quinta-feira, 14 de julho de 2011

Quem manda na News Corp. é a família

Financial Times
JOHN GAPPER
DO "FINANCIAL TIMES"

Rupert Murdoch não é realmente o fundador da News Corp. --ela começou como a News Limited, proprietária de um jornal de Adelaide, sob a égide de seu pai--, mas ele personifica o grupo há 59 anos. O império de mídia foi construído em torno de suas apostas e opiniões, com pouca consideração pelo que outros possam pensar.

Assim, Murdoch é visto como exemplo --embora eles possam não querer admitir o fato agora-- pela geração mais jovem de empreendedores na internet que estão levando suas empresas às bolsas de valores, por meio de ofertas públicas iniciais de ações. Também eles querem conservar o controle sobre suas empresas, ao mesmo tempo em que levantam capital junto a outras fontes.

Esta semana Murdoch tentou aplacar seus acionistas intranquilos, alguns dos quais o estão processando devido à débâcle do grampeamento de telefones no Reino Unido, anunciando uma recompra de ações no valor de US$ 5 bilhões.

É um pouco tarde para começar a agir com sensibilidade em relação aos acionistas, em vista da maneira como ele passou por cima dos interesses deles desde que veio à tona a gravidade dos erros de conduta cometidos na News International.

Ninguém na News Corp., nem mesmo o próprio Murdoch, se dá ao trabalho de fazer de conta que o grupo seja administrado segundo quaisquer outro princípio senão aquilo que seu presidente quer. Qualquer empresa de capital aberto que levasse a sério os desejos de seus acionistas --o que dirá os de políticos e reguladores-- teria forçado Rebekah Brooks, executiva-chefe das operações dos jornais no Reino Unido, a partir imediatamente.

Em lugar disso, Murdoch viajou a Londres para ficar do lado de Brooks e declarar que ela era "a prioridade". Fez com que parecesse que ele preferiria perder tanto o "News of the World" quanto o esforço, primeiro adiado e agora abandonado, para adquirir 100% da British Sky Broadcasting, a sacrificar a executiva.

Murdoch não apenas se comporta como se a News Corp. ainda fosse um empreendimento familiar, como vem dando mostras de julgamento errático.

Suas iniciativas recentes mais ousadas --antes da tentativa de adquirir a BSkyB-- foram comprar o MySpace por US$580 milhões em 2005 e depois vendê-lo por US$35 milhões, e gastar US$5 bilhões com a Dow Jones em 2007, para mais tarde desvalorizá-la em US$2,8 bilhões.

Não surpreende que os acionistas --ou, melhor dizendo, os donos das ações de classe A da empresa, com direitos de voto limitados-- estejam insatisfeitos. Mas há pouco o que eles possam fazer, já que os Murdoch exercem controle em toda a News Corp., com sua participação de 38% nas ações de classe B, que dão direito a voto, assim como controlam a BSkyB em grande medida através da participação de 39% da News Corp.

Esse fato deve servir de aviso a investidores que estão mostrando grande interesse pelas ofertas públicas iniciais de redes sociais e companhias na internet. Desde a oferta pública inicial da Google, em 1994, tornou-se praxe que os empreendimentos do Vale do Silício não apenas adotem uma estrutura acionária com ações de duas classes, para garantir o controle sobre a votação aos fundadores das empresas, como que declarem que isso é bom para os acionistas sem poder.

A companhia de games online Zynga, que se registrou na semana passada para uma oferta pública inicial de ações, é a mais recente firma na internet a adotar uma estrutura acionária que garante que o controle continue nas mãos de seus fundadores --no caso em pauta, por meio de uma estrutura de três classes de ações na qual apenas Mark Pincus, o fundador da Zynga, será dono de ações da classe C. A Facebook já montou uma estrutura com duas classes de ações, e a LinkedIn e outras têm participações acionárias de duas classes.

O empreendedor na internet e capitalista de investimentos Marc Andreessen argumenta que "os interesses dos acionistas públicos muitas vezes serão mais bem atendidos se o controle da votação ficar com os fundadores e líderes chaves da empresa", porque isso capacita esses últimos a concentrar sua ação na construção do negócio, sem se deixarem distrair pelo "barulho" de curto prazo dos mercados acionários.

Sob alguns aspectos, a News Corp. é um exemplo dos benefícios de se ter um empreendedor de pulso firme no comando. Rupert Murdoch construiu algumas empresas muito grandes --incluindo a BSkyB e a Fox News-- partindo do zero, desafiando a visão dominante e enfrentando o establishment. Como força que desafia as expectativas, poucos se comparam a ele.

Recentemente, contudo, os investidores vêm perdendo mais do que ganharam pelo fato de permitir que ele detenha o controle. Em lugar de construir um negócio que, com o tempo, recompense os investidores por sua paciência, Murdoch vem fazendo aquisições mal pensadas, entregou a seu filho James o controle de uma divisão grande --e, como ficou claro, muito problemática-- da empresa, e tem dado apoio irrestrito a executivos que cometeram erros graves de administração.

"Os fundadores falam dos interesses de longo prazo da empresa, mas você sempre pode atribuir seus erros ao longo prazo", disse Charles Elson, professor na Universidade de Delaware. "Quando o longo prazo chega, o fundador já terá morrido, e seus acionistas sofredores, também."

Rupert Murdoch, que está com 80 anos, quer entregar o controle da empresa a seus filhos, que prometem (na melhor das hipóteses) levar adiante seu estilo de comando. Antes da débâcle com os jornais, James tinha conquistado o respeito dos investidores quando comandou a BSkyB, e Elisabeth consolidou o Shine Group, um grupo de produção de televisão, antes de ele ser comprado pela News Corp. este ano.

Mas, não importa como o poder venha a ser dividido entre eles, não há sinais de que eles administrarão a News Corp. de maneira muito diferente de como seu pai vem fazendo há seis décadas. Eles herdarão a ambição desmedida de Rupert Murdoch e a visão que ele tem da empresa como sendo o domínio particular de sua família.

Alguns investidores e analistas ainda acreditam que Chase Carey, o executivo operacional chefe da empresa, e os outros executivos profissionais que cercam os Murdoch consigam suavizar os instintos arrogantes destes e fazer com que eles levem em conta os interesses dos acionistas. Em última análise, porém, eles trabalham para a família.

A teoria relativa a empresas de administração familiar e de estrutura acionária de duas classes, como a News Corp., é que elas beneficiam seus investidores no longo prazo. Depois de quase 60 anos sob a égide de Rupert Murdoch, isso ainda não aconteceu.

TRADUÇÃO DE CLARA ALLAIN

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