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Luis NassifOntem conversei longamente com um jornalista experiente em comunicação pública.
Contava ele que, no governo Clinton, coube a Hillary Clinton conduzir o mais ambicioso programa de governo, as mudanças no Medicare, o plano de saúde público.
Para se defender de vazamentos e boicotes, Hillary enfeixou todas as informações em suas mãos, não deixou vazar nada, não montou uma estratégia sequer de comunicação.
Quando o plano foi anunciado, a oposição republicana destruiu-o em dois tempos com interpretações falsas, mas que pegaram – como, por exemplo, a de que todos os ricos teriam que se tratar no Medicare. O governo Clinton perdeu a batalha de um projeto fundamental no campo exclusivo das informações.
São algumas das lições dos erros cometidos quando governos fecham informações.
Especialmente no caso brasileiro, não se pode ter a ingenuidade de tratar as informações – antes do processo decisório – como um livro aberto. A velha mídia já se definiu como partido político, perdeu o pudor e a cautela.
Esse é um dado da realidade, a ser trabalhado por um plano de comunicação. E não-comunicação positivamente não é estratégia de comunicação.
No caótico governo Itamar, o Ministro da Fazenda Paulo Haddad era vítima de tiros diários de próprios membros do governo comandados pelo Ministro da Justiça Maurício Correa. Conseguiu se segurar – até perder a paciência – graças ao trabalho exemplar e proativo de Rubens Pontes, seu assessor de comunicação. Com canais azeitados com alguns poucos jornalistas, Rubinho se incumbia diariamente de esvaziar balões e desligar bombas relógios. Não havia estratégias, políticas de comunicação nem nada, mas um assessor proativo e antenado com a luta diária das notícias.
Mesmo em 2008, antes que a política anticíclica de Mantega desse certo, houve um trabalho espontâneo de assessores econômicos desbastando a lógica das medidas, trazendo os argumentos internos para fortalecer a luta no campo da opinião pública.
Hoje em dia todos esses canais estão intimidados, os assessores de imprensa do governo Dilma reduzidos à condição de marcadores de agenda, de algodão entre cristais. Não por culpa deles, mas pelo viés anti-notícia da própria presidente.
Comunicação como parte do planejamento
Comunicação pública é algo tão fundamental na ação de governo que deveria fazer parte do planejamento de cada programa complexo. Desde o início, se mapeariam os pontos mais polêmicos, os temas técnicos que poderiam dar margem a mal-entendidos, os pontos legitimadores do projeto, os dados que permitam compreender os objetivos traçados.
Depois, a estratégia de divulgação gradativa dos dados e a identificação dos jornalistas tecnicamente aptos a entender a matéria e disseminar os conceitos – e não se está falando de jornalistas menos críticos, mas de jornalismo técnico capaz de transmitir com objetividade os fatos e formular as críticas pertinentes.
Nos últimos anos, a politização da velha mídia tornou irrespirável o ambiente interno das grandes redações. Grandes jornalistas foram obrigados a jogar na retranca, para preservar a dignidade; abriu-se espaço para privilegiar os ambiciosos, dispostos a qualquer jogada. Abriu-se espaço para o jornalismo colón (de intestino).
Agora, esse clima desanuviou, ainda que minimamente. Percebem-se respiros de jornalismo. Por isso mesmo, não se deve tratar a velha mídia como um todo homogêneo.
Há ilhas de jornalismo remanescentes, jornalistas capazes de entender temas complexos e reportá-los com honestidade crítica. No futuro, os jornalistas que ficarão serão esses, capazes de um pacto sério com a notícia e com as fontes. É com eles que devem ser recompostos os laços da comunicação pública.
Governo desarmado
Internamente, tem-se um governo desarmado, inclusive para se contrapor às interpretações mais primárias de dados públicos.
Os exemplos de manipulação são variados, reiterados, e não há uma estratégia interna para rebatê-los.
Exemplos:
- Um programa contem várias rubricas orçamentárias. O jornal analisa uma rubrica específica e apresenta como se fosse o todo, para poder informar que a execução do programa foi mínimo. Uma questão técnica facílima de ser rebatida, mas que se eterniza por falta de uma política de comunicação.
- No caso PAC, cansei de ver manipulação de sites – repercutidos pela mídia – utilizando a liberação orçamentária como indicador do andamento do projeto. Ora, sabe-se que o pagamento ocorre depois de entregue o serviço. Portanto, o indicador adequado é o acompanhamento físico. No entanto, essa jogada se repetiu durante todo o PAC, “pegou” sem que houvesse uma ação de comunicação (simples) para anular essa bobagem.
Hoje em dia, a questão da comunicação é fundamental inclusive na gestão privada. E a função do homem de comunicação não é o de agendar entrevistas. É aquele que tem visão sistêmica da empresa, conhecimento amplo da notícia e da mídia, capacidade de fazer o meio campo entre fontes confiáveis e jornalistas confiáveis.
Os Ministérios dispõem de pessoal com essa capacidade. Mas reduzidos, por imposição de governo, a meros agendadores de entrevista.
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