terça-feira, 14 de janeiro de 2014

EUA freezer

A maior onda de frio das últimas duas décadas nos EUA mata

mais de 20 pessoas, paralisa parte do país e complica a vida de

quem foi passar férias na capital turística do mundo


Ana Carolina Nunes
No filme “O Dia Depois de Amanhã”, uma superprodução americana de 2004 no melhor estilo cinema catástrofe, o mundo enfrenta uma espécie de cataclisma climático por conta das ações do homem no meio ambiente. Com o aquecimento global, calotas polares se desprendem do Ártico, bloqueiam correntes marinhas e, em vez de um período mais quente, boa parte do Hemisfério Norte passa a enfrentar uma nova era glacial. No filme, única saída para os americanos é pedir asilo no México para não morrer de frio.
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GLACIAL
Em Chicago, o lago Michigan congelou e a sensação
térmica chegou a 50 graus negativos
Mesmo dez anos depois de seu lançamento, muitos americanos devem ter se lembrado, nesta última semana de frio recorde em quase todo o país, dessa produção estrelada por Dennis Quaid. É verdade que as baixas temperaturas não foram capazes de fazer com que milhões de americanos simplesmente largassem tudo para viver no México, mas, com certeza, muita gente que enfrentou a sensação térmica de 50 graus negativos deve ter considerado essa possibilidade.
Não fazia tanto frio nos Estados Unidos há pelo menos duas décadas. Por conta de um fenômeno climático raro, temperaturas glaciais tomaram conta de praticamente todo o meio-oeste e nordeste do país, afetando mais de 140 milhões. Ao menos 20 mortes foram registradas em decorrência do frio intenso que atingiu regiões do país que não estavam exatamente acostumadas a ver neve, gelo e ventos cortantes. E nas regiões já acostumadas com as temperaturas baixas, a sensação foi de estar no Polo Norte. Em Chicago, por exemplo, o urso polar do zoológico local precisou ser levado para um local fechado.
Mas foi em Nova York que a onda recorde de frio pegou muita gente de surpresa. Capital turística do mundo, a principal cidade americana recebe cerca de 50 milhões de visitantes todos os anos, sendo dois milhões deles brasileiros. Mesmo conhecendo as características da cidade nesta época do ano, pouca gente imaginava que poderia enfrentar sensação térmica de 20 graus negativos e muita, muita neve.
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RECORDE 
A massa de ar polar fez com que Nova York ficasse com a cara do Alasca,
com muita neve, muito vento e muito frio, obrigando moradores e turistas
a improvisar para suportar a sensação térmica de até 20 graus negativos
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“Eu quase não conseguia sorrir nas fotos, de tanto frio”, conta o comissário de bordo Fernando Tomazzini, de férias pela terceira vez em Nova York. Dificuldade também para o banho, pois, ao amanhecer, a água estava congelada nos canos, e chuveiros e torneiras não ofereciam mais que um filete de água. Apesar das boas histórias que colecionou, Tomazzini não pretende encarar uma nova onda de frio como a desse ano. “Nunca senti tanto frio na minha vida”, diz, mesmo tendo conseguido um casaco extra de esqui emprestado por uma amiga americana.
As coloridas roupas de esqui foram a principal arma de quem estava em Manhattan para enfrentar o clima congelante. O brasileiro Leandro Lima, que vive na metrópole há seis anos, aproveitou a viagem para uma estação de esqui no estado de Wyoming e já saiu de casa paramentado. “Aqui na estação de esqui a temperatura está maior do que estava em Nova York”, compara achando graça. O mais complicado, no entanto, foi chegar ao aeroporto para sair da cidade. O percurso que normalmente dura cerca de 40 minutos se estendeu por duas horas e meia. “Era um deserto branco nas ruas. A neve caía intensamente e não se via um carro circulando”, testemunha. Chegando ao aeroporto, Leandro ainda se deparou com uma multidão que teve seus voos cancelados e não conseguia ir para casa. “As pessoas ficaram assustadas, pois no ano passado Manhattan não viu neve”, ele lembra. Leandro teve sorte em conseguir pegar o avião. No país todo, cerca de 15 mil voos foram cancelados durante os dias de frio e neve intensos.
Tanto frio foi causado por um fenômeno conhecido como vórtice polar, que está presente constantemente nos dois polos do planeta, tanto no inverno quanto no verão. A diferença é que neste ano o vórtice, uma espécie de ciclone de ar frio responsável por enviar massas polares para fora dos polos, ficou maior do que o normal e seu centro de atividade mudou de posição. Em vez de ficar concentrado na região norte do Canadá, o centro do vórtice, dessa vez, moveu-se em direção ao sul e ficou parado sobre a região dos Grandes Lagos, na fronteira entre o Canadá e os Estados Unidos. Por conta disso, em algumas cidades do estado de Michigan as temperaturas chegaram a 35 graus negativos. Em Chicago, por conta do vento, a sensação térmica atingiu incríveis 51 graus negativos.
Tanto frio paralisou boa parte do país. As autoridades apelaram para que a população permanecesse em casa e, principalmente, não dirigisse. Algumas famílias fizeram até estoque de alimentos para evitar saírem às ruas. Escolas e escritórios foram fechados como medida de segurança. Até mesmo alguns bombeiros foram afetados, ao se depararem com hidrantes congelados. Em Chicago, o Lago Michigan congelado se assemelhava mais a uma grande pista de patinação.
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Sofrimentos à parte, no estado de Michigan, a cidade de nome “Hell”, que significa “inferno” em inglês, virou piada ao ter sua paisagem congelada e vídeos na internet fizeram sucesso, como o que mostra a água fervendo se transformar em vapor frio assim que entra em contato com o ar ou a bolha de sabão se congelar em segundos.
Apesar da intensidade, os meteorologistas afirmam que não há nada de anormal no frio registrado essa semana. “A Terra possui ciclos naturais que ainda não são totalmente conhecidos, como manchas solares, El Niño, La Niña. Não há nada de anormal nisso”, diz Samantha Martins, Meteorologista do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP.  

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