pretendia ter salvo a democracia contra o comunismo, a ditadura escalou um coronel do Exército, Gerson de Pina, para investigar o que aconteceu. Depois de muito conversar e interrogar, naquele clima cordial que você pode imaginar,  o coronel concluiu que a fuga de Arraes e tudo mais fazia parte de um plano tramado durante uma feijoada intelectuais e políticos de esquerda.

Jornalistas que cumpriram seu dever de narrar os fatos deixaram um registro – com fotos – para a história. Através de uma edição de março de 1965, na  Última Hora, jornal que os militares ainda não haviam conseguido fechar, podemos saber que membros da Academia Brasileira de Letras foram ouvidos naquilo que, como o próprio jornal revela, havia se transformado no IPM da Feijoada. Nomes como Barbosa Lima Sobrinho, uma das referencias de democracia e interesses nacionais, foi interrogado. O editor Álvaro Lins também. Perguntado sobre o evento, Álvaro Lins esclareceu que, por recomendação médica, estava proibido de comer feijão. Cada vez mais zangado numa situação em que os modos truculentos da investigação ajudavam a sublinhar seu caráter ridículo, o coronel responsável pelo IPM limitava-se a ameaçar Arraes. Dizia que se ele deixasse a embaixada da Argélia seria preso imediatamente, esclarecendo que as provas de seus “antecedentes criminais” já se encontravam em poder do governo de Pernambuco.

Meio século depois, quando o próprio João Goulart recebeu as honras da pátria e os insetos de 1964 fogem até dos advogados e professoras infatigáveis da Comissão da Verdade, era de se imaginar que os direitos e garantias do regime democrático fossem uma realidade permanente em nossa paisagem como o Pão de Açúcar ao mar do Rio de Janeiro. Engano. O escândalo em torno da feijoada de Delúbio mostra um esforço deliberado para contestar garantias que a lei prevê.

É isso que deveria ser investigado – e não a feijoada, a que todos temos direitos. Afinal, como dizia um poeta, hoje é sábado. 

http://www.conversaafiada.com.br/brasil/2014/03/08/pml-na-duvida-contra-o-reu-nao-e-preciso-de-provas-basta-a-duvida/