domingo, 22 de agosto de 2010

Reflexões Sobre a Lei dos Fichas Limpas.

Cedo em minha vida aprendi, por experiência própria, que é tênue a linha divisória entre a honestidade e a delinquência. O que separa uma da outra é a escolha que fazemos. Nem sempre, porém, nossas escolhas dependem unicamente de nós. Uma conjunção de fatôres influenciam-nos de um modo que a escolha feita pode não refletir o que os outros esperam de nós. O ambiente familiar, social, profissional, exerce um grande poder de resolutividade sobre o indivíduo e dirá muito do que cada um se tornará como pessoa. No final, as decisões que tomamos são de nossa inteira responsabilidade e para cada escolha que fazemos, haverá consequências para o bem ou para o mal. É da natureza humana decaída seguir o caminho mais fácil, exercitar a lei do menor esforço, buscar vantagens na boa-fé daqueles que nos depositam sua confiança. Negar o acima é ir de encontro a essencia do cristianismo que declara ser o homem imperfeito, portanto passivo de redenção que só pode ser encontrada em Cristo. Como vivemos em um plano terreno e há indivíduos que estão muito além das regras elementares de sociabilidade, frequentemente ultrapassando os limites impostos pela convenções, instituiu-se o contrato social que rege igualmente sobre todos um conjunto de regras, de um regime político ou de um governante. O império da lei regulando a sociedade. Se fossêmos todos perfeitos nada disso seria necessário. Como não somos, tornou-se comum especialmente em nosso país criar leis para tudo. São tantas leis ineficazes, criadas pelos legislativos, na maioria das vezes para aplacar o furor da sociedade, que só servem para desmoralizar o judiciário e tornar motivo de chacota na boca da populaça que se habituou a repetir o dito: há leis que pegam e leis que não pegam. Não há um exemplo maior do que a legislação que rege o sistema eleitoral brasileiro. Todo ano, há regras novas que normatizam as eleições. O que era permitido na eleição passada, agora é proibido. Não conseguimos consolidar nosso sistema eleitoral e firmar jurisprudência consistente que perdure ao longo do tempo. Na verdade não há excrecência maior do que termos uma côrte Superior de Justiça Eleitoral. Algo totalmente dispensável, que poderia ser suprido pelo próprio STF, economizando recursos humanos e financeiros. Foi noticiado pelo jornal Folha de São Paulo que um partido político entrou com representação no TSE contra outro, porque o segundo tinha em seu comitê político central em Brasilia um enorme painel estampando a foto de sua presidenciável, infringindo a lei eleitoral que determina, pasmem, minunciosamente, as dimensões permitidas para o uso da foto da candidata nesse tipo de mídia. Como a representação se baseava em fotos, a ministra relatora determinou que um técnico do TSE fosse até o local com uma fita métrica verificar se o painel atendia as especificações da lei eleitoral. Pode haver algo mais surreal do que presenciar um técnico de um tribunal da importância que o TSE tem no sistema político brasileiro, em frente ao comitê de uma candidata comandando uma turma de operários com a determinação de fazê-los medir um painel com o fito de dar cumprimento a legislação que reza não ser permitido que tal painel ultrapasse o limite de quatro metros quadrados, sob pena de ser enquadrado na categoria de outdoor, instrumento de propaganda não permitido nas atuais eleições, caso esteja além das medidas estabelecidas? E se o painel tivesse quatro metros quadrados e dez centimetros, também infrigiria a legislação, por conseguinte deveria ser retirado. É com esse tipo de picuinha que estão a provocar a justiça. Quando temos a justiça eleitoral preocupada em interpretar uma legislação esdrúxula que se concentra no trivial, no comezinho e fecha os olhos para o que realmente interessa, cuidar que a campanha se restrinja a dispusta entre os candidatos , não podemos esperar outra coisa a não ser que atuação do TSE caia no ridículo de consumir tempo se debruçando sobre questões de somenos importância que não influirá em nada na decisão pessoal do eleitor. Me vem à mente as palavras do grande mestre que disse, guias cegos que coais o mosquito e engolís o camelo. E a tal de lei dos fichas limpas? Não há monstrengo jurídico igual em nosso ordenamento. Totalmente inconstitucional. Nega a presunção de inocência, retroage para prejudicar, contrariando a norma que expressa que a lei só pode retroagir em benefício do réu, cerceia o direito ao contraditório, a ampla defesa e exclui o candidato do processo eleitoral antes de sentença transitada em julgado. Mas a lei foi criada por causa dos varões de plutarcos que sedimentaram um clima de descrença generalizada na classe política, fomentada pelos meios de comunicação que incutiu na mente do cidadão mediano que somos um país extremamente corrupto, perpassando a firme atuação da polícia federal que realizou inúmeras operações no combate diuturno aos crimes contra o patrimônio público. Pode o TSE fazer algo diferente? Não! O tribunal tem de interpretar a lei, lei criada pelos nossos parlamentares. Até o STF se pronunciar sobre sua constitucionalidade, assisteremos perplexo a desmoralização da justiça perante a opinião pública. Desmoralização porque os tribunais eleitorais interpretam a lei pela imposição de seu múnus, negando registro eleitoral àqueles candidatos que estão enquadrados no que prescreve a legislação vigente e um outro tribunal superior a revoga atendendo aos ditames da constituição que assegura que ninguém será considerado culpado senão por sentença transitada em julgado. Neste samba do crioulo doido, fica o leigo a criticar a justiça quando os culpados são os que produziram a lei nas casas legislativas. No meu modesto entender, a decisão de excluir um candidato corrupto do processo eleitoral, primeiramente caberia ao partido já no pedido de filiação, exigindo do filiando um exame na instância partidária, de sua vida pregressa. Constatada sua inindoneidade a filiação deveria ser negada. Se no entanto já estiver filiado, constadado que perdeu a condição de idoneidade que deu origem a sua filiação, o partido deveria negar legenda. Segundo; ao critério objetivo do eleitor que deveria abster-se de votar em alguém com ficha criminal suja, por fim; aos prórprios parlamentares que deveriam reformar a constituição para acabar com as infinidades de recursos e filigranas jurídicas que levam à chincanas, e a própria justiça que deveria se debruçar com mais atenção nesse tipo de crime e ser mais célere para evitar a prescrição e a impunidade de quem é alvo de ação judicial por crime de corrupção.

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