domingo, 30 de outubro de 2011

A estratégia política do denuncismo




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É curioso como está se processando o xadrez político. Em muitos aspectos, lembra bastante o pré-64 - o que não significa necessariamente que o desfecho será o mesmo.
Dilma assumiu pretendendo acabar com a polarização política dos últimos anos. Fez acenos em direção aos jornais, colocou-se acima dos partidos e do próprio PT, afastou-se dos sindicatos - no início, com imprudência, depois com cuidado - e da blogosfera.
Um dos pontos centrais da sua estratégia foi o de aceitar as denúncias contra Ministros. Fez como o lutador de judô que calibra o golpe aproveitando o embalo do adversário.
Nas primeiras rodadas, acumulou pontos. Na sequência, o jogo está indefinido. Essa estratégia fortaleceu o denuncismo de forma nunca vista desde a campanha do "mensalão". Aparentemente a presidente saiu ilesa, por não estar no centro do fogo que está consumindo seus ministros.
Só aparentemente. O ímpeto redobrado com que a velha mídia coloca os ministros em fila e os vai fuzilando conseguiu criar no seio da classe média midiática o mesmo clima do "mar de lama" de Getúlio e Jango.

Repito: não significa que o desfecho será o mesmo. Significa que o cadinho de cultura para um golpe é o mesmo.
Por que se usa a palavra "golpe" com tanta semcerimônia? Pela relevante razão de que, quando se adota o "denuncismo" como estratégia política única, o caminho democrático só é viável quando se tem um candidato competitivo empunhando a bandeira - como Jânio Quadros, por exemplo. Nas circunstâncias atuais, não existe um Jânio no meio do caminho da oposição.
Assim como em 1964, não há uma oposição política com musculatura, com projetos claros de poder, candidatos competitivos. José Serra é carta fora do baralho. Nos seus primeiros movimentos, Aécio Neves não mostrou estatura política. Geraldo Alckmin não conseguirá avançar além da província.
Candidatos de maior potencial - como Eduardo Campos - estão fora, por enquanto, do leque de alianças da velha mídia, além de ser de um Estado fora do eixo politico do sudeste. Resta o quê, então?
A história, quando se repete em tempo real, permite um estupendo aprendizado. A partir do que ocorre agora, é possível mergulhar no passado, intuir sobre o que foi o dia a dia político de outras crises, como as que tolheu Vargas e Jango, ou mesmo como teria sido a habilidade política de JK, toureando as diversas tentativas de golpes.
A história é um jogador de xadrez caprichoso, que vai utilizando as circunstâncias para redefinir o papel das peças do tabuleiro. Jornalistas, políticos, de história de lutas contra a intolerância, contra o arbítrio, de repente são colocados em um novo papel, intolerante, fora do reino das ideias, para se situar exclusivamente na tática de salientar a corrupção, no "mar de lamas", no perigo Chávez, utilizando o mesmo repertório que o grande Afonso Arinos - um oposicionista civilizado - considerava fora de moda em 1964.
Naqueles tempos, havia as Forças Armadas no fim da estratégia.
E agora? Confesso que não sei.
Numa ponta tem-se o avanço das novas mídias, novos grupos jornalísticos tirando a influência da velha mídia, novos jornais de papel, os portais exercendo um contraponto ao menos no reino da audiência e da publicidade.
Mas é inegável que a ideologia predominante do jornalismo formal ainda é pautado pelo pacto dos quatro - Globo, Abril, Folha e Estadão. E é inegável que, fora de períodos eleitorais, a opinião pública midiática permanece com inegável influência.
Por seu lado, a blogosfera ainda fala para uma militância. Faz o contraponto, desconstroi factóides, mas não forma opinião ainda, a não ser a dos convertidos.
Na física (ou na química) há determinados corpos em equilíbrio até que ocorre um fato qualquer que provoca o desequilíbrio. Esses movimentos mudam totalmente a força dos agentes internos.
O pilar do equilíbrio atual é o quadro econômico razoavelmente estável. Em caso de crise econômica - uma hipótese por enquanto (felizmente) fora do horizonte - esse cadinho de indignação plantado diariamente pela velha mídia terá desfechos imprevisíveis. Há amplo espaço no horizonte para a ampliação ilimitada da radicalização.
Será um belo desafio para Dilma Rousseff e seu maior aliado, Lula.

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