segunda-feira, 2 de abril de 2012

O senador Cachoeira




É assim que os pares de Demóstenes Torres têm se referido ao próprio no senado depois que a Polícia Federal cuidou de deslindar os esquemas de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira que montou uma rede clandestina de espionagem e mergulhou o Estado de Goiás no submundo do crime com influência direta nas indicações de autoridades para o governo tucano de Marconi Perillo, fato este amplamente divulgado pela imprensa, no escândalo trazido à tona pela operação Monte Carlo que lançou luz entre dois personagens bastantes conhecidos da política nacional, Carlinhos Cachoeira, chamado por Veja de empresário de jogos e o senador Demóstenes Torres, o mais implacável moralista do senado federal. Ex-moralista, digo melhor.




Demóstenes é hoje um cadáver ambulante em busca de um enterro digno. Sua constante presença na imprensa como voz a ecoar a moralidade pública e a condenar sumariamente aqueles que caíram em desgraças, tragados por algum escândalo de corrupção, o transformaram num dos nomes símbolos da ética, reserva moral de um país que não aceita mais a corrupção a corroer as engrenagens da máquina pública por um lado, e inimigo público número um dos muitos que foram alvos de seu destempero verbal, sempre a exigir um comportamento irrepreensível no homem público que agora sabe-se nem de longe mantinha, já que as escondidas usava seu mandato para defender os interesses de Carlinhos Cachoeira, o que está a lhe render uma saraivada de críticas contundentes, dado o seu passado de Varão de Plutarco com suas catilinárias moralistas a alcançarem tantos que um dia entraram no radar do senador e sofreram as mais vilipendiosas acusações morais disparadas por Demóstenes Torres da tribuna do senado, no cumprimento do papel que deu a si mesmo, qual seja o de grande guardião da moralidade pública e portanto um implacável opositor da corrupção.



São muitos desafetos prontos a exigirem uma rigorosa prestação de contas do Senador Demóstenes. No senado ainda estão lá Renan Calheiros e José Sarney. Os dois conhecem bem o que é ser cobrado pelo discurso frio e cortante da ética, tantas vezes formulado por Demóstenes e dirigido diretamente a um ou a outro sem meias palavras, exigindo que se licenciassem do mandado, renunciassem à condição de presidente da casa para defenderem-se das denúncias de então, sob pena de desmoralizarem o senado, era o que bradava aos quatro cantos a plenos pulmões. Agora que Demóstenes se encontra exatamente onde estavam Sarney e Renan não muito tempo atrás, não há um sinal sequer que indique disposição do senador Demóstenes em se licenciar ou renunciar ao mandato para evitar a desmoralização do senado. O que ele sempre exigiu dos outros nega para si. Mas labuta em vão. Sua inevitável cassação é só uma questão de tempo. Perdoa-se o pecador, o pregador não.

Demóstenes enfrenta a humilhação de ter a honra publicamente enxovalhada. Recebeu uma cozinha importada de presente de Cachoeira. Teve contas pessoais pagas pelo contraventor. Recebeu um celular do tipo Nextel, habilitado em Miami a mando de um delegado da PF que garantia a Cachoeira que esta mesma PF não dispunha de tecnologia capaz de fazer um grampo nesse telefone. Evidentemente o delegado estava errado. Demóstenes usou o mandato de senador para fazer loby em favor de Cachoeira, na Anvisa, na Infraero e no TJ de Goiás.

Os esquemas de Cachoeira vão muito além do senador Demóstenes Torres. Envolvem deputados de vários partidos, inclusive do PT. Envolvem também diretamente o governador Marconi Perillo acusado de ceder cargos do governo a indicações políticas promovidas por Carlinhos Cachoeira. Envolve o redator chefe da revista Veja, Policarpo Jr, flagrado em mais de 200 conversas telefônicas com o bicheiro. Sabe-se que Cachoeira pautava a Veja e se vangloriava de ser o principal informante da revista nos maiores escândalos da era Lula. O ex-prefeito de Anápolis veio a público confirmar a informação de que o tal "mensalão" tinha sido tramado por Cachoeira e Demóstenes e depois repassado para Veja. Esta mesma Veja inventou um grampo sem áudio em que participava Demóstenes e Gilmar Mendes resultando na queda de Paulo Lacerda da Abin, o ex-presidente Lula receber ameaças de ser chamado às falas e a operação Sathiagraha ser publicamente desmoralizadas para a tender aos interesses de Daniel Dantas.

Tão grave quanto a associação de Demóstenes com Cachoeira é a associação da principal revista do país com o crime organizado e esta mesma revista atentar contra o Estado Democrático de Direito ao fazer campanhas e mais campanhas baseadas em informações ilegais de que o presidente estaria a facilitar a corrupção em seu governo e por isto ser miseravelmente execrado dia e noite com vista a ter seu mandato cassado e sua deposição pedida pelo congresso. Isto realmente aconteceu no Brasil. Veja montou varias capas criminosas para derrubar o presidente Lula e por pouco não consegue. Só não conseguiu de fato porque FHC escolheu defender a tese do sangramento do presidente, um erro de avaliação que permitiu a Lula soerguer-se das cinzas. A Veja não pode passar incólume deste processo sem sofrer as consequências de suas escolhas. Não é possível que a justiça feche os olhos para os desmandos dessa revista. Providências precisam ser tomadas urgentemente a bem do Estado Democrático de Direito e da liberdade de imprensa.

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