Novamente a exploração sórdida do aborto que deveria ser tratado como uma questão de saúde pública, disponibilizando o Estado as condições necessárias para que as mulheres que façam a opção de abortar não corram o risco de morrer numa dessas clínicas clandestinas ou pelas mãos de parteiras despreparadas, ou ainda tomando o Citotex, abortivo vendido clandestinamente em qualquer boteco da esquina. E olha que tenho uma formação cristã muito bem alicerçada.
Apenas compreendo que este é um assunto que diz respeito à consciência individual de cada um, não cabendo ao Estado ou a líderes religiosos ditarem qual escolha deve a mulher fazer com o seu corpo, até porque se um dia o aborto vier a ser discriminalizado no Brasil, ninguém será forçada a abortar. Só o fará quem quiser. E se pecado é, como acredito que seja, é a Deus que a pessoa prestará contas e não a uma denominação religiosa ou a sua liderança.
Que as preocupações da Igreja se limitem a uma ampla doutrinação dos fiéis "interna corporis" sobre a questão do aborto, ensinando-lhe os princípios valiosos do evangelho, o conceito do criador sobre a vida e as consequências de se desobedecer o que determina as escrituras divinas. Este é o papel do verdadeiro pastor de ovelhas.
A partir daí a responsabilidade é de quem fez a escolha de abortar e somente aquela que buscou tal ato extremo poderá sofrer as consequências de cunho espiritual advindas pelas ações que tomou. Não há provisão nos evangelhos para uma salvação coletiva e ninguém será responsabilizado pelas ações de outrem. A salvação afirmou Paulo é individual, falo sob o ponto de vista religioso.
Voltando ao debate do aborto na visão de um Estado laico, o tema volta a ser explorado pelos colunistas amestrados da grande imprensa nacional que ideologizam os mais comezinhos e os mais relevantes aspectos que digam respeito ao governo Dilma e o anterior de Lula, colocando-os na vala comum, na categorização absurda do maniqueísmo simplista de enxergar as coisa apenas de um ponto de vista e não pelo todo.
O blogueiro da Veja se superou agora apelando para religiosidade do povo brasileiro numa exploração abjeta da fé alheia querendo reavivar a campanha sórdida que o PSDB patrocinou contra a então candidata Dilma. O blogueiro tira proveito de uma declaração dada por Gilberto Carvalho, num ambiente privado, para insuflar o fanatismo religioso de católicos e evangélicos fundamentalistas. Carvalho diz que a luta ideológica agora é contra os pastores televangelistas que através do evangelho da prosperidade coopta os recém-chegados à classe C.
Reinaldo Azevedo já havia aproveitado a indicação da nova ministra da secretaria especial das mulheres, Eleonora Menicucci, ardorosa defensora da discriminalização do aborto e antiga militante do movimento feminista, para jogar a cavalaria obscurantista dos fundamentalistas cristãos sobre o governo Dilma, melindrando-os com o revival de um tema que lhes é muito caro.
A ministra indicada reafirmou seus conceitos favoráveis a discriminalização do aborto para depois dizer que esta era posição pessoal dela, mas que faria o que o governo determinasse. Dilma assumiu um compromisso histórico durante a campanha passada, por obra e graça de José Serra que introduziu a patranha do aborto durante a campanha eleitoral com setores religiosos que se posicionam contra o aborto e sabe que terá de cumprir com a palavra empenhada no sentido de não de envidar qualquer esforço que mobilize sua base no congresso para alterar a legislação atual.
Por mais que se interdite o debate do aborto por causa de idiossincrasias religiosas, mesmo sendo o Estado Laico e não Teocrático, cedo ou tarde esta pauta terá de ser enfrentada por quem não esteja apenas interessado em angariar votos. E tenho comigo que outra vez será o tema central das eleições presidenciais de 2014, só que a presidenta atual prometerá novamente não influenciar na alteração da legislação vigente e se eleita, como não poderá ter um terceiro mandato, vai sim tratar do aborto da maneira que é pra ser, um problema de saúde pública.
Abortará quem quiser, ninguém será obrigado ou incentivado a abortar, mas se o fizer terá o sistema de saúde público à disposição para não correr risco de morrer nas mãos de pessoas despreparadas e oportunistas que trabalham num ambiente inapropriado e de alto risco para quem faz o aborto clandestino.
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