Renato Janine Ribeiro
11/07/2011
A presidenta Dilma está numa fase difícil de seu governo, mas que dizer da oposição? Do PV, como alternativa de poder, já não se fala. Restou a oposição tradicional, o PSDB, mas sem rumo. Por razões que a razão desconhece, seu candidato à Presidência, em vez de apostar naquilo em que ele é bom - o desenvolvimentismo - e que sempre lhe agregou valor em nossa política, preferiu na reta final da campanha de 2010 aderir ao moralismo, no aborto e até na homofobia.
O conglomerado tucano foi e é uma trinca de partidos. O maior deles é o PSDB. Dos três, só ele pode concorrer à Presidência da República. Já o DEM foi nosso maior partido, elegendo 105 deputados federais em 1998. Mas minguou para 43, em 2010. Largou o nome de PFL, sangra com a saída do prefeito de São Paulo, seu maior líder eleito. Pouco lhe resta, salvo fundir-se com o PSDB. O terceiro é o PPS, antigo Partido Comunista Brasileiro: serve uma excelente retórica de esquerda somada a uma prática frágil. O PPS subsistirá mas, como vários partidos, sua vocação é ser coadjuvante - o que não é desonra alguma: também coadjuvantes recebem o Oscar.
Mas o eixo está no PSDB. Restam-lhe, hoje, três presidenciáveis. No Brasil, ser presidenciável é um galardão. Significa que o político recebe realce. Poucos presidenciáveis chegam à presidência, é óbvio, mas não basta ser político - ou político bom - para ser presidenciável, isto é, alguém com reais chances de se eleger. Os três são ex-governadores, dois de São Paulo e um de Minas Gerais. Parece que, após elegermos três presidentes sucessivos que jamais governaram um Estado, estaríamos voltando à regra de que se aprende a governar degrau a degrau, como quase sempre foi em nossa história.
Vejamos os três nomes. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, conta com a fama de pessoa calma e tranquila, mas já teve sua chance em 2006 e, talvez porque partiu para a agressão verbal ao então presidente Lula, conseguiu perder votos no segundo turno em relação ao primeiro, feito raro e que reduz sua cotação nacional. José Serra, ex-governador paulista, concorreu duas vezes à presidência e perdeu. Restaria o príncipe encantado que, desde a pré-campanha de 2010 aparecia como o nome do futuro, fadado a resgatar a morte do avô, diplomado mas que morreu antes de assumir a presidência, Tancredo Neves. Dizem que Serra lhe teria prometido a candidatura em 2014, qualquer que fosse o resultado do pleito do ano passado. Mas na noite do segundo turno, ao sair o resultado das eleições, Serra se absteve de cumprimentar correligionários que não fossem paulistas. Mais recente, o episódio em que Aécio Neves se recusou a prestar o teste do bafômetro deixa certa preocupação sobre sua maturidade para a Presidência. É provavelmente o melhor articulador dentro do partido, seu nome mais simpático e encantador, provém de um Estado que está há tempos fora do Planalto (até porque Dilma é mais gaúcha do que mineira) - mas deu à sociedade um exemplo negativo, em termos de conduta pessoal.
Este rápido percurso pelos nomes não substitui, porém, o que realmente conta: o projeto que o partido defenderá. Nenhum partido brasileiro, como se sabe, se diz de direita. O DEM, tentando não ser esvaziado por Kassab e sobreviver ao PSDB, outro dia ousou dizer-se "conservador". Mas talvez não tenha como ser um partido liberal, o que, aliás, não se confunde com conservador. O PSDB fará haraquiri se for conservador, e terá dificuldade em ser apenas liberal. Mas é fato que foi indo para a direita. Sua criação já mostrava algo estranho. Os partidos social-democratas, na Europa, nasceram dos sindicatos. Mas aqui não houve amor entre o mundo sindical e o PSDB. Significativo da dificuldade de se dizer "social-democrata" é um artigo na Folha, por sinal brilhante, em que Gustavo Franco definia, no começo do ano, a "social-democracia" em que acreditava: nada sobre o mundo do trabalho, tudo sobre economia, finanças e gestão. Estava mais para um liberalismo consistente do que para a social-democracia. Disso, o resultado é que a social-democracia brasileira acabou sendo o PT no governo.
Lembremos. Quando, no começo de 2002, Roseana Sarney aparecia como a promessa de uma candidatura forte da direita (pelo PFL), não acreditei. Ela não teria um projeto consistente. Mesmo sem as denúncias que liquidaram sua candidatura, não creio que se viabilizasse. Uma campanha eleitoral pode surpreender, mas antes de mais nada decanta as exceções, os excessos, as bolhas. O PSDB tem três anos para galvanizar o País. Sorte dele que sua crise se dê agora; imaginem se estivéssemos já em 2014. Qual será seu projeto, é difícil saber. O partido parece se dividir entre um projeto que seria o de Serra, ou melhor, o de Bresser Pereira: desenvolvimento econômico, com projeto nacional e bons resultados sociais; e outro, que retomaria a linha privatizante de FHC, o projeto que o "Economist" queria que Serra adotasse, mas sabia que ele não assumiria. Ora, dos dois projetos, o segundo parece ter completado seu papel, enquanto o primeiro foi e é executado, bem, pelo PT. Que discurso resta, então, ao partido tucano? Retomar a herança do governo Fernando Henrique parece pouco promissor. Concorrer com o PT em seu terreno é perda de tempo. Mas, em suma, o problema da oposição hoje não é o número de deputados, é o que ela quer fazer do Brasil. E, no fundo, deveria ser este o problema, não da oposição, mas de todos nós. Não importa tanto se um partido é grande e viável, ou não. Isso muda. O que importa é que o Brasil se beneficie das melhores propostas.
Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo. Escreve às segundas-feiras
E-mail rjanine@usp.br
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