sábado, 25 de fevereiro de 2012

Efeito Serra: PT receia isolamento de Haddad e PMDB prevê uma coligação menor para Chalita


Sob ordens médicas, Lula esforça-se para refrear sua loquacidade. Precisa dosar o uso da voz pelas próximas quatro semanas, quando fará os exames que avaliarão os resultados do tratamento contra o câncer na laringe. No final da tarde desta sexta-feira (24), Lula traiu a fonoaudióloga que o assiste para atender a um telefonema.
Do outro lado da linha, uma liderança do PT ansiava por ouvi-lo sobre as novidades que assediam o cenário eleitoral de São Paulo. A conversa girou em torno de um nome: José Serra. Mais tarde, em encontro com um companheiro do PT, o interlocutor de Lula dividiu as inquietações que recolheu.
Sonegando os detalhes do diálogo telefônico, resumiu assim a essência da conversa que tivera com o padrinho político de Fernando Haddad, candidato do PT à prefeitura de São Paulo: “O Lula acha que, se o Serra for mesmo candidato, vai dar muito trabalho. A disputa muda de cara.”
Neste sábado (25), Haddad reúne-se com os petistas que integram o comitê de sua campanha. A exemplo do que sucedeu na ligação que motivou a infidelidade médica de Lula, o encontro será monopolizado por Serra. O tucano foi convertido em tema incontornável antes mesmo de sua candidatura tornar-se oficial.
A simples perspectiva da entrada de Serra no jogo eletrificou o tabuleiro. O petismo não é o único segmento a buscar o reposicionamento. O PMDB do vice-presidente Michel Temer também antevê prejuízos à candidatura de Gabriel Chalita. Vai abaixo, em nove tópicos, um resumo da ebulição que o movimento de Serra ateou em 2012.
1. Haddad e o risco de isolamento: A cinco meses do início da propaganda eleitoral, o PT não conseguiu atrair para a coligação de Fernando Haddad um mísero partido. O PMDB recusa-se a abdicar de Chalita. O PTB também mostra-se irredutível na decisão de empinar um candidato próprio, o advogado Luiz Flávio D’Urso.
O PDT do deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força Sindical, achega-se ao governador tucano Geraldo Alckmin. O PP de Paulo Maluf, já fechado com Alckmin, informa que vai apoiar o postulante do PSDB. O PSB e o PR, outros potenciais aliados do PT, gravitam na órbita de influência de Gilberto Kassab (PSD).
2. O reposicionamento de Kassab: Com Serra na disputa, Kassab retira o pé que havia acomodado na canoa de Haddad. Leva para a embarcação tucana a máquina da prefeitura e seus satélites. O PSB, que já ocupa a secretaria de Turismo da gestão tucana de Alckmin, fica mais à vontade para apoiar o PSDB. O PR, controlado em São Paulo pelo deputado-mensaleito Valdemar Costa Neto, potencializa o seu preço.
3. A pressão sobre Dilma Rousseff: dono de um tempo de tevê de cerca de três minutos, o PR tornou-se o principal objeto de desejo do PT. A despeito de Valdemar e de todo o azar que vem embutido na sigla, foi o que restou. Para seduzir o pseudoaliado, o petismo acena com a posição de vice na chapa de Haddad.
O PR acha pouco. Cobra a devolução do Ministério dos Transportes. A pressão para que Dilma atenda à exigência já era grande. Nas próximas semanas, à medida que for subindo a temperatura da panela de pressão paulistana, os apelos do PT e as insinuações dirigidas pelo PR ao Planalto tendem a roçar as fronteiras do insuportável.
4. O teto dos 30%: como que antevendo os riscos, Lula planejara acelerar os entendimentos com Kassab. Via no prefeito uma espécie de José Alencar de Haddad. Um personagem capaz de atrair para o candidato petista os votos conservadores que o fariam ultrapassar a barreira dos 30%, patamar histórico de votos do PT em São Paulo.
Lula pretendia reunir-se com Kassab antes do Carnaval. A doença não permitiu. Internou-se no Sírio Libanês uma semana antes de soarem os tamborins. Só teve alta às véspera do desfile em que a escola Gaviões da Fiel o cultuou na avenida. A essa altura, Serra já atravessava-lhe o samba. Hoje, Lula lamenta não ter amarrado Kassab com a antecedência pretendida.
5. As contas do PMDB: padrinho político de Gabriel Chalita, Michel Temer idealizara para seu candidato uma parceria com o DEM. Um partido que, apesar da erosão que Kassab produziu em seus quadros, ainda conserva o tempo de tevê. Coisa de três minutos. O suficiente para prover a Chalita, já fechado com o PSC, uma vitrine eletrônica poderosa –cerca de oito minutos.
Em reuniões com senador José Agripino Maia (RN), presidente do DEM federal, Temer assegurara ao quase futuro parceiro a posição de vice na chapa de Chalita. Em privado, Agripino diz agora que, com Serra na parada, as chances de seu partido acertar-se com o PMDB são próximas de zero.
Afora o prejuízo televisivo, Chalita passou a flertar com o risco de ser engolfado na disputa pela tradicional polarização PT-PSDB. Para fazer-se notar, o pupilo de Temer terá de exercitar com insuspeitada maestria seu alegado talento de comunicador.
6. A conexão Pernambuco: o governador pernambucano Eduardo Campos, presidente nacional do PSB, frequenta a cena de São Paulo como uma espécie de sujeito oculto. É o principal parceiro de Kassab. Enxerga no PSD um aliado estratégico para seus projetos pessoais.
Por baixo, sonha com a vice de Dilma em 2014. Pelo alto, almeja uma candidatura presidencial. Cultiva em relação ao PT sentimentos antagônicos. A amizade com Lula não o impede de desejar o insucesso do petismo em São Paulo.
Para evitar que suas digitais apareçam, diz que, na capital paulista, quem manda no PSB é o presidente estadual, Márcio França, atual secretário de Turismo de Alckmin. No plano nacional, Eduardo e seu PSB servem de álibi para Kassab. Uma garantia de que a proximidade com Serra não afastará o mandachuva do PSD do apoio à gestão de Dilma.
7. A conexão pão de queijo: A exemplo de Eduardo Campos, o tucano Aécio Neves é outro personagem invisível da disputa de São Paulo. Torce pelo êxito da candidatura municipal de Serra mais do que o próprio Serra. Imagina que, elegendo-se prefeito, seu inimigo cordial será compelido a refrear o projeto presidencial. Derrotado, aí mesmo é que seria expelido do palco nacional. Algo que faria do vaticínio de FHC –“Aécio é o presidenciável óbvio”— uma quase realidade.
8. O tudo ou nada de Serra: ex-presidenciável de 44 milhões de votos, Serra volta-se para São Paulo depois de ter recebido do PSDB federal um tratamento de zero à esquerda. O desprezo o estimula a jogar, numa única mão de cartas, seu futuro político. Retornando à prefeitura, ganha um mandato e o terceiro orçamento da República. Recobra a voz que lhe sonegam. Derrotado, mantém-se no limbo a que foi relegado. Melhor a tentativa do que a autoflagelação.
9. As conveniências de Alckmin: sem Serra, Alckmin iria à sorte dos votos representado por um dos quatro pré-candidatos tucanos que frequentam as pesquisas bem abaixo da linha dos 10%: Bruno Covas, Andrea Matarazzo, José Aníbal e Ricardo Tripoli. Uma eventual derrota seria debitada ao governador, não ao candidato.
Com Serra, Alckmin aborta o vôo de Kassab, complica a vida do PT e tenta evitar sobressaltos prematuros ao seu projeto reeleitoral de 2014. Se der certo, o tucanato conserva a hegemonia em sua principal cidadela. Se der errado, o infortúnio será atribuído mais ao candidato do que ao governador.

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