quarta-feira, 12 de outubro de 2011

A RELIGIOSIDADE CATOLICA DA PRINCESA ISABEL, A REDENTORA*



Princesa Isabel
       Após quatro anos de casada com o francês Gastão de Orléans, o Conde d’Eu, D. Isabel Cristina, a Princesa Imperial do Brasil, primeira filha do Imperador D. Pedro II e da Imperatriz Teresa Cristina, permanecia à espera de um herdeiro que pudesse dar continuidade à Monarquia do Brasil. A todos preocupava a ausência de filhos do casal e isso afligia sobremaneira o espírito da Princesa.

Depois de submeter em vão a todas as terapêuticas impostas pelos médicos da Corte brasileira, e pelos mestres da Academia de Medicina, a Princesa Isabel resolveu a conselho de seu próprio esposo, experimentar as águas ferríferas (contêm sais de ferro), magnesianas (contêm sais de magnésio) e carbogasosas (contêm gás carbônico) já então miraculosas de estações hidrominerais termais localizadas no “Parque das Águas” na cidade de Caxambu, ao sul de Minas Gerais. Reminiscênciou Gastão de Orléans que, em mais de uma vez na família dos Orléans, só nascia um herdeiro, depois que o casal se refazia na vilegiatura de uma estação de águas.

Preocupada com a falta de prole e almejando assegurar a continuidade da dinastia, a princesa decidiu em 25 de agosto de 1868, ir para Caxambu, acompanhada do esposo, do Dr. Feijó (seu médico pessoal e obstetra da Casa Imperial), do Conde (o melhor amigo do Conde d’ Eu no Brasil) e da Condessa de Lages, de alguns fiéis servidores, e de algumas mucamas dedicadas, em busca da grande panacéia para a sua “esterilidade”, baseada na crença que da “virtuosidade” dessas águas brotam propriedades prolíficas. A viagem era longa e sobremaneira incômoda. Contudo, nada disso arrefeceu o ânimo da princesa, pois estava disposta a enfrentar todas as vicissitudes em busca da realização daquilo que ela mais considerava um milagre: o milagre de ter um filho.

Nessa cidade, a Princesa Isabel em suas orações fez a promessa: se o uso daquelas águas lhe desse o filho almejado, faria erigir ali, no morro do Cruzeiro, uma igreja em estilo ogival (gótico) sob a invocação de Santa Isabel, rainha da Hungria, a quem ela própria fora consagrada ao nascer.

Embora a terapêutica com as “águas virtuosas e prolíficas”  não tenha sido exitosa, ela regressou em 15 de novembro para Petrópolis, consolada, robusta, e familiarizada com a simplicidade e paz do sertão.

Regressando de Caxambu, a princesa passou pela cidade de Aparecida, onde fez questão de orar entre os romeiros, em 8 de dezembro de 1868, no Santuário da Capela da milagrosa Nossa Senhora da Aparecida, feita padroeira do Império por D. Pedro I, e  da qual era devota fervorosa. Nessa ocasião, a princesa teria varrido a capela e colocado um pouco dos ciscos entre suas mamas onde fez a promessa, caso conseguisse curar-se da “esterilidade”, ofertaria à imagem de Nossa Senhora um manto azul marinho bordado em fios de prata e ouro, contendo os emblemas dos brasões do Brasil e de Portugal.

 Quando de sua romaria em outubro de 1873 a Lourdes, na França, também fez promessa para curar-se da “esterilidade”, à milagrosa Bernadette Soubirous que tinha visto diversas vezes a Virgem Maria defronte da gruta chamada Massabielle, “a Rocha Velha”, junto à margem do rio Gave em 1858. Nessa cidade, comprou e enviou ao Brasil para sua genitora, um rosário bento, que tocou a gruta Massabielle, e nove medalhas de Nossa Senhora também bentas, e que também tocaram a gruta.

            Em Petrópolis, dedicava-se à limpeza e à decoração semanal da igreja. Em maio de 1875, ela se dedicou totalmente ao “Mês de Maria”, durante o qual altares especiais eram enfeitados diariamente com flores frescas, com missas em homenagem à Virgem. Fazia muitas preces e novenas, e apegava-se cada vez mais aos santos, de quem esperava inspiração e milagre.

Lei Áurea - Libertação dos Escravos
Lei n. 3.353, de 13.05.1888
Os seus atos de benemerência e caridade eram tão grandes, e o seu apego à religião católica tão intenso, que a levou não só a abraçar a causa abolicionista, como a varrer prazerosamente o altar da Capela Imperial da Glória (Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, ou simplesmente, Igreja da Glória), no Rio de Janeiro, enchendo-a de alfaias.

A Princesa Isabel foi católica devota, tanto que a paixão pela família disputava espaço com a dedicação à igreja. Ocupava quase todo o seu tempo com missas, com o confessionário, com festejos religiosos, com quermesses, e com a participação em devoções como a Adoração da Eucaristia. Tinha duas preocupações espirituais, rezar pelos brasileiros e pela conversão dos ateus.

No exílio, recebia diariamente a Eucaristia, ao frequentar  a Basilique du Sacré- Coeur (Basílica do Sagrado  Coração), localizada no bairro de Montmartre, em Paris.

A religião tornou-se um sustentáculo indispensável para Princesa Isabel, dando-lhe forças para enfrentar os seus múltiplos deveres. A fé católica lhe deu um consolo profundo, um lugar de refúgio, valor e objetivo na vida. Ela apegou-se com as devoções de Nossa Senhora de Lourdes, do Sagrado Coração de Jesus, todas identificadas com o Ultramontanismo (sistema dos que são favoráveis à autoridade absoluta do Papa em matéria de fé e disciplina). 
 
Em 1º de agosto de 1901, escreveu para Santos Dumont esta nótula: “Senhor Santos Dumont. Envio-lhe uma medalha de São Benedito, que protege contra acidentes. Aceite-a e use-a na corrente do seu relógio, na sua carteira ou no seu pescoço. Ofereço-lhe pedindo a Deus que lhe socorra sempre”.

Após a morte de sua irmã D. Leopoldina (Duquesa de Saxe- Coburgo- Gota) de febre tifóide em 7 fevereiro de 1871 em Viena, capital da Áustria, aos 24 anos, a Princesa Isabel escreveu: 

“A fé católica é a única consolação para semelhante perda, um consolo profundo em tempos de tristeza, e uma grande bondade divina”.

 Doravante, a Igreja Católica tornara-se para Princesa Isabel um lugar de refúgio, e se empenhou cada vez mais em defender a sua doutrina contra tudo e contra todos, mesmo os hierarquicamente superiores. 


 A Princesa Isabel realmente foi católica do fundo da alma até o fim da vida, ficando conhecida por beata, em função desse fervor religioso.


OUTROS RASGOS QUE FALAM ALTO DO ESPÍRITO RELIGIOSO DA MAIOR DAS BRASILEIRAS:

1- No 35.º aniversário da Imperatriz Teresa Cristina, em 14 de Março de 1857, ela informou: “Hoje, quando acordei, rezei um Padre-Nosso e uma Ave-Maria pela intenção da mamãe. O dia está lindo, parece que Deus também quis festejar os anos da mamãe”.

2- “Acabamos, há pouco, com a festa da Igreja. Perdoei 6 réus e comutei 2 penas de morte. É uma das poucas atribuições de que gosto no tal poder!!!”

3- “Esta tarde o tempo nos deu uma estiada e fomos adorar o Santíssimo. Agora está chovendo miudinho”. (Carta de 02/04/1858).

4- Da Semana Santa, deu a notícia: “Temos ido todos estes dias de manhã e de noite aos ofícios da Semana Santa. Com o Internúncio tivemos seis padres.” (Carta de 11/04/1868).

5- “Hoje, foi dia de limpeza na Igreja e deixamo-la muito bem arranjadinha para amanhã”. (Carta de 07/11/1874).

6- Outra preocupação da princesa era, com um grupo de amigas, cantar nas solenidades religiosas da Matriz, como escreveu ao pai, fazendo galhofa, em 30/11/1874: “Lhe direi, entretanto, que seus cabelos se teriam arrepiados hoje, ao ouvir as vésperas que cantamos na Igreja às 3 horas”.

7- No final do curso do 4º mês de sua segunda gestação, ao referir para a Condessa de Barral que sentiu os movimentos ativos do bebê dentro do seu útero, e sequiosa para a chegada do mês de outubro, o mês de seu parto, exclamou: “Meu Deus! Como eu queria que o mês de outubro já tivesse chegado e passado! E passado como nós queremos que passe!!! Reze por nós a Nosso Senhor e a todos os que estão no Céu!”

8 - Pela canonização do Padre José de Anchieta (o Apóstolo do Brasil): “Queira, pois Vossa Santidade resolver que é lícito aos católicos brasileiros venerarem em seus altares a imagem de tão santo varão. Queira também Vossa Santidade lançar sua apostólica bênção sobre mim e sobre minha família e sobre a Nação Brasileira”. (Palácio, 11/07/1877).

9- “Na Igreja tivemos nosso Mês de Maria sempre precedido do terço, dito em intenção de Papai e de Mamãe. Não são as orações que têm faltado; por toda parte se reza e se manda rezar, e esta manhã nas Irmãs, tivemos uma Comunhão por intenção de Papai. Comungamos nós dois e umas quarenta senhoras”. (13/05/1888).

10- Eis na íntegra as letras apostólicas do Santo Padre Papa Leão XIII por ocasião da outorga da insígnia Rosa de Ouro à Princesa Isabel: “A muito amada em Cristo Filha Nossa Isabel Princesa Imperial Regente do Império do Brasil”. E foi com os lábios trêmulos de santa emoção embriagada quase pela suave fragrância que a flor de ouro desprendia, que a Princesa Isabel após beijá-la comovidamente, afirmou ao enviado do Papa Leão XIII: “Agradeço ao Santo Padre esta grande prova de apreço, e prometo ser filha obediente da Santa Sé”.

11-No exílio, na capela do Castelo d’Eu havia uma imagem do Sagrado Coração de Jesus, entre a Coroa Imperial Brasileira e a bandeira do Brasil Império. Diante desses símbolos a princesa vinha, diariamente, rezar pelos seus queridos brasileiros.

12- Eis a expressão de sua vontade suprema assinalada em seu testamento, feito em Boulogne-sur-Seine, Paris, em 10 de janeiro de 1910: 

“Quero morrer na Religião Católica, Apostólica, Romana, no amor de Deus e no dos meus e de minha Pátria”.

          O seu fervor pelo catolicismo era tão grande que ela era capaz dos mais assinalados sacrifícios. Aos 70 anos de idade e com grande dificuldade para se locomover (precisava do auxílio de uma bengala), por causa do excesso de peso e de problemas cardíacos, visitou em 05 de setembro de 1916, a Igreja Sagrada Família (obra do mais famoso arquiteto catalão, Antoni Gaudí) em Barcelona na Espanha passando todo esse dia em orações.

           A Princesa Isabel, em 6 de novembro de 1884, juntamente com o esposo e os filhos D. Pedro de Alcântara, D. Luis Felipe, e D. Antônio, retornou a cidade de Aparecida, ocasião em que fez uma longa oração perante à imagem de Nossa Senhora agradecendo a graça alcançada (das gestações a termo, com filhos vivos), entregando-lhe uma pequena coroa de ouro de 24 quilates, pesando300 gramas em forma de globo, com uma cruz cravejada de rubis, e com 40 diamantes (24 maiores e 16 menores), acompanhada de uma almofada bordada em prata e ouro para sustentar a coroa, além de um rico manto azul-marinho, com 21 brilhantes representando as 21 Províncias do Império do Brasil. No dia 8 de setembro de 1904, com aprovação do Papa Pio X, a imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida foi solenemente coroada por D. José Camargo Barros. A partir dessa data, oficialmente, a imagem passou a usar o manto, e a coroa passou a adornar a cabeça da pequena imagem.

Cumpriu também a promessa à Santa Isabel da Hungria, e até hoje, existe em Caxambu, a Igreja de Santa Isabel da Hungria.

Princesa Isabel em 8 de dezembro de 1907 em seu exílio em Paris. “Ao pedido que distintas e queridas patrícias me dirigem, de escrever algumas linhas para o Álbum Mariano, não me é lícito deixar de aquiescer. Meu amor e devoção à Santíssima Virgem torna-me grato escrever. Justamente em 1908 festejar-se-á o jubileu de Nossa Senhora de Lourdes, que para mim representa a graça obtida do nascimento de nossa filhinha que Deus quis levar a Si, e para meu consolo foi logo seguido dos nossos três filhos, Nossa Senhora de Lourdes cujo santuário inúmeras vezes visitei com a maior emoção.

Que Nossa Senhora de Lourdes, Nossa Senhora das Vitórias, Nossa Senhora de Pellevoisin, Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora da Glória, cujos dois últimos santuários me é vedado por ora tornar a visitar, proteja nossa cara pátria, meu esposo e filhos, todos aqueles que para sua glória trabalham, e de todo o coração a venera e lhe é dedicado”.

(Redentora) * A sua piedade cristã que lhe falava ao coração, a sua fé inabalável, e a sua sensibilidade religiosa, a fez sancionar em 13 de maio de 1888 (um domingo), a Lei Áurea (Lei Imperial n.º 3353), extinguindo a escravidão em todo o território nacional. Por esse ato, foi cognominada, “A Redentora,” e agraciada pela Igreja Católica com a suma distinção, o Premio Rosa de Ouro. Premio outorgado pelo Santo Padre Papa Leão XIII em 28/09/1888.

Colaboração: Dr.Cleomenes Barros Simões, juntamente com a sua esposa Maria Tereza, são católicos praticantes. Ele é médico Ginecologista e Obstetra na cidade de Guarulhos, São Paulo. Autor dos livros “Toda a Ginecologia e Obstetrícia em Testes” (3ª edição) e “Patologia do Trato Genital Inferior”, ambos da Editora Roca, São Paulo. “Os Partos da Princesa Isabel, a Redentora - Uma contribuição para a História da Medicina no Brasil” da All Print Editora, São Paulo.

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