quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Justiça onerosa, opressora e elitizada



Roberto Monteiro Pinho
O nosso sistema jurídico é oneroso, não só para o cidadão, mas também para os cofres públicos, e seu formato não tem pai e mãe biológica, é por natureza um bastardo. Imperfeito, em seu todo, é moroso e complexo, prima pelo monopólio, e injusto porque compele a sociedade a litigar até mesmo os mais insignificantes casos. Neste contexto, vemos tribunais julgando briga de cachorro, xingamentos, pequenas avarias e danos patrimoniais.
O jurista alemão Claus Roxim trouxe o “principio da insignificância” nos idos de 1964, (…) “segundo a qual a conduta de determinada pessoa, não obstante tipificada como crime, é irrelevante para o Direito Penal quando não é apta a produzir efetiva lesão ao bem juridicamente protegido pela norma, seja a sociedade, o ordenamento jurídico ou a própria vítima”. O jurista Francisco de Assis Toledo se referiu ao alcance do princípio da insignificância, “que se revela por inteiro pela sua própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não devem ocupar-se de bagatelas, ninharias.
Precisamos estar atentos, não apenas às questões que interagimos com a sociedade leiga, mas também às que envolvem o Estado brasileiro e o agente do Poder Judiciário, aplicador das leis e seu intérprete, segundo as normas que edificam esta relação. Se não ofensivo, acho temerário o embate legislativo/judiciário, protagonizando investidas contra atos do governo, do executivo de forma geral, do Senado e da Câmara, conforme recente episódio em que o presidente do STF pretendia que os legisladores submetessem seus projetos ao crivo do judiciário, antes mesmo da sua aprovação plenária, o que é a antecipação do que já ocorre quando a matéria é submetida através de Adin (ação de inconstitucionalidade) ao STF.
Este é um paradigma do regime totalitarista, enfrentado pelos brasileiros nos anos da ditadura militar. A corregedora do CNJ, ministra Eliana Calmon, em recente entrevista foi contundente: “Nós, magistrados, temos tendência a ficar prepotentes e vaidosos. Isso faz com que o juiz se ache um super-homem decidindo a vida alheia. Nossa roupa tem renda, botão, cinturão, fivela, uma mangona, uma camisa por dentro com gola de ponta virada” (…) Precisamos ter cuidado para ter práticas de humildade dentro do Judiciário. É preciso acabar com essa doença que é a “juizite”.
No judiciário do Trabalho, embora seja este o eixo jurídico do direito especializado, seus intérpretes desandaram em inovações, atropelando texto já legislado e até se antecipando a novos projetos de leis, através de um trabalho de acompanhamento da pauta legislativa, intervindo sistematicamente nas questões afetas ao segmento.
Avalio que este tipo de ingerência da magistratura é equivocada, perniciosa e ameaçadora, que elabora e influencia na aprovação de regras, quando permissa vênia, não devia moralmente moldar leis que caberá a ele no futuro julgá-las. Partimos do que acontece com o aplicativo do art. 655-A do CPC que prevê a possibilidade do bloqueio de crédito, exige que o mesmo seja requerido pela parte credora, pelo exequente, quando na verdade ocorre o bloqueio de crédito de ofício, o magistrado impugna o bem oferecido, sem ouvir a parte contrária e monocraticamente decide pelo bloqueio.
Ocorre que juiz não é parte no processo, logo não pode ele próprio se arvorar de advogado da parte exequente, o credor, e ordenar que o bem não serve para garantia da execução e ato contínuo determinar o confisco do crédito. Isso violenta o princípio da legalidade, da imparcialidade, do contraditório, da demanda e da moralidade, todos consagrados no art. 37 caput da CF/88 e no Código de Ética da magistratura engavetado no CNJ.
Há muito se discute por que a Constituição Federal admite a flexibilização de direitos trabalhistas, mediante negociação coletiva, nos casos de salário e jornada de trabalho (CF, art. 7º, VI, XIII e XIV), e por isso a modificação do art. 618 da CLT, como pretendia o governo FHC, não foi adiante já que ao elastecer seu aplicativo, era uma ameaça à segurança do direito laboral.
Por outro lado, os incisos do art. 7º da Constituição não são cláusulas pétreas, uma vez que o art. 60, § 4º, IV, ao restringir o poder de emenda aos direitos e garantias individuais, não abrangeu nem os direitos coletivos do art. 5º, nem os direitos sociais do art. 7º, limitando a sua proteção a parte dos incisos do art. 5º da CF.
Mas tudo acontece em face desta reserva de mercado onde todas as tentativas de buscar alternativas extrajudiciais de solução de conflitos são boicotadas. O espectro desta judicialização, que através das ações a classe jurídica (Ministério Público e Procuradorias) passou a administrar o país juntamente com o Judiciário, aparentemente há aspectos positivos, mas o problema é que são instituições autocráticas e sem responsabilidade de resultado.
Recente, a Subseção (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) anulou o processo de uma ação rescisória que reverteu sentença com reconhecimento de vínculo de emprego entre uma empregada e seu empregador. A seção especializada avaliou que a empregada não foi devidamente citada para se defender na ação. O relator esclareceu que a citação por edital, prevista no artigo 232, inciso I, do CPC deve vir acompanhada da devida comprovação, já que se trata de medida excepcional, é isso, avaliem.

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