sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Esquenta a guerra sangrenta no Judiciário



Esquenta a guerra sangrenta no JudiciárioFoto: DIVULGAÇÃO

AGORA É O DESEMBARGADOR CAETANO LAGRASTA (À ESQ.) QUEM PEDE AO PRESIDENTE DO TJ-SP, IVAN SARTORI (CENTRO), OS NOMES DOS JUÍZES QUE ESTARIAM RECEBENDO BENEFÍCIOS DE FORMA ILEGAL; ELIANA CALMON, DO CNJ, PARTIU PARA O TUDO OU NADA

23 de Dezembro de 2011 às 12:05
Fernando Porfírio _247 – O desembargador Caetano Lagrasta decidiu por mais lenha na fogueira da maior “guerra” já vivida pelo Judiciário brasileiro. O desembargador paulista quer mais transparência e pediu ao presidente eleito do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivan Sartori, que divulgue os nomes dos colegas que receberam de forma ilegítima a verba adiantada que levou o CNJ a passar uma semana na capital investigando a irregularidade.
“Este ‘segredo de Polichinelo’ prejudica a todos, colocando-nos sob suspeita, ao mesmo tempo em que preserva os que se aproveitaram da amizade ou do conluio para desobedecer preceitos legais”, afirmou Lagrasta, que também mandou cópia da carta aos desembargadores Gonzaga Franceschini (vice-presidente eleito) e Renato Nalini (corregedor-geral). “Que respondam por isto, é o que se espera de um Conselho Superior da Magistratura eleito de forma consagradora e que, se espera, irá representar a juventude e a mudança”, completou.
O desembargador Celso Limongi, ex-presidente do Tribunal de Justiça e ex-integrante do Superior Tribunal de Justiça lamentou o clima de guerra que se instalou no Judiciário brasileiro e disse que com isso a instituição cai no descrédito da população. Limongi que também foi presidente da Associação Paulista dos Magistrados afirmou que o maior prejuízo que será amargado pelo Judiciário é o desprestígio.
“Esse, infelizmente, é um triste episódio que nos coloca numa situação de perda de confiança da sociedade”, afirmou Limongi. “Juízes, desembargadores e ministros tem não só que ser honesto, mas mostrar essa honestidade”, completou. Limongi disse que durante sua administração à frente do Tribunal de Justiça não privilegiou ninguém, mas revelou que pagava direitos alimentares a servidores e juízes que estavam com problemas graves de saúde.
“Da mesma formou que não é correto sair por aí dizendo que existe bandido de toga, todo magistrado tem por dever prestar conta de suas atividades à sociedade”, disse o ex-presidente da corte paulista. Para Limongi, o debate público que está sendo conduzido por autoridades da Justiça só faz crescer as teses defendidas pelos setores retrógrados de dentro e de fora do Judiciário.
Tropa de choque
O debate vem sendo alimentado por associações de magistrados. As entidades se transformaram na tropa de choque dos interesses de um grupo de ministros e desembargadores das cortes de Justiça. O que une esses senhores é a oposição a um órgão nacional com poder de investigar o Judiciário. Esvaziar o poder do CNJ é o primeiro passo da estratégia. Fustigar e isolar a corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, o segundo objetivo. O terceiro caminho é abrir uma investigação contra a ministra por uma suposta quebra de sigilo. A palavra de ordem é fazer a ministra provar do mesmo veneno que distilou.
Os mais afoitos coçam às mãos só de pensar em envolver a ministra num processo criminal. A cúpula do Judiciário brasileiro está envolvida numa guerra intestina, que pode provocar um colapso institucional. No lugar do CNJ, preferem o quadro de sete anos atrás, quando a apuração sobre as atividades de magistrados era exclusividade das corregedorias dos tribunais. Foi nessa época que pipocaram escândalos como o da construção do TRT de São Paulo de onde foram desviados quase R$ 170 milhões e que teve como envolvido o juiz Nicolau dos Santos Neto.
As ideias desse grupo foram infladas pelo destempero da corregedora, quando, em setembro, afirmou que havia bandidos escondidos atrás da toga. A indiscrição de Eliana Calmon abriu a crise no Judiciário. Esse grupo aproveitou a deixa para isolar a ministra e por extensão diminuir o poder de investigação do Conselho Nacional de Justiça. O clima de litígio cresceu depois da inspeção que o CNJ resolveu patrocinar no Tribunal de Justiça de São Paulo, berço onde fez carreira, entre outros, ministros como Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski.
O clima azedou de vez esta semana, quando duas liminares concedidas pelos ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandwski em ações da AMB, da Ajufe e da Anamatra (associações dos magistrados em geral, federais e trabalhistas) contestando competências de controle do CNJ, principalmente em processos administrativos disciplinares à revelia das corregedorias dos próprios tribunais de segunda instância.
O primeiro, por meio de liminar, reduziu os poderes do CNJ. O segundo, também usando de medida cautelar, suspendeu as investigações que tinham como alvo eventual enriquecimento ilícitos de magistrados, servidores públicos e familiares de membros do Judiciário. As medidas colocaram o Judiciário brasileiro em pé de guerra, bem na véspera do Natal.
A estratégia de fustigar a ministra foi articulada no eixo São Paulo-Brasília. Os principais personagens fizeram manchetes nos últimos dias. São ministros do Supremo e presidentes de associações de magistrados. A ofensiva mais organizada contra Eliana Calmon teve como epicentro a investigação feita no Tribunal de Justiça de São Paulo e o vazamento de informações da correição sigilosa.
O fato obrigou o presidente da corte paulista, José Roberto Bedran, a enviar ofício à ministra pedindo explicações e reclamando da atitude de executores da correição. A ministra negou qualquer vazamento por parte da corregedoria.
Na ocasião, o presidente do STF e do CNJ, Cezar Peluso se colocou à frente da campanha. O ministro divulgou nova na qual classificou como “leviana” a declaração de Eliana Calmon. Peluso foi estrategicamente retirado de cena, e outro paulista foi escalado para bater de frente com a ministra. A ideia era evitar exposição desnecessária de autoridades do Judiciário. O lugar de Peluso foi assumido pelo presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), desembargador Nelson Calandra.
A AMB já havia protocolado uma ação que pretendia limitar, sob o fundamento de inconstitucionalidade, o poder e a atuação correcional do CNJ. Para a AMB, o CNJ, pela sua corregedoria, só pode atuar subsidiariamente, ou seja, quando as corregedorias dos tribunais se omitem. O tema provocou divergência entre o ministro Peluso e a ministra Eliana Calmon.
A ação chegou a entrar na pauta 13 vezes, mas não foi julgada. De início, o relator, ministro Marco Aurélio, achou melhor retirar o tema da pauta até os ânimos se aclamarem. No entanto, no último dia antes do recesso, veio a bomba: em liminar, Marco Aurélio,, sozinho, cortou as asas do CNJ. Estava aberta uma nova fase: a da guerra total.
Mas a resistência ao CNJ vem sendo conservada há pelo menos sete anos. Sua validade começou depois da aprovação da Emenda Constitucional 45, em dezembro de 2004. Ao votar esse dispositivo da reforma do Judiciário, a maioria do Congresso Nacional considerou que as corregedorias dos tribunais não funcionavam a contesto e tiveram até sua autoridade moral arranhada por episódios de puro corporativismo.
O raciocínio da época que levou à frente a ideia da criação do CNJ com uma corregedoria forte foi a de que se as corregedorias dos tribunais fossem eficientes, não teria ocorrido, tantos escândalos envolvendo magistrados. Além disso, as corregedorias estaduais só tem competência para investigar juízes de primeiro grau, ficando as denúncias envolvendo desembargadores a cargo da Presidência dos Tribunais e do Órgão Especial.
Atualmente, tramitam na Corregedoria Nacional de Justiça 115 processos contra juízes de primeira instância e 35 contra desembargadores. Em seis anos de atuação, o CNJ condenou cerca de 50 magistrados, dos quais metade foi punida com a pena máxima no plano administrativo: a aposentadoria compulsória. No mesmo período, o CNJ foi objeto de 32 ações diretas de inconstitucionalidade, das quais 20 foram propostas por entidades de juízes, como a AMB.
O ex-conselheiro do CNJ e diretor da FGV, Joaquim Falcão chegou a dizer esta semana que esses números revelam "uma estratégia de guerrilha processual permanente contra o CNJ". Joaquim Falcão fala com conhecimento de causa. Quando conselheiro do CNJ enfrentou as baterias do Tribunal de Justiça de São Paulo que não queria cumprir a simples decisão de enviar as informações do que foi pago aos juízes paulista que proferiam votos no lugar de desembargadores e ganham um bônus por isso.
Todo mundo sabe que o CNJ foi uma das maiores inovações do Judiciário brasileiro e a Justiça se tornou mais transparente depois de sua criação. A artilharia contra a corregedora Eliana Calmon se deve por uma simples razão: a ministra pediu a análise das declarações de bens e rendimentos apresentados por magistrados e servidores, principalmente nos casos com movimentação acima de R$ 500 mil.
A ministra foi além e pediu que a investigação abrangesse cônjuges e filhos e que fosse dada prioridade a quatro tribunais, entre eles o TJ de São Paulo. Segundo ela afirmou na entrevista de ontem estava cumprindo a lei e atuando dentro do seu poder de correição e de controle do Judiciário.

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