domingo, 5 de fevereiro de 2012

O assassinato de Einstein em Manhattan








Fernando Soares Campos:
testemunha do crime e autor

Assaz Atroz
Albert Einstein viera a Nova Iorque com a missão de acompanhar e assessorar o Distrito de Engenharia Manhattan, o famoso Projeto Manhattan, que tinha como meta produzir a bomba atômica.

Naquela noite de 7 de dezembro de 1944, o já relativamente célebre cientista caminhava pela calçada. O rigoroso inverno nova-iorquino castigava até a sua preciosa massa encefálica. Absorto em conjecturas sobre a possibilidade de viajar no tempo e no espaço sem queimar um baseado, Einstein parou ao lado de uma lixeira. Enfiou a mão no bolso do sobretudo, sacou uma pequena lanterna, acendeu e colocou-a sobre o coletor de lixo.

Ficou por alguns minutos contemplando o tênue feixe de luz. Inclinou-se, encostou o rosto na lanterninha e mirou por cima da projeção luminosa. “Será possível?!” Ergueu-se, olhou ao redor e certificou-se de que ninguém o observava. Cruzou os braços, fechou os olhos e cerrou o cenho. Assim, concentrado, nem notou que começara a levitar.

Um gato preto, sentado na escada de incêndio de um prédio em frente, assistia àquela cena insólita. O felino arrepiou-se quando viu Einstein elevar-se lentamente, se posicionar sobre o feixe de luz da lanterna e, num átimo, sumir! Shuuupt! – “Myauauau!” [“Acho que estou sonhando!”]

No umbrático cenário apareceu um mendigo, que pegou a lanterna, examinou a peça curiosamente e a desligou. O homem nem podia imaginar que, ao clique de desligar, Einstein despencou e se esborrachou no chão. Ploft!

Estirado no meio da calçada, um tanto sonolento, abriu os olhos lentamente. No primeiro momento não percebeu que já era dia claro, mas aos poucos sua vista foi-se adaptando à claridade, e ele enxergou o mundaréu de gente que transitava no local. Ao seu lado já se acumulava umas moedas e até algumas cédulas verdinhas de baixo valor.

O venerável cientista levantou-se e pôs-se a caminhar acompanhando um dos fluxos dos transeuntes. Só aí notou que permanecia em Manhattan, na mesma calçada em que empreendera aquele esforço de concentração, na noite passada. “Noite passada?!” – Imaginou que talvez, depois da intensa pressão mental, tivesse arriado devido a um possível colapso dos sentidos.

A passos vacilantes e ainda em estado de ligeiro torpor, Einstein caminhava sem notar qualquer alteração ambiental. Ouviu uma música e parou em frente à loja da qual emanava o som, sem olhar para o estabelecimento. A canção lhe pareceu estranha, mas bastante agradável. Fechou os olhos e aguçou a audição:

Imagine que não há paraíso
É fácil se você tentar
Nenhum inferno abaixo de nós
Acima de nós apenas o céu
Imagine todas as pessoas
Vivendo para o hoje

Imagine não existir países
Não é difícil de fazê-lo
Nada pelo que lutar ou morrer
E nenhuma religião também
Imagine todas as pessoas
Vivendo a vida em paz

Você pode dizer
Que eu sou um sonhador
Mas eu não sou o único
Eu tenho a esperança de que um dia
você se juntará a nós
E o mundo será como um só

Imagine não existir posses
Me pergunto se você consegue
Sem necessidade de ganância ou fome
Uma irmandade humana
Imagine todas as pessoas
Compartilhando todo o mundo

Você pode dizer
Que eu sou um sonhador
Mas eu não sou o único
Eu tenho a esperança de que um dia
Você se juntará a nós
E o mundo viverá como um só

A música cessou. Inspirado na poética composição ele formulou uma de suas geniais tiradas: “Imaginar é mais importante que o saber, pois o conhecimento é limitado, enquanto a imaginação viaja ao infinito”.

Continuou a caminhar. Parou numa esquina, parecia estar apreciando a movimentação das pessoas e o trânsito de veículos nas ruas, mas na verdade ele estava alheado de tudo, por isso nem notou a aproximação de um rapaz que carregava um livro preso no sovaco.

O jovem o abordou:

– Queira me desculpar, mas o senhor não é Albert Einstein, que foi professor na Universidade de Princeton?

– Sim, mas... eu não “fui” professor em Princeton – estranhou. – Ainda faço parte do corpo docente daquela instituição.

“O velhos são assim mesmo: estão sempre perdidos no tempo e no espaço.” – pensou o rapaz. E continuou: – Eu gostaria de ter um autógrafo seu. Pode ser?

– Sim, com prazer! Tem papel?

O rapaz pegou o livro que trazia debaixo do braço e do bolso um lápis. Entregou o material à celebridade do mundo científico e acadêmico.

Einstein leu o título da obra: “O Apanhador no Campo de Centeio”. Abriu o livro na página inicial, em que pretendia escrever uma mensagem e registrar seu autógrafo. Perguntou:

– Como você se chama?

Ambos são Kaio Diego Chapman
– Chapman, Kaio Diego Chapman...

Escreveu: “Caro Kaio Diego, creio que neste mundo somente duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez dos homens. Mas não tenho certeza se isso é verdadeiro em relação ao primeiro. Abraços. Albert Einstein. Nova Iorque, 8 de dezembro de 1944”.

Entregou o livro e o lápis ao fã.

Kaio leu a mensagem e observou:

– Acho que o senhor se confundiu... Hoje é dia 8 de dezembro, sim, mas... de 1980!

Einstein lembrou-se da “noite passada”: a lanterninha, o feixe de luz, a esforçada “concentração”. .. Só então atentou para os trajes do jovem, o quê lhe pareceu, não sabia por que, um tanto excêntrico. E os óculos? Nunca vira igual modelo. Olhou em sua volta. Agora, tudo ao seu redor lhe causava estranheza: carros, prédios, cartazes, vitrines... Fez menção de se afastar, continuar caminhando... Ouviu Kaio Diego lhe chamar:

– Professor!

– Sim! – voltou-se para o rapaz.

Kaio Diego empunhava um trezoitão apontado contra Einstein.

– Professor, não me leve a mal, mas isso é pelo bem da humanidade... – disparou a arma até descarregá-la.

Einstein caiu fulminado. O sangue escorreu pela calçada, e sua memória iniciou processo de projeção de reminiscências... Em sua mente se sucediam imagens da infância, caçando passarinho nas caatingas de Ulm, nadando e pescando no lagovon Männer; quebrado uma cadeira na cabeça do coleguinha de sala de aula; estudante na universidade; viajando mundo afora, a visita ao Brasil; a Teoria da Relatividade... Novamente aquela música de momentos atrás soava aos seus ouvidos de moribundo... Pensou: “Eu deveria ter-me dedicado à música. Talvez assim tivesse evitado um final tão trágico...”
Enola Gay

Uma mulher que assistiu a tudo da janela de um prédio em frente correu ao telefone e ligou para a polícia. Informou o endereço e concluiu desesperada: “Tá lá um corpo estendido no chão!”

Em instantes a polícia chegou ao local do crime. Os policiais avistaram Kaio Diego Chapman com o livro em uma mão e o revólver na outra, pálido, balbuciando disparates:

– Eu salvei Hiroshima e Nagasaki... Corrigi a História... O Enola Gay não partiu... Não tem mais Little Boy nem Fat Man... Podem conferir os novos registros... Agora, cientistas de todo o mundo vão pensar mil vezes antes de se dedicarem ao desenvolvimento de armas de destruição em massa...

Fat Man e Little Boy
Sem que os curiosos mortais que cercavam a cena do crime notassem, um raio precipitou-se sobre o corpo da vítima e o abduziu...

Einstein relaxou o cenho, abriu os olhos e, surpreso, viu o mendigo à sua frente, com a lanterninha ligada, focando o seu rosto.

– Não é nada do que você está pensando! – falou encabulado o cientista.

– Entendo... É que ultimamente andam servindo uísques de péssima qualidade!

O mendigo se foi, e Einstein também se pôs a caminhar noite adentro, sem reparar que o gato preto na escada de incêndio miava insistente: “Myauau! Ruuum!” [“A gente vê cada coisa!”]

Hoje Kaio Diego Chapman vive confinado num manicômio judicial cinco estrelas, em Manhattan, onde passa os dias ruminando elucubrações macabras para justificar seu tresloucado ato.

Assista ao vídeo em que dois imbecis defendem o assassinato de cientistas iranianos, no programa Manhattan Connection no canal GNT da Rede Globo (cabo).


E para refrescar a “moringa”... Imagine


Ilustração de JAM: Sociedades Alternativas (caricatura)
Demais fotos: redecastorphoto

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