quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Líbia: Depois do bombardeio que a Al Jazeera inventou


Do vi o mundo

December 01, 2011
Enquanto os ‘guerreiros humanitários’ vibram…
A questão-chave sobre a guerra na Líbia
Nos dias de hoje os guerreiros humanitários estão se gabando, graças à proclamada vitória na Líbia. A única superpotência do mundo, com o apoio moral, militar e mercenário dos amantes da democracia do emirado do Qatar e com os poderes imperialistas históricos da Grã Bretanha e da França, foi capaz de esmagar sem surpresa o governo estabelecido de um estado esparsamente habitado do norte da África em apenas sete meses. O país foi violentamente ‘liberado’ e deixado para quem quiser pegar. Quem vai ficar com qual pedaço, entre as milícias armadas, as tribos e os islamistas da jihad, não é do interesse da mídia ocidental ou dos humanitários mais do que era a Líbia antes da TV do Qatar, a Al Jazeera, despertar o zelo cruzadista em fevereiro, com reportagens não-documentadas sobre atrocidades iminentes*.
A Líbia pode mergulhar de volta na obscuridade enquanto os campeões ocidentais de sua destruição brilham sob os refletores. Para apimentar a auto-congratulação, eles dedicam alguma atenção aos pobres palhaços que se negaram a embarcar na mesma canoa.
Nos Estados Unidos, mas ainda mais na França, os que se opuseram ao partido da guerra foram poucos em número e foram ignorados. Mas não deixa de ser uma oportunidade para isolá-los ainda mais.
Em seu artigo, “Líbia e a esquerda: Benghazi e depois”, Michael Bérubé usa a ocasião para juntar os críticos da guerra sob o rótulo de “maniqueístas da esquerda” que, segundo ele, simplesmente respondem com oposição automática ao que fizerem os Estados Unidos. Ele e os de sua turma, por contraste, refletem profundamente e apresentam razões para bombardear a Líbia.
Ele começa dizendo:
“No fim de março de 2011, um massacre foi evitado — não qualquer tipo de massacre. Pois se Kadafi e suas forças conseguissem esmagar a rebelião líbia em seu quartel-general de Benghazi, os choques resultantes teriam reverberado muito além do leste da Líbia. Como Tom Malinowski da Human Rights Watch escreveu, ‘a vitória de Kadafi — junto com a queda de Mubarak no Egito — teria sinalizado para os governos autoritários da Síria à Arábia Saudita à China que se você negociar com manifestantes você perde, mas se você matá-los você ganha…’”.
“Os ataques liderados pela OTAN contra as forças de Kadafi, na verdade, fizeram mais que prevenir uma catástrofe humanitária na Líbia — embora deve-se reconhecer que apenas isso seria justificativa suficiente. Ajudaram a manter viva a Primavera Árabe…”
Mas tudo isso é perfeitamente hipotético.
Qualquer massacre que tenha sido evitado em março, outros massacres aconteceram em vez daquele, mais tarde.
Ou seja, se esmagar uma rebelião armada é massacre, uma rebelião armada vitoriosa também implica em massacre, e assim temos uma escolha entre massacres.
E, se as propostas de mediação da América Latina e da África tivessem sido consideradas, o massacre hipotético poderia ter sido evitado por outros meios, mesmo que a rebelião armada tivesse sido derrotada — uma hipótese que o partido pró-guerra se negou a considerar desde o início.
Mas ainda mais hipotética é a noção de que o fracasso da rebelião líbia teria danificado fatalmente a “Primavera Árabe”. Isso é especulação pura, sem qualquer fiapo de prova.
Os governos autoritários certamente não precisavam de uma lição para ensiná-los a lidar com manifestantes, o que em último caso depende dos meios políticos e militares à disposição deles. Mubarak perdeu não por ter negociado com os manifestantes, mas porque o Exército financiado pelos Estados Unidos decidiu abandoná-lo. Em Bahrain, a Arábia Saudita ajudou a matar manifestantes. De qualquer forma, os governantes autoritários árabes, inclusive o emir do Qatar, odiavam Kadafi, que tinha a mania de denunciar a hipocrisia deles em encontros internacionais. Eles ficaram felizes com a queda de Kadafi.
Esses argumentos pró-guerra estão na mesma classe das “armas de destruição em massa” do Iraque ou da ameaça de “genocídio” em Kosovo — perigos hipotéticos usados para justificar a guerra preventiva. “Guerra preventiva” é o que permite a um superpoder militar, tão poderoso que nunca precisou se defender de ataque estrangeiro, atacar outros países. Caso contrário, qual é a justificativa para se ter um exército se não podemos usá-lo?, como perguntou certa vez [a ex-secretária de Estado] Madeleine Albright.
Mais adiante em seu artigo, Bérubé cita seu colega guerreiro humanitário Ian Williams, que argumentou que a série de objeções à intervenção na Líbia “foge da questão crucial: o mundo deveria deixar civis líbios morrer nas mãos de um tirano?”. Ou, em outras palavras, a “pergunta-chave” é: “Quando um grupo de pessoas que está prestes a ser massacrado pede ajuda, o que você faz?”.
Com esta seleção de perguntas “cruciais” e “chaves”, explorando o sentimento de culpa, Bérubé e Williams varrem de lado todas as objeções legais, éticas e políticas ao ataque da OTAN na Líbia.
Mas nada autorizava estes senhores a decidir qual é a “questão-chave”. Na realidade, a “questão-chave” deles levantava uma série de outras questões.
Primeira delas: Qual grupo de pessoas? Elas estão mesmo perto de ser massacradas? Qual é a fonte desta informação? Teria havido exagero? Ou teria havido invenção pura e simples, com o objetivo de forçar poderes estrangeiros a intervir?
Um jovem cineasta francês, Julien Teil, fez uma entrevista marcante com o secretário-geral da Liga de Direitos Humanos da Líbia, Slimane Bouchuiguir, na qual ele admite candidamente que “não tinha provas” das alegações feitas perante a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, que levaram à expulsão imediata do representante oficial da Líbia e, a partir disso, às resoluções da ONU autorizando o que viria a ser a troca de regime feita pela OTAN. Na verdade, nenhuma prova foi produzida do “bombardeio a civis líbios” denunciado pela Al Jazerra, o canal de TV financiado pelo emir do Qatar, que emergiu com uma grande fatia dos negócios de petróleo líbios depois da “guerra de libertação” da qual o Qatar participou.
Imagine agora quantos grupos minoritários existem em países de todo o mundo que adorariam ter a OTAN bombardeando o caminho para que eles chegassem ao poder. Se tudo o que tiverem de fazer for encontrar um canal de TV que noticie suas alegações de que estão prestes “a ser massacrados”, a OTAN vai ficar ocupada pelas próximas décadas, para alegria dos intervencionistas humanitários.
Um traço saliente deste grupo é sua seletividade. De um lado, eles automaticamente descartam todas as declarações oficiais vindas de governos “autoritários” como propaganda falsa. De outra parte, eles parecem nunca notar que as minorias têm interesse em mentir sobre sua condição com o objetivo de obter apoio externo. Eu observei isso em Kosovo. Para a maioria dos albaneses, era uma questão de dever  com seu grupo nacional dizer o que quer que fosse necessário para conquistar o apoio de estrangeiros para sua causa. A verdade não era um critério importante. Não é necessário culpá-los por isso, mas também não é obrigatório acreditar neles. A maioria dos repórteres que esteve em Kosovo, sabendo que isso agradaria aos editores, baseou seus despachos em quaisquer que fossem as lendas contadas a eles por albaneses que queriam que a OTAN separasse Kosovo da Sérvia. Foi o que aconteceu.
Na verdade, é sábio ter cautela sobre o que todos os lados dizem em conflitos étnicos ou religiosos, especialmente em países com os quais não se tem intimidade familiar. Talvez as pessoas não mintam na homogênea Islândia, mas na maior parte do mundo a mentira é uma forma normal de promover os interesses de grupo.
A importante “questão-chave” sobre como responder “a um grupo de pessoas prestes a ser massacrado” é um golpe retórico destinado a tirar o problema do campo da realidade contraditória para levá-lo à esfera de ficção puramente moralista. Sugere que “nós” no Ocidente, inclusive o mais passivo dos telespectadores, temos o conhecimento e a autoridade moral para julgar e agir sobre qualquer evento em qualquer parte do mundo. Não é o caso.
E o problema é que as instituições intermediárias, que possuem o conhecimento que se requer e a autoridade moral, foram ou tem sido enfraquecidas ou subvertidas pelos Estados Unidos em sua insaciável busca por mais do que consegue mastigar. Como os Estados Unidos têm poderio militar, promovem o poder militar como solução para todos os problemas. A diplomacia e a mediação estão sendo crescentemente negligenciadas e desprezadas. Isso não é deliberado, nem resultado de um política pensada, mas resultado automático de 60 anos de crescimento da máquina militar.
A verdadeira questão crucial
Na França, onde o presidente Nicolas Sarkozy lançou a cruzada anti-Kadafi, a unanimidade pró-guerra foi maior que nos Estados Unidos. Uma das poucas personalidades proeminentes da França que falaram contra a guerra foi Rony Brauman, um ex-presidente do Médicos Sem Fronteiras, e um crítico da ideologia da “intervenção humanitária” promovida por outro ex-líder do MSF,  Bernard Kouchner. A edição de 24 de novembro do Le Monde trouxe um debate entre Brauman e o maior promotor da guerra, Bernard-Henry Lévy, que trouxe à tona a verdadeira questão crucial.
O debate começou com algumas disputas sobre fatos. Brauman, que inicialmente apoiou a noção de intervenção limitada para proteger Benghazi, disse que rapidamente mudou de ideia depois de se dar conta de que as ameaças envolvidas eram uma questão de propaganda, não de realidade observável. Os ataques aéreos contra as manifestações em Trípoli foram “uma invenção da Al Jazeera”, ele observou.
Ao que Bernard-Henri Lévy respondeu, no estilo marca-registrada dele de mentira indignada. “O que? Uma invenção da Al Jazeera? Como você, Rony Brauman, pode negar a realidade daqueles jatos que mergulhavam para metralhar manifestantes em Tripoli que todo o mundo viu?” Pouco importa que o mundo nunca tenha visto isso. Bernard-Henri Lévy sabe que o que quer que ele diga será ouvido na TV e lido em jornais, sem necessidade de provas. “De um lado, você tinha um exército super equipado por décadas e preparado contra um levante popular. De outro você tinha civis desarmados”.
Quase nada disso foi verdadeiro. Kadafi, temendo um golpe militar, manteve seu exército relativamente fraco. O muito denunciado equipamento militar ocidental nunca foi usado e as compras de Kadafi, como as feitas por estados ricos em petróleo, foram mais um favor aos fornecedores ocidentais que uma contribuição eficaz para a defesa. Além disso, o levante na Líbia, em contraste com protestos em países da região, era claramente um levante armado.
Mas além da questão factual, a questão crucial no debate entre os dois franceses era de princípio: a guerra é ou não boa?
Perguntado se a guerra na Líbia marca a vitória do direito à intervenção, Brauman respondeu:
“Sim, sem dúvida… Alguns festejam a vitória. De minha parte, deploro, porque vejo que houve a reabilitação da guerra como forma de resolver conflitos”.
Brauman concluiu: “Além da frivolidade com a qual o Conselho Nacional de Transição, cujos membros eram desconhecidos, foi imediatamente apresentado por Bernard-Henri Lévy como um movimento democrata secular, existe uma certa ingenuidade em querer ignorar o fato de que a guerra cria dinâmicas que favorecem os radicais, em detrimento dos moderados. Essa guerra não acabou. Ao fazer a escolha de militarizar a revolta, o CNT deu aos mais violentos sua oportunidade. Ao apoiar a opção em nome da democracia, a OTAN assumiu uma responsabilidade pesada, além de seus meios. É porque a guerra é uma coisa ruim em si que não devemos promovê-la…”
Bernard-Henri Lévy ficou com a última palavra: “A guerra em si não é uma coisa ruim! Se torna possível evitar violência pior, é um mal necessário — essa é a teoria completa da guerra justa”.
A ideia de que este princípio existe é “como uma espada de Damocles sobre as cabeças de tiranos que se consideram os donos de seus povos, o que já é um progresso formidável”. Bernard-Henri Lévy está feliz com a ideia de que  desde o fim da guerra na Líbia, Bashir Al Assad e Mahmoud Ahmadinejad dormem pior. Em resumo, ele celebra a perspectiva de novas guerras.
Assim, esta é a pergunta-chave crucial: a guerra é ruim em si? Bauman diz que sim e a estrela da mídia conhecida como BHL diz que não, “se torna possível evitar violência maior”. Mas qual violência é pior que a própria guerra? Quando a maior parte da Europa ainda estava em ruínas, depois da Segunda Guerra Mundial, o tribunal de Nuremberg proclamou seu julgamento final:
“A guerra é em si uma coisa diabólica. Suas consequências não ficam apenas nos estados beligerantes, mas afetam todo o mundo. Iniciar uma guerra de agressão, portanto, não é apenas um crime internacional; é o supremo crime internacional, diferente de outros crimes de guerra porque contém em si a maldade acumulada do todo”.
De fato, a Segunda Guerra Mundial continha em si “a maldade acumulada do todo”: as mortes de 20 milhões de cidadãos soviéticos, Auschwitz, o bombardeio de Dresden, Hiroshima e Nagasaki e muito, muito, muito mais.
Sessenta anos depois, é fácil para norte-americanos e europeus ocidentais, com suas vidas ainda relativamente confortáveis e seu narcissismo incentivado pela ideologia dos “direitos humanos”, contemplar o início de guerras “humanitárias” para “salvar vítimas” — guerras nas quais eles não correm maior risco do que quando jogam videogame.
Kosovo e Líbia são as guerras humanitárias perfeitas: nenhum ferido, nem mesmo um arranhão nos bombardeiros da OTAN e nem mesmo a necessidade de ver derramamento de sangue no solo. Com o desenvolvimento da guerra por aviões não tripulados, tais guerras seguras, à distância, abrem a perspectiva de “intervenção humanitária” sem riscos, o que pode permitir a celebridades ocidentais como Bernard-Henri Lévy posar como campeões hipotéticos em defesa de vítimas de hipotéticos massacres hipoteticamente evitados por guerras reais.
A “pergunta-chave”? Há muitas questões importantes resultantes da guerra na Líbia e muitas razões importantes e válidas para se opor a ela e continuar se opondo. Como na guerra em Kosovo, deixou um legado de ódio no país-alvo, cujas consequências envenenam a vida das pessoas que vivem nestes países por gerações. Isso, naturalmente, não é de interesse particular das pessoas no Ocidente, que não prestam atenção nos danos humanos causados por sua matança humanitária. É apenas o resultado menos visível de tais guerras.
De minha parte a questão chave, que motiva minha oposição à guerra da Líbia, é o que ela significa para os Estados Unidos e o mundo. Por mais de meio século, os Estados Unidos tem sido canibalizados pelo complexo industrial-militar, que infantilizou a moral do país, desperdiçou sua riqueza e solapou sua integridade política. Nossos líderes políticos não são genuínos, mas foram reduzidos ao papel de apologistas deste monstro, que tem seu próprio moto burocrático — bases que proliferam no mundo, buscando e criando estados clientes servis, provocando desnecessariamente poderes como a Rússia e a China. O dever político primário de norte-americanos e seus aliados europeus deveria ser o de reduzir e desmantelar esta máquina militar gigantesca, antes que nos leve a todos, inadvertidamente, ao “supremo crime internacional” sem retorno.
Assim, minha principal oposição a esta recente guerra é que, precisamente num momento em que alguns em Washington estavam hesitantes, “intervencionistas humanitários” como Bernard-Henri Lévy, com sua pretensão sofista de “R2P”, “proteger civis inocentes”, alimentaram e encorajaram o monstro, ao oferecer a ele “as frutas fáceis de colher” de uma vitória na Líbia. Isso tornou a luta para trazer paz e sanidade ao mundo ainda mais difícil do que já era.
DIANA JOHNSTONE é autora de Fools Crusade: Yugoslavia, NATO and Western Delusions. Ela responde e-mails no diana.josto@yahoo.fr
*****
*Em ‘Who Said Gadafi had to Go’, no London Review of Books, Hugh Roberts também sustenta que os ataques aéreos por parte de aviões militares de Kadafi contra manifestantes, denunciados pela Al Jazeera, não aconteceram:
“Em 21 de fevereiro o mundo ficou chocado com as notícias de que o regime de Kadafi estava usando a força aérea para massacrar manifestantes pacíficos em Tripoli e outras cidades. A principal divulgadora dessa notícia foi a al-Jazeera mas o assunto foi rapidamente replicado pela rede Sky, pela CNN, BBC, ITN e outros. Antes do dia acabar a ideia de impor uma zona de exclusão aérea na Líbia era amplamente aceita, assim como a ideia do Conselho de Segurança impor sanções e um embargo de armas, congelar os bens da Líbia e indicar Kadafi e aliados ao Tribunal Penal Internacional, sob a acusação de cometer crimes contra a humanidade. A resolução 1970 foi aprovada cinco dias depois e a proposta de uma zona de exclusão aérea monopolizou as discussões internacionais sobre a crise na Líbia dali por diante.
[...]
Nos dias seguintes eu fiz tentativas de checar a notícia da al-Jazeera. Uma fonte que consultei foi um blog tido como confiável, o Informed Comment, mantido e atualizado todos os dias por Juan Cole, um especialista em Oriente Médio da Universidade de Michigan. Ele tinha um post datado de 21 de fevereiro intitulado ‘Bombardeios de Kadafi fazem lembrar os de Mussolini’, que recordava que entre 1933-30, Italo Balbo defendeu a guerra aérea como a melhor forma de lidar com populações coloniais revoltadas.
[Nota do Viomundo: A Itália foi o poder colonial na Líbia]
O post começava: ‘Os ataques e bombardeios contra manifestantes civis em Trípoli pelos jatos de Muammar Gaddafi na segunda-feira…’, palavras sublinhadas que linkavam para um artigo assinado por Sarah El Deeb e Maggie Michael, da Associated Press, publicada às 9 da noite de 21 de fevereiro. O artigo da AP não corroborava as alegações de Cole de que os caças de Kadafi (ou qualquer outra aeronave) tinham atacado ou bombardeado qualquer pessoa em Tripoli ou outro lugar. O mesmo é verdadeiro para todas as fontes indicadas em outros itens relacionados à Líbia e à notícia dos ataques aéreos postados por Cole no mesmo dia.
Passei a maior parte do tempo no Egito, mas como muitos jornalistas que visitaram a Líbia passaram pelo Cairo, fiz questão de perguntar aos que pude encontrar sobre o que tinham visto em campo. Nenhum deles encontrou nenhuma confirmação para a notícia. Eu me lembro especialmente do dia 19 de março, quando perguntei ao especialista britânico em norte da África, Jon Marks, que tinha acabado de fazer um tour pela Cirenaica (passando por Ajdabiya, Benghazi, Brega, Derna e Ras Lanuf), o que ele sabia sobre a notícia. Ele me disse que ninguém com quem tinha conversado havia mencionado o assunto. Quatro dias depois, em 22 de março, o [jornal norte-americano] USA Today trouxe um artigo surpreendente de Alan Kuperman, autor de Limites da Intervenção Humanitária [The Limits of Humanitarian Intervention] e co-editor de Apostando na Intervenção Humanitária [Gambling on Humanitarian Intervention].
O artigo, ‘As cinco coisas que os Estados Unidos deveriam considerar na Líbia’, forneceu um poderosa crítica da intervenção da OTAN como violadora das condições que deveriam ser observadas para uma intervenção humanitária ser justificável e bem sucedida. Mas o que mais me interessou foi a declaração dele de que ‘apesar da ampla presença de câmeras em telefones celulares, não há imagens de violência genocida, uma alegação que parece ser propaganda rebelde’. Assim, depois de quatro semanas, eu não estava só entre os que tentaram encontrar provas de um massacre aéreo. Descobri subsequentemente que a questão tinha sido levantada algum tempo antes, em 2 de março, em audiência do Congresso dos Estados Unidos quando [Robert, secretário de Defesa] Gates e o almirante Mike Mullen, chairman do Joint Chiefs of Staff, testemunharam.Eles disseram ao Congresso que não tiveram confimação das notícias de que aeronaves controladas por Kadafi tinham atirado em cidadãos.
A notícia era mentirosa, assim como a notícia que foi divulgada no mundo em agosto de 1990 dizendo que tropas iraquianas tinham matado bebes do Kuwait ao desligar incubadoras em maternidades, assim como eram falsas as alegações exageradas dos dossiês sobre as armas de destruição em massa de Saddam [Hussein]. Mas, como Mohammed Khider, um dos fundadores da FLN, disse uma vez, ‘quando todos acreditam numa falsidade, ela se torna realidade’. A corrida para a troca de regime [na Líbia] estava em andamento e nada conseguiria detê-la”.

Nenhum comentário: