Gabriel Bonis
Insatisfeito com a baixa representatividade em organismos financeiros internacionais, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou na reunião dos chefes de finanças do G20 no sábado 24, na Cidade do México, que o BRIC (grupo composto por Brasil, Rússia, Índia e China) só vai contribuir com um nova ajuda à Europa caso o Fundo Monetário Internacional (FMI) realize a reforma em suas cotas para aumentar o poder dos emergentes no órgão.
Há tempos os emergentes pressionam por mais influência nas agências e entidades financeiras, sem grande sucesso. Por isso, a revista econômica norteamericana Bloombergaponta que, em paralelo ao evento no México, os representantes do BRIC discutiriam um novo caminho: a criação de um banco multilateral a ser mantido apenas por países em desenvolvimento para financiar projetos nestas regiões.
A medida, apresentada pela Índia, ainda está em fase de inicial de discussão, mas circula entre o grupo e vai ser debatida de forma mais específica na reunião dos BRIC em março, diz a publicação.
A inciativa é bem vista por Amir Khair, ex-secretário de Finanças em São Paulo e especialista em contas públicas. Segundo ele, a eventual criação do banco do BRIC pode ter um forte apelo político. “É uma forma de união dos emergentes, que possuem enorme força neste contexto internacional em que FMI e Banco Mundial servem apenas para financiar os desenvolvidos.”
Júlio Sérgio Gomes de Almeida, doutor em economia e consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), destaca que a ação seria um instrumento de promoção de investimentos e exportações entre os emergentes. “As agências existentes cumprem esse papel, mas possuem uma orientação de gestão mais dirida pelos países desenvolvidos.”
O banco dos BRIC seria, neste contexto, um instrumento para os emergentes evidenciarem ainda mais sua força, uma vez que as tentativas de conquistar espaço no FMI e Banco Mundial para eliminar as nomeações de um europeu e um americano para a presidir as entidades, respectivamente, não foram bem sucedidas.
“Há um déficit de representatividade destes países nos organismos internacionais. É natural que desejem aumentar sua influência, porque até agora quase não houve avanços”, ressalta o consultor.
Em 2011, após a renúncia de Dominique Strauss-Kahn, os emergentes não conseguiram se unir ao redor de uma candidatura própria para a direção do FMI, que acabou entregue à francesa Christine Lagarde. O mesmo pode ocorrer em junho, quando Robert Zoellick deixará o comando do Banco Mundial.
De acordo com Khair, os europeus possuem mais cotas de participação no FMI do que sua atual importância econômica, uma manutenção irreal de influência que frustra os emergentes. “Caso todos os BRIC invistam neste banco (juntos, eles possuem mais de 4 trilhões de dólares em reservas), seria um volume de recursos expressivo para se aplicar em projetos de países em desenvolvimento, que teriam mais chances de sucesso e retorno.”
Uma afirmação lógica, pois, segundo dados do próprio FMI, os países do BRIC devem crescer juntos 24% em 2012, enquanto os EUA têm estimativa de 1,8% de avanço do PIB e os 17 países da Zona do Euro vão encolher 0,5% ao todo.
A criação do banco, que entrou em pauta porque os organismos existentes não têm conseguido (ou mostrado vontade suficiente) de financiar as nações em desenvolvimento de forma efetiva, poderia dinamizar os recursos para os emergentes. “Estados Unidos e Europa ainda tentam superar a crise e o retorno dos investimentos em países em desenvolvimento é garantido, além de haver um grande mercado consumidor”, destaca Khair.
Esse número atraente de compradores é um dos atrativos para a criação do banco, que pode ampliar os mercados de exportação destes países, além de ser um benefício adicional conferido aos emergentes menos desenvolvidos, aponta Almeida. “Esse instrumento atende aos interesses dos emergentes com maior poder, mas também potencializa o desenvolvimento e investimentos nas demais nações emergentes.”
Para o ex-secretário de Finanças em São Paulo, o banco permitiria desenvolver políticas específicas a países africanos com empréstimos a condições mais favoráveis, algo pouco provável no FMI ou BM. “Esses lugares podem dar retorno, precisam apenas de uma ajuda.”
A fim de atender essa demanda, a entidade deveria ter um perfil semelhante ao do BM, financiando projetos de desenvolvimento, defende o consultor do IEDI. “A instituição não pode ter preferência de países ou privilegiar interesses dos emergentes de maior força para evitar disputas de poder.”
“Os emergentes, principalmente os BRICs são credores agora. Nada mais justo que usem seu dinheiro para o desenvolvimento próprio”, afirma Khair.
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